Como o Golden State Warriors vai reagir à adversidade?
Giancarlo Giampietro
O Golden State Warriors viveu um ano praticamente perfeito. Um técnico novo brilhante, um sistema repaginado, e a dominância da NBA. A melhor defesa, o segundo melhor ataque, sufocando e correndo. O MVP Stephen Curry. O grande salto de Klay Thompson e Draymond Green. Um elenco versátil. Tudo isso para desembocar na melhor campanha da liga, com sete vitórias a mais que o Atlanta Hawks, com um aproveitamento de 81,7%. Não só isso, mas a sexta melhor campanha da história, ao lado de outros times históricos.
Agora, esse mundo perfeito se vê seriamente ameaçado, após duas derrotas seguidas para o Memphis Grizzlies, que se vê liderando a série pelas semifinais do Oeste ao limitar o poderoso ataque californiano a apenas 89 pontos no Jogo 3. A pauta obrigatória, então, é a seguinte: como o Warriors vai responder a tamanha adversidade? A primeira verdadeira resistência que enfrenta desde o início da temporada. “Esse é um processo de aprendizado para nós. Somos um time muito jovem”, afirma o treinador Steve Kerr. “Agora este é o nosso momento da verdade. Você tem de aprender durante os playoffs.”
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Talvez a intenção de Kerr seja dizer que seu elenco é inexperiente, não jovem de idade, uma vez que a média de idade do elenco é de 27 anos, contra 27,7 do Memphis Grizzlies. O núcleo de Stephen Curry (27), Klay Thompson (25) e Draymond Green (25) chegou a esta edição dos mata-matas com apenas três séries disputadas em 2013 e 2014. Do outro lado, o Memphis Grizzlies já tem uma base que está em seu quinto ano de competição em alto nível, com sete séries e 42 partidas na caixola. Entre tantos componentes táticos do confronto, a experiência, o emocional também faz diferença, não há como negar.
Agora fica essa dúvida sobre como esses caras vão se comportar no Jogo 4, claramente decisivo, nesta segunda-feira. Após a segunda derrota seguida, a resposta deles foi de tranquilidade. De que, obviamente, as coisas não haviam saído como queriam, mas que tinham plena capacidade de reverter o quadro e acalmar a turbulência que, sabem, já gira em torno do time, fora do vestiário. Aliás, é o que eles ouvem durante todo o campeonato, aquela de sempre: o sucesso da temporada regular vai se traduzir para os playoffs? Esse estilo de jogo pode ser vencedor? “Eles são uma equipe que só ataca com arremessos. Arremessos não dão certo. Todo esse tipo de coisa vai aparecer agora”, afirma Draymond Green, com a personalidade de sempre. “É frustrante, mas é divertido”, diz Curry.
Personalidade? Green pode ter atacado muito mal, acertando apenas uma de oito tentativas de cesta, mas ele mesmo diz que não é chutando que ele vai ajudar o Golden State a virar a série. Sua relevância maior está na defesa, na liderança e nos pequenos detalhes. Porém, no quarto período deste sábado, quando o Warriors já tentava antecipar sua reação antes de conceder mais uma derrota, o ala-pivô falhou clamorosamente.
Primeiro, invadiu o garrafão durante um lance livre cobrado por Curry, o maior arremessador desta geração. Perdiam por seis pontos, a 3min35s do fim, e cada cesta era importante. “Foi apenas uma jogada estúpida que você não pode cometer num jogo desta magnitude, e assumo toda a responsabilidade por isso, já que não fez o menor sentido. Você está falando de um cara que supostamente tem um elevado QI”, afirmou, de novo, com a mesma sagacidade de sempre. O atleta é duro ao falar sobre os outros. Não ia mudar o tratamento em uma autorreferência.
O problema é que, dois minutos depois, precisamente a 1min13s do fim, Green se atrapalharia novamente. O Grizzlies já não tinha Marc Gasol em quadra, excluído com seis faltas, e o placar apontava cinco pontos de diferença, com posse de bola para os veteranos. O ala-pivô saiu em disparada com a bola, driblando-a feito um maluco, na tentativa de acelerar o jogo e pegar a defesa desprevenida. Na verdade, quem não estava preparado para a transição era o próprio jogador, que deu de cara com Courtney Lee, pronto dar o bote e recuperar a bola. Um baita estrago.
E aí a gente se pergunta: o que levou Green a deslizar desta maneira? Foram dois erros bestas na conta de um jogador que, sim, continua sendo um dos mais inteligentes da liga. Talvez só mais difíceis de entender do que os três lances livres errados em quatro batidos por Klay Thompson em todo o jogo. Ou o fato de Curry ter desperdiçado também outros dois chutes em sete disparos a partir da linha. Na temporada regular, eles acertaram, respectivamente, 91,4% e 87,9%. Nos playoffs, os números despencaram para 83% e 65%. Nesse contexto, a invasão de Green fica um pouco menos grave, já que não era um ponto tão garantido assim. Nota-se um desequilíbrio do time para além dos lances livres, contudo. Nos tiros de longa distância, mesmo quando bem posicionados e se contestação, os atletas do Warriors falharam nos últimos dois jogos. Acertaram apenas 4 de 18 chutes quando estavam “totalmente livres”, segundo a medição do SportVU, o sistema que digitaliza toda a ação das partidas em cada ginásio de NBA. Quando tinham defensores entre 1,2 e 1,8 m de distância, o aproveitamento foi de apenas 4 em 16. Baixíssimo.
Então será que eles realmente estão se divertindo em quadra? Talvez simplesmente não tenha sido a melhor escolha de palavras por Curry. E outra: mesmo que estejam com a confiança abalada, o erro maior seria acusar o golpe e revelar dúvidas. Não não poderiam jamais fazer isso. Os números, por conta, já são preocupantes. O Golden State converteu neste sábado apenas 43,2% dos arremessos e 23,1% em três pontos (errando 20 de 26) – contra, respectivamente, 47,8% e 39,8% na temporada. No Jogo 2, derrota em casa, foi ainda pior: 41,9% e 23,1%. O estrago maior acontece no primeiro tempo: segundo dados do Synergy, o time estava acertando 51,2% de seus arremessos e desperdiçando 7,3 posses de bola no primeiro tempo durante os playoffs até o sábado. Neste Jogo 3, foram 38,1% e nove erros em 24 minutos.
Reflexo, claro, da forte defesa do Memphis. Porque tem isso também: não é que o Golden State esteja se afundando contra um Minnesota Timerwolves ou, glup, um New York Knicks. Com formação completa nos playoffs – leia-se: com Mike Conley na armação –, os caras disputaram cinco jogos e ainda não perderam. Só não dá para se ater apenas ao sucesso recente, já que esse núcleo experiente somou mais de 50 vitórias nas últimas três temporadas – e que, na atual, foi por muito tempo o segundo melhor time da conferência, até perder rendimento a partir do All-Star Game. Para ser mais específico, até o dia 18 de fevereiro, o clube tinha a terceira melhor campanha da liga, com 73,6% de aproveitamento.
A identidade, sabemos todos, é fortemente vinculada aos seus pivôs e a opressão física que eles podem proporcionar, com a assessoria da tenacidade de Tony Allen (que já soma 11 roubos de bola na série e 23 nos playoffs, com mais de três por jogo nas últimas quatro rodadas) e da agilidade de Courtney no perímetro. O jogo pesado com a dupla Gasol e Z-Bo, e tal, como uma das raras exceções seguindo essa linha, ao lado do Indiana Pacers de West e Hibbert. Para o atual campeonato, porém, Joerger também conseguiu desenvolver seu sistema ofensivo, terminando com o 13º ataque mais eficiente – sendo que até o All-Star era o 11º. Nada de outro mundo, de amedrontar oponentes, mas um avanço para quem não havia passado da 17ª colocação nas três temporadas anteriores, seja com Dave Joerger ou com Lionel Hollins.
Mas, sim, a defesa continua o ganha-pão. É a segunda melhor dos mata-matas, atrás apenas do Chicago Thibs. Contra o Warriors, vemos essa retaguarda se recompor rapidamente em transição, com muita consciência do que precisa ser feito. O vício, a força do hábito empurra os jogadores para perto da cesta, certo? Contra Curry e Thompson, você precisa desacelerar alguns metros atrás para contestar os arremessos de longa distância. A ideia é inibir a definição rápida do time que mais acelerou durante a temporada.
Uma vez contido o contragolpe, o serviço continua. Os defensores precisam povoara linha perimetral, com participação dos pivôs, aliás, já que Andrew Bogut, hoje, não representa ameaça alguma lá embaixo. Tantas lesões gravíssimas acumuladas na carreira custam muito ao australiano. Então lá está Gasol, gigante e inteligentíssimo, aparecendo numa cobertura imediata diante dos chutadores, fechando espaços e impedir infiltrações. Com menos gente agredindo com a bola, você também contém a troca de passes, ou pelo menos passes que possam liberar os arremessadores. Sem corredor e sem paciência para entender a melhor hora de atacar, o que temos é um aro amassado, mesmo. Segundo Kerr, seus atletas estão correndo, apressados, em vez de jogar com velocidade, pensando.
Para buscar a virada, é bom pensar com carinho no que aconteceu nas últimas duas partidas. Foi realmente falta de sorte na finalização? Ou tranquilidade? Stephen Curry não se mostra intimidado. “Eles tentam tirar nossas oportunidades de arremesso livre de três, seja em transição ou em meia quadra. Ainda assim, consegui me liberar e tive boas chances, o que me deixa bastante encorajado. Basta manter esses movimentos. Sei que os chutes vão cair”, afirmou o MVP da temporada. Draymond Green assegura que ninguém está surtado: “Perder duas em sequência não vai te deixar feliz. Mas, ao mesmo tempo, ninguém está abandonando o navio aqui. Ninguém está entrando em pânico e jogando a toalha”.
O Warriors sofreu duas derrotas consecutivas em três ocasiões durante sua jornada na temporada regular e, de imediato, reagiu com séries de 8, 9 e 16 triunfos. Qualquer arranque desse nível lhes colocaria na decisão da NBA, perto do título. Os playoffs, porém, são outro assunto, ainda mais enfrentando um adversário de respeito. Agora só resta saber se o aprendizado apregoado por Kerr será acelerado, para que eles possam tentar terminar a história da forma como esperavam.