Bulls usa cartilha anti-Heat para encerrar sequência de vitórias dos astros de Miami
Giancarlo Giampietro
Faltavam 2min41s para o fim, e Chris Bosh pegou um rebote ofensivo após arremesso errado de três pontos de LeBron James. O ala-pivô do Miami Heat havia feito a captura na zona morta, pela direita do ataque e mal teve tempo de reagir quando Kirk Hinrich deu o bote. Feito um leão, agarrou a bola com tudo e a arrancou das mãos de um jogador cerca de 20 centímetros mais alto e 20 quilos mais pesado.
No ataque seguinte, o armador do Bulls partiu com tudo para a cesta, pelo centro do garrafão sem se importar (aparentemente) que havia acabado de tomar dois tocos seguidos de LeBron e Bosh nas posses de bola anteriores. Subiu resoluto a tentar mais uma bandeja. Pelo menos foi o que os atléticos defensores dos atuais campeões pensaram – na última hora, já no alto, Hinrich flexionou o corpo para a frente e, por trás dos defensores, fez o passe para Taj Gibson, posicionado à sua esquerda. O ala-pivô subiu confiante para o arremesso, com boa elevação, e matou a bola. Nas palavras de Mike Breen, “Bang!”. Eram nove pontos de vantagem no placar.
Não há sequência em quadra que defina mais esta versão do Chicago Bulls, de operários, nada de egoísmo, com um esforço fantástico para encerrar a série histórica de vitórias de LeBron James, Dwyane Wade e sua badalada e formidável equipe com um placar de 101 a 97.
Quando Pat Riley, com a conivência de suas estrelas, manipulou todo o mercado de agentes livres em 2010, a diretoria de Chicago, que se considerava no páreo pelos serviços de James, Wade e/ou Bosh, teve se voltar a um plano B, com jogadores mais baratos, mas aguerridos, que formariam a defesa mais sufocante da liga sob a orientação minuciosa e beligerante de Tom Thibodeau. Os dois times estavam destinados a combater nos playoffs. O Heat, obviamente, teve mais sucesso até aqui, com duas aparições nas finais e um título.
Mas os homens de Thibs obviamente não entregariam os pontos nesta quarta-feira ou na temporada. Mesmo sem Derrick Rose durante todo o ano e sem Joakim Noah para o clássico. Mesmo com um banco severamente enfraquecido com as saídas de Asik, Korver e Watson, devido ao corte de despesas imposto pela chefia – os homens de terno e gravata, sim, nunca chegaram a acreditar que seus jogadores teriam alguma chance este ano sem a presença de Rose, optando, então por baratear o elenco, agradando ao proprietário Jerry Reinsdorf. Que o técnico se virasse, então, contando com um bem-vindo retorno de Hinrich, o incansável Luol Deng e o progresso de Jimmy Butler.
Brigaram do início ao fim, ciente da quantidade extra de holofotes que a partida pedia devido ao momento incrível vivido por Miami e se alimentaram de uma torcida enloquecida, preparada para a briga, de um modo bem raro de se ver nas arenas pomposas, predominada por yuppies, ao redor do país.
Espertamente, atacaram os adversários no ponto em que são mais frágeis, os rebotes, apanhando 12 na tábua ofensiva e 31 na defensiva, com 12 a mais no geral. Além disso, conseguiram conter os tiros de três pontos (35%, 7-20), baixando também o aproveitamento geral da equipe de Spoelstra (48,1%, índice relativamente baixo frente ao que eles vinham produzindo, ainda mais o elenco de apoio; se descontarmos o rendimento de LeBron, a conta despenca para 43,3%).
No ataque, mexeram a bola com astúcia, conseguindo 27 assistências em 40 cestas de quadra, num esforço coletivo tremendo: quatro jogadores deram mais de cinco passes para cesta: Hinrich, Deng, Butler (!) e Gibson (!!), e outros dois ainda contribuíram com três quadra (Boozer e Robinson). Demais. Individualmente, contaram com linhas excelentes de Boozer (que também teve 21 pontos e 17 rebotes) e Deng (28 pontos, 7 rebotes). Deu tudo certo no plano de Thibodeau, a não ser pelo excesso nos desperdícios de posse de bola (18, que poderiam ter custado uma nota contra um time de contragolpe tão devastador como o que enfrentaram).
O Chicago Bulls já reinou na NBA absoluto nos anos 90 com o melhor jogador de todos os tempos, respaldado por mais uma grande estrela e diversos exímios especialistas que os complementavam. Naqueles tempos, o Bulls, de uma cidade blue collar, tinha um elenco baseado na maior estrela da liga. Tal como o Miami Heat. Nada mais significativo, então, que, com essa fórmula subvertida, fossem os trabalhadores de hoje a parar em 27 a arrancada de vitórias do time da Flórida.
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Kirk Hinrich chegou à em 2003, no mesmo Draft de LeBron, Bosh e Wade (e Carmelo). Tirando essa deliciosa coincidência, pensando nos acontecimentos desta quarta, ele, contudo, nunca esteve no mesmo grupo de fato da trinca. Eram os quatro, o pobre Darko e os outros. Não que Chicago se importasse com essa distinição. Até 2008, o armador prestou inestimáveis serviços ao clube, ajudando a recuperar sua imagem depois dos desastrosos anos pós-Jordan. A partir daí seu rendimento foi caindo aos poucos, com o acúmulo de problemas físicos e a ampulheta sendo virada e revirada sem parar. Foi despachado para o Washington Wizards no Draft de 2010, justamente para o Bulls economizar salários e investir no mercado. Acabou repassado ao Atlanta Hawks, até retornar este ano, sem muito alarde.
A recepção por parte de torcedores, treinadores e antigos companheiros, porém, não poderia ter sido melhor – diziam que voltava para casa. Tem médias de 7,1 pontos, 5,3 assistências e 37,2% nos tiros de quadra. Números que não contam de modo algum sua relevância para o time, como um autêntico líder em quadra, sacrificando o corpo já todo arrebentado, com um espírito dos mais combativos do campeonato.
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Não é uma questão de eleger o bem contra o mal, em termos de gestão. Ao tentar contratar LeBron, o Bulls idealizava o mesmo modelo de Miami, com o ala jogando ao lado de Derrick Rose e Noah. Com a mudança da regulamentação financeira da liga, ficou muito mais complicado agora de se reprisar os movimentos feitos por Riley há três anos. O presidente do Heat, porém, tem um trunfo a seu favor: tanto James como Wade não exigiram o salário máximo, permitindo que ele pudesse investir nas contratações pontuais e essenciais de Shane Battier e Ray Allen.