Todos contra Angola: AfroBasket começa valendo quarta vaga olímpica
Giancarlo Giampietro
Na Ásia, ou dá China, ou dá Irã. Na Europa, é aquele salve-se-quem-puder, pega-para-capar de sempre. A Espanha aparece como um favorito constante, mas a competição é brutal, premiando seis países diferentes com o título desde 2000. Nas Américas, até pela folga que os Estados Unidos ganham, as forças também se dividem, a ponto de o México ser o atual campeão. A Oceania, com seu dérbi Austrália x Nova Zelândia, não conta.
Agora, quando o assunto é o AfroBasket, temos Angola como a grande força de todas as competições Fiba. Nossos primos distantes começam nesta quinta-feira a disputa por mais um caneco, num clássico lusófono contra Moçambique, valendo dessa vez não só a hegemonia continental como a vaga olímpica para o Rio de Janeiro 2016. Vaga que eles deixaram escapar em Londres 2012 justamente em seu único deslize neste século: eles venceram sete das últimas oito edições do torneio, caindo apenas na final de 2011 contra a Tunísia.
Levando em consideração seu retrospecto, dá para falar em deslize, mesmo. Voltando ainda mais no tempo, veremos que, das últimas 13 edições, os angolanos triunfaram em 11. Mesmo que não tenham uma produção de talentos em massa, ou que estes não sejam exportados com frequência, como fazem os senegaleses, por exemplo, o fato é que os caras conseguiram montar boas equipes sucessivamente para dominar a competição africana.
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Em termos de desenvolvimento de talentos no continente, aliás, pede-se um aparte: a matéria-prima do continente é inesgotável, mas ainda precariamente burilada. A ponto de um país como a Nigéria sair coletando jogadores descendentes nos Estados Unidos para poder formar uma forte seleção. Esse movimento obviamente alargou gama de convocação de modo considerável. O que não quer dizer que, dentro de suas fronteiras, haja uma usina de atletas de ponta. Não é uma crítica ao que eles vêm fazendo, embora essa iniciativa desperte certa polêmica no continente, ao mesmo tempo que suscitou a concorrência a fazer o mesmo. Pelo que já vimos das últimas competições, dá para dizer que os selecionados adoram a experiência de jogar pelo país, com o entusiasmado Al-Farouq Aminu, um dos quatro atletas com contrato de NBA inscritos no torneio, sendo o maior exemplo disso. Quando estão organizados, têm obtido relativo sucesso, ainda que não tenham chegado à final do Afrobasket. O terceiro lugar em 2011 foi o máximo que conseguiram até agora.
Organização, aliás, é o maior inimigo de muitas das seleções do continente. São diversos os relatos, nas competições passadas, de motim de jogadores contra as federações ou um técnico em específico, tal como acontece no mundo do futebol. A troca de treinadores também é uma constante, o que sempre atrapalha e também ajuda a compreender a hegemonia angolana, que usa a continuidade ao seu favor. Para este ano, os veteranos Joaquim Gomes e Olimpio Cipriano, supercampeões, foram excluídos por opção técnica, mas a base vem de longa data, tendo no jovem pivô Yanick Moreira, que se formou nos Estados Unidos sob a batuta de Larry Brown e assinou contrato de training camp com o Los Angeles Clippers, um novo pilar para seu jogo interno. O espigão teve médias de 17,8 pontos e 8,2 rebotes na última Copa do Mundo, ajudado, é verdade, pelos 38 pontos e 15 rebotes que somou contra uma Austrália de corpo mole.
Tunísia e Costa do Marfim são os outros times que apresentaram alguma consistência nos últimos campeonatos, se posicionando, ao lado de nossos patrícios, sempre entre os quatro primeiros de 2009 a 2013. Camarões (2009), Nigéria (2011) e Egito (surpreendente vice-campeão em 2013) foram os intrusos, no caso.
Dessa forma, a Tunísia aparece como a segunda principal favorita ao título e à vaga olímpica. Os africanos setentrionais foram os únicos a desbancar os angolanos neste século, vencendo a competição há quatro anos, em Madagascar. Sim, em Madagascar — muito difícil imaginar melhor sede que essa, hein? Como anfitriões e capitaneados por Salah Mejri, têm grandes chances, desde que não deixem o fator casa jogar contra. Banco do Real Madrid nos últimos dois anos e agora de contrato com o Dallas Mavericks, concorrendo com Samuel Dalembert e JaVale McGee por uma vaga no elenco, o espigão Mejri é uma presença física inigualável no Afrobasket. Tem 2,17m de altura, muita envergadura, corre a quadra feito um ala e salta que é uma beleza.
Fora isso, no papel, a Nigéria chega fortíssima, com uma linha de frente abarrotada, com versatilidade e capacidade atlética. Al-Farouq Aminu é muito provavelmente o melhor jogador da competição. Suas deficiências no drible não ficam tão expostas como na NBA, o que lhe permite atuar mais como um criador de jogadas, algo que não deve acontecer em Portland. Guardadas as devidas proporções, é como se ele se transformasse num Andre Iguodala a serviço da seleção, causando grande impacto dos dois lados da quadra. Para constar: Iguodala e Emeka Okafor foram os principais alvos dessa expansão nigeriana, mas recusaram o assédio, tendo o ala do Golden State Warriors, inclusive, vencido o Mundial de 2010 e as Olimpíadas de 2012. Os dois deixariam o time praticamente imbatível, creio, mas ainda há talento de sobra aqui. Ike Diogu, se os joelhos deixarem, ataca dentro e fora do garrafão, com uma munheca sensacional. Alade Aminu, irmão de Farouq, protege a cesta e tem bom chute de média distância. Por fim, Shane Lawal pode ser uma das sensações do torneio. O pivô de 28 anos é uma aberração atlética e, depois de fazer uma grande temporada pelo Dinamo Sassari na Itália, fechou um belo contrato com o Barcelona. No perímetro, o armador Ben Uzoh tem explosão e envergadura para atormentar os adversários na defesa, enquanto o ala Chamberlain Oguchi costuma ser a referência do time em jogadas mais apertadas.
Outra equipe que merece atenção e respeito é Senegal. O pivô Gorgui Dieng, em teoria, seria o principal concorrente de Aminu ao prêmio de MVP. Defendendo a equipe nacional, o jogador de 25 anos ganha muito mais protagonismo em comparação ao papel que desempenha pelo Minnesota Timberwolves. Dieng também tem bola para atacar dentro e fora do garrafão, é dominante nos rebotes e excelente na cobertura defensiva, com mobilidade e timing perfeito para os tocos. Na última Copa do Mundo, teve médias de 16,0 pontos , 10,7 rebotes, 1,8 roubo de bola, 1,5 toco e 2,0 assistências. Dominante, isto é, liderando a seleção a surpreendentes vitórias contra Croácia e Porto Rico. Ao seu redor há uma coleção de jogadores longilíneos, com suposto bom entrosamento: oito dos atuais convocados participaram do Mundial. Vão fazer falta o pivô Hamady N’Diaye, xerifão típico, e Maurice Ndour, ala-pivô do tipo strecht four, graduado pela Universidade de Ohio e que fez ótima liga de verão pelo Knicks para ser contratado pelo Dallas Mavericks.