Vinte Um

Quebra de establishment e muita torcida no NBB
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Giancarlo Giampietro

Paulistano, um dos semifinalistas inéditos do NBB 6

Paulistano, um dos semifinalistas inéditos do NBB 6

Não vou sentar aqui e escrever mil maravilhas sobre as classificações de Paulistano e Mogi para as semifinais do NBB. Não que eles não mereçam, mas pelo simples fato de não ter acompanhado tão a fundo o campeonato, à devida maneira – as razões são muitas, mas podemos dizer que tudo se resume a tempo e, de qualquer forma, o texto não é sobre lamúrias de um só residente da Vila Guarani paulistana… Paremos por aqui. Vocês podem até não acreditar, mas nunca me atraí muito pelo charlatanismo. Não adianta inventar onda, usar argumentos abstratos e incensar aquilo sobre o qual não se tem muitas certezas. Ninguém merece. O que posso dizer, então, é especificamente sobre os acontecimentos da sexta-feira de basquete nacional que se passou. Um dia que terminou, fazendo os descontos obrigatórios, com saldo bastante positivo para a liga.

A começar pela quebra do establishment. São dois semifinalistas inéditos, que não constavam realmente em nenhuma bolsa de apostas no início da jornada, assumindo os lugares de Brasília (presença cativa entre os quatro melhores nas primeiras cinco edições da competição), Pinheiros (terceiro em 2011 e 2012) ou Uberlândia (vice do ano passado, e dono de um dos maiores orçamentos do país até esta temporada, algo que vai acontecer na próxima).

Para se definir os finalistas, o jogo nem sempre vai ser disputado em alto nível, algumas limitações técnico e táticas ainda são estridentes, mas também não dá para pegar tudo num punhado só, amassar com cara de asco e atirar na lata de lixo, achando que fez uma baita cesta. Tivemos dois ginásios lotados, tomados inicialmente pela euforia, para depois fazer a inevitável concessão à tensão. Em meio a esse cenário, algo muito relevante: os torcedores visitantes também presentes e fazendo barulho. Um envolvimento, um apego muito bem-vindo.

Dos francanos, não esperamos outra coisa, mesmo que obrigados a percorrer o uma distância maior e encarar o rush de São Paulo para chegar em tempo ao Paulistano. Já a galera de Mogi acaba sendo uma positiva novidade. Obviamente que a cidade tem lastro com o basquete, mas esse vínculo andava dormente. A recente guinada do clube, subindo degrau por degrau, alcançando os holofotes dos playoffs, deixando um gigante como o Pinheiros pelo caminho, serviu para acender a chama novamente. E eles têm feito uma baderna daquelas.

Torcida, Mogi, NBB, 2014, playoffsEsse é o resultado de brincar com as emoções de gente que tenha o mínimo interesse pelo esporte em geral. Dois jogos de matar-ou-morrer em sequência? Drama puro, chama público. Ainda mais com o desenvolvimento de suas respectivas narrativas durante a fase decisiva. Para Mogi, essa história ganha até contornos de fábula, com o time terminando a temporada regular com mais derrotas (18) do que vitórias (14), superando o Macaé por apenas um triunfo para garantir a última vaga nos mata-matas, como o 12º colocado. (Explicando, para os que não acompanham a liga: as oitavas de final são uma espécie de playoff preliminar, com chaveamento envolvendo os times que terminaram entre os quinto e 12º lugares, enquanto os quatro demais aguardavam para a disputa das quartas de final.)

Cheio de confiança, Mogi bateu primeiro o Pinheiros, campeão e vice das últimas duas Liga das Américas, e, depois, Limeira, ambos de virada. Já o Paulistano estava posicionado entre os cabeças-de-chave, depois de conquistar uma surpreendente segunda colocação ao término de 32 partidas, com 23 vitórias e 9 derrotas, deixando para trás o poderoso Brasília (21-11), ficando abaixo apenas do Flamengo (26-6), intrometido entre os favoritos. Foi o time de Gustavo de Conti que assisti de perto nesta sexta, como um dos poucos que não xingava alguém no ginásio Antonio Prado Júnior.

(Aliás, aqui cabe outro parêntese: ninguém quer que o público pire na ópera ou entoe um coral creole caribenho, nem nada disso. Mas tudo tem um limite. A cena é recorrente, com o Melk já registrou em crônica lá atrás, mas não deixa de causar espanto: todos aqueles garotinhos com cachinhos angelicais de um clube de elite da maior metrópole do país sentadas na arquibancada, atacando o mundo todo, apoiados, claro, pelos berros dos pais. Do outro lado, a caravana francana não fazia por menos. Foram eles, na verdade, quem deram início aos trabalhos ofensivos, antes do tapinha inicial. E, claro, esse não é um problema exclusivo dos dois clubes envolvidos, nem do NBB e do basquete. Educação, a gente não se vê por aqui.)

Abstraindo as torrenciais indelicadezas, como Paulão, alvo predileto da gurizada, fez por muito tempo, até não aguentar mais, dava para falar em clima de frenesi total, especialmente com a arrancada francana a partir dos minutos finais do terceiro período. A torcida dos visitantes nunca parou de apoiar sua equipe e quase se viu recompensada com uma reação daquelas.

O Paulistano chegou a abrir uma vantagem de 15 pontos no terceiro período, mas viu os adversários empatarem o placar em 72 a 72, a 4min20s do fim. Nesse momento, porém, o ala Henrique Pilar, o grande nome do jogo, voltou a desequilibrar, com seis pontos em sequênca – primeiro numa cesta de três após dobra para cima de Desmond Holloway na zona morta, depois com uma infiltração que resultou em falta-e-cesta, restando 1min21s. A partir daí, Franca se perdeu em precipitações em quadra, buscando sempre o tiro de longa distância, inclusive na posse de bola seguinte ao grande lance de Pilar, saindo de um pedido de tempo, diga-se. Não teve água no chope dos locais.

Venceu o time que apresentou um basquete mais equilibrado durante a noite. De novo: falo especificamente sobre este jogo. Fossem infinitamente superiores, não haveria a necessidade de uma quinta partida e tanto sofrimento. Em linhas gerais, contudo,  o time de Gustavo apresenta mais possibilidades. Tem um ataque potencialmente mais imprevisível, sobre o qual escreveremos mais durante a semana.

Ao final do confronto, pausa para falar com alguns atletas, sendo bastante inconveniente, é verdade, em meio a amigos e familiares. Conversa vai, conversa vém, tudo muito bom, mas, quando a turma da TV não para de passar pedir licença, penando para desarmar o aparato da transmissão, estava sinalizada que era mais do que hora de subir a Augusta (veja bem: su-bir a Augusta e, não, des-cer) e voltar para casa. Deu tempo para ignorar o finalzinho do jantar da família, ir direto para o sofá, cheio de maus modos, e pegar o quarto período de Limeira x Mogi. Deu tempo para ver o time do forasteiro Paco García se comportar muito bem emocionalmente nos minutos finais, resistindo à pressão de mais um desfecho dramático, celebrando seus novos heróis. Sobre esses heróis, também ampliar a discussão na sequência. O que vale, primeiro, é registrar o surgimento deles, nem que sejam efêmeros, para Mogi das Cruzes e, quiçá, para o público um tanto invocado e não necessariamente engajado do Paulistano. Para um NBB que ainda luta por espaço, por identidade, um ótimo passo.


Personagens dos playoffs: Splitter reage
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Giancarlo Giampietro

Tiago Splitter x LaMarcus Aldridge

Tiago Splitter já sabia o que vinha pela frente, mas estava preparado. Depois de lidar com Dirk Nowitzki por sete partidas, era hora de se virar com LaMarcus Aldridge. ''Acho que LaMarcus é um Dirk mais jovem, que pode arremessar, infiltrar, jogar no garrafão e fazer muitas coisas. Não será fácil'', afirmou, antes de a semifinal da Conferência Oeste começar.

Difícil, mesmo, foi a vida do líder do Portland Trail Blazers nesta quinta-feira. No geral, também com a contribuição de Tim Duncan, o cestinha viveu uma jornada infernal, matando apenas 6 de seus 23 arremessos de quadra. Dentro desses números, 14 chutes foram contabilizados sob a vigilância do catarinense, dos quais ele acertou apenas dois. Os 14% de acerto valeram como o segundo pior de sua carreira, com um mínimo de dez chutes computados.

Não é questão de patriotada, vocês sabem. Mas, após destacar o que Nenê fez contra o Chicago Bulls, chegou a hora de também dar o devido espaço para o catarinense. Com a cabeça fria e competência, vai dando conta do recado, mostrando que os US$ 36 milhões que o San Antonio Spurs comprometeu em lhe pagar por quatro temporadas fazem sentido. Justamente contra um dos times que tentou convencê-lo a deixar o Texas no ano passado, quando o pivô se tornou agente livre, semanas depois de ter pouco sido utilizado na histórica final contra o Miami Heat.

Splitter poderia estar jogando ao lado de LaMarcus, e não contra

Splitter poderia estar jogando ao lado de LaMarcus, e não contra

''Você se sente bem que alguns times o queiram, e às vezes você até mesmo sente que seria legal tentar algo novo. Você fica com aquela dúvida na cabeça'', disse ao San Antonio Express-News o jogador que teve sondagens firmes do Blazers e do Atlanta Hawks. ''Mas eu realmente queria continuar. Essa era a minha primeira opção. Quando tive a chance, abracei. O Spurs fez uma oferta que gostei e é ótima para mim e minha família. Não poderia dizer não.''

Que o Spurs tenha valorizado suas contribuições só poderia contar para recuperar um pouco de sua confiança, especialmente depois de ter jogado apenas 12min30s nos últimos dois jogos contra o Heat na decisão. Praticamente como se ele tivesse jogado apenas um período de oito possíveis.  ''Isso sempre vai ficar na cabeça. Não tem como tirar. O que dá para fazer é seguir em frente e pensar apenas na próxima temporada'', disse na ocasião da extensão de seu vínculo com a franquia.

Para quem acompanha à distância, é difícil entender como alguém que tem médias de apenas 19,8 minutos na carreira, com 8,3 pontos e 5,3 rebotes, pode valer essa bolada toda. Ainda mais quando, no ano primeiro ano de seu volumoso contrato, ele regrediu estatisticamente tanto do ponto de vista das métricas avançadas como em produção por minuto. Por causa disso – ou talvez explicando isso, vai saber -, viu seu tempo de quadra se reduzir, depois de ter ganhado  espaço com Gregg Popovich nas suas três primeiras temporadas em sequência. As críticas viriam, naturalmente.

Nos mata-matas, porém, o valor de Splitter fica mais explícito. Numericamente, em nove partidas até esta sexta-feira, ele tem a maior média de minutos de sua carreira, em qualquer fase, com 28,1 por jornada, bem acima dos playoffs de 2013.  Em uma projeção por 36 minutos, sustentaria um double-double de 12,8 pontos e 11,1 rebotes, com presença marcante nas tábuas ofensiva e defensiva. Mas nada no basquete se resume apenas a números.

Contra o Mavs, ele foi o defensor primário de Dirk Nowitzki, que ficou limitado ao seu pior aproveitamento de quadra desde 2007, acertando somente 42,9% de suas tentativas de cesta. Obviamente os méritos não são exclusivos do brasileiro, com um rodízio de defensores e um sistema para atrapalhar o craque. Mas seu papel neste desarranjo do alemão foi inegável, algo que o leitor TristaSP, que tem a insustentável paciência de aturar esse blogueiro, mencionou no ato.

Tal como Duncan, Splitter, menos comprido e mais baixo, diga-se, é um defensor impertinente à base de fundamentos. Não há dúvidas que o pivô é alguém extremamente coordenado e com boa mobilidade para alguém de seu tamanho – basta comparar seus movimentos com os de Robin Lopez, por exemplo. Mas há uma distância considerável em termos atléticos com a elite da classe. Contra um Miami Heat ''pequeno'' e explosivo, isso pode pesar. Em geral, no entanto, contra as fortes duplas de garrafão do Oeste, suas habilidades fazem a diferença.  Ele dificilmente se deixa iludir com as fintas de seus oponentes, pois quase nunca vai tentar aquele toco espetacular – uma vez que não é o maior saltador da paróquia. Isso não o impede de se colocar entre os melhores defensores diante do aro na temporada regular. Também é difícil ver o catarinense deixar seu posicionamento em busca de uma recuperação de bola, atacando a linha de passes. Dentre todas as suas qualidades, a maior talvez seja a consciência daquilo que é e pode realizar em quadra (já recomendei este link do site Pounding the Rock, inteiramente dedicado ao Spurs, mas não custa sugerir outra vez).

Testemunhar o trabalho do brasileiro no mano a mano com LaMarcus é relativamente fácil. (Quer dizer, que fique claro: fácil para nós observarmos, mas de modo algum uma tarefa de tranquila execução). Terry Stotts desenha jogadas simples para que seu pivô fique isolado num canto da quadra, com mais liberdade para desenvolver seus movimentos, driblando sem se preocupar com a chegada repentina de um marcador extra. No início do quarto período, diante de Boris Diaw, estava funcionando. Popovich convocou Splitter de imediato, e a farra acabou. Nesse ponto, a capacidade de Tiago de minimizar o impacto de seu oponente sem, por enquanto, precisar da marcação dupla, é essencial para o equilíbrio defensivo do Spurs, mantendo os ótimos arremessadores do perímetros mais contidos.

Agora, por outro lado, há muito mais que Tiago possa oferecer em quadra para minar os adversários. Como, por exemplo, os corta-luzes que arma do outro lado da quadra. Algo que não só livra seus companheiros para chutes com mínima liberdade, mas também atormenta e atordoa aqueles que sofrem o impacto. ''Os bloqueios deles machucam. Eles fazem bloqueios de verdade, um grande trabalho em preparar e conter nos bloqueios'', afirma o armador Damian Lillard. ''Isso te desgasta muito. Perseguir Tony Parker é uma coisa. Ser acertado toda santa vez, tentando fazer isso, é outra. Tira muito de você.''

No ataque, ele também serve como uma excelente válvula de escape para tramas em pick and roll com Tony Parker e Manu Ginóbili, devido a sua inteligência para se posicionar sempre como uma ameaça no corte para a cesta, em ângulos favoráveis para a recepção de passes, atraindo a defesa. ''Acho que minha conexão com Tony e Manu nos momentos quando Tim está fora de quadra ajuda muito a equipe a encontrar espaço para nossos chutadores, partindo para a cesta ou fazendo o bloqueio. É uma parte de nosso jogo, e a usamos muito bem na temporada passada.''

Essas intangíveis todas aparecem como itens silenciosos, discretos no contrato oferecido pelo Spurs. São detalhes como esse que justificam o salário de US$ 9 milhões anuais para Splitter. ''Tiago é um defensor muito bom no garrafão. Ele também é bom na defesa de pick-and-roll e, se formos falar em ataque, ele joga realmente muito bem com as pessoas que temos e é um ótimo passador para a sua posição'', avaliou RC Buford, gerente geral do clube, o executivo do ano da liga.

Detalhes que obviamente não passaram despercebidos pelo gerente geral do Blazers, Neil Olshey, um caça-talentos de respeito, que ajudou a construir o atual timaço do Clippers e trouxe estabilidade a uma franquia de bastidores um tanto delicados como o Blazers (gerida pelo bilionário Paul Allen, um gênio dos negócios, mas por vezes intempestivo e cheio de cupinchas que podem interferir em decisões de basquete para a qual não estão exatamente preparados).

Antes de ser agraciado com a bizarra concessão de Robin Lopez pelo Pelicans, que tinha a intenção de limpar sua folha de pagamento desperadamente para assinar com Tyreke Evans, o dirigente – e ex-ator (!?!) – estava empenhado em investir no catarinense. Acontece que, assim como havia ocorrido em 2012 com Roy Hibbert e o Indiana Pacers, o Spurs nem permitiu que as conversas fossem adiante. Souberam do quanto o clube do Oregon estava disposto a pagar e já bateram o martelo. Não houve dramalhão nenhum, do jeito que Popovich gosta.

Lopez se encaixou perfeitamente no Blazers, é verdade, trombando com gente mais graúda, dando a LaMarcus o respiro necessário. Nesta série contra o Spurs, porém, na hora de avaliar os jogos nos seus pormenores, talvez seja inevitável para Stotts & Cia. se perder num breve devaneio sobre como seriam as coisas caso tivessem roubado Splitter para o seu lado.


Personagens dos playoffs: Nenê. Ele mesmo
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Giancarlo Giampietro

Nenê x Joakim Noah teve placar favorável ao brasileiro

Nenê x Joakim Noah teve placar favorável ao brasileiro

Nenê já está há 12 anos na NBA, e tem gente que ainda não se conforma: como pode alguém que combine tanta força física, velocidade e técnica não ser uma estrela na liga? Ou mesmo uma superestrela? No ataque, o pivô realmente sabe fazer um pouco de tudo. Seu chute de média distância cai de modo frequente a ponto de percisar ser marcado – e, se o defensor não o pressionar, pode pagar o pato com o brasileiro, ótimo passador, deixando alguém de frente para a cesta. Ele ainda pode bater em velocidade em direção ao garrafão. Aguenta o tranco jogando de costas e também sabe lidar bem com a eventual dobra. Completo.

E aí o grandalhão vai lá e arrebenta com Joakim Noah e o Chicago Bulls, numa rara série que terminou cedo nestes playoffs completamente alucinantes. Teve quem disse que já não era a hora, mas também teve quem se surpreendesse pelo fato de ele ter sido dominante por diversos jogos em sequência.

Ao final do confronto, mesmo alguém orgulhoso como Noah não teve como não elogiá-lo — dias depois de fazer das suas provocações, uma vez que obviamente ele não iria deixar passar despercebida a expulsão do adversário no Jogo 3. ''Ele foi um monstro lá embaixo, você tem de dar muito crédito para ele'', afirmou. Vejamos, num vídeo editado pelo Coach Nick, do BBallBreakdown:

Então fica essa inquietação, mesmo, entre os americanos. O que acontece?

Aqui do nosso lado, embora Nenê não seja dos personagens mais comunicativos e falantes, temos mais base para falar a repeito, né? Contexto é tudo, e dá para começar falando sobre mentalidade. Fora religião, das poucas coisas que o pivô fala abertamente, sempre sai algo na linha do conjunto, espírito coletivo etc. No seu caso, não é baboseira, algo treinado. Acho que já escrevi isso aqui, então corre-se (sempre) o risco da repetição: mas qualquer um que o veja em ação, sabe que ele não está preocupado com números, com espetáculo para as câmeras, nem nada. De vez em quando sai uma cravada de top 10, mas é sabido que o cara faz e gosta de fazer o básico, e muito bem, obrigado. Com a ressalva de que ''básico'' aqui vale como ''elementar'', ''fundamental'', e, não, algo ''trivial''. E não é todo mundo que dá conta disso.

''São todas as suas intangíveis'', afirma o treinador Randy Wittman. ''Usso essa palavra para Nenê o tempo todo. Ele pode pontuar, arremessar, driblar, passar e pode defender. Quando não o temos em quadra, não existe outro que possa fazer todas essas coisas.''

Essa abordagem do jogo é muito bem-vinda pelos técnicos, mas pode ficar perdida em meio a tantos egos e marketing da liga norte-americana. Não é nada midiática. Ninguém vai por em slow motion um corta-luz perfeito ou um passe preciso para Marcin Gortat em movimento de high-low. Ainda mais que seu parceiro polonês não ajuda!  Ele tem aquele jeito é todo malucão, mas também se dá por satisfeito em por a bola no quadradinho por uma cesta simples. Para completar, a presença de Gortat também empurra Nenê para mais longe da cesta. Ele nunca atacou tão distante do aro assim, em toda a sua carreira. Além disso, seu número de cravadas é inferior à metade do que somava nos tempos de Denver.

Aliás, quem não se lembra das temporadas do Nuggets em que até mesmo Earl Boykins e Voshon Leonard arriscaram mais? O jogo discreto do são-carlense pode até mesmo ser ignorado, atropelado por seus próprios companheiros. Ao menos, em 2004, o ala Jon Barry ficou para trás. E como faz? Você tem um pivô com tantos recursos e permite que um cestinha medíocre como Voshon Leonard fique tanto com a bola? Loucura do técnico Jeff Bzdelik! Ou não. Foram várias as ocasiões que vimos George Karl, o sucessor, implorar publicamente para que o brasileiro fosse mais fominha, para que chamasse mais o jogo. Mas essa simplesmente não parece uma vocação natural para o atleta. É por isso que Wittman também diz: ''Ter ele de volta nos ajudou muito''.

Dono do Wizards, Ted Leonsis veste camisa de Nenê em jogo de gancho

Dono do Wizards, Ted Leonsis veste camisa de Nenê em jogo de gancho

E aqui chegamos a outro ponto: ter-ele-de-volta implica que ele estava fora. O pivô ficou afastado do Wizards por seis semanas, devido a uma lesão no joelho. Dessa vez, porém, o timing foi favorável ao jogador: ele conseguiu retornar pouco antes de a temporada regular se encerrar, a ponto de desenferrujar, estando ao mesmo tempo mais descansado.

Lesões: algo recorrente na trajetória de Nenê, que só teve quatro temporadas com pelo menos 90% dos jogos disputados e que em apenas uma ocasião, 2009-10, foi para a quadra em todas as rodadas, já recuperado de um câncer. Tantas ausências, claro, levaram os mais críticos a julgá-lo por chinelinho. Até porque, sempre que possível, alguém não vai perder a chance de arrebentar o joelho de modo proposital, claro, na primeira partida da temporada, com apenas três minutos de jogo.

Os problemas físicos foram tantos que causam, sim, danos psicológicos. Por exemplo: na penúltima partida desta temporada, Wittman usou o atleta por 24 minutos, acima dos 16 a 20 estipulados, dando a ele a chance de marcar 18 pontos, se soltando em quadra. Em vez de celebrar, o paulista disse: ''Isso me surpreendeu um pouco. Foram cinco minutos a mais, mas tudo bem. Estou gostando do que vejo, mas espero que nós mantenhamos os minutos que havíamos combinado, porque se eu forçar muito a barra, posso acabar pagando o preço. Então espero que possamos controlar meus minutos um pouco''. Que jogador gosta de se preocupar com esse tipo de coisa?

Então fica assim, para a turma do amendoim. Chinelinho nos Estados, desertor no Brasil. Vai ser difícil esquecer as vaias que o pivô tomou no Rio de Janeiro naquele histórico jogo de pré-temporada contra o mesmo Bulls, mas que acabou nos proporcionando um episódio famigerado desses. A questão da seleção é mais complexa, discutida aqui, mas não deixa de ser irônico que aqueles torcedores enfezados de outubro agora tenham de sentar na poltrona em casa e conviver com isso, enquanto o pivô passava por cima do melhor defensor da liga.

Aqui cabe um parêntese também: dias depois da eliminação, Noah passou por uma cirurgia no joelho esquerdo, que o vai deixar de molho por dois a três meses. O francês havia acusado suas dores ainda nos vestiários do United Center, mas sem querer usar como desculpa. Não estava 100%, mas um JoJo limitado é chato o bastante para tirar o sono de muita gente. Menos Nenê, dessa vez.

O brasileiro, de qualquer forma, não foi decisivo apenas atacando. Na defesa, anulou Carlos Boozer quando requerido – como no quarto período do Jogo 5, após a lesão de Taj Gibson -, mas, principalmente, ajudou a cortar as linhas de passe que Noah adora explorar. ''Eles me pressionaram muito, muito mais do que o normal'', diz o pivô, quando seu time ainda tinha chances. ''Tenho de fazer um trabalho melhor para manter a bola viva e evitar o turnover.''

Com sua agilidade e envergadura, Nenê também pode ser um defensor implacável e versátil, combatendo no garrafão ou flutuando no perímetro de modo agressivo, a ponto de incomodar até mesmo armadores. DJ Augustin e Kirk Hinrich, no caso, nem representavam tanta ameaça.

Nenê anula Carlos Boozer, para desgosto da torcida do Bulls

Nenê anula Carlos Boozer, para desgosto da torcida do Bulls

A relevância do brasileiro para o Wizards, todavia, vai além de sua técnica. Em Washington, o jogador assumiu naturalmente um papel de mentor, num elenco pouco experiente e carente de boas referências depois do convívio com JaVale McGee e Andray Blatche.Na hora de enfrentar um time encardido como o Bulls de Thibs, então, era necessário que assumisse a iniciativa, até para facilitar a adaptação de John Wall e Bradley Beal a uma nova realidade. Cabia a ele guiar sua galerinha. Mesmo assim, com a vaga nas semifinais do Leste garantida, ainda fez questão de falar de seus dois novos irmãozinhos.

''Estou muito feliz por Bradley Beal e John, porque muita gente disse coisas ruins sobre eles, que os dois não conseguiriam  jogar bem nos playoffs'', disse o pivô, provavelmente se referindo a cornetas da capital norte-americana, uma vez que, no geral, os dois jovens foram bastante elogiados durante a temporada. ''Tiro o meu chapéu para eles.''

''Acho que tudo o que a gente enfrentou foi necessário para nos dar maturidade, experiência. Tudo acontece por algum motivo, e essa é a razão para estarmos nessa posição. Estivemos aprendendo nos últimos dois anos, e agora é o nosso momento'', continuou.

A reverência precisa se feita, antes de tudo, para o próprio pivô, que teve médias de 17,8 pontos, 6,5 rebotes, 3,3 assistências e 1,5 roubo de bola, matando 54,8% dos arremessos em quatro partidas. Nem o péssimo aproveitamento nos lances livres, de 30% – com poucas tentativas, diga-se -, afetou sua produção. Nenê foi muito mais agressivo, elevando sua média de 11,2 arremessos por jogo na temporada regular para 15,5 na primeira rodada dos playoffs.

Por quatro partidas, Nenê realizou aquilo que muitos projetam para seu basquete. Não que sinta-se obrigado a dar qualquer tipo de satisfação. ''Eu só ligo para aquilo que posso controlar. Sou muito profissional e estou muito maduro para lidar com isso. Já passei por várias situações difíceis'', afirmou ao Washington Post. ''Quem odeia, odeia, não tem o que fazer. Só podemos controlar aquilo que trabalhamos aqui, nossa atitude, nosso jogo. Isso é algo que os críticos não podem mudar. Vamos jogar duro e com muita paixão. Quem odeia conhece o passado. Eu conheço o presente. Mas o futuro só deus sabe.''

Bem, o futuro imediato coloca Nenê e Gortat de frente com dois pesos pesados do Indiana Pacers, Roy Hibbert e David West. Mais dois problemões para o brasileiro encarar, contra os quais faria bem manter o nível apresentado contra Noah, Gibson e Boozer. ''Se não existissem aqueles que nos odeiam, não conseguiríamos atingir nossos objetivos, sabe? Acredito que podemos surpreender se jogarmos do modo certo. Acredito nos meus companheiros  e que podemos fazer algo especial'', disse. Obviamente, para Wall, Beal, Ariza e Wittman a recíproca hoje é bem verdadeira


A cesta decisiva – e o migué – de Lillard
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Giancarlo Giampietro

Damian Lillard não quer nada o que ver com isso. O cronômetro a 0s9 do fim, seu time dois pontos atrás do placar? Pffff, tô fora dessa, cara. Não é à toa que ele se coloca lá do outro lado da quadra, com diversos companheiros e adversários posicionados entre ele e a reposição de Nicolas Batum. Podem reparar no vídeo abaixo: o armador do Blazers está vagando pela quadra até que o francês é autorizado a fazer o passe. ''La-la-ri-la-lá'', parece estar cantando.

Até que… Partiu!

Quando Chandler Parsons se tocou, já era tarde demais. Um baita migué, daqueles que a gente faz desde que começou a jogar basquete. Lillard fez seu papel direitinho saiu em disparada em sua semiparábola, pronto para fazer o que mais gosta:

Muitos questionaram a decisão de McHale de colocar Parsons em Lillard, em vez de sua peste chamada Patrick Beverley. Bem, o ex-superastro do Boston Celtics fez uma série de bobagens durante todo o confronto, mas não sei bem se essa está conta. Primeiro: Beverley está passando mal há dias, mal treinando direito, provavelmente jogando à base de drogas. As lícitas, no caso. E este era o último instante de um jogo que durou mais de 1h53, depois de algumas duras batalhas já acumuladas nos últimos dias. Além disso, hoje pode soar absurdo, mas Parsons conseguiu se fixar na rotação do Rockets já em seu ano de novato, sendo um cara de segunda rodada de Draft, devido ao seu empenho defensivo. Acreditem, já existiu esse dia. Além do mais, é um cara esguio, ágil e alto. Ideal para atrapalhar a recepção. Né?

Realmente tem o que se discutir aqui. Mas o fato é que, uma vez concluída a jogada, o ala acaba dando razão aos críticos. De modo algum ele poderia ter dado aquela separação inicial para Lillard, com tão pouco tempo no relógio. Nas fotos (mais abaixo), temos a impressão de que ele estava perto para contestar o chute mortal de um craque emergente. Se for pensar no pieque, até que talvez ele tenha se recuperado bem… Só que não. Nada disso: a bola já estava bem distante das mãos de seu adversário quando ele chega para o toco. Pior: nem mesmo um corta-luz foi posicionado no caminho do atleta do Blazers. Não há contato de Mo Williams antes de seu companheiro engatar a quinta.

Com o vídeo congelado em 11 segundos, temos Lillard já praticamente esperneando para mostrar o quão livre ele estava. Já eram no mínimo duas passadas de distância para qualquer marcador mais próximo. E aí que cabe uma outra pergunta para McHale: que diabos James Harden estava fazendo em quadra? Difícil tirar sua superestrela, né? Mesmo quando o figura já é reconhecida como um dos piores defensores de toda a liga. Reparem que Harden fica perdido com Wes Matthews ali na cabeça do garrafão, mesmo que o ala esteja praticamente de costas para a linha de passe.

Damian Lilllard, clutch, inbound play, Game 6, Blazers, Rockets

Com míseros 0s9 por jogar, obviamente não dá tempo de pensar: ''Ferrou'', quando a bola chega às mãos do armador, mesmo que o batalhão de estatísticos do Rockets soubesse que Lillard mata 42% de seus arremessos de três tanto em situações de calmaria ou correria (parado ou em movimento). Mas já era, mesmo.

''Nós falamos especificamente para eles que não era para permitir chutes de três'', disse McHale, culpando seu elenco — muitos acreditam que foi seu último jogo como treinador do time. ''Não parece que foi verdade. Um puta arremesso. Um puta arremesso. Ficou livre. Puta arremesso. E lá foi o jogo'', disse Jeremy Lin (em tradução livre demais até, porque obviamente Jeremy Lin não fala coisa feia). ''É o pior sentimento que já tive na minha vida'', completou o pobre coitado do Parsons.

Um tiraço para a história, em semanas eletrizantes de basquete. Milhares de pessoas permanecendo no ginásio, dançando, gritando, mesmo com o jogo encerrado há tempos. A primeira vitória numa série de playoffs para o Blazers desde 2000. É claro que Lillard queria a bola.

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Por outro ângulo, praticamente dentro da quadra. Reparem nas palminhas:

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As fotos:

Ângulo para deixar o chute mais épico (e mais difícil do que foi)

Ângulo para deixar o chute mais épico (e mais difícil do que foi)

Oi, Parsons, bom dia? Lá foi a bola

Oi, Parsons, bom dia? Lá foi a bola

A separação entre Lillard e Parsons

A separação entre Lillard e Parsons

Lillard para a TV

Lillard para a TV

Damian Lillard 2014, Brandon Roy novembro de 2008: bombas contra Rockets

Damian Lillard 2014, Brandon Roy novembro de 2008: bombas contra Rockets

Deixa falar, deixa cantar, deixa rimar. Lillard, senhor de Portland

Deixa falar, deixa cantar, deixa rimar. Lillard, senhor MC de Portland

It's Lillard Time!

It's Lillard Time!


Personagens dos playoffs: Wesley Matthews (Jr.)
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Giancarlo Giampietro

Quando a defesa é o highlight, fazendo a diferença

Quando a defesa é o highlight, fazendo a diferença

As coisas nunca aconteceram de modo fácil para Wesley Matthews Jr. Mesmo sendo filho de um ex-jogador da NBA. Seu pai, na verdade, talvez tenha sido o primeiro a empurrar o garoto para uma trilha mais exigente, acidentada, ao sair de casa antes mesmo de conhecê-lo.

''Sei que isso me deixou mais durão, mais forte. Não sei se isso é bom ou mau. Mas sei que vou descobrir mais para a frente'', afirmou o ala do Portland Trail Blazers, em longa matéria da Comcast Sportsnet que serviu como uma espécie de terapia, discutindo o relacionamento com o primeiro Wes Matthews, bicampeão pelo Los Angeles Lakers ao lado de Magic Johnson e Kareem Abdul-Jabbar.

Matthews, o júnior, ainda não teve um privilégio desses. Pelo contrário, ele é um dos capitães do grupo daqueles que batalhou um bocado para chegar à NBA e conseguir um contrato (bastante generoso, no seu caso). Quando saiu da universidade de Marquette, passou batido pelo Draft de 2009.

Símbolo de uma geração de Marquette que também mandou Jimmy Butler para a NBA

Símbolo de uma geração de Marquette que também mandou Jimmy Butler para a NBA

Hoje, 22 dos atletas selecionados naquela temporada já estão fora da liga, incluindo cinco que foram escolhidos entre os 30 primeiros. Nesse grupo de excluídos, obviamente são poucos os simplesmente optaram por ficar distantes do basquete profissional norte-americano. Na verdade, dois: o armador Sergio Llull, ídolo do Real Madrid e que nãos e cansa de esnobar o Houston Rockets, e o ala Emir Preldzic, cujos direitos pertencem ao Washington Wizards, mas não deve abrir mão da fortuna que recebe do Fenerbahçe tão cedo.

De resto, os demais 20, com os alas Terrence Williams e Earl Clark e os armadores Rodrigue Beaubois e Jonny Flnn (o sexto colocado!) dentre eles, obviamente trocariam de lugar com Matthews para ontem. O ala do Blazers sabe muito bem disso. Que eram as grandes as chances de ele se ver do outro lado. Por isso, vai aproveitar cada instante em quadra na amalucada série contra o Houston Rockets como se fosse o último. Num comportamento, é preciso dizer, um tanto anômalo nesse embate.

Não é que Blazers ou Rockets, times que somaram 108 vitórias na temporada regular, tenham enjoado de vencer. Fosse o caso, não teríamos três prorrogações em quatro jogos. Agora, por outro lado, se formos levar em conta a média de 234 pontos por jogo — ou mais de 117 por time –,  talvez valesse um esforcinho a mais de ambas as partes, não? Na defesa, digo. Né, James Harden?

Ninguém vai discutir o talento do Capitão Barba com a bola em mãos. Um senhor arremessador, inventivo nos dribles, saindo para todos os lados, explosivo e forte o bastante para romper a primeira linha da defesa e desafiar os grandalhões no garrafão, descolando, por vezes, até mais de 20 lances livres num jogo, ou mais. O drama, porém, fica para o que ele faz do outro lado, na defesa.

Com o passar da temporada, as críticas, justas, ao ala-armador do Rockets foram se acumulando. E o movimento das lâminas de barbear furiosas não ficou restrito aos especialistas, aos cri-cris. Experimente dar uma busca por aí: ''Harden + defense''. Saca só, como diria o Maurício Bonato, do Sports+ (ignorem a bola se focalizem no nosso… herói):

Sujeito atencioso, né? Fiscalizador, opressor, faria o Tony Allen morrer. De desgosto, ou vergonha. A gente sabe que Harden tem muitas responsabilidades ofensivas, criando e finalizando. Sua taxa de uso (usage rate, numa tradução beeem livre) por posse de bola é muito elevada, superior a 27% nas últimas duas temporadas e ultrapassando a marca de 30% nos playoffs. Agora querem saber? LeBron James é ainda mais exigido no ataque do Miami Heat… Numa quantidade menor de minutos, tá certo. Mas nada que justifique a imensa diferença na conduta defensiva das duas estrelas. Com o agravante de que o atleta do Rockets não tem de modo algum o status de consagrado.

No ataque, um pouco fora do ar. Blazers não se importa

No ataque, um pouco fora do ar. Blazers não se importa

Em termos de fama, talento e produção, também é óbvio que Harden está degraus e degraus acima de Matthews, o atleta com quem mais bate de frente nos playoffs até aqui. Todavia, com todas as suas limitações – e números bem ruins no ataque até aqui, ainda que numa amostra pequena de quatro jogos -, seu oponente sabe que há muitas possibilidades a mais num jogo de basquete do que somar 30 pontos por partida. Se ele não vem conseguindo reproduzir contra Houston aquilo que ele fez muito bem na temporada, vai compensando com agressividade, fome de bola do outro lado da quadra. ''Nasci para isso'', afirma o ala.

Voltando no tempo: Matthews não foi selecionado por nenhuma franquia no Draft, mas forçou a porta até garantir sua vaga no elenco do Utah Jazz, disputando todas as 82 partidas da temporada 2009-2010, com a reputação de bom defensor e de alguém que sabe exatamente o que tem de fazer em quadra. Agente livre ao final do campeonato, recebeu uma bolada do Blazers com um contrato de seis anos e mais de US$ 35 milhões.

(Aliás, sua trajetória impressionou tanto os dirigentes da liga, incomodados talvez por terem deixado passar uma figura dessas, que a universidade de Marquette emplacou uma série de seus rapazes nos últimos anos. Ele virou o símbolo de uma equipe que, se não revelava supercraques e nem recebia os colegiais mais badalados, ao menos fornecia gente madura, bem fundamentada, pronta para o que der e vier. Para comparar, desde que ele assinou com o Jazz, seis atletas já ganharam uma oportunidade. Antes, na década anterior, apenas três dos Golden Eagles foram aproveitados, Dwyane Wade sendo uma grande exceção.)

Em Portland, Matthews chegou a confessar: estava relaxando um pouco, e até seus amigos percebiam e o provocavam. Que ele já não era mais o leão de antes. Deu um duro danado nas férias, voltou para a atual campanha com tudo, e Terry Stotts só pôde aplaudir, uma vez que seu rendimento ofensivo também era muito bom. Contra o Rockets, parte desta receita não vinha dando certo (com 12 para 34 nos arremessos), até se recuperar no domingo, matando 8 em 15 tiros de quadra. Se a bola não está caindo, contudo, isso não vai impedir que ele se empenhe em fazer seu trabalho. Completo.

''O Wes é durão, cara'', afirmou o armador e jovem líder Damian Lillard. ''Ele marca desta forma toda noite, não importando quem seja. Não vou falar que isso tira energia dele no ataque. Tem vezes que a bola simplesmente não cai. Ele tem feito um ótimo trabalho defendendo James. Sabendo dessa série, conversamos sobre como alguns caras teriam de fazer um sacrifício. E o Wes está colocando seu coração e sua alma em tornar as coisas difíceis para James Harden, e isso vem dando resultado para nosso time.''

Não quer dizer que Matthews esteja anulando, varrendo o astro do Rockets de quadra. Mas tem tornado realmente sua vida mais difícil. E não só isso. No eletrizante Jogo 4, o ala fez diversas jogadas para dar a vitória ao seu time, à revelia de seus 21 pontos. Antes de seu roubo de bola no finalzinho, no meio da quadra, Matthews já havia participado do lance em que manteve o Blazers vivo no jogo, brigando por duas vezes pelo rebote e no abafa para cima de Jeremy Lin, que deu a Mo Williams o direito de fazer a cesta que aparece em qualquer clipe de melhores momentos.

De qualquer forma, sua postura combativa em quadra acabou recompensada com seu desarme para cima de Patrick Beverley no meio da quadra, ao final da prorrogação, numa dobra de marcação de certa forma com desfecho espetacular. Aquele mergulho em direção à bola que fica bonito em slow motion. Muitos queriam estar ali, mas foi Matthews que deu um jeito de chegar lá.


Personagens dos playoffs: Vince Carter
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Giancarlo Giampietro

Vince Carter, herói das masas e de Nowitzki

Vince Carter, herói das masas – e de Dirk Nowitzki. É isso aí

Quem se lembra de quando havia gente doida o bastante para dizer que o Dirk Nowitzki nem era tudo aquilo que se falava, que ele nunca vencia nada que prestasse, que era apenas um bom arremessador, mas um fracote para triunfar na NBA? Mais um desses euros molengas, que não aguentava o tranco, e tal. Seu jogo só servia para a temporada regular. Na hora do vamovê, tirava da reta, afinava.

Estamos falando aqui dos idos de 2008, mais ou menos, e o alemão ainda não havia conquistado seu anel de campeão, derrubando LeBron James e a cambada de South Beach nas finais. De fato uma loucura. Mas o supercraque ao menos conseguiu assumir o controle da situação, ditando, com talento e, ufa, resultados, qual a percepção em torno de sua carreira, se é que um dia ele vai parar de jogar. Dá para imaginar Nowitzki girando, devagar quase parando, aos 50 anos, atirando a bola bem lá pro alto, e o arco terminando num chuá daqueles.

Agora, e quem se recorda dos tempos em que Vince Carter era o futuro da NBA? O tanto de pôsteres ''Vinsanity impressos com cravadas inigualáveis, como aquelas de sua inesquecível exibição no torneio de enterradas de 2000, ou mesmo aquela mais absurda (de todos os tempos) sobre o pobre Fredereic Weiss nos Jogos Olímpicos de Sydney, no mesmo ano. Sem contar os diversos NBA Actions que terminaram com suas jogadas que realmente testavam as mais conservadoras leis da física. Sim, aí voltamos no tempo um pouco mais, mesmo, no início da década passada, quando ainda era possível ter a dúvida sobre quem teria a melhor carreira: Vince ou Kobe.

Dunk of Death, Carter, Weiss

Muita coisa também correu por baixo da ponte desde então. Muuuuuita coisa, neste caso. Carter foi de cidadão honorário a figura mais odiada em Toronto, onde até hoje é vaiado – especialmente por ter forçado sua troca, sabotando por completo seu valor, a ponto de o (incompetente, é verdade) Rob Babcock tê-lo repassado por um pacote de Eric Williams, Aaron Williams, um veteranaço Alonzo Mourning, que se recusou a jogar por lá, e duas escolhas de primeira rodada que viriam a ser Joey Graham e Renaldo Balkman (este para o Knicks). Bateu de frente com Jason Kidd em New Jersey. Não ajudou o Orlando Magic a segurar Dwight Howard. Não foi contagiado pela mágica de Steve Nash em Phoenix. Não, não e mais não. Varou os 30 anos como uma pálida lembrança de alguém que já havia sido extremamente relevante para o marketing da liga. até ser dispensado pelo Suns aos 34. Sim, para diversos críticos (oi!), era o fim.

Agora, no caldeirão que Rick Carlisle remexe e prepara com gosto, tudo parece ter um jeito, uma função. Carter foi mais uma contratação-tampão de Mark Cuban em 2011, depois de o proprietário ter implodido o time campeão, para desespero de Nowitzki. A ideia era adicionar veteranos produtivos, seguir em frente com um elenco minimamente competitivo, até que pudessem dar mais uma grande tacada no mercado – algo que não aconteceu exatamente, por mais que Monta Ellis esteja disputando sua melhor temporada. Nessa toada no ritmo de nós-trupica-mas-não-cai, Carter encontrou um novo nicho. Sem muita pressão, firmou-se na rotação, como um sólido chutador para espaçar a quadra ou assumindo mais responsabilidade quando Dirk está descansando, sem contar o fato de também ter se apresentado surpreendentemente como um valente marcador na primeira linha defensiva. Passou a se sentir tão bem que, ciente do final iminente de seu contrato, afirma já ter feito o suficiente pelo clube para merecer uma renovação. Aos 37 anos.

Depois da sensacional cesta da vitória contra o San Antonio Spurs neste sábado, Cuban vai ter de apelar realmente ao pragmatismo se quiser abrir mão do ala. Não custa rever o lance (até o momento em que o dono do clube invade a quadra para abraçá-lo):

Manu Ginóbili sofreu um leve empurrão e deixou o ala escapar por um instante, o suficiente para que seu oponente pudesse receber o passe. Mas o argentino se recuperou rapidamente e o pressionou no canto da quadra. Carter se contorceu e acertou um arremesso extremamente complicado. Valendo o jogo, a liderança da série. Justo ele, que ganhou, justo ou não, a fama de um dos grandes amarelões durante a década.''Às vezes você erra um arremesso importante, como em 2001, e você tem de liidar com isso por um tempo até receber a oportunidade novamente'', disse o ala, em referência ao chute em que errou em duelo com o Philadelphia 76ers de Allen Iverson nos playoffs de 13 anos atrás, pela semifinais do leste. Naquela ocasião, o ala viajou para a Carolina da Norte para participar de sua cerimônia de formatura durante a série, numa decisão que gerou muita polêmica e o perseguiu, basicamente, para sempre.

Com o jogo na linha, Carlisle não pensou em nada disso. ''Ele me disse: 'Ei, você vai receber a bola e vai matá-la'. Eu disse: 'OK, sem problema'. Na minha cabeça, eu já havia feito o arremesso antes mesmo de a jogada acontecer. Fico feliz que tenha dado certo'', afirmou o atleta, sem tanta empolgação assim para alguém que havia acabado de voltar ao grande palco da liga, num momento crucial para sua equipe. Gato escaldado, claro. Mas vivo, em busca da redenção que Nowitzki já teve.

* * *

 Aqui, uma compilação de 100 (!?) enterradas de Carter no auge. Imaginem se o YouTube e o Twitter estivessem vivos na época. Blake Griffin não teria chances, convenhamos:

*  *  *

Seguem duas fotos do lance capital do terceiro jogo da série contra o Spurs, com o Mavs na frente por 2 a 1. Para mim, ainda mais espetaculares que o vídeo, com destaque para a segunda (o calcanhar quase mordiscando a linha e Manu saltando feito um louco):

Vince Carter x Manu Ginóbili, jogo 3, Mavs x Spurs

Mavs vs Spurs, Carter, clutch, Game 3 win

*  *  *

Por fim, o gráfico de aproveitamento de arremessos de Carter durante a temporada. Na quina esquerda da quadra, justamente o seu ponto preferido:

Vince Carter shot chart, 2013-2014


A NBA precisa banir o dono racista do Clippers
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Giancarlo Giampietro

Sterling e sua ex-namorada: uma bomba de relações públicas para a NBA se livrar

Sterling e sua ex-namorada: uma bomba de relações públicas para a NBA se livrar

Há tanto sobre o que escrever depois de uma primeira semana daquelas nos playoffs da NBA. Que tal o cartão de visitas de Troy Daniels, das viagens de busão pelo interior do Texas e dos hambúrgueres apressados aos luxos da grande liga, sob os holofotes,  salvando a temporada do Houston Rockets? E o Nenê, que fez ninguém menos que Joakim Noah, o agora oficialmente melhor defensor da temporada, de gato e sapato? Para, depois, se perder numa bobagem imperdoável para alguém que é o veterano da turma, a referência num time que tenta curtir seu primeiro momento de alegria desde os tempos em que Gilbert Arenas ainda não havia cruzado, mancando, a fronteira da insanidade? Tem muito mais, para todos os gostos: a inventividade de Rick Carlisle, os renascidos Beno Udrih e James Jones, Pero Antic x David West, Toronto em chamas, LaMarcus etc.

Mas, neste sábado, após o TMZ — vejam só, o TMZ!!! — divulgar um áudio extremamente desagradável de Donald Sterling, o proprietário do Los Angeles Clippers, no qual ele pede singelamente a sua namorada para que ela pare de se deixar fotografar com pessoas negras e que, por favor, não as leve para o Staples Center para assistir aos jogos de seu time, e que era para se evitar até mesmo esse zé-ninguém que atende por Magic Johnson, fica impossível falar sobre basquete. Ficou para o segundo, terceiro ou quarto plano.

Justo o basquete.

Em nenhum momento, em nenhuma instância social, qualquer tipo de manifestação racista pode ser aceita, tolerada. Mas no esporte em geral, e especialmente na NBA, ou na modalidade do bola ao cesto em específico, isso se torna ainda mais deplorável. Repugnante. Nojento. E que o dicionário nos dê mais e mais termos para abordar o caso.

Aqui do meu canto, segundo minha curta experiência, o basquete sempre foi uma realidade à parte, passando de forma alheia a muitas das desigualdades que tomam conta de nossa vida, não importando o estágio da globalização, ou da suposta racionalidade que deveríamos ter atingido. Escrevo aqui como um paulistano declaradamente branco de classe média – cuja família já flutuou de média-pra-alta, média-pra-baixa, dependendo do plano ou índice econômico da vez. Então que adotemos, mesmo, a… Hã… ''média''.

De qualquer forma, isso significou estudar sempre em colégio particular, com convênio médico em dia, frequentando shoppings, matinês a cada fim de semana, sem muita dificuldade – ao, menos, claro, segundo minha percepção, ignorando sacrifícios que o pai já fazia. No meu círculo de amigos, colegas, no que dependia, ou fosse depender dessa rotina, havia ou haveria apenas brancos. É um fato. No colégio, contava-se nos dedos o número de negros inscritos. Em todas as turmas.

Foi apenas com o basquete que meu convívio se expandiu. Praticamente todos os amigos negros que tenho fiz nas quadras, especialmente aquela imaginária diante de uma tabela improvisada na rua Abagiba (Vila das Mercês), na qual já fraturei a mão ao tomar uma cama de gato e cair destrambelhado no meio-fio. Foi gente que saiu da quadra, da rua para casa, entrando portaria adentro, por mais que alguns olhares no prédio estranhassem. Se eu percebia isso, imagine eles? Mas os outros que se lascassem, o 'estrago' já havia ocorrido.

De modo que, sim, o jogo se tornou uma espécie de templo para mim. Não deliberadamente como forma de justiça social, mas simplesmente por ser um universo em que dinheiro, cor de pele, nem nada externo importava. A gente queria saber apenas de bater bola, ficando a tarde inteira olhando para cima, para a cesta. Não havia razão para perder tempo com esse tipo de excrescência intelectual.

Com o passar dos anos, meu grau de atividade boleira diminuiu de modo considerável, mas a paixão pela coisa ficou. Dentro desse contexto, os comentários de Sterling ficam ainda mais ofensivos. Ninguém tem o direito de mexer com algo sagrado assim. Sua fala não fere apenas o bom senso, mas, particularmente, uma porção de memórias.

Agora, obviamente a ofensa é bem mais pesada para tantos outros. Peguem por exemplo um filme como ''12 Anos de Escravidão'' e o acalorado debate que ele causa no circuito norte-americano. Obviamente há profundas feridas sociais ainda abertas por lá, e nem poderia ser diferente. Quando o tema envolve a NBA, uma superpotência econômica impulsionada especialmente por mão-de-obra negra, falar em escândalo é pouco. E chegou a hora, ainda que bem tarde, de se dar um basta nisso.

Os jornalistas mais veteranos na cobertura do campeonato  se apressaram em dizer que de modo algum a gravação divulgada pelo site de fofocas mais odiado da América os surpreende. Que já ouviram coisa muito pior saindo da boca mal-lavada do sujeito. Para eles, pouco importa que Sterling se defenda, levantando suspeitas sobre a autenticidade do conteúdo divulgado. Seu histórico, por si só, já seria o suficiente para uma revolta.  Como Phil Jackson já questionou: quantos ''incidentes'' a mais causados por este imbecil seriam necessários para que uma providência fosse tomada? Acontece que, numa conveniente e institucional hipocrisia, a direção da liga conviveu com isso por anos e anos, fazendo vista grossa.

Devido ao ocaso tecnológico – em que o vicioso ciclo de notícias de 24 horas por dia, sete dias por semana enfim se mostrou últil -, dessa vez as barbaridades do velhinho ''pegaram'', viraram manchete por todas as partes. A opinião pública se deu conta da gravidade e do descompasso da situação de se ter um proprietário de um clube de basquete racista. Não há mais como fugir, evitar o assunto. Os cartolas que se virem diplomaticamente.

Não é algo fácil de se resolver, mas eles precisam dar uma resposta adequada. Não dá mais, espero, para enrolar, enrolar, enrolar e torcer para que o suspense, o drama dos playoffs seja o suficiente para encobrir a sujeira. Ou dá? Lembrem-se que não existe na liga um poder centralizado, ainda mais agora com a aposentadoria de David Stern. Mesmo com o velho comissário, porém, não haveria algo muito claro para se fazer: tanto ele como Adam Silver são funcionários dos 30 associados, personagens que controlam as franquias. São relações complicadas, com distintas facções ideológicas, numa ciranda de gente muito poderosa, de que não brinca em serviço. A ponto de um desbocado como Mark Cuban, que tanto torpedeou a administração de Stern, se esquivar  em público. Disse que era algo ''óbvio'', dispensava repercussão e, ao mesmo tempo, seria resolvido internamente.

Cuban e outros podem fazer rodeios, mas não tem mais volta. Como conciliar agora Sterling numa mesma reunião com Michael Jordan, dono do Charlotte Bobcats? E o que dizer de Doc Rivers? Como o vitorioso treinador pode aceitar receber ordens – e cheques – de uma figura asquerosa dessas? Para não falar de Chris Paul, a face da franquia em quadra e presidente do sindicato dos atletas, ou Blake Griffin, cujas acrobacias valorizaram, e muito, o patrimônio do bufão. Aliás, são quantos os brancos no elenco do ex-primo pobre de Los Angeles? JJ Redick, Hedo Turkoglu e mais ninguém.

Fulos da vida, sem chão, Redick entre eles, os atletas do Clippers se reuniram neste sábado e ventilaram a possibilidade de fazer um boicote. Abrir mão de disputar o quarto jogo da série contra o Warriors – e quão legal seria se contassem com o apoio dos arquirrivais odiados do outro lado?  Mas pensaram, repensaram e afirmam que vão para a quadra. É algo complexo, mesmo. Por um lado, seria uma bomba para a liga resolver, com sua credibilidade e muitos milhões de dólares em jogo. Por outro, esse grupo de atletas já batalhou por mais de 80 partidas na temporada. É o trabalho, o sonho deles. Abririam mão disso, ou simplesmente estão acima de um verme desses? O título seria deles ou de Sterling? Que joguem e ataquem essa situação, amparados legalmente e pela comunidade da NBA, mas depois. No caso de conquista, é de se imaginar que o proprietário só poderia comemorar num camarote reservado, no ostracismo, acompanhado de alguma gentalha de KKK, distante do vestiário e dos verdadeiros protagonistas.

No ostracismo, sim: a atitude pode ter efeito inócuo, já que a franquia continuaria embolsando a grana da bilheteria e afins, mas o empresário, primeiramente, tem de ser banido do Staples Center e outras arenas. Seria uma vergonha transmitir jogos em que sua figura pudesse aparecer para as câmeras da TV, a poucos metros de Rivers ou Griffin.

Obviamente que Sterling será multado também. É o que o escritório da liga em Nova York mais sabe fazer. Relembrem que Micky Arison, dono do Miami Heat, foi punido em US$ 500 mil ao criticar alguns de seus pares durante o lo(u)caute, em 2010. E essa multa teve muito mais a ver com o ferimento de práticas comerciais, estratégicas. Era um momento de intensa barganha por parte dos dirigentes, e Arison foi penalizado como reprimenda à suta suposta tentativa de sabotar negociatas que terminaram tão favoráveis aos magnatas.

A questão em torno do mentecapto que dirige o Clippers, porém, é muito maior. É, na verdade, imensurável. Não há dinheiro que o bilionário possa desembolsar  que valha sua ignorância. Como bem disse Kenny Smith, ex-armador do Rockets e comentarista da TNT, é uma vergonha que Sterling seja rico apenas quando o assunto sejam dólares. Disso ele entende, e talvez tenha que se preparar espiritualmente para abrir mão de seu brinquedinho em troca de mais algumas centenas de milhões a mais. Uma vez terminada a temporada, o núcleo forte de gestão da liga, antes presidido por Peter Holt, do Spurs, precisa encontrar algum meio de forçar a venda da franquia.

Candidatos não vão faltar. Bill Simmons, uma das figuras mais influentes da ESPN hoje e proprietário de uma caderneta de ingressos da franquia californiana, escreveu pouco antes de os mata-matas começarem sobre como a liga vive um momento de Eldorado também financeiro.  O Milwaukee Bucks, santamãe, custou mais de US$ 500 milhões. Serão diversos os Tios Patinhas, então, esperando na fila, pela chance de desembolsar até mesmo mais de US$ 1 bilhão para adquirir um clube em ascensão como o Clippers, com dois superastros na folha de pagamento, ainda mais numa cidade como Los Angeles.

É algo legalmente possível? Forçar a saída de Sterling? Muito provavelmente não, mas, com pressão de todos os lados, incluindo dos outros donos de clube, talvez a situação fique de fato insustentável. A não ser, claro, que boa parte desses gestores esteja de acordo com o discurso racista desse camarada. Se nenhuma decisão drástica, radical for tomada, teremos a resposta. E aí os atletas que terão de tomar alguma providência, como já prometem fazer, ainda que o próprio Chris Paul, imerso nos playoffs, tenha se calado por ora. DeAndre Jordan, por outro lado, foi brilhante ao postar em sua conta de Instagram simplesmente um quadro negro. Para ele, não havia muito o que dizer.

LeBron James, porém, se pronunciou, e foi como um legítimo rei. ''Não há espaço para Donald Sterling na NBA'', afirmou, entre outras ponderações. ''Acredito em Adam. Acredito na NBA. Se esses comentários forem verdadeiros, eles têm de fazer algo, e fazer rapidamente, antes que isso saia de controle.”

E ponto.

Não há mais espaço para gente desta laia em lugar nenhum, muito menos no nosso basquete – NBB, Euroliga, ou Parque do Ibirapuera. Nem aqui no VinteUm. Qualquer sujeito que possa pensar ou dizer algo semelhante ao que falou o dono do Clippers só pode ser considerado persona non grata neste blog. Não são bem-vindos definitivamente.


Perguntas para Los Angeles Clippers x Golden State Warriors
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Giancarlo Giampietro

Steph Curry x CP3: dois dos melhores armadores do mundo em uma só série promissora

Steph Curry x CP3: dois dos melhores armadores do mundo em uma só série promissora

– Andrew Bogut volta?
Os deuses basqueteiros têm alguma coisa para resolver com o pivô australiano. Nesta temporada, o cara até que conseguiu segurar as pontas em quadra, passando da marca de 65 partidas, depois de jogar apenas 44 nas duas anteriores. Mas aí chega a reta final do campeonato, e o que acontece? Claro que ele teria de sofrer uma fratura em seu quadril direito. E o Warriors sem seu aussie predileto é outra equipe. Andre Iguodala ajuda, e muito, com sua capacidade atlética e atenção defensiva no perímetro, mas a retaguarda da equipe depende em demasia da proteção de aro e da ocupação de espaços que o pivô oferece. No ataque, seus passes também são um diferencial, é verdade, mas o que preocupa aqui realmente é a consistência defensiva. Jermaine O’Neal curte um mezzo revival, mas definitivamente não tem o mesmo impacto.

– Sem Bogut, quem vai arrumar confusão com o Clippers?
Bogut adora usar seus cotovelos – e o corpanzil em geral – para, digamos, incomodar a concorrência. Blake Griffin era um de seus alvos preferidos, e a tensão entre os dois brutamontes foi primordial para o aquecimento da rivalidade entre esses dois clubes californianos nos últimos anos. Bem, Klay Thompson já se candidatou a assumir a vaga de atleta mais visado/odiado saiu acusando Griffin de ser um fingidor, cheio de cenas, o famoso “flopper”. Em possíveis encrencas em quadra, olho também em Matt Barnes.

 

– O progresso de DeAndre Jordan é sustentável?
Com o pulso firme de Chris Paul e a produção estupenda de Blake Griffin, mais um punhado de bons arremessadores ao redor deles, o ex-primo pobre de Los Angeles se tornou o ataque mais eficiente da liga. Sua defesa também melhorou sob a coordenação de Doc Rivers,  mas ainda não num patamar em que possa ser equiparada aos resultados obtidos por Spurs ou Thunder nos últimos dois anos (sempre no top 5). E muito do sucesso que o Clippers possa ter em frear um ataque poderoso como o do Warriors vai passar por DeAndre Jordan. Ele não virou nenhum Bill Russell, por mais que Doc queira dar aquela moral, mas sua evolução durante o campeonato foi impressionante. Aos 25 anos, o gigantão amadureceu e não só elevou drasticamente sua média de rebotes, como progrediu consideravelmente em seus índices defensivos (e ofensivos). Numa série de mata-matas, porém, as eventuais falhas de posicionamento e cobertura podem ser exploradas com mais facilidade. Sem Bogut, o Warriors vai tentar afastar DJ da cesta sempre que puder, com pick and pops com David Lee, O’Neal e Marreese Speights. Nessas situações, a complexidade dos movimentos aumenta, e o pivô tem de dar a resposta, especialmente considerando o que o time tem de recursos no banco de reservas quando o assunto são os grandalhões. Ainda mais se Stephen Curry estiver envolvido como o driblador buscando o corta-luz.

– O mundo poderá sobreviver ao embate entre Jordan e Jamal Crawford?
Sim, chegou o dia em que dois dos figuraças que já foram mais malhadas pelo espírito avoado e/ou fominha na liga duelam nos playoffs. São dois jogadores com crossover mortal, capacidade para frear o drible em qualquer ponto da quadra e subir de modo ameaçador para o chute. De vez em quando podem exagerar um pouquinho. Só um pouquinho… Ok, está certo que Jamal-C, em seus tempos de Clippers, vem recebendo muito mais elogios, com razão. Botou a cabeça no lugar, disse que enfim se entendeu como ser humano – e jogador de basquete. Mas ainda lembramos de seus tempos de Bulls e Knicks, em que era capaz de bater bola por 20 segundos  até arriscar um chute desvairado a 12 metros da cesta. Comportamento semelhante ao de Jordan-C no Washington Wizards, até que o maninho tomou um chá de semancol servido por Brad Stevens em Boston. Um outro tipo de Tea Party.

– Pode Stephen Curry ter relevância também na defesa?
Que o filho mais velho de Dell Curry é um dos melhores arremessadores, se não o melhor desta era dourada, não há dúvida. Né!?!? Pessoalmente, é um dos meus jogadores prediletos, daquele que vale o ingresso por conta própria. Seu chute é tão bom que sua habilidade para servir aos companheiros acaba ficando em segundo plano. Poderíamos falar até o amanhacer sobre seu talento ofensivo, mas, na hora de encarar um elenco do quilate do Clippers, ninguém passa impune do outro lado da quadra. Steph vai ter de aguentar a bronca.  Mark Jackson pode evitar o confronto direto com Chris Paul e colocá-lo para vigiar Redick ou Matt Barnes. Mas cada um desses representa desafios: inteligente demais, Redick busca muito bem os corta-luzes do lado contrário, algo que exige disciplina para se frear, enquanto Barnes pode cortar agressivamente para o garrafão, com ou sem bola, além de ser mais alto e comprido.


Perguntas para Miami Heat x Charlotte Bobcats
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Giancarlo Giampietro

Vamos tentar abordar neste fim de semana cada uma das oito séries que abrem os playoffs da NBA. Até segunda-feira, pelo menos. A ver:

LeBron x Bobcats=61 pontos

LeBron x Bobcats = 61 pontos

– O que o Bobcats vai fazer com aquele número 6?
Charlotte viu Carmelo e, principalmente, LeBron se esbaldarem durante a temporada regular. O que talvez pouco saibam: o time de Steve Clifford terminou o campeonato como a sexta melhor defesa (atrás dos suspeitos de sempre: Indiana, Chicago, San Antonio e Oklahoma City Thunder e outra presença inesperada, o Golden State, em quarto). Agora, contra os atuais bicampeões, o futuro (e novo) Hornets vai precisar encontrar algum meio de frear a força da natureza #LBJ. LeBron teve média de 38 pontos por jogo nos confrontos, contando a jornada incrível dos 61 pontos. Não há quem possa criticar a dedicação, o empenho do ainda jovem Michael Kidd-Gilchrist, mas ele precisa de ajuda.

 – Oi, Dwyane, tudo bem? Como vai a vida?
Desde o dia 18 de março, o veterano co-piloto do Miami Heat ficou fora de 12 dos 16 jogos do time. Haja precaução com seus combalidos joelhos. Para o sujeito desenferrujar, foi escalado nas últimas três partidas, somando apenas 64 minutos no total. Foi contra Hawks, Wizards e Sixers, em três derrotas, com o time abrindo mão da luta pelo mando de quadra nos playoffs. Aliás, se formos comparar, o clube terminou com a mesma campanha do Houston Rockets e do Portland Trail Blazers. Por essa poucos esperavam. Muito tem a ver com o joga-ou-não-joga de Wade. LeBron ficou sobrecarregado durante a jornada, sem fôlego para ser, ao mesmo tempo, o grande cestinha e o grande defensor noite após noite – de acordo, claro, com os padrões altíssimos estabelecidos pelo superastro. Em fevereiro, no mês em que Wade ficou fora de quadra por apenas duas rodadas, a campanha foi de 10 vitórias em 11 jogos (a única derrota foi o, glup!, Utah Jazz), com o ala-armador somando 21 pontos, 5,6 rebotes, 5,5 assistências e 60,9% de aproveitamento de quadra, em 34 minutos. Spoelstra precisa de um rendimento desses para ter sucesso nos mata-matas. Mas vai ser logo de cara? Ou, contra o Bobcats, o técnico ainda conseguirá preservá-lo?

– Estaria o mundo preparado para se divertir com Josh McRoberts?
Ele já esteve iluminado pelos holofotes. Jogou por Duke. Vestiu a camisa do Los Angeles Lakers. Mas agora deu a sorte de estar do outro lado da quadra em uma série melhor-de-sete-que-precisa-ser-televisionada-por-motivos-de-LeBron. Melhor ainda: talvez calhe de o próprio LeBron ficar na sua cobertura, dependendo da rotação de pivôs que Spoelstra vai usar. Sucesso. Aqui, não conta só o visual, mas principalmente a habilidade do passe do ala-pivô, que caiu como uma luva como o parceiro de Al Jefferson. O Baby Al foi um estrondo durante o campeonato, com 21,8 pontos, 10,8 rebotes e double-doubles que te fazem engasgar na cadeira, mas fiquemos todos de olho no McBob.

– E, por falar, em pivôs, qual vai ser, Spo? Aliás, qual o time?
Em suas duas campanhas de título, o Miami Heat contou com contribuições significativas de Shane Battier, o Sr. Presidente, inteligente que só, alguém que casa bem com o sistema que gira em torno de LeBron, ajudando na defesa e espaçando o ataque. Os minutos do ala têm sido completamente irregulares. Em abril: 6, 0, 31, 20, 24, 3, 0, 15 e 40. Em março: 19, 21, 20, 16, 9, 16, 28, 11, 21, 15, 14, 9, 18, 8, 0, 24, 27, 0. Para comparar, em fevereiro, oscilou entre 17 e 35 (sim, algo ainda discrepante, mas com um tempo mínimo de quadra bem mais razoável). Em janeiro, foi desfalque por cinco noites, mas, quando jogou, ficou entre 19 e 31 minutos (num só jogo isolado, acima de 30, com o restante situado entre 19 e 21). Tudo isso para dizer que, com Battier, o Miami adota seu formato small ball. É o time que dominou a liga. Com Haslem ou Oden, alguns parâmetros mudam sensivelmente. Resta saber se Batier foi outro a ser resguardado, ou se despencou da rotação, mesmo. Rashard Lewis está no aguardo – credo. Mas é isso: foram diversos afastamentos/lesões durante a jornada. O entrosamento, a essa altura, já é algo natural, para quem convive há tanto tempo. Mas, de qualquer forma, fica a observação.

– Gary Neal, recordar é viver?
Ou melhor: longe da máquina azeitada que é o Spurs, será que esse temperamental cestinha tem a manha de marcar 24 pontos em 25 minutos contra o Miami Heat. O torcedor mais fanático da turma de San Antonio, aquele que realmente se preze, obviamente vai conectar o League Pass nos momentos em que Neal sair do banco de reservas, para conferir. Quem não se lembra da erupção do arremessador naquele espancamento que o time texano promoveu no Jogo 3 das históricas finais do ano passado? Na temporada regular, mudando de Milwaukee para Charlotte, Neal sustentou seus números (nada espetaculares, diga-se).

– Por fim, Kembinha, preparado?
É difícil melhorar quando se chama Kemba. Mas “Kembinha” dá conta do recado, né? Um amigão fanático por Fantasy se refere assim ao rapaz. Campeão universitário por Uconn, ele comemorou este ano as estripulias de Shabazzzzzzzz, tirou um sarro do MKG, descansou um pouco na reta final, tudo legal. Agora, vai ter de respirar fundo: nunca é legal para um armador enfrentar a blitz do Heat. Para alguém que fica tanto tempo com a bola, o subestimado armador do Bobcats comete poucos erros. Mas que se prepare, porque lá vem abafa em sua direção.

A diversão acabou, Kembinha. MKG não merecia isso

A diversão acabou, Kembinha. MKG não merecia isso


Heat e Cavs vêm ao Brasil! Mas e o LeBron?
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Giancarlo Giampietro

Oficial, por enquanto

Oficial, por enquanto

Cleveland Cavaliers e Miami Heat vão jogar no Rio de Janeiro no dia 11 de outubro. A NBA vai voltar ao Brasil, com dois amistosos de pré-temporada em dois anos consecutivos. Isto está certo, legal demais.

Agora…

Obviamente este post sai como água no chope, bastante impopular, mas é preciso ponderar: cravar que teremos LeBron James por estas bandas na véspera do feriado é, no mínimo, prematuro.

É complicado falar do outubro de qualquer clube da NBA quando se está em abril. Sobre o mês 10 dos atuais bicampeões já beira o impossível. Tudo por causa dos nomes pintados de azulzinho na coluna 2014-2015 desta página aqui.

Vejam a legenda: azulzinho quer dizer “opção do jogador”. No sentido de que eles decidem o que vão fazer da vida: se vão manter o contrato ou se vão revogá-lo, para entrar no mercado de agentes livres. E lá aparecem: LeBron James, Dwyane Wade e Chris Bosh. Ah, e o Udonis Haslem também.

Sim, para quem não se lembra (“Alô, McFly, tem alguém em casa!?”), existe a possibilidade de o trio parada dura de o Heat dizer adeus ao clube. Não só eles, como praticamente todo o elenco formado por Pat Riley – de contratos garantidos para a próxima temporada, só constam Chris Andersen e Norris Cole.

Vai acontecer?

Ninguém sabe. Nem Riley, David Stern, Adam Silver, Erik Spoelstra, Jim Buss, Phil Jackson e Barack Obama. É duro, sinto muito, mesmo, mas nem você, muito menos eu podemos dizer, prever.

Porque, daqui até lá, existe esta coisa chamada mata-mata, ou playoff, no meio do caminho. Os caras vão em busca do tricampeonato.

É algo tão difícil, que o Steve Kerr, no início deste campeonato, simplesmente não conseguia apostar na equipe como seu principal candidato ao título. Ele, parte integral daquele mítico Chicago Bulls, falava sobre o desgaste mental e físico que as consecutivas participações nas finais da NBA causam. Mas cá estamos na reta final da temporada regular, com o clube bem posicionado na disputa. Não são necessariamente favoritos, mas estão bem no páreo. Que a bola suba para vermos o que acontece.

A configuração do Miami Heat que vem ao Brasil vai depender, obviamente, do desfecho dessas batalhas. Quão sangrentas serão? Quem vai vencer? Se forem campeões, se darão por satisfeitos? Ou vão pensar num tetracampeonato histórico, que não ocorre desde o Celtics de Russell? Se perderem, ficarão mordidos, em busca de revanche? Ou vai cada um procurar sua turma?

O Cavs, mesmo, vai acompanhar isso com muita atenção. Imagine: LeBron vindo ao Brasil, legal!!!, mas com a camisa de sua ex-equipe. É possível? Sim, embora muito improvável.

Para que isso aconteça, pode ser que sobre até mesmo para Anderson Varejão. O pivô capixaba, saibam, vai estar em seu último ano de vínculo com a franquia, mas com um detalhe importante: seu contrato é parcialmente garantido. Não tenho aqui de cabeça os detalhes, mas o Cavs pode rescindir seu vínculo até um dia X e economizar boa parte de seu salário – ou mesmo trocá-lo para um time que esteja interessado, mesmo, em poupar. Ainda está cedo para fazer esse tipo de conta, mesmo.

O mais importante aqui não seria um mero corte de gastos, mas, sim, a possibilidade de abrir espaço em uma folha de pagamento já esvaziada para investir em outros agentes livres. Mesmo que o autoproclamado Rei ignore os clamores pelo seu retorno.

Vão fazer? Também acho difícil, considerando a popularidade do brasileiro e as diversas e raras habilidades que o pivô tem, que vão muito além de sua cabeleira. Mas, na hora da reformulação de um elenco, uma das frases que mais se houve é que fulano de tal “preferiu seguir uma outra direção”. Raios, no momento nem o gerente geral David Griffin sabe se vai continuar no emprego ou não. Seu cargo ainda carrega a etiqueta de “in-te-ri-no”.

No fim, é isso. Atletas, dirigentes, agentes, jornalistas, torcedores. Não importa: em abril, estão todos sujeitos a reviravoltas.

De concreto fica: Miami e Cleveland jogarão no Rio de Janeiro. Mas quem exatamente? Os playoffs que vão nos contar. Enquanto isso, não faz mal usar os verbos de modo condicional.