Chegou a hora de aceitar o Atlanta Hawks como sério candidato
Giancarlo Giampietro
Há alguns caminhos básicos para aceitar um time qualquer como favorito, ou forte candidato ao título. Cada vez mais se valoriza números e números, dentre os quais o saldo de pontos acumulado durante a campanha se destaca como um grande indicador para além da óbvia comparação entre vitórias e derrotas. O seguidor mais conservador pode se apegar a outros fatores como a quantidade de superestrelas em um elenco e o retrospecto, histórico recente dessa equipe nos mata-matas. Ainda assim, essa abordagem também tem uma base empírica, já que são raríssimos os casos de clubes que conquistaram a NBA sem contar com um craque transcendental em sua formação.
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Tanto que o Detroit Pistons virou a menção obrigatória de exceção dessa regra, com os Wallace que não eram irmãos e a dupla entrosadíssima de Billups e Hamilton. Todos All-Stars, bem acima da média, que se entenderam muito bem e entraram para os livros históricos. Mas nenhum deles vai entrar no panteão. O Spurs de 2014 poderia até entrar nessa lista também, mas vai depender de como você avalia o fato de a equipe contar com Parker, Duncan e Ginóbili, que já não estavam no auge mais, mas cujo currículos causam, de qualquer forma, inveja em muita gente.
Deixemos os atuais campeões de lado, todavia. Ou melhor: nem tanto, já que, para falar sobre o Atlanta Hawks, não dá para ignorar o fator #SpursDoLeste, com um time armado sob os mesmos princípios saudáveis que Gregg Popovich consolidou em San Antonio. Em seu segundo ano de trabalho na Geórgia, Mike Budenholzer vai obtendo resultados incríveis. Nesta quarta, por exemplo, ele já se assegurou como o técnico da seleção do Leste no All-Star Game, com a melhor campanha da conferência, por ora inatingível. Seus atletas venceram 28 das últimas 30 partidas que disputaram, vindo de 14 vitórias seguidas, igualando o recorde da temporada 1993-94. Os falcões estão voando, mesmo, como nunca antes na história da franquia. Ainda assim, guiada por princípios históricos – resumidos na marcante frase de Jordan sobre crianças, homens e playoffs –, a crítica demorou a reconhecê-los como séria ameaça na liga americana. Pode incluir esta besta quadrada aqui nesse pacote. Pode, também, esquecer qualquer preconceito. O Atlanta veio para ficar.
Não quer dizer que o título é deles já, de modo antecipado. Que seja impossível de perder. Qualquer lesão de Al Horford, Jeff Teague, Kyle Korver e Paul Millsap já os deixariam em maus lençóis. O Washington segue jogando de igual para igual com a maioria dos grandes. Mesmo em espiral, Toronto não pode ser desrespeitado. Para não falar de Chicago e Cleveland, esses, sim, os conjuntos estelares, que vão chegar aos mata-matas, independentemente da histeria ao redor de ambos. Importante dizer que todos esses times já foram surrados pelo Hawks. De qualquer modo, muita coisa pode acontecer em 40 partidas, em três meses de temporada regular até a chegada aos mata-matas.
Se tivéssemos, no entanto, a chance de congelar o tempo e deslocar esse Hawks de hoje, 22 de janeiro de 2014, e descolá-lo para os primeiros dias de abril, teríamos no páreo um favorito, e tanto. Favorito e encantador, ainda que sem o sex appeal de um Golden State Warriors comandado por um técnico tão carismático e vitorioso e liderado em quadra por um talento precioso como o de Stephen Curry.
O irônico é que o gerente geral Danny Ferry, ainda afastado por uma gafe-ou-comentário racista, fez de tudo para contratar a chamada superestrela. Alguém da estirpe de Curry – ou do ala-pivô Bob Pettit, que guiou a equipe nos tempos de St. Louis ao título em 1958, desbancando Bill Russell, Red Auerbach e o Celtics. Foi atrás de Chris Paul e Dwight Howard, nativos da Geórgia, quis também se reunir com Carmelo e LeBron. Dikembe Mutombo, Joe Johnson e Isaiah Rider (risos) que nos desculpem, mas o clube não conta com ninguém desse porte desde as cravadas inigualáveis de Dominique Wilkins nos anos 80.
Não rolou, claro. Fechou, então, com Millsap, Korver, DeMarre Carroll, Mike Scott, Pero Antic, Thabo Sefolosha e Kent Bazemore. E não é que deu certo? Com um basquete eficiente, consistente, de movimentação de bola totalmente solidária e arremessadores perigosos para quebrar qualquer sistema defensivo, de Thibs a marcação por zona, a turma de Al Horford está arrebentando. Ênfase em solidariedade, por favor. É um conceito que pode ser banalizado se usado a cada crônica de jogo, a cada análise de uma equipe. Neste caso, contudo, não precisa se preocupar, pois o termo cabe ferfeitamente.
O Atlanta é o segundo time em assistências por jogo, atrás do Golden State. Mas acho que já aprendemos que se basear apenas em números absolutos não cola mais, né? Cada equipe joga num ritmo, produzindo mais ou menos números. O melhor, sempre, é saber o quão eficiente o conjunto se apresenta. Então que tal conferir o ranking de assistências por posse de bola e ver que, nessa medição, eles aparecem em primeiro? Lideram também a coluna de percentual de cestas de quadra que são assistidas – o Spurs, observem, está em terceiro. Esse padrão se mantém para seus chutes de três pontos: apenas 7,1% dos tiros de longa distância decorrem de jogadas individuais, em vez de um passe, contra 9,2% do Spurs. Istoé, Jamal Crawford, Nick Young e JR Smith não teriamm espaço por lá. Nas bolas de dois pontos sem assistências, o percentual sem assistências é maior (39,9%, e aqui entram as infiltrações de Jeff Teague e Dennis Schröder), mas ainda é o menor da liga. Por fim, na média de assistências para cada turnover, estão em terceiro. Nas últimas sete vitórias, em seis ocasiões eles bateram a marca de 30 assistências. Vamos todos juntos, então, repetir: jo-go so-li-dá-rio. Pode soletrar também, se achar necessário.
A excelente visão de quadra e a predisposição para passar a bola resultam, obviamente, numa bola seleção de arremessos. A equipe é a terceira no aproveitamento efetivo de arremessos, a medição que dá um pouco mais de valor para os arremessos de três pontos, já que… segundo minhas contas, três é maior que dois. Sim, Budenholzer também é um adepto dos arremessos de três como peça integral de uma ofensiva, tendo o segundo melhor aproveitamento da liga nesse quesito (atrás apenas do Golden State). O sistema do ex-assistente do Coach Pop enfatiza o chute de fora, mas não chega a ser obcecado como o Houston Rockets, sendo o nono que mais arrisca, mas com oito tentativas a menos que os texanos). Por ter um excelente rendimento, no entanto, é o quarto time que mais depende da bola de longa distância para gerar pontos.
Parêntese obrigatório aqui para o Sr. Kyle Elliot Korver, nascido no dia 17 de março de 1981, natural de Lakewood, na Califórnia. O que ele está fazendo nesta temporada não existe. Quer dizer: existe, mas é inédito – nunca um atleta terminou a temporada regular com mais de 50% tanto nos arremessos de dois como de dois e 90% nos lances livres. Seus números, respectivamente: 51,8%, 53,5% e 92,2%. Ele lidera a liga no aproveitamento do perímetro pelo segundo campeonato seguido. Sua habilidade neste fundamento faz com que seus companheiros ataquem com 4 contra 4, já que ele não pode ficar livre de modo algum. Ele transformou um chute de três em bandeja, gente. E aí que foi engraçado ver o cara enterrar nesta quarta contra o Indiana Pacers, em transição. Foi sua primeira cravada desde desde 16 de novembro de 2012, contra o Kings! No meio do caminho, ele matou 484 chutes de fora em 198 jogos. Vejam abaixo e, logo depois, seu esmeraldino gráfico de arremessos:
Korver merece estar no All-Star. Mas este também é o caso de Teague, jogando seu melhor basquete, Millsap, que vai receber uma bolada no mercado de agentes livres, e Horford, o faz-tudo perfilado por Zach Lowe com a maestria de sempre e que só não tem o status de superestrela por jogar em Atlanta e pelas lesões peitorais bizarras. Dificilmente os técnicos vão encontrar espaço no banco da seleção do Leste para fazer justiça a todos eles.
Ao menos eles não dão a mínima para isso. Millsap ficou todo orgulhoso ao ser selecionado no ano passado, mas vai sobreviver se a façanha não se repetir. O mesmo vale para os outros. Afinal, numa unidade dessas, é muito complicado separar o sucesso de um e o do outro. “Sentimos que temos peças realmente boas que combinam bem, e entendemos que temos de jogar juntos para ter sucesso”, diz o atirador de elite.
Depois de longa consulta nos números, são poucos os pontos fracos a serem apontados para um raro caso de time que está entre os dez melhores no ranking de eficiência ofensiva e defensiva (Golden State, soberano, e Portland são os outros). O máximo que dá para falar é de uma fragilidade nos rebotes. Na tábua defensiva, ocupa apenas a 18ª posição na coleta de rebotes disponíveis, situação da qual Greg Monroe e Andre Drummond tiraram proveito na segunda-feira (juntos, somaram 12 rebotes ofensivos). Além disso, o Hawks é o 19º em contra-ataques: apenas 11,6% de seus pontos saem em transição, contra 18,6% do Warriors, e também o 18º em lances livres (17,1%). Esses pontos, porém, não preocupam tanto, devido a sua excelência na execução em meia quadra. Para os mata-matas, porém, podem fazer falta.
Ah, claro, se for para falar de números, o pior de todos é o de público, o sétimo pior da liga, com 16.327 espectadores em média – 2.500 a mais que o lanterna Timberwolves. O torcedor de Atlanta tem demorado para se interessar pela excelente fase. A despeito do incidente com Ferry, passar os dias sem prestigiar essa equipe é um pecado. Contra o Pistons, no feriado em homenagem a Martlin Luther King, a arena teve capacidade esgotada (19.108). Contra o modorrento time do Pacers, nesta quarta, só 15.045 foram ao ginásio. A baixa audiência só não impede que o valor da franquia tenha subido quase 100% no último ranking divulgado pela Forbes.
Vale mencionar também que o Hawks encarou até o momento a quinta tabela mais fraca da liga. Juntos, seus adversários têm aproveitamento de 48,9,%. Por outro lado, estão empatados com o Bulls nesse quesito. O Wizards, concorrente direto, teve a segunda jornada mais fácil, com 48%. O time de Budenholzer também fez mais jogos fora do que em casa (22 x 21, é verdade).
Então é isso: você precisa se esforçar para encontrar algum senão nessa jornada do Hawks, que se tornou apenas o terceiro time da história do Leste a somar 28 vitórias em um intervalo de 30 jogos. Os outros dois? Miami em 2012-2013 e Chicago em 1995-96, e ambos levaram o título. Bastam mais três triunfos para que eles igualem as 38 da temporada passada (38). Com aproveitamento de 81,3% na atual campanha, a equipe cresceu até o momento 34,7%, o maior salto.
Recordes? All-Star? Favoritismo? Não que isso tudo valha algo para eles. “Todos nós sabemos de verdade que ainda não conquistamos nada”, disse Korver. “Eu amo quando a melhor equipe vence os melhores jogadores. Foi o que aconteceu nas finais do ano passado para mim.”
A final vencida pelo Spurs. Vocês sabem, o Hawks do Oeste.