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Bogdanovic: como construir uma jovem estrela sérvia
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Giancarlo Giampietro

Bogdan-Bogdan, 22 anos, chamando o jogo contra o Brasil

Bogdan-Bogdan, 22 anos, chamando o jogo contra o Brasil

Este espaço vem batendo na tecla nos últimos dias contrapondo o impacto que a produção das categorias de base de Brasil e Sérvia tem na formação de suas respectivas seleções. O paralelo poderia ser feito com qualquer outro dos países que disputam as semifinais da Copa do Mundo, mas calhou de serem os balcânicos a surgirem no meio do caminho de um time nacional que realmente tinha esperança de brigar por medalha.

Dentre os muitos talentos sérvios lançados ano após ano, num ritmo muito mais acelerado que o Brasileiro, embora tenham população 20 vezes menor, o caso de Bogdan Bogdanovic me parece o mais interessante para ser investigado, envolvendo diversas facetas do basquete de lá que talvez ajudem alguma alma iluminada com poder de decisão no basquete brasileiro.

Com 22 anos, o ala-armador, uma das revelações a serem vigiadas no Mundial, aparece como o terceiro cestinha sérvio no torneio, atrás apenas de Miroslav Raduljica, um pivô que também nos conta uma lição, e Milos Teodosic, que andava deveras comportado até arrebentar com a defesa brasileira nesta quarta-feira. Em termos de eficiência, ele aparece em quarto na lista, superado também por Nemanja Bjelica. Todos eles mais velhos, diga-se. Agora, se formos ver o saldo de cestas de seu time nos minutos em que esteve em quadra, ele tem a melhor marca, com +7,9, batendo Teodosic, por exemplo, por 2,3 pontos. Número por número, acho que dá para eleger o rapaz já como um dos protagonistas da equipe.

Bogdan-Bogdan tem 22 anos. Está entre os protagonistas sérvios

Bogdan-Bogdan aqui errou a bandeja, acuado pela cobertura de Nenê: mas o garoto foi bem no geral, com 12 pontos, sendo assistido pelo gerente geral do Phoenix Suns na plateia

Algo que um ou dois anos antes não estava nada previsto. Bogdan-Bogdan é o protagonista de uma das ascensões mais significativas do basquete europeu em tempos recentes. Nesta escalada, boa parte do roteiro era planejada. Mas também não dá para negar que a interferência de umas pitadinhas de sorte.

Em maio de 2010, ele mostrou as caras para um bom contingente de olheiros nternacionais no tradicional Nike International Junior Tournament, em Paris. O sérvio foi inscrito como atleta do FMP, clube que revelou dos anos 90 para cá gente como Teodosic, Zoran Erceg, entre outros, mas, pelo que consta, estava apenas emprestado. A ideia era usar o torneio juvenil como vitrine para seus habilidades, neste tipo de combinação que agentes e equipes de menor orçamento podem realizar. Deu certo.

Segue um relato do DraftExpress, serviço de scouting dos mais prestigiados que você vai encontrar: “Bogdanovic tem um jogo bastante versátil ofensivamente. Ele pode criar seu próprio arremesso, cortando pela direita ou pela esquerda e também faz seus arremessos do perímetro, mesmo que seu lançamento precise ficar mais rápido e consistente. Ele também pode pontuar de costas para a cesta e dá sinais de que um jogo de meia distância está surgindo, especialmente com a cesta da vitória que fez contra o Málaga, garantindo uma vaga nas finais. Ele não estava completamente integrado ao time e, em algumas ocasiões, ele levou essa coisa de vitrine bem literalmente. Estava um pouco faminto cuidando de seu próprio arremesso, forçando algumas bolas bem ruins e arriscando infiltrações difíceis”.

Antes ser alistado pelo FMP, o garoto jogou pelo Zvezdara e pelo Žitko Basket. Ao final de sua participação naquela competição juvenil, conseguiu o que queria: um contrato profissional, e com o Partizan Belgrado, aos 18 anos. Em duas temporadas, foi aproveitado em apenas 23 jogos da liga local. Em 2012-13, porém, já estava mais preparado para entrar de vez na rotação dessa potência sérvia. Estreou na Euroliga e na Liga Adriática, com médias de 5 pontos no torneio continental, mas sentindo o peso da concorrência elevada (acertou, por exemplo, apenas 10 de 33 arremessos que tentou em seis jogos). No campeonato nacional, os números subiram para 9,8 pontos e aproveitamento superior a 42% nos chutes, com 39% de três. Alguns degraus foram escalados, mas ninguém imaginava o que viria a seguir.

Bogdan-Bogdan, líder da horda

Bogdan-Bogdan, líder da horda

Aqui é importante explicar qual a realidade do Partizan hoje. Na Sérvia, os caras ganharam simplesmente os últimos 13 títulos. Sim, 13. No âmbito regional, ainda conquistaram seis das últimas oito Ligas Adriáticas, campeonato que reúne agremiações da antiga Iugoslávia. Nos Bálcãs, eles encaram concorrência chata – só foram campeões nacionais neste ano, por exemplo –, mas está claro que hoje são eles quem mandam por lá. Se for para olhar para o resto do continente, porém, a relativização deixa o clube pequeno. Seu orçamento é bem reduzido comparando com espanhóis, gregos e, especialmente, russos e turcos. Então o que eles fazem? Trabalham basicamente com atletas jovens, um ou outro americano disponível no mercado e veteranos sérvios, mas não os de elite: tanto que, na atual seleção nacional, não estão representados por nenhum atleta.

Para terem sucesso, dependem que esses garotos sejam realmente promissores e precocemente produtivos. O interessante é que, devido ao espaço e a visibilidade que acaba proporcionando, o time tem recebido também jogadores de outros países – na última Euroliga, contaram com três revelações francesas: o pivô Joffrey Lauvergne, outro semifinalista do Mundial e que já foi embora para a Rússia, e os armadores Leo Westermann e Boris Dallo. Todos saem ganhando: o Partizan ganha personagens talentosos para explorar, e os jovens recebem tempo de quadra para se desenvolverem e ganharem exposição.

Nesse contexto, Bogdanovic, em seu quarto ano de casa, foi alçado ao patamar de jogador-chave, sob a orientação do técnico Dusko Vujosevic. Esperavam dele uma produção consistente para conseguir, quiçá, uma campanha respeitável na Euroliga e manter a hegemonia balcânica. O ala-armador, do ponto de vista individual, superou todas as expectativas. Um fator que contribuiu para isso: uma grave lesão de joelho sofrida por Leo Westermann, que aumentou sensivelmente as responsabilidades de seu companheiro. Ele teve de ficar com a bola muito mais tempo em mãos – muito mais do que estava acostumado – e viu seu progresso ser bastante acelerado. Cometeu um caminhão de turnovers (3,4 por jogo), é verdade, mas teve liberdade para errar até se tornar também uma atacante mais confiante e com mais recursos ao final da jornada.

Ao analisá-lo quatro verões depois daquele torneio juvenil em Paris, Jonathan Givony viu um jogador formado. “O Bogdanovic se aproveitou da lesão para assumir  um papel muito mais proeminente no ataque como um condutor de bola primário e também como facilitador. Sua versatilidade é impressionante, liderando a equipe em pontos, assistências, tocos e taxa de uso, enquanto vai acertando 40% da linha de três”, afirma. “Não há dúvida de que, nesse meio tempo, ele emergiu como o prospecto mais intrigante da geração nascida em 1992 na Europa.”

Bogdanovic teve médias na Euroliga de 14,8 pontos, 3,7 assistências e 3,7 rebotes, além de 1,6 roubo de bola, em 31 minutos. Carregava uma carga pesada e conseguiu triplicar seus números em um ano, ajudando o Partizan a se classificar para a segunda fase do campeonato, o Top 16. Em sua melhor atuação, marcou 27 pontos em casa contra o CSKA, liderando uma rara vitória sobre um dos favoritos ao título, matando 10 de 16 arremessos. Fez também 24 pontos e 5 assistências contra o Bayern de Munique e o Zalgiris Kaunas e 25 pontos e 5 rebotes contra o Barcelona. No final, foi eleito a “estrela ascendente” do campeonato, entrando numa lista em que constam Ricky Rubio, Nikola Mirotic, Erazem Lorbek, Andrea Bargnani, Danilo Gallinari e Rudy Fernández.

Seu basquete, então, em uma temporada saiu de coadjuvante para algo muito acima do que o clube de Belgrado poderia pagar. Antes de ser selecionado pelo Phoenix Suns no Draft da NBA em 27º, foi transferido para o Fenerbahçe, no qual vai substituir seu xará Bojan Bogdanovic e será treinado pelo legendário Zeljko Obradovic (só precisa ver se Obrado estará com saco para aguentar mais um ano num elenco cheio de estrelas, mas que fracassou de modo retumbante no ano passado, causando ataques histéricos no técnico). Antes de sair do Partizan, deixou sua marca nas finais do campeonato sérvio: com 30,8 pontos, 4,8 rebotes e 4,2 assistências, liderou mais uma vitória contra o arquirrival Estrela Vermelha para conquistar seu quarto título nacional, também o 12º seguido do clube. Passou a ser idolatrado pelos torcedores, a ponto de sua conta no Twitter ser: Líder da Horda. Então tá, né?

Pela seleção foi convocado pela primeira vez já para o EuroBasket do ano passado, com 21 anos. Teve médias de 9,4 pontos e 4,3 rebotes em 26 minutos, com 43,4% nos arremessos. Foi elogiado por Sasha Djordjevic, como uma das maiores promessas do basquete europeu. Na Copa do Mundo, depois de tudo, joga por 27,3 minutos, abaixo apenas de Bjelica, e soma 11,4 pontos, 2,7 rebotes e 2,6 assistências, com 49,2%, mantendo média próxima a 40% nos tiros de três em ambas as campanhas. Contra o Brasil, foram 12 pontos, 6 rebotes, 2 assistências, 2 tocos e 5/9 nos arremessos, em 26 minutos.

O gerente geral do Suns, Ryan McDonough, estava no ginásio em Madri e adorou o que viu. “Ele foi muito eficiente e conseguiu os arremessos que gosta de fazer, nos seus lugares preferidos. As cestas vieram com os pés plantados, a partir do drible e em infiltrações. Estou impressionado com sua capacidade para criar jogadas. Ele pode fazer um monte de jogadas que a maioria não consegue”, analisou em entrevista ao jornal AZ Central. “E o Bogdan tem essa atitude, e digo isso para o bem. Ele é competitivo, muito valente, confiante. Não vai recuar diante de ninguém.”

Importante dizer que, se no Partizan era o dono da bola, pela Sérvia ele só vai recuar em relação aos seus companheiros mais tarimbados. Na equipe semifinalista, a prioridade ainda fica para Teodosic e o jogo interno com Raduljica e Nenad Krstic. Aos 22 anos, há tempo pra tudo. Bogdanovic tem a idade de revelações brasileiras como Raulzinho, Lucas Bebê e Cristiano Felício. Porém, sem discutir a questão de quem seria mais talentoso que o outro, é fácil constatar que está num estágio de desenvolvimento muito mais avançado, já voando alto na carreira. É preciso apenas entender em que condições ele cresceu, qual foi o cenário para que ele pudesse chegar lá antes da maioria.


As semifinais da Copa do Mundo em números
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Giancarlo Giampietro

Gente, vocês querem números? Faltam apenas quatro jogos para o sonho de uma Copa do Mundo de basquete de verão terminar. Com quatro times em disputa, sendo que um vai sair de mãos abanando, assim como aconteceu com Brasil e Espanha. Mas, isso, claro, vocês já sabiam. Vamos com outros dados, então:

No poderoso ataque americano, tem até para DeRozan. Dale, cravada

No poderoso ataque americano, tem até para DeRozan. Dale, cravada

102,3 – Os EUA têm o melhor ataque da Copa, e o restante não chega nem perto. Com 102,3 pontos por jogo, abriram quase 20 de vantagem para a Espanha, que agonizou diante da defesa sufocante dos franceses nesta quarta. Entre os que ainda estão no páreo, a Sérvia aparece em segundo, com 80,1, ajudada pela sacolada que deram no Brasil. A Lituânia anotou 76 pontos em média, enquanto a França tem 72,9 (apenas a 14ª no geral).

68,8% – Sérvia e França estão empatados com este fraco aproveitamento em seus lances livres, valendo as 17ª e 18ª posições no ranking geral. Os EUA, com 71,3%, aparecem em 13º. A Lituânia tem 75,2%, em quarto. Por curiosidade, as Filipinas lideraram o quesito, com 79,6%.

44 – Este a gente colocou no primeiro dessa texto dessa série estatística, mas, depois da tragédia espanhola, vale o reforço: foi em 1970, há 44 anos, a última vez em que o país anfitrião viu sua seleção comemorar o título: a Iugoslávia. O que, nos tempos de hoje, nem vale: eram vários países em um, sendo que três deles disputaram a atual edição: Croácia, Eslovênia e Sérvia.

A vitalidade de Jonas Valanciunas, estrela lituana de apenas 22 anos e o quinto reboteiro do Mundial, com 8,6

A vitalidade de Jonas Valanciunas, estrela lituana de apenas 22 anos e o quinto reboteiro do Mundial, com 8,6

28 – É a média de idade da Lituânia, o time mais velho entre os semifinalistas. O restante? França e Sérvia empatam com 26 anos, enquanto os Estados Unidos têm 24. Este talvez seja o dado mais relevante para colocar em perspectiva a campanha brasileira, com uma seleção de 31 anos. Todas essas quatro potências já têm uma base armada para o próximo ciclo olímpico.

23,8 – Surpreendentemente, o ala Klay Thompson é o jogador americano que mais tempo fica em quadra no Mundial, com 23,4 minutos, contra os 23 cravados de Kyrie Irving. No total, isso representa apenas três minutos a mais (164 a 161). O pivô Andre Drummond, convocado basicamente como apólice de seguro num eventual embate com a Espanha que agora jamais vai acontecer, somou 38 minutos, quase uma partida de Fiba inteira (6,3 por partida).

22,1 – O quanto a França arremessa de três pontos por jogo, o maior número entre os quatro semifinalistas, mesmo que eles tenham, de longe, o pior aproveitamento (ridículos 31,6%). EUA, Lituânia e Sérvia estão todos na casa de 19 chutes de longa distância por rodada, com os lituanos, claro, tendo a melhor pontaria: 40%. Culpa do pivô Darjus Lavrinovic, que tem acertado surreais 62,5% de seus arremessos, e do armador Adas Juskevicius (57,1%). O Brasil se despediu do torneio com 16,9 tentativas e 37,3% de acerto.

20 – Erros para a Espanha em arremessos de três pontos em sua derrota para a França, tendo tentado 22 disparos. Ok, é um número que pertence muito mais fase anterior, mas, nestes tempos de redes sociais em ebulição por conta desse processo chamado “Festa da Democracia”, todo mundo parece acreditar que jornalismo é manipulação, né? Então tomem aqui a prova mais clara. (Na verdade, o número é fundamental para explicar a classificação francesa, com uma linha defensiva assustadora, que arrepiou os espanhóis: um time desse nível acertar apenas 9,1% de seus chutes de fora? #sacrebleu).

13,9 – Dos 48 jogadores que ainda podem jogar o Mundial nesta reta final, Miroslav Raduljica, quem diria, é o cestinha, com 13,9 pontos. Logo em sua cola vem o Anthony Davis, mas pode chamar de Monocelha, com 13,7. Passaram quatro equipes que não dependem tanto assim de um jogador para carregar o ataque. Verdade seja dita: era o mesmo caso do Brasil. Entre os 20 principais pontuadores, em média, do torneio, apenas Kenneth Faried, com 13,0, se junta ao sérvio e a seu compatriota nessa. Desta forma, José Juan Barea ao menos pode acrescentar esta linha em seu currículo: “*Cestinha da Copa do Mundo de basquete 2014, com 22,0 pontos – só não perguntem, por favor, qual foi a campanha do meu time”.

Batum está com cara de que queria fazer pelo menos uns 15 pontinhos por jogo, vai...

Batum está com cara de que queria fazer pelo menos uns 15 pontinhos por jogo, vai…

9,9 – Por falar em cestinhas, esta é a média de pontos de Nicolas Batum no torneio. O ala do Blazers, acreditem, lidera a seleção francesa nesse quesito. Joffrey Lauvergne tem 9,4, Thomas Heurte, 8,4, Boris Diaw, 7,9, e por aí vamos… Incrível.

4 – A França falhou em marcar que 70 pontos em quatro de seus sete jogos na competição. Se formos descartar os dados computados contra Egito e Irã, restaria apenas uma partida, então, em que cruzaram essa… Nada fantástica marca. E foi contra quem? Justamente a Sérvia, seu adversário das semis, vencendo por 74 a 73. Mas, ‘bora lá repetir todo mundo: “Cada jooooogo é uma históooooria”.

1 – Apenas um time não tem sequer um atleta com contrato de NBA em seu elenco: a Sérvia. Raduljica jogou o campeonato passado pelo Bucks, foi trocado para o Clippers e acabou dispensado, como já foi amplamente divulgado, embora a turma em geral insista em ignorar isso. O ala Bogdan Bogdanovic foi draftado pelo Phoenis Suns neste ano, em 27º, mas vai seguir sua carreira na Europa, pelo Fenerbahçe, talvez por mais dois anos, antes de pensar numa transferência. No clube turco, terá a companhia de Nemanja Bjelica, jogador já selecionado pelo Minnesota Timberwolves. Quem sabe Flip Saunders não decide dar uma chance para o ultratalentoso ala-pivô num futuro próximo? Sem Kevin Love, há vagas. E aqui vale um destaque importante: é muito tentador escrever que a Sérvia não tem sequer um jogador de NBA. Porque, a julgar pela cobertura geral do Mundial, só importa quem joga nela, né? Só o selo de aprovação da liga atestaria a qualidade de um atleta. Aí vem a Sérvia, e… Pumba.

0 – Nenhum jogador naturalizado vai disputar as semifinais. Quem chega mais perto disso é o Kyrie Irving, que nasceu na Austrália, mas se mudou com o pai, mais um desses ciganos e jogadores americanos, aos dois anos de idade. Sábia decisão a dele, já que os Boomers têm dono: Patty Mills, e ninguém tasca. Sem contar que, em 2020, será a vez de Dante Exum. Ah, a França tem suas importações também, mas em outras circunstâncias. Tanto Florent Pietrus como Mickael Gelabale procedem de Guadalupe, que fica no Caribe, mas ainda é território francês. O ala reserva Charles Kahudi é de Kinshasa, no Congo, mas fez toda a sua carreira no país latino, algo mais que recorrente.


6º lugar no Mundial: é o que tem para hoje. E depois?
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Giancarlo Giampietro

(Atualização: com a derrota da Espanha para a França, o Brasil perde uma colocação na classificação geral, caindo de quinto pra sexto. Que fase!)

Brasl derrotado, Sérvia vence, Copa do Mundo, basquete, crise, CBB

A frase não vai parecer genial, mas é precisa ser dita: o Brasil tanto podia ganhar da Sérvia nesta quarta-feira, como poderia perder. E perdeu. Era um duelo equilibrado, sem favoritos, pelas quartas de final de uma Copa do Mundo de basquete. Alguns detalhes aqui e ali poderiam ter se corrigido, mas o fato é que o time brasileiro, desde a sua composição ao que executava em quadra, estava longe de ser perfeito. Era competitivo, estava na briga pelo pódio, mas não tinha direito adquirido nenhum ali. Estava metido em um jogo enroscado, se descontrolou emocionalmente na volta do intervalo e, pumba!, quando passou, já era. Vitória sérvia.

Isso tudo se refere a 10 de setembro de 2014 e a um geração de jogadores que, em geral,  está em seu auge, descontando uma ou outra peças periféricas de sua rotação, que já se veem mais perto da aposentadoria. Quer dizer, uma pequena retificação: essa competitividade da seleção brasileira passa por 10 de setembro e deve se estender até os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro 2016. A seleção vai receber uma Olimpíada com as mesmas chances, se as coisas correrem normalmente.

Agora, e o que vem depois disso?

Depois de assimilada a eliminação – que poderia ser evitada, mas acontece –, muito do que se ouviu em tempo real foi sobre “o bom trabalho” executado, que é algo que não pode ser descartado prontamente, e bla-bla-blá. Obviamente que não. Aliás, quem estaria argumentando de modo contrário? O Brasil se despede do Mundial com o quinto sexto lugar, o mesmo posto de Londres 2012. O basquete internacional não é para qualquer um, mesmo num cenário em que boa parte dos grandes concorrentes estava seriamente desfalcada.

Mas só precisamos ter cuidado com a generalização: se for falar em bom trabalho, que fiquemos com Rubén Magnano e seu grupo de veteranos. Não que o argentino deva ser ou esteja blindado de críticas. O ataque brasileiro não funcionou como poderia, tendo muita dificuldade para produzir de modo eficiente em situações de meia quadra. Sua convocação final se mostrou redundante. Ele não pediu mais um tempo naquele fatídico terceiro período. Etc. Entre os atletas, houve surpresas e decepções. Agora, me parece que esse é o tipo de discussão que toda equipe vai ter ao final de uma campanha. Vai acontecer até mesmo nos Estados Unidos. Não existem times perfeitos. Existem times que reconhecem suas deficiências e procuram amenizá-las. Pode ser que tenha faltado isso? Sim, certamente faltou. A verdade, porém, é que a seleção caiu, com suas virtudes e limitações.

Seleção brasileira, banco, 2014, basquete

O que não dá para fazer é ficar jogando confete para cima depois de um quinto sexto lugar e deixar que muitos penetras entrem nessa festa (inexistente). Não dá para incluir os cartolas da CBB (a inoperante Confederação Brasileira de Basquete) nessa. Sua diretoria – e até mesmo os manifestos opositores aos atuais gestores – devem ser barrados na porta. Porque, entre as limitações que temos, dá para falar de fundamentos e minúcias de jogadores e de alguns nomes convocados, mas o buraco, mesmo, está ao redor desta seleção.

O basquete brasileiro foi para um Mundial com sua força máxima – pelo menos segundo o gosto de seu treinador, com americano naturalizado, e tudo – e com média de 31 anos, a mais elevada da competição. A Sérvia tem média de 26 anos. Entre seus protagonistas, apenas um está acima dos 30 anos, o pivô Nenad Krstic. O ala Bogdan Bogdanovic, autor de 12 pontos, tem apenas 22 anos, mesma idade do titular Nikola Kalinic. Milos Teodosic tem 27. Nemanja Bjelica, 26, assim como Miroslav Raduljica e Stefan Markovic. Já deu para entender, né? O time balcânico que deu uma surra hoje pode pensar até mesmo nas Olimpíadas de 2020.

Bogdan-Bogdan tem 22 anos. Está entre os protagonistas sérvios

Bogdan-Bogdan tem 22 anos. Está entre os protagonistas sérvios

A verdade, contudo, é que eles nem precisam, já que não sabem nem ao certo se estarão no Rio 2016. As coisas na Sérvia funcionam de outro jeito, devido à alta competitividade para se entrar naquela seleção. Eles trocam de geração a cada dois anos, é algo impressionante. Estão aí para comprovar Marko Keselj e Milan Macvan, dois semifinalistas de 2010, atletas bem pagos de Euroliga e que não chegaram nem perto de jogar este Mundial. Os esquecidos e os eleitos para o time de hoje que se cuidem, aliás, porque a fornada de 1994 e 95 também já é boa o bastante para sonhar com as grandes competições, vindo de um vice-campeonato mundial em 2013. O armador Vasilje Micic e os pivôs Nikola Jokic e Nikola Milutinov jajá estarão por aí – dois deles já foram draftados pela NBA neste ano.

Do Brasil, se formos recuperar as últimas campanhas com algum sucesso em torneios internacionais de base, temos a galera que terminou o Mundial Sub-19 de 2007 (1988/89) em quarto, além da equipe que deu um sufoco danado nos Estados Unidos na Copa América Sub-18 de San Antonio, em 2010 (galera de 1992/93).  Se a turma de Raulzinho, Felício e Bebê já se aproxima, perigosa e precocemente do ostracismo, o que dizer daqueles quatro ou cinco anos mais velhos? Antes da partida desta quarta, já havia passado por esse caso alarmante. Dessa geração, apenas dois atletas hoje estariam no radar da seleção principal – mas com chances remotas de aproveitamento: Rafael Mineiro e Paulão. Entre os sérvios, dois saíram triunfantes em Madri (Raduljica e Markovic), enquanto Macvan e Keselj já haviam disputado a edição de 2010, conforme citado.

Para não falar apenas de Sérvia, fica o registro: a Argentina, a Austrália, os Estados Unidos, a Lituânia, a Croácia e muitas outras equipes já apresentaram bases renovadas para esta Copa. O grau de protagonismo dos atletas mais jovens variou de uma equipe para a outra, mas pelo menos eles estavam na Espanha, vivendo a experiência intensa que é disputar um torneio de elite desses. Do lado brasileiro, dos mais jovens, apenas Raulzinho pode falar a respeito do assunto, já com duas edições em seu currículo.

Não é que não existam opções. O armador Rafael Luz e o pivô Augusto Lima já são realidades no basquete europeu, jogadores produtivos no campeonato nacional mais difícil do continente – a Liga ACB espanhola. Augusto, aliás, foi um dos destaques individuais na temporada passada – e mal teve chance para mostrar serviço na seleção “b” que ficou com um (?) honroso bronze no Sul-Americano. O pivô Lucas Mariano e o ala Leo Meindl (Franca) e o armador Ricardo Ficher (Bauru) também aparecem num grupo de revelações lembradas por Magnano nos últimos anos. Para não falar de Bruno Caboclo, ala surpreendentemente escolhido pelo Toronto Raptors no Draft da NBA, o atleta de maior potencial nessa lista, sem dúvida. Em seu ex-clube, o Pinheiros, também há pelo menos mais três garotos para serem monitorados.

Daí que… Ué? Então de que trevas você está falando, meu chapa? Olha aí o tanto de jogador jovem aí que você acabou de citara. Para um comentário desses, reverteria o jogo: mas o simples fato de nos apegarmos a cinco, seis, sete nomes já não diz muito sobre a quantas anda a produção de talentos nacional? Digo, se todo mundo sabe de cor quais são as apostas para o próximo ciclo olímpico, acho que isso significa justamente como as coisas andam errado. Já se comprova o número bastante limitado de alternativas, num país com 200 milhões de habitantes, cujo Ministério dos Esportes aponta a modalidade como a segunda mais praticada.

Além do mais, não é brincando de apostar em garotos, como se o desenvolvimento seguisse a lógica do mercado futuro, que os problemas de constituição de um time – e do basquete – brasileiro serão solucionados. A carreira dessa molecada não está nem mesmo garantida, de modo que soa absurdo depositar em seus ombros carências de uma estrutura toda deficitária. Em setembro de 2014, eles são apenas promessas, que precisam jogar e  treinar em paz, seguindo sua rotina, quiçá com a melhor orientação disponível. Não é hora de ficar buscando nomes – mas, sim, de trabalhar pra ter um maior número de nomes possível.

Só com uma confederação que trabalhe desta maneira, com essa mentalidade, que não dependa de milagres – o advento de do Grande Jogador da Silva –, que se pode exigir mais do que o atual time conseguiu. De novo: a despeito de toda a precariedade estrutural lamentada, os veteranos de Magnano tinham plenas condições de ir adiante neste Mundial. Mas não foram. Goste ou não, é uma seleção brasileira se afirma como a quinta/sexta melhor do mundo. É o que tem para hoje.

Brasil perde, CBB, Copa do Mundo, Sérvia

*   *   *

Em tempo, e algo que não pode ser esquecido jamais: depois do fiasco que foi a participação na Copa América, na qual, sem seus melhores jogadores, Magnano naufragou, perdendo para Jamaica e Uruguai, a CBB teve de desembolsar um milhão de euros para ser “convidada” para jogar o Mundial. Arredondando: 3 milhões de reais. Então, do ponto de vista administrativo, é um fiasco ficar fora do pódio. Um quinto lugar não vale 3 milhões de verdinhas. Os patrocinadores ganharam alguma visibilidade em TV aberta, ainda mais depois da vitória sobre a Argentina, mas o prejuízo da confederação é brabo. Ainda mais para quem já está endividado.

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Acho que vale reforçar: o Brasil levou aquilo que seu técnico julga de melhor para o Mundial, inclusive naturalizando o Larry. Com o grupo que levou, Magnano foi para o tudo ou nada. Contra muitos adversários desfalcados. E terminou em quinto. Isso diz muito sobre a dureza que é lutar por uma medalha no basquete de hoje, mas também sobre o nível atual da seleção. É de se ponderar, mesmo.


Sérvia se aproveita de destempero brasileiro, atropela e está na semifinal
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Giancarlo Giampietro

O jogo de contato de Raduljica incomoda. Uma falta nele, muita reclamação, e lá se foi o placar

O jogo de contato de Raduljica incomoda. Uma falta nele, muita reclamação, e lá se foi o placar

O jogo já estava complicado, duro, conforme o esperado. Até que, no início do terceiro período, um momento de destempero da seleção brasileira, a equipe mais velha da Copa do Mundo, foi praticamente mortal. Do seu lado, cheia de confiança, a Sérvia, num jogo de quartas de final, não ia permitir reação nenhuma. Não só administrou, como aumentou, e muito, a diferença, eliminou seu adversário e avançou para a semifinal – e a consequente disputa de medalhas. A equipe balcânica venceu por 84 a 56 e agora enfrenta a França, que surpreendentemente eliminou a Espanha.

O Brasil começou a terceira parcial de guarda baixa, permitindo que o adversário abrisse nove pontos de vantagem, após um primeiro tempo muito parelho. Depois de uma falta de Anderson Varejão sobre Miroslav Raduljica, a arbitragem sinalizou mais duas faltas técnicas contra Tiago Splitter e Marquinhos, com 7min19s no cronômetro. Os europeus fizeram cinco pontos nos lances livres e mais dois numa bandeja de Stefan Markovic, de modo que, com 7min10s, os brasileiros tinham novamente a posse de bola, mas com 16 pontos de desvantagem.

Um instante de descontrole emocional que acabou abalando um grupo com 31 anos em média (bem superior que a idade média dos sérvios, de 26). O técnico Rubén Magnano chegou a pedir um tempo de imediato, mas não foi o suficiente para acalmar sua equipe. O técnico argentino não viria a interferir na partida novamente, mesmo com a seleção ficando quatro minutos sem pontuar. Quando Raulzinho acertou um tiro de três a 1min18s do fim, ele estava apenas reduzindo um placar que já apontava 20 pontos de desvantagem. O quarto período começou com 66 a 44.

Bjelica faz a falta e pára o contra-ataque brasileiro: algo recorrente no primeiro tempo, em jogo tático dos sérvios

Bjelica faz a falta e pára o contra-ataque brasileiro: algo recorrente no primeiro tempo, em jogo tático dos sérvios

Cada jogo é uma história, mesmo. Esse duelo pelas quartas foi  completamente diferente do primeiro embate entre os times. Ainda pela fase de grupos, foi o Brasil que primeiro abriu uma larga vantagem no placar, de até 18 pontos, para depois sofrer uma virada preocupante. Ainda assim, a equipe nacional conseguiu se acertar no quarto período e triunfou.

Na primeira fase, os sérvios haviam vencido apenas os frágeis Irã e Egito, tendo perdido também para Espanha e França. Nos mata-matas, porém, o time elevou sua produção de modo impressionante. Nas oitavas, derrubou a Grécia, até então invicta, por 90 a 72, chegando muito mais preparada para uma revanche com os brasileiros.

Depois de comer poeira contra o Brasil no primeiro jogo, especialmente na etapa inicial, os sérvios praticamente abriram mão da disputa pelos rebotes ofensivos para recomporem sua defesa com mais agilidade. Na mínima chance de escapada dos adversários, não hesitavam em fazer faltas táticas, para frear o jogo. Deu certo.

Em meia quadra, a seleção nacional seguiu com dificuldades de execução, problema detectado desde a fase de amistosos. Se contra a Argentina os pivôs conseguiam se impor fisicamente, dessa vez a disputa, digamos, corporal era muito muito mais equilibrada. Os sérvios conseguiram proteger sua cesta com autoridade, limitando seu oponente com apenas 38% nos chutes de dois pontos (9/24) nos primeiros 20 minutos.  Os únicos que conseguiram ser produtivos lá dentro foram Varejão e Marquinhos. Varejão acertou apenas 2/7 nos arremessos, mas seguia firme no lance, em posição favorável para o rebote, cavando faltas, convertendo seus lances livres e, ufa!, chegando a oito pontos no primeiro tempo – a média no torneio era de 8,2.

A munheca certeira de Teodosic fez estragos: 10 lances livres convertidos também

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Do outro lado, o time de Magnano simplesmente não conseguia segurar o genial e genioso Milos Teodosic. O experiente armador chamou muito o jogo na linha de três pontos e usou a largura de seus pivôs, especialmente Nenad Krstic, pivô que estava em forma muito melhor, se compararmos com sua exibição na primeira partida. O veterano, largo toda a vida, estabeleceu corta-luzes fortes, daqueles que castigam, mesmo, e liberou seu companheiro. Teodosic  teve espaço para chutar e criar – soube também explorar a recuperação tardia de marcadores para forçar a falta e infiltrar. Faltou comunicação entre seus marcadores. Se era para deixar algum rival livre, poderiam escolher qualquer um dos outros quatro, menos o armador. E ele fez a equipe pagar por essas falhas e hesitações, anotando 16 pontos dos primeiros 37 dos balcânicos.

Outro problema foi a contenção do talentosíssimo Nemanja Bjelica. O ala-pivô tem 2,08m, longas pernas e joga bem afastado da cesta. Tirava Anderson do garrafão e abria espaços. Quando precisou atacar no mano-a-mano, bateu o pivô capixaba com certa facilidade, invadiu o garrafão e pontuou. Faltou alguém fechar esse corredor na cobertura. As coisas só melhoraram nesse sentido quando Nenê veio para a quadra. O são-carlense tem recuperação muito mais ágil, cercando a turma do perímetro com mais controle.

No segundo tempo, a Sérvia variou sua abordagem, pingando bolinhas no pivô Raduljica. Uma opção que havia sido sua prioridade no primeiro confronto, lembrem-se, mas que havia sido descartada até então nesta quarta-feira. O sérvio marcou quatro pontos em menos de dois minutos. No ataque seguinte em que foi acionado, sofreu a falta de Varejão, e o resto foi história.

A seleção brasileira simplesmente saiu dos trilhos a partir daí, e seu adversário não teve piedade, nem oscilação, nem nada. Matou, no geral, 50% dos seus arremessos, ao passo que limitou seu adversário a 34%. Teodosic terminou com 23 pontos. Krstic, impressionante no terceiro período, fez 10 pontos, matando 5 de suas 7 tentativas de cesta. Mas os números, no fim, nem importam. A partir do momento em que as faltas técnicas foram marcadas, era como se Brasil e Sérvia tivessem entrado num terceiro jogo nesta Copa do Mundo, para o qual apenas os balcânicos pareceram preparados.


Fã de Harley e Stephen King, gigante sérvio desafia brasileiros
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Giancarlo Giampietro

Cara de mal e físico de urso: o páreo duro que os brasileiros têm pela frente

Cara de mal e físico de urso: o páreo duro que os brasileiros têm pela frente

Miroslav Raduljica é uma grande figura, nos mais diversos sentidos. Com 2,13 m de altura e um peso que nenhuma medida oficial jamais vai precisar, o pivô se transformou aos 26 anos numa inesperada arma da seleção sérvia nesta Copa do Mundo, pronto para desafiar novamente o garrafão de NBA composto por Tiago Splitter, Anderson Varejão e Nenê, nesta quarta-feira.

Raduljica provavelmente já chamaria sua atenção logo no tapinha inicial. O cara é realmente imenso.  “Ele é um cara grande, é como um urso”, resume seu jovem companheiro de seleção, o ala Bogdan Bogdanovic.

Nesse corpanzil todo, o sérvio decidiu também usar uma grande quantidade de tinta para compor as mais diversas, complexas e sinistras tatuagens. Os desenhos podem envolver até mesmo um livro de seu autor preferido: Stephen King, para quem ele sonha apresentar a tattoo especial. A propósito, ela está em seu antebraço esquerdo, e desconfio que tenha como inspiração um dos volumes que compõem a série “A Torre Negra”, com caveira metida no meio – se alguém souber, favor eclarecer. “Nunca assisti TV. Sempre fui muito ligado em livros. Quando ganhei meu primeiro do Stephen King, tinha uns 10 ou 12 anos, e fiquei fascinado. Era só disso que queria saber”, afirma em entrevista ao site oficial do Milwaukee Bucks, seu ex-time.

Se não for o seu gosto trocar ideias sobre o best-seller King, Raduljica também pode falar bastante sobre a Harley-Davidson, a fábrica de motocicletas fundada justamente em Milwaukee. “Sou o maior fã no planeta”, garantiu , tendo chegado para conhecer as dependências do Bucks com uma camiseta preta tradicional da marca. “Não é uma coincidência. Comprei ontem quando estava conhecendo a cidade. Estava muito empolgado de ter visitado o museu e depois fui para a loja. Acho que comprei a loja inteira.”

O problema, minha gente, é que, embora essas informações ajudem a humanizar o personagem – “por trás daquela carcaça toda, reside um coração” –, a compra de roupas para motoqueiros também pode reforçar sua imagem de malvado: fica andando todo de preto e jaqueta de couro por aí, parecendo um Son of Anarchy aditivado. Não obstante, desde que se apresentou para seu primeiro ano na NBA, resolveu cobrir o braço direito também. Entre as novas tatuagens está uma escritura: “Memento mori“. É uma frase em latim que significa basicamente: “Lembre-se de que você vai morrer”. E aí? Não é um amor? Além disso, decidiu cultivar para o Mundial uma barba de tal espessura e comprimento que já rivaliza com a de James Harden.

Sons of Anarchy

Sons of Anarchy

Imaginem esse tipo, então: gigante, largo, todo tatuado, cabelo raspado nas laterais e muito barbudo, além do look sombrio. Se você for o pivô adversário, tendo de aguentar uns 30 ou até mesmo 40 minutos com um sujeito desses, faz como? Mas o pior, MUITO PIOR: e você só for um pobre repórter que cobre basquete!?

Por acaso dá vontade de perguntar algo na zona mista, ou melhor passar reto e olhando para baixo, de preferência? Durante a temporada da NBA, quando o calouro se destacava ao sair do banco de reservas para arrebentar em quadra, os setoristas do Bucks se depararam com esse dilema. Obviamente, o dever de reportar é soberano, e eles no fim “encaravam” – ou tinham de encarar – a fera, de gravador e microfone em punho.

Como fez o repórter Guido Nunes, do SporTV, valente que só, ao parar o pivô na zona mista, logo depois da impactante vitória da Sérvia sobre a Grécia, pelas quartas de final da Copa, em Barcelona. Sua equipe havia vencido por 90 a 72, numa das exibições mais bonitas da competição. Raduljica marcou 16 pontos e pegou 6 rebotes em 24 minutos. Quando questionado se aquela havia sido a melhor partida de sua seleção no campeonato, ele poderia ter sorrido mas optou por não fazê-lo. Apenas disse com um semblante fechado algo como: era aquela a pergunta que ele estava esperando e que, mesmo se o brasileiro o tivesse indagado sobre qual o seu modelo de Harley preferida, ele teria respondido sobre o belíssimo jogo que haviam feito. “Então você foi bem nessa”, disse.

OK, a parte das Harleys eu inventei, mas o resto foi verdade. Figura.

É de se imaginar esse tipo de contato do pivô com a rapaziada que cobriu a desastrosa campanha do Milwaukee no campeonato 2013-14 da liga norte-americana. A direção da franquia tinha realmente a esperança de competir por uma vaga nos playoffs da esvaziada Conferência Leste, mas teve de aturar, no fim, 67 derrotas em 82 partidas. Uma jornada em que o calouro Giannis Antetokounmpo foi um dos pontos positivos e na qual o pivô sérvio também teve seus momentos.

Quando Raduljica foi anunciado, a sensação foi de estranheza total. Nem mesmo a turma mais ligada no basquete europeu sabia explicar o que estava por trás daquela sacada, uma vez que o bisnagão não despertava interesse nem mesmo dos grandes da Euroliga. Não que ele fosse um completo desconhecido: como juvenil, foi campeão mundial pela Sérvia, enfrentando até mesmo a seleção brasileira naquele torneio, numa história triste que já contamos aqui. Ele fechou um contrato com o Anadolu Efes, da Turquia, mas mal foi aproveitado por lá. Foi emprestado sem parar,  jogando a principal competições de clube do continente pelo Partizan Belgrado em 2011-12. Nada de outro mundo, e, de repente, lá estava o cara no meio do Winsconsin.

O técnico Larry Drew (demitido e substituído por Jason Kidd) pouco o utilizou. O pivô só recebeu 465 minutos no total, o equivalente a dez jogos e um pingado. Mas quer saber? Em termos de produção estatística, ele esteve bem. Numa safra bastante fraca de novatos, foi um dos poucos que ficou acima da média nas medições de eficiência.O problema é que era difícil de encontrar a hora certa para usá-lo. Numa liga que prioriza cada vez mais a velocidade, o sérvio se rastejava pela quadra.

Um dos jogos em que pôde ser acionado foi contra o Detroit Pistons de Andre Drummond e Greg Monroe, no dia 22 de janeiro. Somou 8 pontos e 8 rebotes, em 20 minutos, e seu time time, aleluia!, venceu uma. Em todo o mês, foi o único triunfo, com uma ajudinha de sua atuação física. “Ele sabe como usar seu corpo”, afirmou Drew. “Ele tem dificuldade para ir de um lado para o outro da quadra, mas, para alguém do seu tamanho, ele sabe como se mexer por ali e trombar. Os jogadores inteligentes entendem o que estão enfrentando e entendem quais são suas vantagens e desvantagens.”

Raduljica sabe mesmo o que precisa fazer. “Apenas tentei ficar em uma boa posição para atacar a tabela e… brigar pelo rebote, vamos dizer assim. Sei lá. É isso o que eu faço”, afirmou, sobre o embate com Drummond, hoje o 12º homem na seleção dos Estados Unidos. “Era o jeito de jogar contra ele, que pula mais do que eu e é mais atlético. Tive de encontrar um jeito de afastá-lo da cesta.”

De braço direito limpo, Raduljica se deu bem numa noite de janeiro contra o Pistons

De braço direito limpo, Raduljica se deu bem numa noite de janeiro contra o Pistons

Nenhum dos pivôs brasileiros é tão atlético ou explosivo como o jovem do Pistons. Poucos são. Mas ele são rápidos e ágeis o bastante para incomodar o sérvio. Ao mesmo tempo, têm de se proteger na defesa, porque sabem que lá bem pancada. No duelo da primeira fase, pelo Grupo A, a seleção balcânica não hesitou em acionar o gigante logo de cara, tentando minar o garrafão adversário – e também encher seu cestinha de confiança.

Pois, sim, Raduljica está liderando o ataque da Sérvia, mais um dado inesperado, com 14,5 pontos por partida e aproveitamento de 54% nos arremessos, para alívio de Nenad Krstic, que é capitão da seleção e em quem se apostava como a referência do jogo interior. “Ele me livrou da pressão jogando tão bem assim”, diz o veterano ex-Nets, Thunder e Celtics ao site da Fiba Europa. “Não estou nem perto de 100% fisicamente. Mal posso jogar 10 ou 15 minutos, então é um grande alívio para mim vir para o jogo sabendo que Raduljica está aqui.”

Raduljica tenta abrir espaço no garrafão

Raduljica tenta abrir espaço no garrafão

Sim, o novo pivôzão sérvio está lá, limpando espaço no garrafão com muito movimento de… quadril. Fora as braçadas, ombradas e esparramadas. Os pés não se mexem tanto assim. Nenê e Splitter se viraram muito bem contra ele, mas ficaram carregados de falta. De todo modo, permitiram apenas quatro cestas de quadra em oito arremessos e forçaram quatro turnovers. Seguraram o adversário abaixo de suas médias no torneio: dever cumprido. Mas não deve ser nada prazeroso enfrentar uma montanha dessas.

Mas ele acha o maior barato. “Estou me divertindo e me sentindo muito bem. É ótimo estar de volta”, diz Miroslav, que foi vice-campeão do EuroBasket de 2009 e andava afastado da seleção desde então. Como disse: poucos davam bola para ele, como Hammond fez em Milwaukee e agora faz o técnico Sasha Djordjevic. “É uma sensação ótima. Fazia alguns anos que não ficava na equipe. Agora estou aqui num Campeonato Mundial, um momento muito especial. Dá para dizer que o treinador me deu confiança e que acredita em mim. Então me senti bem desde o primeiro dia.”

Na Espanha, Raduljica tem motivações a mais também para jogar bem e avançar com a Sérvia: está sem clube. Horas antes de fazer sua estreia, soube que havia sido trocado no mesmo pacote com Carlos Delfino, do Bucks para o Clippers, que o dispensaria na hora. A ideia de Doc Rivers era limpar salário na folha, fugir de multas pesadas e reforçar o elenco com atletas que seriam mais baratos, como o pivô Epke Udoh.

Ironicamente, Udoh é outro atleta ex-Bucks que se assume publicamente como um leitor voraz – risos: parece até ousadia dizer isso, né? –, tendo criado  um Clube do Livro para trocar dicas e promover debates, vejam só.

Será que um dia, nesse mundinho pequeno, ele vai ter a chance de se sentar com o sérvio para analisar alguma obra fantástica de Stephen King? Tomara.

Afinal, Splitter, Nenê e Varejão já têm muito com o que se preocupar nesta quarta – que os analgésicos estejam separadinhos no vestiário brasileiro.


Escalação da Sérvia tem enigma para o Brasil responder
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Giancarlo Giampietro

Kalinic, nenhum minutinho de quadra na 1ª fase contra o Brasil

Kalinic, nenhum minutinho de quadra na 1ª fase contra o Brasil

Pode a mudança de um só jogador numa escalação mudar drasticamente o jeito de uma equipe jogar?

Ô, se pode.

Ainda mais quando você está trocando um pivô de 2,10 m e seguramente mais de 115 kgs por um ala de 2,03 m de altura e capacidade atlética acima do comum.

Pois, então: a Sérvia vai de Vladimir Stimac ou Nikola Kalinic em sua rotação contra o Brasil, em confronto pelas quartas de final da Copa do Mundo de basquete, nesta quarta? Pois é essa a dúvida que a comissão técnica brasileira deve estar ruminando em sua preparação para o embate que significa disputar uma medalha, ou não, nesta competição.

No duelo da primeira fase, vencido pelo Brasil por oito pontos, o técnico Sasha Djordjevic escalou um quinteto inicial gigantesco para bater de frente com os pivôs brasileiros de NBA. Os titulares regulares – Miroslav Raduljica e Nemanja Bjelica – estavam acompanhados por Stimac.

Já sabemos no que deu essa história: ainda que os sérvios tenham coletado muitos rebotes ofensivos e carregado a linha de frente brasileira de faltas, eles acabaram comendo poeira em quadra. A seleção brasileira conseguiu se virar muito bem defensivamente e acelerou horrores sua transição e venceu o primeiro tempo por 16 pontos – a vantagem chegou a ser de até 18.

Na volta do intervalo, Djordjevic, um cerebral armador nos tempos de jogador, voltou com uma formação muito mais leve para quadra. O pesadão Raduljica estava acompanhado de quatro atletas bastante leves. Seu companheiro de garrafão era o magricela Stefan Bircevic – e muito talentoso ofensivamente, com chute de três e facilidade surpreendente para o drible aos 2,10 m de altura –, enquanto dois armadores e um ala completavam a rotação: Stefan Markovic, Milos Teodosic e Bogdan Bogdanovic.

Sasha Djordjevic vai de Stimac novamente no 1º quarto?

Sasha Djordjevic vai de Stimac novamente no 1º quarto?

Também sabemos o desenrolar dessa história: os sérvios enfiaram 32 pontos na conta dos brasileiros– a maior quantia que a seleção levou em um quarto em seus primeiros seis jogos. Nem a Espanha, que marcou 30 pontos no primeiro quarto naquela surra que deram, conseguiu tanto.

A movimentação da equipe balcânica melhorou muito com os dois armadores e Bogdanovic em quadra. Os brasileiros tiveram problemas para perseguir os adversários fora da bola, permitindo muitas quebras de rotação e cestas fáceis para os oponentes. Dos 32 pontos, 12 foram marcados em cestas de três pontos – algo parecido com o que vimos no primeiro quarto argentino (cinco bolas de longa distância dez minutos).

Há seis dias já, a seleção tomou aquela virada, chegou a ficar atrás no placar por até sete pontos no início do quarto final, mas conseguiu reagir graças a uma defesa mais atenta no exterior e a uma participação decisiva de Tiago Splitter, com pontuação no garrafão e distribuição de jogo, e Marquinhos, recebendo os passes do pivô catarinense e matando seus tiros de fora. Detalhe: a virada da virada brasileira aconteceu ainda com a formação mais baixa da Sérvia em quadra. Para os cinco minutos finais, Stimac retornou, sem conseguir influenciar no andamento da partida – pelo contrário, a vantagem que era de três pontos, subiu para os oito finais.

É de se perguntar se Stimac vai deixar saudade no Unicaja Málaga

É de se perguntar se Stimac vai deixar saudade no Unicaja Málaga

Obviamente os técnicos de ambos os lados vão se debruçar sobre esse jogo, estudando o que deu certo e o que precisa ser corrigido. Virão os ajustes – e os ajustes extra, com cada um pensando qual poderia ser o movimento do outro. Uma das partes mais legais do basquete e que só os privilegiados que estão analisando a fita do jogo e fazendo anotações vão saber contar com precisão, até que a bola suba na quarta-feira.

A Sérvia usou Stimac por apenas oito minutos naquela partida, mas foram oito minutos em que o Brasil venceu por dez pontos. A escolha por esse pivô, que foi companheiro de Rafael Hettsheimeir no Unicaja Málaga e agora vai jogar no Bayern de Munique, só se justifica por um temor pelo jogo físico do adversário. Pois Stimac, do que vi durante a temporada, rende muito mais quando sai do banco, para dar suas trombadas ocasionais, atacar a tabela ofensiva e descansar rapidamente. Vez ou outra, o chute de média distância cai, mas ele não me parece uma arma que cause receio.

Além disso, a presença de Stimac ao lado de dois grandalhões acabou empurrando Nemanja Bjelica mais para o perímetro, com o ala-pivô marcando e atacando Marquinhos, de modo que algumas de suas habilidades foram anuladas. Tal como Bircevic – e com mais talento –, o jogador draftado pelo Minnesota Timberwolves é outro espigão que joga com uma naturalidade de armador com a bola. Ataca a cesta quase sempre frontalmente, apostando no seu chute de três pontos e seu corte de passadas largas. Também é um belo passador. É um cara que acompanhei bastante durante os últimos dois anos de Euroliga e que, pelo Baskonia ou Fenerbahçe. e quase nunca é escalado como um “3”, do jeito que pensou Djordjevic.

Na fase de grupos, Stimac participou de todas as cinco partidas, 48 minutos no total (9 em média). Contra a Grécia, porém, praticamente sumiu da rotação: jogou um só minutinho. Em uma curva contrária esteve o ala Nikola Kalinic. De apenas 22 anos, a revelação do Estrela Vermelha teve seu maior tempo de quadra no torneio justamente nas oitavas de final, com 21 minutos. Se você for conferir suas estatísticas gerais, poderá falar a respeito dos 26 minutos que teve contra os egípcios. Mas essa não conta, tá? Fiquemos combinados. E a curiosidade que constatamos fica justamente pelo fato de ele não ter participado só de um confronto. Justamente com o Brasil.

Sinceramente, tentei verificar se foi alguma virose, gripe ou ataque de rinite, mas não consegui descobrir. Ainda que as chances de um Brasil x Sérvia nas quartas de final fossem altas, não dá para imaginar que Djordjevic tenha escondido o jogo na ocasião. Caso seu lateral não tenha enfrentado nenhum problema médico, talvez o técnico simplesmente considerasse que não teria papel para ele naquela partida? Vai saber. Não imagino, francamente, que ele vá repetir essa estratégia, depois do que o rapaz fez na grande vitória sobre os helênicos.

Kalinic anotou 12 pontos em 21 e ainda somou quatro rebotes e duas assistências. Mais do que os números, conta a velocidade e o arrojo que ele entregou para sua equipe, brindando o público em Madri com as seguintes jogadas:

Gostaram?

Não é todo dia que um atleta vai colocar Ioannis Bourousis ou um Kostas Papanikolau num pôster. E aí o Kalinic me faz isso de uma vez! No mesmo jogo, no mesmo tempo, com fal-e-cesta. Lances impressionantes que podem ser comemorados, mesmo, e que, segundo Bogdan Bogdanovic, encheu o time de confiança no intervalo. Mas não só isso: são duas jogadas que mostram o potencial do ala. Ele deu mais agressividade, mobilidade e opção de contra-ataque para seu time para ajudar a derrubar uma das melhores campanhas do torneio até então.

Só precisa ver se todo dia é dia. Tirando os 11 pontos que fez contra o Egito, o ala havia somado apenas 11 contra Espanha, França e Irã, mas tentando também apenas quatro cestas , acertando três delas. Quer dizer: as chances que teve, aproveitou, mas  a) parece não haver muito espaço para ele no time; b) talvez ele seja mais tímido, disputando apenas seu segundo torneio adulto com a seleção, vindo de 2,8 pontos por média no Eurobasket; c) ou que ele esteja sujeito realmente aos preceitos táticos de Djordjevic.

Se Kalinic estiver antenado, envolvido com o time, tem o tipo de capacidade atlética que vai requerer algum cuidado da defesa brasileira vai ter de lidar caso o sujeito seja, mesmo,e escalado. Fica o mistério, agora com menos de 24 horas de estudos dos técnicos, e a Sérvia precisando escolher qual cartada vai dar.


Duelo com a Sérvia escancara buraco na base brasileira
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Giancarlo Giampietro

Raduljica, sete anos depois, volta a enfrentar Brasil no mata-mata

Raduljica, sete anos depois, volta a enfrentar Brasil no mata-mata

Quando a bola subir na quarta-feira, pelas quartas de final da Copa do Mundo, não será a primeira vez que o armador Stefan Markovic e o pivô Miroslav Raduljica vão enfrentar o Brasil num mata-mata de torneio Fiba. Sete anos atrás, ainda adolescentes, no Mundial Sub-19 eles levaram a melhor contra em uma semifinal que acabou em vitória tranquila dos balcânicos, 89 a 74.

Para quem clicou imediatamente no link acima, já deu para ver os dois ficaram, respectivamente, 26 e 23 minutos, em quadra, contribuindo com 12 pontos, 7 assistências e 6 rebotes. Números regulares. Mas vale o destaque, mesmo, estatístico daquele jogo é a quantidade de brasileiros presentes na seleção nacional que derrubou a Argentina no domingo passado: 0. Isso mesmo: ze-ro.

José Neto está na seleção principal em 2014. Dos garotos, poucos chegaram perto

José Neto está na seleção principal em 2014. Dos garotos, poucos chegaram perto

Quer dizer, se formos considerar o assistente técnico José Neto, temos ao menos um – ele era o treinador daquele time. Daquela geração era de 1988-89, dos quais foram pinçados os 12 representantes para aquela campanha (?) histórica, hoje todos eles com 25 e 26 anos,  nenhum jogador conseguiu se desenvolver a ponto de entrar na lista final de Rubén Magnano para competir por uma medalha na Espanha.

Quem chegou mais perto disso foi o ala-pivô Rafael Mineiro, que disputou o Campeonato Sul-Americano deste ano, como peça integral da rotação, com médias de 6,2 pontos e 4,8 rebotes. Da seleção B, Raulzinho e Rafael Hettsheimeir foram chamados para compor o grupo principal.

Embora não tenha conseguido dar o grande salto, o talentoso Mineiro é um caro caso de atleta que conseguiu alguma continuidade em sua carreira internacional desde o Mundial Sub-19. Desde, então, ao menos conseguiu jogar três Sul-Americanos, mais que o grande nome daquela categoria: Paulão Prestes. O pivô participou só de um Sul-Americano – ironicamente, em 2006, anterior ao torneio de base. Os problemas físicos de Paulão estão bem documentados, guiando uma trajetória de altos e baixos. Foi muito bem cotado na Espanha, acabou draftado pelo Minnesota Timberwolves (algo muito difícil e não pode se perder de perspectiva), mas se lesionou demais e teve problemas com a balança. Chegou a ser pré-convocado por Magnano em duas ocasiões e hoje é a grande aposta do Mogi, ao lado de Shamell.

De resto, temos o ala Betinho em São José, com média de 13,6 pontos, 2,0 assistências e 32,5% nos três pontos em sua carreira no NBB, o ala-pivô Rodrigo César no Uberlândia e o pivô Romário no Macaé. Outro que chega ao NBB agora é o armador Carlos Cobos, de dupla nacionalidade (Espanha e Brasil), criado na base do Unicaja Málaga ao lado de Paulão, e que também não conseguiu se firmar na Liga ACB. Ele acabou de acertar com o Franca de Lula Ferreira, que ao menos vai fazendo esse trabalho de prospeção, tentando recuperar alguns dos garotos espalhados por aí.

Contando: foram citados, então, seis atletas daquele time sub-19, 50%. O restante, para termos uma ideia, é até difícil de rastrear. Luiz Gomes, que hoje é um dos motores por trás do Mondo Basquete – um site bem bacana para você visitar –, fez esse trabalho hercúleo no ano passado, já constando uma geração verdadeiramente perdida.

Thomas Melazzo, fora do basquete

Thomas Melazzo, fora do basquete

Cauê Freias, autor da cesta da vitória contra a Austrália de Patty Mills nas quartas de final, e Bruno Ferreira, o Biro, estão no Caxias do Sul e devem disputar a Liga Ouro, Segunda Divisão do NBB. Houve quem tenha parado e largado o esporte: o ala Thomas Melazzo, que tinha um potencial absurdo, hoje é personal trainer, aparentemente vivendo em Salt Lake City, terra do Utah Jazz. Se alguém souber do paradeiro dos demais, por favor, caixa de comentários aberta abaixo.

Dia desses, no Twitter, o mesmo Luiz Gomes estava especulando a respeito, apontando algumas promessas  de então e hoje na elite. Muitos deles classificados para os mata-matas de uma Copa do Mundo, na elite. A Sérvia já escalou o ala-pivôs Marko Keselj e Milan Macvan na fase decisiva do Mundial de 2010, para se ter uma ideia. No time de hoje, tem Markovic e Raduljica e ainda conta com mais cinco jogadores que teriam idade para disputar aquele torneio, mas só ganhariam visibilidade mais tarde.

Já a França apresenta quatro nomes de seu time sub-19 que bateu o Brasil na disputa pelo bronze: o armador Antoine Diot, o ala Edwin Jackson, o pivô Kim Tillie e um certo Nicolas Batum. O pivô Alexis Ajinça certamente estaria na Copa do Mundo, não tivesse pedido dispensa. Até mesmo os Estados Unidos, com sua produção de talentos incomparável, tem um representante de 2007 aqui: Stephen Curry! Daquele elenco, destacam-se também nomes como DeAndre Jordan (Clippers), Patrick Beverley (Rockets) e Michael Beasley (Marte).

Entre os demais quadrifinalistas da Copa, para ser justo, é preciso dizer que a Espanha só tem um atleta daquela jornada: o ala Victor Claver. Lituânia e Turquia? Nenhum. A Eslovênia não havia se classificado.Mas também é preciso dizer uma coisa sobre os lituanos: sua atual seleção conta com cinco jogadores nascidos depois de 1988 (o ano-limite para inscrição naquele Mundial): Adas Juskevicius, Sarunas Vasiliauskas, Mindaugas Kuzminskas, Donatas Motiejunas e Jonas Valanciunas – os dois últimos simplesmente as maiores apostas dessa tradicional potência. Já os turcos têm três: o caçula Cedi Osman, de apenas 19, além de Furkan Aldemir (cujos direitos na NBA pertencem ao Sixers) e Baris Hersek.

Nessa categoria, de atletas de 26 anos ou mais jovens, também se enquadram os argentinos Facundo Campazzo, Nícolas Laprovíttola, Tayavek Gallizzi, Matías Bortolín e Marcos Delía. A Austrália contou com seis: Dante Exum (19), Brock Motum, Cameron Bairstow (23), Matthew Dellavedova, Ryan Broekhoff (24) e Chris Goulding (25, este convocado para aquele Mundial Sub-19). Já os Estados Unidos possuem apenas um jogador nascido antes de 88: Rudy Gay, e só.

No Brasil, com 22 anos, Raulzinho é a figura solitária. Rafael Luz acabou preterido no último corte, enquanto Augusto Lima dançou já no Sul-Americano. Uma decisão bastante sensata poupou Bruno Caboclo dessa. Já Lucas Bebê foi deixado na geladeira, depois da escapada do ano passado. Ao menos o filho do Raul vem sendo utilizado com regularidade por Rubén Magnano, contribuindo para valer hoje – e ao mesmo tempo ganhando uma experiência extremamente valiosa para o futuro. Agora, fora isso, a seleção que joga na Espanha, a mais velha do Mundial, é apenas para agora e agora.

Obviamente que a base do elenco de Magnano é fortíssima, não sobram vagas. Como acontece com a Espanha. Agora, na periferia do plantel, será que não dava para encaixar? Depois de uma vitória contra a Argentina, na iminência de um confronto com a Sérvia, pode ter gosto de chope aguado todas essas lembranças. Nesta semana, as preocupações dos envolvidos com o jogo ficam realmente direcionadas só para a quadra. Fora dela, porém, nos escritórios da CBB, o tema já deveria estar na mesa há tempos. Sem precisar que a figura até folclórica de Raduljica, nesta quarta-feira, servisse como recado.


O 8º dia da Copa: Grupo do Brasil 100% e milagre turco
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Giancarlo Giampietro

Os turcos vibram com virada no finzinho

Os turcos vibram com virada no finzinho

Era difícil julgar a chave de Grupo da Morte. Afinal, esse jargão implica que algum time favorito vá ficar pelo caminho, de modo precipitado, já na primeira fase de um torneio. No Grupo A da Copa do Mundo de basquete, tínhamos a superfavorita Espanha acompanhada por Brasil, França e Sérvia. Grandes times, sem dúvida. Mas aqueles que o complementavam eram o Irã, que não inspira medo, e o Egito, pior time da competição. Num cenário em que os quatro primeiros se classificavam, não havia risco, mesmo que os iranianos tenham dado trabalho aos franceses. Mesmo que não possa ser considerado mortal, as oitavas de final trataram de comprovar a força de seus candidatos. Com a classificação de Brasil e Sérvia neste domingo, os quatro classificados para o mata-matas seguem vivos nas quartas de final.

O jogo do dia: Turquia 65 x 64 Austrália
O que há de se lamentar nesta jornada foi a impossibilidade de assistir aos instantes finais deste jogo. Acontece que a partida em Barcelona atrasou bastante devido a um problema de cronômetro no ginásio. Fora minutos preciosos que acabaram levando o desfecho dramático confronto a coincidir com o primeiro quarto de Brasil x Argentina. E aqui já registro minha admiração pelos comentaristas de futebol que falam com a maior naturalidade sobre como estão com duas ou três TVs ligadas em casa, monitorando múltiplas partidas. Com basquete, não consigo.

O que a gente levanta, então, pelos relatos é que o ala multifuncional Emir Preldzic, um dos atletas mais singulares do basquete europeu, acertou uma bola de três a cinco segundos do fim, para definir uma vitória dramática e de virada. Do jeito que os mais malucos dos torcedores turcos mais gostam.  Vejam:

Os Boomers ainda tentaram um último ataque, mas Joe Ingles foi desarmado. A equipe da Oceania controlou o placar durante 30 minutos. Entrou no quarto período com quatro pontos de liderança, mas chegou a abrir 12 no primeiro tempo, fazendo bom uso de seus pivôs fortes, que conseguiram se impor mesmo contra um garrafão de respeito como turco. Mas tomaram essa adaga no final. O que não deixa de ser carma, lembrando que eles foram acusados de terem entregado um jogo para Angola, na tentativa de evitar um confronto com os Estados Unidos nas quartas. Caíram nas oitavas, mesmo, e a Turquia vai enfrentar a Lituânia.

A surpresa: Sérvia 90 x 72 Grécia
A maior prova como a chave de cima dos mata-matas da Copa do Mundo ficou muito desequilibrada. O quarto colocado do Grupo A derruba o 1º do B. Fora isso, a Grécia continua sendo um grande time e que provavelmente passaria com tranquilidade pelas oitavas se fosse pegar México (4º do D) ou Nova Zelândia (4º do C, ainda que eles tenham engrossado as coisas com a Lituânia hoje).

Bogdan-Bogdan encara defesa grega

Bogdan-Bogdan encara defesa grega

O placar acima é exagerado pelo que foi a partida. Os sérvios abriram uma senhora diferença a partir do início do quarto período, quando os helênicos passaram a jogar com aquela nuvenzinha escura sobre a cabeça. Passou a dar tudo errado para os líderes do Grupo B. Umas duas dúzias de bandejas foram perdidas, enquanto o adversário exalava confiança. Bogdan Bogdanovic (21 pontos) se soltou em quadra. Milos Teodosic (13 pontos, 5 assistências e incrível liderança positiva) está sempre solto em quadra. Mas o time todo esteve bem, com destaque também para o ala Nikola Kalinic, que nem chegou a enfrentar o Brasil durante a semana. O sérvio estrelou dois dos highlights da competição (veja mais abaixo).

O técnico Sacha Djordjevic encontrou um equilíbrio perfeito entre o jogo interior e o de perímetro, em vez de pingar insistentemente a bola no bisnagão chamado Miroslav Raduljica. O pivô está fazendo bom Mundial e anotou 16 pontos em 24 minutos hoje. Mas é muito lento e desengonçado. Se for a única via de escape do ataque, acaba travando todo o time. Mas a Sérvia soube dosar as pancadas do seu grandalhão com a habilidade dos homens de fora e fez uma das exibições mais bonitas e eficientes desta competição. Etão está nas quartas.

O que é ótimo sinal para a seleção brasileira, de alguma forma. Seu Grupo por enquanto tem 100% nos duelos de oitavas de final, com os balcânicos se juntando a Espanha e França. Desses, dois já foram derrotados pelo Brasil. A Sérvia espancou a Grécia, que havia derrotado a Argentina na última rodada da fase de grupos com certa tranquilidade.

Um causo
Vocês se lembram que, na primeira fase, o técnico Jonas Kazlauskas reclamou da virulência australiana na defesa, né? Falou em “basquete-rúgbi” até. Pois bem. A pressão que os Boomers fizeram foi só um aperitivo para o que a Lituânia enfrentaria neste domingo contra a Nova Zelândia. Os Tall Blacks não têm tantos jogadores habilidosos assim, mas em termos de intensidade e sede pela bola, poucos os igualaram nesta Copa. Depois de venceremo primeiro quarto por 23 a 9, os lituanos se comportaram com certa complacência em Barcelona, talvez acreditando que tivessem vencido a partida em 10 minutos. Nada disso.

Os neozelandeses brigaram bastante, foram tirando a diferença quarto a quarto até assumir a liderança do placar a menos de sete minutos para o fim. Ênfase em briga: não houve nenhum jogo desleal, mas o fato é que eles desceram a marreta na defesa, cometendo 28 faltas. Em uma delas, o armador Taj Webster fez um corta-luz tão duro que aparentemente causou uma fratura de costela do ala Simas Jasaitis. O lituano saiu de quadra andando, mas com muitas dores e dificuldade para respirar. Dessa vez Kazkauskas achou tudo normal. “A Nova Zelândia fez um jogo excelente”, afirmou. “Foram muito duros na defesa, mas nós vencemos o jogo”, completou. Então é isso.

O Haka – e a intensidade – de sempre dos neozelandeses

O Haka – e a intensidade – de sempre dos neozelandeses

Alguns números
48 – com os 27 pontos de Bojan no sábado e os 21 de Bogdan neste domingo, temos 48 pontos para o sobrenome Bogdanovic nas oitavas de final da Copa. Os dois alas brilharam em Madri. A diferença é que o sérvio se classificou para as quartas. Uma curiosidade: na próxima temporada, Bogdan-Bogdan vai substituir o Bojan-Bogdan no Fenerbahçe, da Turquia.

26 – pontos marcou Corey Webster na derrota da Nova Zelândia. Obviamente este não é o padrão do armador. Sua média no Mundial foi de 13,7 por jogo. Na estreia contra a Turquia, ele havia feito 22 pontos. Então dá para se ter uma ideia de que é um jogador explosivo, pronto para produzir aqui e ali. Cria bastante a partir do drible, é agressivo e forte, embora um pouco cabeça-dura na hora de soltar a bola. A despeito de seus defeitos, é de se imaginar como ele ainda não saiu do basquete neozelandês. Chegou a ficar um ano como universitário nos Estados Unidos, jogando pelos  Eagles de Lambuth (oi?), mas voltou para ser profissional em casa, aos 20. Seu irmão mais novo, Taj, joga por uma equipe mais tradicional da NCAA, Nebraska. O pai, Tony, também foi jogador.

6 – Jonas Valanciunas dominou o garrafão para a Lituânia no embate com os  Tall Blacks, que são aguerridos, mas nem tão altos assim. Foram 22 pontos e 13 rebotes (5 ofensivos, muitos deles cruciais no quarto final!) para o ainda jovem pivô lituano. Sem contar seus 35 pontos de eficiência. Mas prefiro destacar aqui as seis conversões em seis tentativas de lances livres do lituano: 100% para o grandalhão, que agora chega a 70% no campeonato. Valanciunas vai jogar com Lucas Bebê e Bruno Caboclo na próxima temporada da NBA, mas como titular absoluto do Toronto Raptors.

2 – são os países convidados (que, na verdade, pagaram um milhão de euros para participar da festa) pela Fiba que estão entre os oito melhores: Brasil e Turquia. Grécia e Finlândia foram os outros dois.

O que o Giannis Antetokounmpo fez hoje?
Num jogo de extrema pressão como esse contra os sérvios, o prodígio grego recebeu a confiança de Fotis Katsikaris, ganhando 14 minutos, e alternou bons (7 pontos, 100% de quadra) e maus momentos (4 turnovers, 4 faltas), de acordo com a idade. Ao mesmo que ainda comete bobeiras no ataque (andada ao receber a bola em movimento em direção ao aro, falta de ataque em jogada individual ao utilizar demais os braços), pode fazer um lance destes aqui:

Então, ânimo garoto! Muita coisa pela frente ainda:

Giannis chateou.

Giannis chateou.

Tuitando:

 O ala Nikola Kalinic estrela uma das de melhores jogadas do torneio na certa. De 22 anos, ele nem foi aproveitado na partida contra o Brasil pela fase de grupos. Nas oitavas, somou 12 vitórias, 4 rebotes e 2 assistências. E ainda faria isto aqui:

Mais uma falta e cesta/enterrada de Kalinic para cima dos gregos, e aí o ala abusou, subindo no aro com tudo. Lembrando a turma de:

A legenda do basquete de playground: Woody Harrelson! Digo: Billy Hoyle, craque de Homens Brancos Não Sabem Enterrar.

O armador Mantas Kalnietis, afastado do Mundial devido a um deslocamento na clavícula, assiste angustiado ao confronto entre sua Lituânia e a Nova Zelândia.


Mas o Twitter inteiro estava esperando, mesmo, por outro jogo, como demonstra o armador Rafael Luz, que poderia muito bem estar nesta Copa.


O 2º dia da Copa do Mundo: coisas estranhas acontecem
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Giancarlo Giampietro

Vocês se lembram daquelas jornadas triplas da Copa do Mundo da FIFA, né? Um jogão atrás do outro, dominando sua agenda. Pois bem. Pegue esse agito todo e multiplique por quatro. O resultado é a Copa do Mundo da Fiba. É muito basquete num dia só: 12 partidas! Uma tabela de estatística vai atropelando a outra, os fatos vão se acumulando, e pode ficar difícil de dar conta de tudo. Vamos dar um passada, então, pela rodada. Para o básico, deixe de ser preguiçoso e acesse o site oficial da competição, né? Veja lá a situação dos grupos e os todos os resultados. Sobre a vitória brasileira sobre o Irã, clique aqui.

Neste domingo, o Mundial flertou um pouco mais com acontecimentos estranhos. Enquanto o Brasil treinava contra o Irã, Senegal derrotava Porto Rico, para conquistar sua primeira. Por 20 minutos, nossos irmãos angolanos davam uma canseira na Lituânia, até que arrefeceram no segundo tempo. E a Turquia… Bem, a Turquia nos deu o…

O jogo da rodada: EUA tomam um beliscão
Ao final do primeiro tempo, com os turcos vencendo por 35 a 30, ficava aquela sensação no ar: será que vai acontecer isso, mesmo? Será que o Team USA pode realmente perder logo na segunda rodada da Copa, para a Turquia, mesmo? A equipe de Ergin Ataman conseguiu amarrar o jogo nos 20 minutos iniciais, dominando os rebotes, desacelerando as ações em quadra e movimentando bastante a bola. Na defesa, salpicou uma zoninha aqui e ali, que confundia os impacientes norte-americanos.

Na volta do intervalo, porém, veio o atropelo: 63 a 37 para os rapazes de Coach K, que voltaram do vestiário babando de raiva. Pressionado, o treinador, aliás, manteve seu quinteto inicial por muito mais tempo – segurando no banco, por exemplo, um Derrick Rose pior que nulo.  Houve um lance no início do terceiro período em que três atletas ao mesmo tempo fizeram falta em Asik. Era ianque caindo de um lado para o outro no tablado, num esforço que derrubou o ataque adversário. Os desarmes e contestações resultaram em contragolpes e desafogo. James Harden também assumiu o controle do ataque, na sua melhor forma: quando joga de modo agressivo, mas seguro ao mesmo tempo (14 pontos + 7 assistências). É habilidoso demais no drible, e ninguém do outro lado estava preparado para brecá-lo. Kenneth Faried e Anthony Davis passaram a dominar o garrafão. Os dois ágeis pivôs terminaram com 41 pontos, enterrando tudo e qualquer coisa por cima dos grandalhões mais pesados da Turquia.  Com todos correndo de modo alucinado, saía uma atrás da outra:

A surpresa: Senegal vence

Maurice Ndour sobe para a bandeja: 8 pontos

Maurice Ndour sobe para a bandeja: 8 pontos

Bom, para vocês terem uma ideia do tamanho da surpresa neste recinto, tinha os porto-riquenhos como candidatos a azarões nesta Copa do Mundo. Sabe-tudo, né? A lição que fica: nunca aposte suas fichas  em Porto Rico. A segunda: nem leve muito a sério o que está sendo escrito aqui. Óbvio.

Depois de levarem marretada da Argentina na primeira rodada, José Juan Barea e Carlos Arroyo foram praticamente eliminados logo no segundo dia com uma derrota por 82 a 75. Não assisti. Seria meio difícil entender como uma seleção com dois armadores tão talentosos poderia perder para uma equipe que basicamente não tem armação. Mas aí já encontramos uma causa: os 11 minutos de jogo para Arroyo. O veterano, que fez uma temporada excepcional na Europa e estava, enfim, se entendo bem com Barea em quadra, sofreu uma grave torção de tornozelo, indo parar no hospital. Pode ser que nem jogue mais no torneio.

Além disso, os senegaleses oprimiram os caribenhos atleticamente. Ganharam a disputa nos rebotes (38 a 33), cobraram mais lances livres (27 a 17) e permitiram um acerto de apenas 43,8% nos arremessos de dois. Sem muito o que fazer perto da cesta, Porto Rico desandou a disparar de três, como culturalmente gostam: 29 chutes de fora, contra 42 no perímetro interno. Em sua estreia em competições Fiba, Gorgui Dieng segue impressionante: 18 pontos, 13 rebotes, 2 tocos e 2 assistências em 34 minutos.

Essa foi apenas a terceira vitória de Senegal nos Mundiais, a primeira contra um time de fora da Ásia e a primeira também numa partida que não seja pelo “torneio de consolação” – nos tempos em que se disputava o 15º lutar etc. Antes, o país havia batido a China por 89 a 79 em 1978 e superado a Coreia do Sul por 75 a 72 em 1998.

Deve ser legal!

Um causo
“Contra os argentinos beligerantes muito pior pior passou Dario Saric, que está bem conservado Nocionija (11 pontos), mas depois de uma de cotovelo de Argentina perdeu seis dentes, na verdade, implante, então ele procurou a mudança. Eventualmente Dario e tal de volta no jogo para estar nessa linha que selou essa grande vitória. Solução protética temporária para o problema Saric estarão disponíveis o mais tardar amanhã por um dentista local, mas sem ele é que ele será capaz de jogar.” Calma, ninguém saiu bebendo por estas bandas aqui na sede das Organizações 21, na Vila Bugrão paulistana. O parágrafo acima foi redigido pelo Sr. Tradutor Google, com base em relato do diário Vecernji , da Croácia. Se a gente juntar os fragmentos, dá para entender que o jovem Dario Saric teve a infelicidade de se deparar com o cotovelo de Andrés Nocioni num dos primeiros jogos do dia. Perdeu seis (SEIS!) dentes nesse… Acidente. Na verdade, os dentes perdidos já eram de um implante. Então, para ele, ficou elas por elas, de modo que voltou para a quadra e contribuiu na segunda vitória croata em duas rodadas: 90 a 85. Depois, foi ao dentista. Mas deve jogar nesta segunda, sem problema.

Dario Saric ao fundo, bem distante do cotovelo de Nocioni

Dario Saric ao fundo, bem distante do cotovelo de Nocioni

 (Outro causo
Pelo Grupo A, em duelo de rivais diretos pela vaga, a França se meteu em mais um jogo duro, a segunda pedreira em duas rodadas, mas saiu com a vitória sobre a Sérvia: 74 a 73. Um pontinho, convertido pelo pivô Joffrey Lauvergne em lance livre no último segundo. Até aí, normal. Não foi a primeira vez, nem a última em que um jogo de basquete é definido desta maneira. Acontece que, em papo com jornalistas sérvios– ele era jogador do Partizan Belgrado –, fez uma confissão: “Tenho de ser honesto com você, não sofri falta no final da partida”, segundo relato do popular tabloide Večernje Novosti. Será? O pivô Miroslav Raduljica já havia cantado a bola: “Perguntem ao Joffrey, ou para os árbitros. Não seria objetivo se tivesse de dizer algo”. Já o técnico sérvio Aleksandar Djordjevic mal se continha: “Estou irritado, e acho que com razão. Tudo o que foi duvidoso foi marcado contra nós”.)  

Alguns números
30 – A Argentina perdeu para a Croácia, mas não olhem para Luis Scola para tentar entender o que se passou. O pivô argentino marcou 30 pontos na derrota – a sexta vez que chegou a essa marca em um jogo de Mundial. Esse é para a história.  

26 – Na segunda rodada, Goran Dragic repetiu os 26 minutos da estreia. De novo: Phoenix Suns e Eslovênia chegaram a um acordo para limitar a utilização do genial armador. É algo que pode virar tendência para os próximos torneios, dependendo da sensibilidade e empenho na diplomacia de ambas as partes. Contra o México, o astro, que somou 18 pontos e 6 assistências, e nem precisou de mais, graças ao desempenho de seu irmão caçula…  

0 – Estávamos esperando por um grande jogo de Zoran Dragic nesta temporada de seleções, e ele finalmente saiu neste domingo. E foi um estrondo: o ala-armador marcou 22 pontos em 22 minutos num jogo tranquilo contra o México. Mas o destaque, mesmo, fica para sua linha de arremessos: 4/4 nos arremessos de dois pontos, 4/4 nos de três pontos e 2/2 nos lances livres. Sim, ele não perdeu nenhum arremesso na jornada.

Goran Dragic, em raro momento de aperto contra o México: 89 a 68

Goran Dragic, em raro momento de aperto contra o México: 89 a 68

 Andray Blatche: contagem de arremessos
42! – Depois de tentar 24 chutes na estreia contra a Croácia, o pivô mais filipino do Mundial maneirou em nova derrota, agora contra a Grécia: 18 chutes de quadra (6/15 de dois pontos e 0/3 de longa distância). Ele terminou com 21 pontos e 14 rebotes em 33 minutos, enquanto nenhum de seus companheiros tentou mais que sete chutes.  

O que Giannis Antetokounmpo fez hoje?
Não foi muito, não. Foram três pontos, todos em lances livres, em apenas 14 minutos. Em arremessos de quadra, foram 0/3 de longa distância, e só. Curva de aprendizado ainda pela frente para o adolescente grego.

No Twitter:

A Finlândia tomou um vareio contra os Estados Unidos na véspera, mas reagiu prontamente contra a Ucrânia. Para que acabar com a festa? Neste domingão, a farra foi a de sempre, como o armador Petteri Koponen nos mostra. Não importando o que acontecer daqui para a frente, os #Susijengi já levaram para casa o Troféu Joinha de Simpatia.

Miroslav Raduljica, um autêntico bisnagão sérvio,  judia do aro em Granada.


Libertem a fera, quer dizer, o Manimal! O jogador mais pilhado do Mundial – e olha que Anderson Varejão está em ótima forma…

O Team USA posou para a foto oficial no primeiro jogo de agasalho. Não pode. Tiveram de repetir hoje, com uma animação que só.


Brasil e Espanha respiram aliviados em Mundial de desfalques
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Giancarlo Giampietro

Magnano está treinando todos aqueles com que esperava contar. Raridade

Magnano está treinando todos aqueles com que esperava contar. Raridade

O Brasil tem um time rodado, o elenco mais experiente de todos os 24 inscritos na Copa do Mundo de basquete. Com o mesmo grupo, trocando Caio Torres por Rafael Hettsheimeir, terminaram as Olimpíadas de Londres 2012 com o quinto lugar.

São dois pontos importantes para justificar qualquer otimismo que o Basqueteiro da Silva possa sentir em relação ao torneio que começa neste sábado.

Mas saiba que há mais um elemento importante a ser considerado: entre as seleções que afirmam publicamente que jogam por uma medalha neste Mundial, apenas o Brasil e a anfitriã Espanha vão levar para quadra o que no jargão da imprensa esportiva se chama de “força máxima”.

Rubén Magnano, que tanto chiou no ano passado ao final de uma vexatória Copa América, tem agora ao seu dispor a lista que julga ideal. Justamente num campeonato em que seus principais concorrentes estão seriamente avariados.

Se é para falar em desfalque, a lista começa obrigatoriamente com os Estados Unidos da América. O Coach K teve de montar sua lista final sem LeBron James, Kevin Durant, Carmelo Anthony, Russell Westbrook, Paul George… (respirem fundo, que ainda tem mais)… Kevin Love, Blake Griffin e LaMarcus Alridge. Isso para não falar de Michael Jordan, Wilt Chamberlain, Mugsy Bogues, John Isner e os Harlem Globe Trotters. Ainda assim, são candidatos ao ouro, claro – mas sem amedrontar tanto os donos da casa.

A França, campeã europeia, não vai contar com os pontos, assistências e, principalmente, liderança de Tony Parker, seu Macho Alfa. Se já não fosse duro o bastante, ainda perderam seus dois melhores pivôs: Joakim Noah e Alexis Ajinça, duas baixas seriíssimas para sua defesa, além do fogoso e criativo ala-armador Nando De Colo. Resulta que a dupla Boris Diaw e Nicolas Batum vai ter de mostrar do que é feita. Acostumados a vida toda a escoltar Parker – e outras estrelas como Roy, Lillard, Nash, LaMarcus, Duncan, Stoudemire etc. em suas carreiras –, os dois agora têm de canalizar todo o seu talento como referências primárias. Era para os Bleus estarem no topo da pirâmide dos favoritos, mas eles acabam rebaixados ao segundo escalão.

Mesmo nível em que aparece a Lituânia não tinha o estourado ala-pivô Linas Kleiza, cestinha que, quando em forma, pode ajudar qualquer time do mundo. Mas ainda poderia conviver com isso, já que há pivôs de sobra por lá. O problema sério foi ter perdido, de última hora, seu armador Mantas Kalnietis, que deslocou o ombro no último teste da seleção. O cara não é cerebral, não está nem entre os 20 melhores do mundo em sua posição, mas calha de ser o único do país com tarimba para liderar um time desses, a despeito de seus arroubos de loucura aqui e ali. Basicamente: era o jogador que os lituanos não podiam perder.

Šarūnas Vasiliauskas tem as cartas lituanas em mãos: foi o único armador que sobrou no elenco

Šarūnas Vasiliauskas tem as cartas lituanas em mãos: foi o único armador que sobrou no elenco

Na Argentina, a lamentação fica por conta da ausência de Manu Ginóbili, primeiro, e de Carlos Delfino, em segundo. Manu tentou de tudo para se alistar, mas o Spurs disse não, preocupado com a recuperação de uma fratura por estresse na perna. Delfino nem jogou a temporada depois de passar por uma cirurgia no pé direito. Os dois eram basicamente as únicas opções seguras de pontuação no perímetro para Julio Llamas, que agora se vê com um elenco desbalanceado – Scola, Nocioni e Herrmann jogam basicamente na mesma posição hoje em dia.

Já está bom?

Nada, tem muito mais.

Lorbek poideria dar uma baita ajuda para Goran The Dragon não fosse o joelho estourado

Lorbek poideria dar uma baita ajuda para Goran The Dragon não fosse o joelho estourado

A Eslovênia poderia ter um baita time, mas, por motivos diversos, seja de disputas de ego ou lesões, vai com uma equipe remendada para o Mundial. Enquanto Goran Dragic estiver inteiro, eles terão chances. Mas o fato é que sua cotação nas casas de apostas seria mais elevada se o pivô Erazem Lorbek (que não fez uma boa temporada pelo Barcelona, mas ainda é um craque) tivesse pedido dispensa e se Dragic, Beno Udrih e Sasha Vujacic levantassem a bandeira de paz. Boki Nachbar ainda poderia ajudar, caso não tivesse se despedido da seleção.

Por falar em despedidas e seleções balcânicas, bem que o veterano e ainda produtivo Zoran Planinic poderia dar uma forcinha para sua Croácia. Ainda na região, a Sérvia não vai poder contar com o jovem armador Nemanja Nedovic, lesionado, e com o ala Vladimir Micov, que brigou com o técnico. São coadjuvantes, mas estariam entre os 12 num cenário perfeito.

Se a Grécia ttivesse Vassilis Spanoulis entre seus convocados, também teria subido alguns postos na lista de candidatos ao pódio, mesmo que Dimitris Diamantidis siga aposentado de competições Fiba. Kostas Koufos e Sofoklis Schortsanitis também deixariam o garrafão helênico muito mais pesado, com o perdão do trocadilho. A arquirrival Turquia não é confiável, mas se tornaria mais forte com Ersan Ilyasova formando uma bela linha de frente com Preldzic e Asik. Hedo Turkoglu? Nem levaria, mas fica o registro.

Mesmo meu candidato preferido a azarão do Mundial, Porto Rico, tem seus problemas. Há quem julgue que o gigante PJ Ramos não faça falta – é certamente o caso do técnico Paco Olmos, que se recusou a chamá-lo –, mas não há como relevar a baixa do ala John Holland. Americano de ascendência porto-riquenha, ele não tem muito cartaz neste mundão Fiba, mas se tornou um personagem fundamental para o time devido a sua capacidade atlética, apetite pelos rebotes e defesa. “Grande coisa”, poderia responder o técnico Orlando Antígua, da República Dominicana. “Nós perdemos o Al Horford. O Al Horford, meu craque!!!”

Al Horford poderia fazer toda a diferença para os dominicanos

Al Horford poderia fazer toda a diferença para os dominicanos

Do outro lado do planeta, a Austrália ficou sem seus dois principais jogadores: o armador Patty Mills, o explosivo reserva do San Antonio Spurs e também o cestinha das últimas Olimpíadas, operado, e o pivô Andrew Bogut, do Golden State Warriors, que já não tem mais saúde para praticar basquete nas férias.

Se você somar todos os nomes em negrito, vai ver que são mais de 20 jogadores fundamentais fora de combate, além de todas as ausências norte-americanas. Isso tira um pouco do brilho do torneio, mas abre caminho para quem chega inteiro. Mesmo assim, ninguém vai ser insano de dizer ficou “moleza” para Huertas, Splitter, Nenê & Cia. Mas que as chances aumentaram e estão aí, não há dúvida.