Vinte Um

Cavs desfalcado pede ajuda aos amigos de LeBron

Giancarlo Giampietro

Visão de dirigente de LeBron vai ser testada

Visão de dirigente de LeBron vai ser testada

LeBron James tinha um plano, desde o início. Se era virar as costas para um Dwyane Wade em frangalhos, para os arremessos de Chris Bosh e uma liderança como Pat Riley, que fosse para um clube em que pudesse dar as cartas – se não todas elas, mas grande parte do baralho. Se pudesse ser em casa, quanto melhor.

Quando o Rei decide retomar suas raízes, nem toda a ingenuidade de Cleveland vai poder confiar que fosse por mero sentimentalismo e apego a crenças locais. Isso pode até ter influenciado em todo o processo, mas um cara tão inteligente e ambicioso como LeBron não vai seguir um rumo porque o coração mandou. Assim como faz em quadra, sua versão homem de negócios avalia tudo o que está ao seu redor nos mínimos detalhes antes de tomar qualquer, na falta de melhor termo, decisão.

A maior prova disso é sua própria carta publicada na Sports Illustrated, comunicando ao povo de South Beach que estava retornando com os seus talentos para Ohio. Lá, deixou claro que Andrew Wiggins e Anthony Bennett não faziam parte de seus planos, abrindo caminho para a negociação por Kevin Love. O ala exigia um sacrifício do futuro por parte da franquia para instaurar seu reinado imediato. Sabemos o que aconteceu.

>> Não sai do Facebook? Curta a página do 21 lá
>> Bombardeio no Twitter? Também tou nessa

Pois agora Kevin Love está fora de ação. Oficialmente, no caso – uma vez que não possamos dizer que o ala-pivô estava 100% presente de corpo e alma durante uma temporada cheia de pequenos incidentes que, quando agrupados, pintavam um cenário no qual sua saída de Cleveland, como agente livre, era realmente possível. Ninguém sabe ao certo mais depois da cirurgia no ombro esquerdo que vai tirá-lo das quadras por até seis meses.

O que sabemos é que, sem Love, LeBron e todos os seus chapinhas vão ter de realmente jogar muito para combater o Chicago Bulls nas semifinais do Leste. Talvez seja injusto com David Griffin, o gerente geral que merece o prêmio de Executivo do Ano pelo simples fato de ter tornado possível a volta do superastro e ainda realizou duas excelentes trocas em meio a um momento de crise. Mas é notório que algumas contratações do Cavs foram, digamos, sugeridas por James.

Espera-se alguma coisa, qualquer coisa da dupla acima

Espera-se alguma coisa, qualquer coisa da dupla acima. Ambos com 34 anos

Sim, estamos falando de Mike Miller e James Jones, além de, em menor escala, Shawn Marion – que não é dos amigos íntimos, nem nada disso, mas foi recrutado pessoalmente pelo craque. Ainda mais com JR Smith suspenso das duas primeiras partidas em Cleveland, esses veteranos precisam dar alguma contribuição para o Cavs. Mesmo que David Blatt opte por usar Timofey Mozgov e Tristan Thompson ao mesmo tempo e por longos minutos. Mesmo com minutos elevados para LeBron e Irving, que já tiveram, respectivamente, 43,0 e 40,5 minutos contra o Boston Celtics. Love e Smith acumularam mais de 53 minutos em média, que precisam ser absorvidos por alguém.

“A margem de erro contra o Celtics era tamanha que eles poderiam jogar num nível C, que tudo bem. Mas agora essa margem diminuiu consideravelmente. Contra o Bulls, não vai dar nem mais o B”, afirmou o jornalista Brian Windhorst, do ESPN.com, em podcast com Bill Simmons, editor-chefe do Grantland. Windhorst não está mais 100% dedicado ao dia a dia do Cavs, mas é um dos repórteres mais bem conectados dentro da franquia – e também com o círculo mais íntimo de LeBron. Acompanha o ala desde sua adolescência.

Windhorst depois mencionou a necessidade de pelo menos um integrante desse trio parada dura jogar bem em jogos isolados. Tipo: se Jones for bem na primeira partida, Marion, na segunda e Miller, na terceira. Para darem mais opções a David Blatt. Do contrário, as coisas podem se complicar. O técnico também adiciona Kendrick Perkins a essa lista. “Caras que estão no banco e não estavam jogando muito, com Shawn, Mike e Perk, precisam obviamente estar prontos para jogar mais minutos, e sei que eles vão fazer isso por serem profissionais e terem experiência e por terem estado em situações vitoriosas antes”, afirmou.

De fato, são todos trintões com muita bagagem e histórias para contar e que já foram campeões em diferentes momentos de suas carreiras. Estão habituados a momentos de pressão. Blatt (e LeBron) têm de se apegar a esse conceito, mesmo, para contar com os veteranos. Já que, em termos de atividade em quadra, a produção foi praticamente nula durante a temporada.

cavs-bench-2015-jones-miller-marion

Mesmo no caso de uma projeção estatística por 36 minutos, as coisas não melhoram muito. Na maior parte do tempo, os quatro jogaram mais como aposentados do que como peças importantes num time de playoff. Para não falar das dificuldades de Jones e Miller na defesa e as trapalhadas de Perk no ataque, cometendo turnovers sem parar (32,1% das posses de bola na qual foi envolvido). Contra o Celtics, Miller não teve um minuto sequer de ação, enquanto Marion e Perk somaram sete. Jones foi o único que jogou regularmente, com 46 minutos em quatro partidas, acertando apenas 2 de 11 arremessos de três (a especialidade de sua carreira).

Não que seus contratos tenham sido completamente equivocados. Faz bem uma presença reconfortante no vestiário, ainda mais no caso do Cavs, que seria o time mais visado/badalado/atacado/pressionado do campeonato. Não é por acaso que, ao checar o plantel do hegemônico Chicago Bulls de Phil Jackson (e Jerry Krause…), vamos encontrar verdadeiros anciões como James Edwards em 1996, aos 40, acompanhado por John Salley e Jack Haley, e Robert Parish em 97, aos 43. Mas nenhum desses pivôs velhacos teria um papel relevante em quadra. Bem diferente do que se espera em Cleveland agora.

Bicampeão com Miami e um dos melhores amigos de LBJ, James Jones está confiante. Ou mais ou menos confiante: “Uma parte essencial de nosso time foi subtraída, mas acho que temos o suficiente e nós sabemos que temos o suficiente. Então vamos jogar, competir. No final do dia, é questão de dar nosso melhor e esperar que esse melhor seja o bastante”, diz o ala

Essa incerteza gera um suspense tático para lá de intrigante – e deve até mesmo dificultar a vida dos técnicos de Chicago em um primeiro momento. Na hora de preparar o scout da série, eles vão precisar se ater com cuidado aos reduzidos minutos em que Kevin Love – e Smith – estavam no banco e tentar tirar conclusões a partir daí.

Mike Miller teve algumas grandes partidas pelo Miami e pelo Memphis nos playoffs. Conseguirá replicá-las?

Mike Miller teve algumas grandes partidas pelo Miami e pelo Memphis nos playoffs. Conseguirá replicá-las?

(Um parêntese: a contraposição dos talentos gera duelos individuais extremamente interessantes. São todas variáveis que corre-se o risco de ficar muito confuso. Tanto aqui no texto como nas pranchetinhas mágicas. Kyrie Irving x Derrick Rose: quem vai pontuar mais e permitir mais/menos pontos também? Iman Shumpert x Jimmy Butler: foi o ala com o qual LeBron comparou Shump no momento da troca, mas o emergente astro do Bulls é muito mais completo – e forte. Mozgov x Gasol: o russo vai tentar brecar o espanhol, mas tomando o máximo de cuidado com faltas. Thompson x Gibson: o canadense saltitante, cheio de energia contra um combalido e valente ala-pivô. Miller/Jones x Dunleavy Jr.: a corrida dos veteranos. Por aí vamos.)

O que pega é que Chicago também tem seus problemas. Joakim Noah está se arrastando pela quadra, e não é que Taj Gibson esteja correndo muito mais. Nikola Mirotic também se contundiu contra o Milwaukee Bucks, para não falar de todo o drama em torno de qualquer queda de Derrick Rose. A despeito da lavada que sofreu no Jogo 6, o Milwaukee Bucks deu muito trabalho.

Como Zach Lowe destaca em sua análise sempre minuciosa, Jason Kidd não teve problema Noah com jogadores menores, uma vez que o pivô não representava nenhuma ameaça. Marion, mesmo dois ou três passos mais lento que os tempos de Matrix, não teria problema com ele e ainda poderia atrapalhar Butler. Será que Jones e Miller também dariam conta? Talvez não seja necessário usar Thompson e Mozgov, uma dupla atleticamente opressora, ma que pode atrapalhar o ataque, em termos de espaçamento. A não ser que Mozgov acerte seus chutes de dois de longe com muita eficiência. Ainda assim, a quadra estará mais apertada para as infiltrações de LeBron e Irving. “Vamos ter de manter nosso ataque espaçado porque é dessa forma que jogamos”, diz Blatt. “Claro que sem os dois na escalação, algumas mudanças precisarão ser feitas. Mas tivemos muito sucesso neste campeonato e não queremos nos afastar tanto das coisas que deram certo.”

Se Miller e Jones ao menos estiverem acertando seus arremessos, a solução mais prática e recomendável talvez seja colocar LeBron como o ala-pivô efetivo do time, algo que ele fez com maestria em Miami, e apostar no small ball. Usar a flexibilidade que uma aberração atlética como o camisa 23 proporciona. O problema é que, dentre as muitas razões para seu retorno a Cleveland, ter Kevin Love ao seu lado no quinteto inicial era muito atraente justamente para afastá-lo da cesta. “LeBron odeia defender no garrafão, ter de batalhar ali. Para ele, é OK jogar ali no ataque de vez em quando, mas odeia marcar na posição 4”, diz Windhorst.

Por essas e outras que a mera cogitação de LeBron para o prêmio de MVP não parece nem um pouco justa com os outros candidatos. Afinal, estamos falando de um jogador que deliberadamente se esquivou de algumas responsabilidades. O mesmo cara que tirou duas semanas de folga durante a temporada para aliviar o estresse sobre a mente e o corpo. Que falou abertamente sobre como, em algumas partidas, estava no modo “relaxa e goza”.

Contra Chicago, ele sabe que não vai poder se comportar assim – vai precisar se desdobrar, alternando entre Gibson, Noah, Mirotic e, provavelmente, Butler, no caso de o ala estiver massacrando Shumpert ou Smith (quando este retornar). Haja fôlego e resistência.

Mesmo que o Bulls também esteja avariado fisicamente, é um time muito mais forte e calejado que o Boston Celtics. Com um número maior de opções que as da final de conferência de 2011 que o Miami derrubou, mas com um mesmo núcleo sedento por seu primeiro título. Thibs, Noah, Gibson e, principalmente, Rose vão brigar enquanto puderem.

Aí que LeBron vai ter de se expor de acordo com o que sua equipe precisar e o adversário pedir. Se houve um motivo para ele curtir a primeira metade do campeonato, era para poder se desdobrar nos playoffs, algo que a primeira rodada. “Obviamente, Kevin traz muito para o nosso time. É uma grande perda para nós. Ninguém vai conseguir assumir sua função – ele é especial por um motivo. Mas alguns dos nossos caras vão ter de se levantar e fazer mais. Precisamos disso, ainda mais com o JR fora”, afirmou James. Que, dessa vez, não vai ser testado apenas como craque, mas também como dirigente. E amigo.