Vinte Um

Arquivo : maio 2014

O Maccabi campeão que deprimiu o poderoso Real
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Giancarlo Giampietro

Festa em Tel Aviv: em prédio, o placar da final. Mais que basquete...

Festa em Tel Aviv: em prédio, o placar da final. Mais que basquete…

“Esta Euroliga fomos nós que perdemos. Se tivéssemos feito as coisas um pouco melhor, seríamos campeões”, afirmou Felipe Reyes. “É uma das derrotas mais difíceis na minha carreira. A equipe que ganhou da nossa não é melhor do que o nossa. Estamos f*****dos.”

Primeiro: o capitão do Real Madrid e um dos símbolos da geração dourada do basquete espanhol realmente soltou esta última frase on the record para resumir o que ele e seus companheiros sentiam nos vestiários em Milão após a derrota para o Maccabi Tel Aviv na final do campeonato continental. Para quem o viu receber o troféu de vice-campeão com o maior desdém, já numa fossa danada, não chega a ser uma surpresa o uso, enfim, de impropérios em entrevistas. Justo com os atletas merengues, um grupo de caras certinhos que pouca emoção deram a matérias que procuravam exaltar uma temporada (quase?) histórica do clube.

Agora, com toda a sua experiência, aos 34 anos, disputando sua décima Euroliga, Reyes sabe, ou deveria saber muito bem que nem sempre o melhor time vai vencer por aquelas bandas. O formato do Final Four já abre naturalmente espaço para os azarões ou coisas atípicas – o Real, mesmo, não vai bater o Barcelona por mais de 30 pontos todos os dias. Há muitos fatores que podem levar a diversas, supostas injustiças. Mas o espanhol que experimente dizer isso diretamente a David Blatt ou Tyrese Rice, o MVP da fase decisiva, aquele mesmo que não tomou conhecimento de nenhum defensor madridista que se aventurasse em pará-lo.

Talvez Blatt pudesse fazer uma concessão: que, no papel, um por um, o elenco do Real de fato daria uma surra no que ele tem ao seu dispor. Quiçá admitisse, mesmo, na esportiva, embora não tenha obrigação nenhuma de fazê-lo. Foi seu time o campeão. E isso, para sua realização e a de milhares e milhares de fanáticos, é o que importa, no fim.

Yarone Arbel, um chapa israelense que acompanha o time e o campeonato há anos, colunista no site da Euroliga e scout profissional, já havia dito no Twitter, de modo um tanto premonitório: A única chance do Maccabi ganhar este jogo é dar uma de… Maccabi. Não será sobre o basquete”.

Foi um comentário que segue a linha do que disse Reyes, horas mais tarde. Sim, o melhor time, como demonstrado durante toda a temporada, era o Real. Acontece que esse Maccabi que chegou a Milão era um monstro completamente diferente daquele que estávamos acompanhando durante as semanas, meses anteriores. Eles estavam transformados.

O clube chegou a perder quatro partidas consecutivas em março, o que é caso para crise institucional. A boataria dava conta de que Blatt estaria absurdamente ameaçado em seu cargo. O time penou para chegar aos mata-matas, mas aí veio um momento mágico, que encaminharia sua jornada para outra direção.

No mesmo Mediolanum Forum, o Maccabi abria o confronto com o emergente Olimpia Milano, sem a vantagem do mando de quadra. Empolgada, atlética, em alta, a equipe da quadra vencia o jogo por 12 pontos, restando algo em torno de quatro minutos no confronto. Ou sete pontos com menos de dois minutos. Os israelenses conseguiram uma virada inacreditável, vencendo na prorrogação. Durante as entrevistas pós-título, o treinador, seus jogadores e os dirigentes concordaram: aquele foi o momento em que passaram a acreditar que algo “especial” estaria por vir (foi a palavra usada por todos).

Veio mesmo. Quando subiram para a quadra no Final Four, estava diante deles. Foram nove mil torcedores do clube em Milão? Há quem diga até 10 mil. Uma quantia muito maior do que a torcida dos outros três clubes juntos. Impressionante, ainda mais por incluirmos aqui Barcelona e Real Madrid – o CSKA tem um nome pesado, mas, depois de transmitir seus jogos por duas temporadas no Sports+, está claro que seus admiradores não podem ser confundidos como “seguidores”.

E não há como o time entrar em quadra, do outro lado do Mediterrâneo, e não se empolgar com aquele mar de camisetas e bandeiras azul e amarelas na arquibancada. Impossível passar incólume por isso e não se sentir ainda maior. Há quem possa achar piegas a frase, mas não vejo como evitá-la: ali, o Maccabi, sim, era mais que um clube.

Se formos pensar, testemunhamos algo parecido neste NBB, com a ascensão do Mogi durante os playoffs. Guardadas as devidas proporções, claro. A torcida veio junto, o time cresceu. Ou: o time cresceu, a torcida veio junto. Difícil dizer o que acontece primeiro. O que sabemos é que, de maneira indiscutível, os dois juntos tornam a criatura mais temerosa.

Vejam as fotos das comemorações em Tel Aviv:

De cima, estava assim

De cima, estava assim

De perto, dava para ver isso

De perto, dava para ver isso

Até que...

Até que…

No meio da baderna, Guy Pnini ergue a taça

No meio da baderna, Guy Pnini ergue a taça

Na Euroliga, o Real era superior financeira e tecnicamente, mas não tinha isso ao seu lado. Como clube, seu adversário era maior.

(Sobre o jogo em si, comento, meio atraso, um pouco mais tarde.)


Pinheiros aposta em Marcel, que encerra seu exílio
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Giancarlo Giampietro

Marcel, na época de São Bernardo

Marcel, na época de São Bernardo

Vocês me dão licença para voltar a uma encarnação passada e resgatar uma postagem de maio de 2012, né?

(Caceta, já se passaram dois anos!)

Foi mais ou menos assim, com algumas partes editadas, apagadas para dar um suspense:

“Você clica no link e começa a ler um artigo do grande Fulano, que tem as seguintes frases iniciais: “Eu gostaria de dizer de início que não tenho mais nenhuma pretensão a posto algum no basquete. Desisti dele em 1975, no vestiário do ginásio da Bradley University, quando me olhei no espelho e vi que seria médico. Só percebi isso em 2011, quando senti que a vida não me faria sentido sem que exercesse minha verdadeira profissão”.

Além do mais, chamam a atenção as seguintes frases:

– “Não reclamo do modo como fui tratado pelos do basquete principalmente nos últimos anos, afinal de contas, tenho que entender que minha maneira de ver o jogo não é a ideal para o basquete brasileiro. Nunca foi”.

– “Não culpo pessoas pelo tratamento quase sempre desrespeitoso que recebi por ter acreditado e lutado pelo ‘meu basquete’.”

– “Tudo o que alcancei e vivi no basquete, me deu o direito de também tratá-lo como sempre fiz: verdade acima de tudo, amor incondicional e luta pelo que acreditava ser o que sempre chamei de ‘o bom basquete’. Aquele jogado dentro da quadra, treinado à exaustão e aperfeiçoado em horas sem fim de treinamento individualizado (eu sozinho dentro do ginásio).”

De quem são as palavras destacadas? Marcel de Souza.

O novo técnico do Pinheiros.

Há dois anos praticamente exatos – faltam dois dias apenas para cravar –, saía no site Databasket a suposta despedida do basquete deste grande jogador e personalidade, uma figura inquieta do cenário brasileiro. E aqui estamos, neste sábado, repercutindo o anúncio de sua contratação, como sucessor de Claudio Mortari.

É uma agradável surpresa.

Com um elenco que vem brigando por títulos nos últimos anos, o clube paulista novamente se permite inovar ao escolher seu treinador. E diz muito sobre o basquete nacional que um estudioso declarado da modalidade, personagem histórico da seleção brasileira, possa ser considerado uma opção fora da caixa, diferente, diante da insossa dança de cadeiras que nos acostumamos a ver, com os mesmos nomes de sempre rodando fazendo ciranda, lá e cá.

Mortari foi a 'aposta' anterior do Pinheiros

Mortari foi a ‘aposta’ anterior do Pinheiros

Antes, o nome de Claudio Mortari já havia causado um certo espanto no meio, como um ser jurássico redescoberto. Não posso dizer que apreciei de modo incondicional o que sua equipe praticou em quadra nos últimos anos. Vieram títulos importantes e inéditos, resultados dignos de elite, mas com um estilo de jogo que assumiu muito das precipitações e loucuras a que já nos habituamos. De qualquer forma, sem prever exatamente o que viria a acontecer, valia a aposta.

Era um campeão mundial, oras. E, por mais que o jogo tenha mudado drasticamente em aspectos físicos, não dá para falar em “conceitos ultrapassados” neste esporte – grandes defesas e grandes ataques já existiram lá atrás. Os conceitos simplesmente são reciclados, reinventados, um instigando o outro. Em essência, o jogo é um só, com objetivos primários, em torno dos quais as diferentes cabeças vão moldar propostas, estratégias e aí, sim, se perder em pormenores essenciais para a vitória. Num cenário particular como o brasileiro, Mortari teve seus acertos e erros, não chegou exatamente a se distinguir, mas esteve longe de ser um fracasso, como tantos esperavam. Agora, de volta a um cargo administrativo, abre espaço para Marcel.

Depois de (quase) dois anos de exílio, ele retorna em uma situação que está próxima da ideal, num clube de ponta e com o qual já está familiarizado, tendo trabalhado por lá no final dos anos 90, contribuindo na transição de Guilherme Giovannoni, Marcio Cipriano e outros. A realidade do Pinheiros, em termos competitivos, porém, era outra.

Desde então, fez um belo trabalho com o São Bernardo, coordenou projetos em Jundiaí e Barueri, mas nunca teve a oportunidade de dirigir um time do NBB, por exemplo. Ele não apenas fará sua estreia no renovado campeonato nacional, como assumirá um time cheio de ambições – e com mais jovens extremamente talentosos para ajudar a lapidar.

Um Pinheiros diferente no retorno de Marcel

Um Pinheiros diferente no retorno de Marcel

É difícil entender o isolamento de um dos grandes ídolos de sua geração, mas é fácil explicar. Embora não seja afeito ao corporativismo vigente, o (ex-?) doutor ao mesmo tempo simplesmente ama o jogo  – daí que o anúncio de sua despedida em 2012 já soava um tanto duvidoso… É difícil largar a coisa, mesmo que frustrações, correria ou atropelos da vida possam empurrar nessa direção. Para quem não estava acompanhando, o craque já havia tornado a escrever Todas as Cestas(-feiras) sobre o jogo, com pauta diversificada e rica. Sem necessariamente apontar alvos, vai dar seus pitacos – e até mesmo gravar e jogar na internet um funk –, e, na vidinha pacata e arraigada do basquete brasileiro, isso não pega lá muito bem, tal como acontece com Paulo Murilo no Basquete Brasil.

Há muita gente por aí que simplesmente tem dificuldade de entender que um indivíduo possa exercer o direito de pensar por conta própria e expor aquilo que sente ou pondera sobre atos aparentemente banais como atirar uma bola ao cesto – além, claro, claro, dos muitos detalhes que precedem o chuá ou um airball. O diretor João Fernando Rossi, do Pinheiros, pelo visto, não se importa com isso. Leitor do articulista do Databasket e alguém que sabe valorizar a história da modalidade, enxergando possibilidades além do que o mercado rotineiro oferece, teve uma boa sacada.

É sempre muito cuidado com a rotina, pois ela realmente pode te engolir. Não dá para ser abelhudo a ponto de questionar a paixão de Marcel por clinicar, mas o certo é que o certificado do CRM estará sempre ao alcance.  Ao menos ele agora poderá mudar de ares um pouco, o que sempre faz bem. A expectativa fica para ver o quanto ele pode alterar, agora com os devidos recursos, o que vemos em quadra e há tempos pede uma chacoalhada.


Dois finalistas, duas jornadas diferentes na Europa, um título marcante
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Giancarlo Giampietro

O show do Real Madrid

O show do Real Madrid

O que dá mais confiança? Um atropelo contra seu arquirrival ou uma vitória de virada com cesta nos últimos segundos? Difícil dizer, ainda mais para quem acompanhou os dois belos jogos desta sexta-feira pela semifinal da Euroliga, mas o certo é que Real Madrid e Maccabi Tel Aviv vão para a decisão de peito estufado, em busca de uma conquista marcante.

Aí você fala: “Ô, cara, e que título não seria marcante? Seu bobo alegre”.

Tudo bem, tudo bem, pode falar.

Mas é que realmente há razões muitas razões para ambos os finalistas celebrarem, para tornar o troféu a ser entregue no domingo mais especial do que o normal.

O Real, por exemplo. A equipe jogou o basquete mais bonito, vistoso e, ao mesmo tempo, eficiente de toda a temporada. E pode incluir aqui NBA, ACB, NBB e qualquer sigla de sua preferência. Os caras cumprem uma temporada histórica, cheia de brilho, que merece todos os troféus possíveis para completá-la. Se for para interromper um jejum que já dura 18 anos, tanto melhor – a última vez que conquistaram o continente foi em 1995, e pensar que a turma do futebol merengue reclama que a Champions não sai desde 2002…

Nesta sexta, no segundo jogo do dia, os madridistas aplicaram mais uma clínica gratuita e impiedosa, vencendo seu confronto por inacreditáveis 100 a 62. Já seria um placar absurdo contra qualquer oponente, o maior em semifinais da Euroliga. Mas quando você sabe que o Barcelona estava do outro lado, as coisas ganham contornos épicos – também foi o maior em Superclássicos em competições europeias, superando os 21 pontos na temporada 1993-94.

Esse é um termo que tem corrido um sério risco de cair num poço banal. Qualquer coisa hoje é épica, qualquer zé mané pode ser eleito um mito graças a uma pedrinha atirada de modo que ela quique na água sem afundar. Mas se a gente pega um Real que chegou a vencer 31 partidas consecutivas e já ganhou a Supercopa e a Copa do Rei em solo espanhol, com ambas as finais contra o mesmo Barça, e soma nessa conta o atropelo cometido em Milão, tudo fica muito grandioso, mesmo.

O Real, a essa altura, luta muito mais do que pelo título. O time de Pablo Laso luta para estourar a porta da história, entrando com tudo, como Cosmo Kramer costumava entrar no apartamento do Jerry. Com pompa e de modo estrondoso. Não será apenas uma equipe listada em meio a tantos outros campeões. Será um grupo relembrado para sempre, mesmo que não consigam repetir taças e o mesmo rendimento avassalador nas próximas campanhas.

O que não quer dizer que não houvesse um suspense para mais um duelo com o Barça em Milão. Marcelinho Huertas e seus companheiros haviam acabado de bater seu principal oponente no fim de semana passado, interrompendo uma sequência de três triunfos dos merengues.

Foi uma vitória com alguns asteriscos (Felipe Reyes, um líder e ainda um baita jogador, não jogou e Rudy Fernandez foi excluído por duas faltas técnicas e o Real tinha a liderança da liga nacional assegurada), é verdade, mas era algo que com o devido contexto colocava o favoritismo do clube blanco em dúvida. Afinal, o Barcelona já havia feito a melhor campanha do Top 16 da Euroliga e vinha numa arrancada na Liga ACB, com o maior saldo de cestas das últimas dez rodadas. Além disso, eles surraram o Real em quadra – embora o placar final tenha sido de 86 a 75, durante a partida a vantagem chegou aos 20 pontos. Tudo isso fazia a semifinal continental ainda mais e mais e mais interessante.

No primeiro quarto, um empate por 20 a 20 aumentava a tensão. O Real apresentou um ataque travado por uns seis, sete minutos – com um jogo atipicamente individualista, com poucas trocas de passes e precipitações na hora de concluir. Do outro lado, a equipe cometia muitas faltas, dando ao adversário o luxo de bater lances livres já a partir da marca de 6 minutos, enquanto Huertas brilhava em suas conexões com Ante Tomic.

Até que Laso chamou do banco de reservas seu MVP, Sergio Rodríguez, um pouco mais cedo do que o usual. E o panorama da partida se alterou drasticamente. O barbudo botou pressão para cima do armador brasileiro, levou ainda mais vantagem contra Victor Sada, e a intensidade de seu time começou a entrar nos conformes. Reyes e o tunisiano Salah Mejri também deram um bom empurrão na equipe, enquanto Nikola Mirotic atacava de modo exuberante, deixando qualquer pessoa ligada ao Chicago Bulls com água na boca.

O primeiro tempo terminou com uma vantagem já mais confortável, de oito pontos (47 a 35), mas era muito difícil prever o que viria a acontecer na segunda etapa. O Barça não conseguiu marcar mais de 14 pontos nos dois quartos, enquanto o Real acumulou 28 e 27. Um espanco, como diria Maurício Bonato. E as pancadas vinham de todos os lados.

Rodríguez foi mais uma vez fenomenal, 21 pontos em 20min51s, sem falar do aproveitamento de 4-5 (80%) nos chutes de três e as seis assistências, dos sete lances livres cavados e toda encheção que ele causa na defesa. Mirotic terminou com 19 pontos em 24 minutos, matando 6 de 8 arremessos de quadra e também foi presença constante na linha de bonificação. Reyes, Sergio Llull e um contido Rudy Fernández também superaram os 11 pontos. Só o caçula Daniel Diez, que entrou em quadra nos últimos 3min21s não fez cesta. Mais números: 60,5% nos chutes de dois (contra 43,6%), 48,3% de três, num número elevado de tentativas, 29, mas com bolas majoritariamente equilibradas (contra 27,8%) e 17 assistências para meros oito turnovers.

Os atletas do Barcelona perderam a compostura em quadra, ficaram desnorteados. Foi um nocaute literalmente técnico. Ainda tentaram apelar para a catimba e algumas faltas mais duras aqui e ali. Kostas Papanikolau, que lutava pelo tricampeonato, chutou a placa de publicidade e bateu boca com torcedores. Ficou feio.

Então percebem como esse título seria algo maravilhoso para o Real, né?

Tyrice Rice e Alex Tyus, decisivos no quarto período em vitória incrível

Tyrice Rice e Alex Tyus, decisivos no quarto período em vitória incrível

Agora, o Maccabi também te seus argumentos. Em Israel, estão acostumados a reinar de modo absoluto, mas ultimamente alguns concorrentes impertinentes vêm dando trabalho. No ano passado, o Maccabi Haifa, liderado por Gael Mekel – hoje reserva do Mavs –, ousou destroná-los na liga nacional. Nesta temporada, o time azul e amarelo ocupa a liderança, mas constantemente pressionado. É algo que incomoda, muito. Mas muito mesmo. Quase como uma nuvem de pernilongos carniceiros.

Em meio a esse desconforto, o clube chegou a perder quatro partidas seguidas – entre liga israelense e Euroliga –, e houve, acredite, quem especulasse ou pedisse a demissão de David Blatt. Algo inconcebível. Para ver como ficam mal-acostumados com o sucesso.

Pois bem. Sofrendo um pouco, o Maccabi conseguiu se desvencilhar de Bayern de Munique e Lokomotiv Kuban, e avançou aos mata-matas com a terceira colocação de seu grupo no Top 16, atrás de CSKA e Real. Nas quartas, derrubaram o Olimpia Milano para assumirem a condição de estraga-prazeres oficial do torneio continental, tirando os anfitriões do Final Four da competição, numa série encerrada em 3-1, mas com jogos duríssimos.

Mesmo os jornalistas locais mais camaradas admitem que este elenco de Blatt é o mais fraco do time de Tel Aviv a chegar ao Final Four nos últimos anos. De qualquer forma, depois de algumas semanas de turbulência, conseguiram se colocar entre os quatro melhores, encerrando um intervalo de dois anos.

Contra o CSKA, eu os colocava como azarões. E por três quartos o time moscovita fez valer esse palpite, chegando a abrir 15 pontos no placar. Na parcial final, no entanto, o armador Tyrese Rice, mais uma dessas formiguinhas atômicas – quase xará e sósia de Ty Lawson –, resolveu barbarizar. O baixinho se esbaldou contra Milos Teodosic, invadindo o garrafão russo quando bem entendia. De pouquinho em pouquinho, seja com suas bandejas ou com os rebotes ofensivos de Alex Tyus – livre, uma vez que os pivôs tinham de sair para tentar bloquear Rice, e a rotação defensiva de Ettore Messina não estava afiada o bastante para reagir rapidamente.

Aliás, um parêntese: após o fiasco de Zeljko Obradovic com seu milionário e caótico Fenerbahçe, dessa vez foi a vez de outra lenda viva do basquete europeu patinar. Um tanto impaciente durante a temporada, soltando os cachorros a toda hora, especulado como possível alvo do Utah Jazz, Messina claramente não soube potencializar todo o talento que tinha ao seu dispor. E, neste quarto período, deixou as coisas saírem totalmente de controle.

Demorou a pedir tempo, fez poucos ajustes e não encontrou um meio de frear Rice. Está certo que o armador Aaron Jackson, um defensor muito mais indicado que Teodosic, foi retirado lesionado nos minutos decisivos. Mas não há muitas desculpas além dessa para justificar o colapso do CSKA. Até que o mesmo Rice fez a cesta da vitória a 5s5 do fim, aproveitando-se de um desperdício de posse de bola infantil dos oponentes, com Victor Khryapa entregando o ouro bandido (aliás, valeu, Czar! A reputação agradece…). O clube russo ainda conseguiu deixar Sonny Weems (fora de sintonia no ataque, talvez cansado por perseguir Rick Hickman na defesa, anulando mais um dos destaques da fase final apontado por um certo bobão) livre na linha de três para um último chute, em vão.

O Maccabi perdeu o jogo praticamente todo e, completamente desacredito, aqui está na decisão. Então não há como eles não acreditarem que o título é possível, mesmo que o Real Madrid tenha feito uma apresentação soberba logo na sequência.

Confiança é uma coisa complicada, da qual não se pode duvidar. Pode equilibrar as coisas entre uma máquina de fazer cestas e um patinho feio nada pelas beiradas.

Se for para dar um palpite, fico mesmo com o Real. Só não digam aos rapazes de David Blatt que seria mais justo que a taça fosse para os espanhóis. Aos trancos e barrancos, também se constrói uma história marcante.


Em quem ficar de olho no F4 da Euroliga: Ante Tomic motivado
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Giancarlo Giampietro

E quem se lembra de um Tomic merengue sem energia?

E quem se lembra de um Tomic merengue sem energia?

Para quem ainda não está farto de tanta emoção, com o que se vem passando nos playoffs completamente alucinantes da NBA e com tantas surpresas no NBB, então é hora de abrir os braços para uma carga extra de drama – e basquete refinado – neste fim de semana. Mais especificamente na sexta-feira e domingo, com o Final Four da Euroliga.

A gente pode falar de Barcelona e Real Madrid, que fazem mais um clássico de matar, ou das constantes potências CSKA e Maccabi, que história não falta. Na verdade, vamos tratar desses clubes, sim, entre hoje e amanhã. Mas, antes, prefiro gastar um tempo com os protagonistas em quadra.

Sim, os melhores jogadores do mundo, inclusive os europeus, estão do outro lado do Atlântico. Parker, Nowitzki, irmãos Gasol, Pekovic, Gortat e tantos mais. Mas não quer dizer que o segundo maior torneio de clubes do mundo fique só com as sobras. Há diversos atletas que assinariam contratos na NBA sem a menor dificuldade, sendo peças relevantes, mas que, por circunstâncias diversas – entre as quais se destaca invariavelmente a adoração de fanáticas torcidas e alguns milhões de euros na conta –, seguem jogando perto de casa.

Navarro e sua breve parceria com Pau Gasol em Memphis. Frustração

Navarro e sua breve parceria com Pau Gasol em Memphis. Frustração

Peguem, por exemplo, Juan Carlos Navarro. Desnecessário falar sobre o currículo, a reputação e o talento de La Bomba. Em sua única temporada nos Estados Unidos, ele não chegou a ser maltratado como Vassilis Sponoulis foi por Jeff Van Gundy em Houston, mas sofreu demais em um ano perdido do Memphis (60 derrotas!), no hiato entre os times de Hubbie Brown e Lionel Hollins. Ainda viu seu grande amigo Pau Gasol ser trocado. Um ano depois, correu de volta para Barcelona, aonde é rei, talvez chocado com a barbárie.

Este é um caso emblemático. Mas há diversos nessa linha: Erazem Lorbek, cortejado pelo Spurs ano após ano, mas que segue no Barça; Dimitris Diamantidis, o mito alviverde do Panathinaikos; Nikola Mirotic, o segundo grande sonho de qualquer torcedor do Bulls que se preze (o primeiro, claro, sendo um Derrick Rose 100%); sem contar os diversos americanos ignorados pelos Drafts da vida, mas que construíram e lapidaram toda uma carreira no velho mundo (Keith Langford, Daniel Hackett, Joey Dorsey, Ricky Hickman, Tremmell Darden, Aaron Jackson, Bryan Dunston etc. Etc. Etc).

Não dá para cravar que todos eles seriam bem-sucedidos num ambiente muito mais exigente do ponto de vista atlético, em que suas façanhas europeias talvez sejam ignoradas, tendo eles que batalhar novamente a partir do zero por respeito e o decorrente tempo de quadra. Dependeria muito da franquia, da diretoria e, claro, do técnico – sem contar a adaptação muitas vezes complicada, como Tiago Splitter e Mirza Teletovic podem testemunhar.

Há que prefira, então, evitar o risco, ficando numa zona de conforto, já bem remunerado. Mas também há aqueles que são simplesmente subestimados, mesmo, não vendo a hora de receber uma boa proposta, mas sem necessariamente estarem dispostos a assinar pelo salário mínimo da NBA, como fez Pablo Prigioni em seu primeiro ano de Knicks, já na reta final da carreira.

Pensando apenas nos quatro semifinalistas, vamos listar abaixo alguns craques que merecem ser observados com atenção, mas sem a menor preocupação se dariam certo ou não na NBA. Bons o suficiente para serem apreciados pelos que já fazem agora. Essa é uma lista que já deveria ter sido escrita antes, para relembrar o belíssimo campeonato que fez Andrés Nocioni, a versatilidade da dupla Emir Preldzic e Nemanja Bjelica, do Fenerbahce, o próprio Dunston, vigoroso pivô do Olympiakos, eleito o melhor defensor da temporada, o jovem italiano Alessandro Gentile, revelação do Olimpia Milano e candidato ao Draft deste ano, e muito mais.

Antes de chegar aos caras, um lembrete para contextualizar: para os que estão (bem) mais acostumados com a NBA, lembrem que o basquete Fiba é jogado em 40 minutos, e não 48. Logo, o tempo de quadra de uma partida da liga norte-americana é 20% maior, de modo que as estatísticas em geral são mais infladas por lá, fazendo alguns dos números abaixo parecerem tímidos. Além disso, a abordagem ofensiva das equipes de ponta da Europa tende a ser diferente, com mais jogadores assumindo responsabilidades, dividindo a bola, mesmo as que têm grandes cestinhas, que poderiam muito bem carregar um time nas costas.

E, ok, aqui entra o momento da propaganda: o evento será transmitido com exclusividade pelo Sports+, canal 28/128 da SKY, com este blogueiro lelé na equipe de equipe, ao lado do ultrafanático e informado Ricardo Bulgarelli e os narradores Maurício Bonato, Rafael Spinelli e Marcelo do Ó, que, cada um ao seu modo, ajudam a dar emoção ao jogo.

Vamos lá, enfim, a alguns destaques do F4, sem necessariamente ser os melhores do campeonato, mas apenas uma lista que dá na telha. Free style, mano, com pílulas publicadas nos próximos dias:

– Ante Tomic, pivô do Barcelona.
11,8 ppj, 6,3 rpj, 2,2 apj, 63,3% de 2 pts, 68,4% nos lances livres em 22 mpj.

E o que você faz quando é dispensado – e, de certa forma, humilhado – publicamente pelo Real Madrid?

O clube merengue não estava lá muito satisfeito com o espírito competitivo de Ante Tomic e resolveu exercer uma cláusula contratual para romper seu vínculo com o pivô croata um ano mais cedo.

Veja este trecho de reportagem do diário As: “Sua falta de energia tapou suas virtudes inquestionáveis, e o Real Madrid preferiu não seguir contando com um jogador que não ofereceu os níveis de energia necessários que a equipe precisava nem sequer em partidas da final que o Real Madrid perdeu ante um Barcelona muito concentrado em seu jogo interior”.

Ok, não foi o técnico Pablo Laso que escreveu o texto, ou nenhum diretor do clube. Mas a gente conhece a relação quase simbiótica entre os jornais da capital e os poderosos do Real. Dá, quase, para assumir como discurso oficial.

Então, Tomic, o que fazer?

Ué, assinar com o Barcelona, claro. E, melhor, arrebentar pelo arquirrival.

Desde que deixou a capital espanhola, migrando para o sul, o pivô adquiriu uma bem-vinda consistência. Nada como boa rodagem e experiência – e uma motivação a mais. É quando você vê o potencial ser concretizado, quando muito, ou tudo, do que se projeta para um jogador acontece começa a acontecer em quadra, até que parece algo praticamente automático – a ponto de ter sido o MVP dos meses de fevereiro e março – em sequência, mesmo, algo que nunca havia acontecido antes na história da liga.

Aos 27 anos, o croata de 2,17m sabe bem o que fazer quando acionado, confiante em produzir como a primeira opção ofensiva do Barcelona. Há momentos em que talvez ele pudesse ser ainda mais explorado, mas esse é o “preço a se pagar” (nem precisa de tanto drama, vai?) individualmente por fazer parte de um dos elencos mais caros e competitivos do continente, cheio de cestinhas de prestígio.

Já fiz essa comparação antes, e ela parece ainda mais válida depois de mais uma temporada: em diversos movimentos, Tomic vai lembrar Pau Gasol, um dos últimos grandes ídolos do clube catalão, especialmente pelo biótipo esguio e até por seu comportamento calmo em quadra – que muitas vezes pode ser interpretado, precipitadamente, como complacência. Seu tiro de média distância precisa ser marcado, embora seja muito mais eficiente num raio de dois ou três passos, usando sua envergadura, embora não tenha tantas alternativas assim (em tremos de sequência de fintas, para abrir mais espaço no garrafão). A visão de jogo e capacidade para servir seus companheiros tanto na cabeça do garrafão como próximo da tabela, de costas para o aro, também vem melhorando a cada ano, chegando a 2,2 assistências por jogo neste ano. Ajuda, nesse sentido, o fato de ter sido desenvolvido como um jogador de perímetro, antes de dar aquela espichada no fim da adolescência.

Sua química com Marcelinho Huertas está num ponto excelente. Com seus braços compridões, vira um alvo fácil para pontes aéreas, mesmo que ele não seja daqueles atletas que castiguem o aro – melhor deixar isso para o Joey Dorsey, mesmo. O legal é quando os dois trocam favores, com o pivô passando para o brasileiro em handoffs, ou com passes por cima dos marcadores para acertar o brasileiro em cortes por trás da defesa.

Hoje, na real, o melhor jeito de parar o pivô do Barcelona é tentar atacá-lo com agressividade do outro lado da quadra, para tentar carregá-lo de faltas (2,7 por jogo). Para alguém de sua estatura, o croata se mexe bem pelo garrafão, mas ainda vai ser vulnerável diante de armadores e laterais numa troca de pick and roll. O difícil é escolher a melhor hora de buscar a infiltração, uma vez que Xavier Pascual arma uma defesa bem compacta, fechando espaços.

Tomic se tornou sem dúvida o principal pivô do basquete europeu, com o terceiro maior índice de eficiência da competição. Algo que a Euroliga confirma, elegendo o atleta como o melhor da posição nos últimos dois campeonatos. É esse o craque que o Real vai ter de encarar mais uma vez.

Seu contrato vai até 2015. O próximo passo natural seria a NBA, na qual ja á foi draftado pelo Utah Jazz em 2008, num daqueles stash picks, na 44ª posição. Mas resta saber se Tomic toparia. Para quem sai de Real para Barça diretamente, não acho que tenha receio de desafios.


Em quem ficar de olho no F4 da Euroliga: Hickman e sua jornada
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Giancarlo Giampietro

Ricky Hickman, Maccabi Tel Aviv, Euroliga

Para quem ainda não está farto de tanta emoção, com o que se vem passando nos playoffs completamente alucinantes da NBA e com tantas surpresas no NBB, então é hora de abrir os braços para uma carga extra de drama – e basquete refinado – neste fim de semana. Mais especificamente na sexta-feira e domingo, com o Final Four da Euroliga.

A gente pode falar de Barcelona e Real Madrid, que fazem mais um clássico de matar, ou das constantes potências CSKA e Maccabi, que história não falta. Na verdade, vamos tratar desses clubes, sim, entre hoje e amanhã. Mas, antes, prefiro gastar um tempo com os protagonistas em quadra.

Sim, os melhores jogadores do mundo, inclusive os europeus, estão do outro lado do Atlântico. Parker, Nowitzki, irmãos Gasol, Pekovic, Gortat e tantos mais. Mas não quer dizer que o segundo maior torneio de clubes do mundo fique só com as sobras. Há diversos atletas que assinariam contratos na NBA sem a menor dificuldade, sendo peças relevantes, mas que, por circunstâncias diversas – entre as quais se destaca invariavelmente a adoração de fanáticas torcidas e alguns milhões de euros na conta –, seguem jogando perto de casa.

Navarro e sua breve parceria com Pau Gasol em Memphis. Frustração

Navarro e sua breve parceria com Pau Gasol em Memphis. Frustração

Peguem, por exemplo, Juan Carlos Navarro. Desnecessário falar sobre o currículo, a reputação e o talento de La Bomba. Em sua única temporada nos Estados Unidos, ele não chegou a ser maltratado como Vassilis Sponoulis foi por Jeff Van Gundy em Houston, mas sofreu demais em um ano perdido do Memphis (60 derrotas!), no hiato entre os times de Hubbie Brown e Lionel Hollins. Ainda viu seu grande amigo Pau Gasol ser trocado. Um ano depois, correu de volta para Barcelona, aonde é rei, talvez chocado com a barbárie.

Este é um caso emblemático. Mas há diversos nessa linha: Erazem Lorbek, cortejado pelo Spurs ano após ano, mas que segue no Barça; Dimitris Diamantidis, o mito alviverde do Panathinaikos; Nikola Mirotic, o segundo grande sonho de qualquer torcedor do Bulls que se preze (o primeiro, claro, sendo um Derrick Rose 100%); sem contar os diversos americanos ignorados pelos Drafts da vida, mas que construíram e lapidaram toda uma carreira no velho mundo (Keith Langford, Daniel Hackett, Joey Dorsey, Ricky Hickman, Tremmell Darden, Aaron Jackson, Bryant Dunston etc. Etc. Etc).

Não dá para cravar que todos eles seriam bem-sucedidos num ambiente muito mais exigente do ponto de vista atlético, em que suas façanhas europeias talvez sejam ignoradas, tendo eles que batalhar novamente a partir do zero por respeito e o decorrente tempo de quadra. Dependeria muito da franquia, da diretoria e, claro, do técnico – sem contar a adaptação muitas vezes complicada, como Tiago Splitter e Mirza Teletovic podem testemunhar.

Há que prefira, então, evitar o risco, ficando numa zona de conforto, já bem remunerado. Mas também há aqueles que são simplesmente subestimados, mesmo, não vendo a hora de receber uma boa proposta, mas sem necessariamente estarem dispostos a assinar pelo salário mínimo da NBA, como fez Pablo Prigioni em seu primeiro ano de Knicks, já na reta final da carreira.

Pensando apenas nos quatro semifinalistas, vamos listar abaixo alguns craques que merecem ser observados com atenção, mas sem a menor preocupação se dariam certo ou não na NBA. Bons o suficiente para serem apreciados pelos que já fazem agora. Essa é uma lista que já deveria ter sido escrita antes, para relembrar o belíssimo campeonato que fez Andrés Nocioni, a versatilidade da dupla Emir Preldzic e Nemanja Bjelica, do Fenerbahce, o próprio Dunston, vigoroso pivô do Olympiakos, eleito o melhor defensor da temporada, o jovem italiano Alessandro Gentile, revelação do Olimpia Milano e candidato ao Draft deste ano, e muito mais.

Antes de chegar aos caras, um lembrete para contextualizar: para os que estão (bem) mais acostumados com a NBA, lembrem que o basquete Fiba é jogado em 40 minutos, e não 48. Logo, o tempo de quadra de uma partida da liga norte-americana é 20% maior, de modo que as estatísticas em geral são mais infladas por lá, fazendo alguns dos números abaixo parecerem tímidos. Além disso, a abordagem ofensiva das equipes de ponta da Europa tende a ser diferente, com mais jogadores assumindo responsabilidades, dividindo a bola, mesmo as que têm grandes cestinhas, que poderiam muito bem carregar um time nas costas.

E, ok, aqui entra o momento da propaganda: o evento será transmitido com exclusividade pelo Sports+, canal 28/128 da SKY, com este blogueiro lelé na equipe de equipe, ao lado do ultrafanático e informado Ricardo Bulgarelli e os narradores Maurício Bonato, Rafael Spinelli e Marcelo do Ó, que, cada um ao seu modo, ajudam a dar emoção ao jogo.

Vamos lá, enfim, a alguns destaques do F4, sem necessariamente ser os melhores do campeonato, mas apenas uma lista que dá na telha. Free style, mano, com pílulas publicadas nos próximos dias:

Ricky Hickman, armador do Maccabi Tel Aviv. 
28 anos, 12,8 ppj, 2,8 apg, 52,1% de 2 pts

Em Tel Aviv, é verdade: qualquer jogador que vista a camisa do Maccabi já pode ser considerado um astro. Nem que o apelo seja apenas local. Para Ricky Hickman, não importa nenhum asterisco, nem nada disso. A partir do momento em que assinou com a superpotência israelense em 2012, relevando algumas propostas financeiras mais atraentes, as coisas enfim passaram a fazer sentido, depois do tanto que remou. Agora, dois anos depois, no Final Four da Euroliga, é hora de curtir o basquete em alto nível.

Ok, para ser mais justo, vale dizer que o armador já havia disputado, na temporada anterior, o All-Star Game da Lega Basket, a liga italiana de pallanacestro. Um campeonato que já foi mais vistoso, mas que ainda merece o respeito. Mas chegar, enfim, a um clube de Euroliga, ainda mais um com essa tradição, era enfim a ratificação do sucesso em sua carreira. Depois de muita espera.

Vejam este currículo: PVSK Pecs na Hungria em 2007; em novembro do mesmo ano, transferência para o CS Otopeni Bucareste. Terminada a campanha, rumbora para  a Alemanha, nem que seja para defender time B do BG 74 Göttingen, numa liga regional. Em dezembro de 2008, assina-se, então, o Giessen 46ers, que hoje está na segunda divisão do país.

(Aqui vale um parêntese para falar sobre o Giessen: os caras já foram de elite e ganharam cinco títulos nacionais, o último nos anos 70, porém. Em seu perfil de Wikipedia, no entanto, o orgulho fica pelo fato de o clube ter contado com o pivô americano Kevin Nash em seu elenco.

Kevin quem? Nash, hoje um astro da luta livre “profissional”, mas que foi pivô lá atrás. Jogou pela universidade do Tennessee, onde se formou em psicologia e da qual foi expulso em 1980 por ter, claro, saído na mão com o técnico Don DeVoe. Largou, então, a NCAA e foi jogar por dinheiro, até se aposentar em 81, defendendo o 46ers, devido a uma lesão no joelho. Aproveitou a estadia na cidade de Giessen e se alistou em uma base americana, servindo por dois anos com tropas da OTAN. Como se não bastasse, também trabalhou numa linha de produção da Ford e foi gerente de um clube de strip. Até entrar para o fantástico mundo da luta livre. Fim de um longo parêntese completamente absurdo, voltamos ao currículo, diabos.)

Ricky Hickman, versão Finlândia

Ricky Hickman, versão Finlândia

Se as coisas não ficam tão bem em tablado germânico, que se mude então para a Finlândia, para defender o Namika Lahti (prazer em conhecê-lo. Aí, em 2010-11, torna descer a Europa novamente, agora para a Itália, na Segundona de novo, pelo Junior Casale. Em 2011-12, enfim, hora de brilhar em um campeonato decente, pelo Scavolini Pesaro, na elite italiana. Foi essa a trajetória de Hickman até aqui. Imagine quantos já não teriam largado as coisas na hora de jogar uma liga amadora alemã…

Pelo Pesaro, Hickman foi para o jogo das estrelas, mas foi seu compatriota e companheiro de time, o acrobático e um tanto errático James White, quem foi agraciado com o grande salto, assinando com o New York Knicks.  Sua recompensa, contudo, veio logo em sequência.

No Maccabi, o americano tem um papel um pouco parecido com o de Vasilis Spanoulis no Olympiakos, ou Juan Carlos Navarro no Barcelona, embora com estilo diferente. Ele é uma válvula de desafogo para o ataque, produzindo muito bem no mano a mano, com habilidade no drible e um primeiro passo avantajado. Só não peçam, contudo, que mate o jogo de três. Seu aproveitamento em dois anos de Euroliga é de apenas 33,8%. Não chega a ser péssimo, ainda mais que muitos chutes são contestados ou em situações de pressão, contra o cronômetro.

Mas é que esse jogador – que também consta da lista de estrangeiros com passaportes fantasiosos, tendo defendido a Geórgia no último Eurobasket, sem, contudo, se chamar Hickmanoshivili –. rende muito mais quando bate para a cesta, quebrando a primeira linha defensiva e bagunçando o sistema adversário.

A partir de suas infiltrações, ele chama a ajuda dos defensores e abre a quadra para os diversos chutadores que David Blatt gosta de escalar. É isso que o brilhante treinador espera de seu armador, especialmente quando Sofoklis Schortsanitis estiver respirando – ou transpirando – no banco de reservas. Agressividade e responsabilidade. Para quem já passou por tanta coisa na carreira, não há o menor problema.


Em quem ficar de olho no F4 da Euroliga: o MVP Rodríguez
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Giancarlo Giampietro

Sergio Rodríguez, Real Madrid, Espanha, barba

Para quem ainda não está farto de tanta emoção, com o que se vem passando nos playoffs completamente alucinantes da NBA e com tantas surpresas no NBB, então é hora de abrir os braços para uma carga extra de drama – e basquete refinado – neste fim de semana. Mais especificamente na sexta-feira e domingo, com o Final Four da Euroliga.

A gente pode falar de Barcelona e Real Madrid, que fazem mais um clássico de matar, ou das constantes potências CSKA e Maccabi, que história não falta. Na verdade, vamos tratar desses clubes, sim, entre hoje e amanhã. Mas, antes, prefiro gastar um tempo com os protagonistas em quadra.

Sim, os melhores jogadores do mundo, inclusive os europeus, estão do outro lado do Atlântico. Parker, Nowitzki, irmãos Gasol, Pekovic, Gortat e tantos mais. Mas não quer dizer que o segundo maior torneio de clubes do mundo fique só com as sobras. Há diversos atletas que assinariam contratos na NBA sem a menor dificuldade, sendo peças relevantes, mas que, por circunstâncias diversas – entre as quais se destaca invariavelmente a adoração de fanáticas torcidas e alguns milhões de euros na conta –, seguem jogando perto de casa.

Navarro e sua breve parceria com Pau Gasol em Memphis. Frustração

Navarro e sua breve parceria com Pau Gasol em Memphis. Frustração

Peguem, por exemplo, Juan Carlos Navarro. Desnecessário falar sobre o currículo, a reputação e o talento de La Bomba. Em sua única temporada nos Estados Unidos, ele não chegou a ser maltratado como Vassilis Sponoulis foi por Jeff Van Gundy em Houston, mas sofreu demais em um ano perdido do Memphis (60 derrotas!), no hiato entre os times de Hubbie Brown e Lionel Hollins. Ainda viu seu grande amigo Pau Gasol ser trocado. Um ano depois, correu de volta para Barcelona, aonde é rei, talvez chocado com a barbárie.

Este é um caso emblemático. Mas há diversos nessa linha: Erazem Lorbek, cortejado pelo Spurs ano após ano, mas que segue no Barça; Dimitris Diamantidis, o mito alviverde do Panathinaikos; Nikola Mirotic, o segundo grande sonho de qualquer torcedor do Bulls que se preze (o primeiro, claro, sendo um Derrick Rose 100%); sem contar os diversos americanos ignorados pelos Drafts da vida, mas que construíram e lapidaram toda uma carreira no velho mundo (Keith Langford, Daniel Hackett, Joey Dorsey, Ricky Hickman, Tremmell Darden, Aaron Jackson, Bryan Dunston etc. Etc. Etc).

Não dá para cravar que todos eles seriam bem-sucedidos num ambiente muito mais exigente do ponto de vista atlético, em que suas façanhas europeias talvez sejam ignoradas, tendo eles que batalhar novamente a partir do zero por respeito e o decorrente tempo de quadra. Dependeria muito da franquia, da diretoria e, claro, do técnico – sem contar a adaptação muitas vezes complicada, como Tiago Splitter e Mirza Teletovic podem testemunhar.

Há que prefira, então, evitar o risco, ficando numa zona de conforto, já bem remunerado. Mas também há aqueles que são simplesmente subestimados, mesmo, não vendo a hora de receber uma boa proposta, mas sem necessariamente estarem dispostos a assinar pelo salário mínimo da NBA, como fez Pablo Prigioni em seu primeiro ano de Knicks, já na reta final da carreira.

Pensando apenas nos quatro semifinalistas, vamos listar abaixo alguns craques que merecem ser observados com atenção, mas sem a menor preocupação se dariam certo ou não na NBA. Bons o suficiente para serem apreciados pelos que já fazem agora. Essa é uma lista que já deveria ter sido escrita antes, para relembrar o belíssimo campeonato que fez Andrés Nocioni, a versatilidade da dupla Emir Preldzic e Nemanja Bjelica, do Fenerbahce, o próprio Dunston, vigoroso pivô do Olympiakos, eleito o melhor defensor da temporada, o jovem italiano Alessandro Gentile, revelação do Olimpia Milano e candidato ao Draft deste ano, e muito mais.

Antes de chegar aos caras, um lembrete para contextualizar: para os que estão (bem) mais acostumados com a NBA, lembrem que o basquete Fiba é jogado em 40 minutos, e não 48. Logo, o tempo de quadra de uma partida da liga norte-americana é 20% maior, de modo que as estatísticas em geral são mais infladas por lá, fazendo alguns dos números abaixo parecerem tímidos. Além disso, a abordagem ofensiva das equipes de ponta da Europa tende a ser diferente, com mais jogadores assumindo responsabilidades, dividindo a bola, mesmo as que têm grandes cestinhas, que poderiam muito bem carregar um time nas costas.

E, ok, aqui entra o momento da propaganda: o evento será transmitido com exclusividade pelo Sports+, canal 28/128 da SKY, com este blogueiro lelé na equipe de equipe, ao lado do ultrafanático e informado Ricardo Bulgarelli e os narradores Maurício Bonato, Rafael Spinelli e Marcelo do Ó, que, cada um ao seu modo, ajudam a dar emoção ao jogo.

Vamos lá, enfim, a alguns destaques do F4, sem necessariamente ser os melhores do campeonato, mas apenas uma lista que dá na telha. Free style, mano, com pílulas publicadas nos próximos dias:

Sérgio Rodríguez, armador do Real Madrid.
Médias de 13,5 ppj, 5 apg, 1,2 bola recuperada, 50,7% de 2 pts, 48,8% de 3 pts, em 22 minutos

Já não vem de agora, mas o barbudo está jogando tão bem que não há como não escrever mais e mais sobre seu basquete. Uma vez conhecido como um clone espanhol de Jason “White Chocolate” Williams, hoje bem mais parecido com um integrante perdido do Los Hermanos, Rodríguez atingiu o ponto perfeito de seu potencial: os lances seguem vistosos, com uma eficiência avassaladora.

Pegue, por exemplo, o ranking dos dez atletas mais produtivos da temporada. Entre gigantes e gigantes – propensos a pegar mais rebotes, a tentar arremessos de maior probabilidade de acerto e, portanto, em situação vantajosa para qualquer calculadora –, o espanhol é o único armador a constar, e numa mais que honrosa segunda colocação.O único abaixo dos 2,00m de altura. Foi premiado, então, nesta quinta-feira, como o MVP da temporada. Justíssimo.

E neste caso nem é preciso recorrer a números. Quando sai do banco, Rodríguez entra no jogo para dar ainda mais velocidade e intensidade ao supertime do Real, se é que isso é possível, fazendo dupla, ou não, com seu xará Llull. Na defesa, ele põe muita pressão nas linhas de passe. No ataque, é sensacional no contragolpe, mas também traz muita lucidez em situações de meia quadra, ficando ainda mais perigoso ao elevar seu aproveitamento de 29,5% para sensacional 48,8% na linha de três pontos.

Aliás, vale sempre a ressalva, porque ainda é muito comum que jogadores e torcedores reclamem, abram o berreiro sobre o status de ser, ou não, titular. Rodríguez, o melhor da temporada, só é ‘reserva’ por questão de equilíbrio nas rotações do Real Madrid, do mesmo jeito que Manu toca a vida na NBA.

Por falar em NBA, o espanhol obviamente está cheio de propostas/sondagens. Mas não se cansa de dizer que está feliz da vida no Real, aonde encontrou estabilidade, conseguindo botar a cabeça em ordem, abrindo caminho para fazer seu talento prosperar. Coisa que não foi possível sob a direção de Nate McMillan em Portland e algo que quase aconteceu com Mike D’Antoni em Nova York.

Ah, em caso de alguma dúvida: não, sua barba não o incomoda em quadra, e, não, ele não tem planos de tirá-la tão cedo.


Em quem ficar de olho no F4 da Euroliga: Khryapa, czar dos fundamentos
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Giancarlo Giampietro

Khryapa explica como se faz

Khryapa explica como se faz

Para quem ainda não está farto de tanta emoção, com o que se vem passando nos playoffs completamente alucinantes da NBA e com tantas surpresas no NBB, então é hora de abrir os braços para uma carga extra de drama – e basquete refinado – neste fim de semana. Mais especificamente na sexta-feira e domingo, com o Final Four da Euroliga.

A gente pode falar de Barcelona e Real Madrid, que fazem mais um clássico de matar, ou das constantes potências CSKA e Maccabi, que história não falta. Na verdade, vamos tratar desses clubes, sim, entre hoje e amanhã. Mas, antes, prefiro gastar um tempo com os protagonistas em quadra.

Sim, os melhores jogadores do mundo, inclusive os europeus, estão do outro lado do Atlântico. Parker, Nowitzki, irmãos Gasol, Pekovic, Gortat e tantos mais. Mas não quer dizer que o segundo maior torneio de clubes do mundo fique só com as sobras. Há diversos atletas que assinariam contratos na NBA sem a menor dificuldade, sendo peças relevantes, mas que, por circunstâncias diversas – entre as quais se destaca invariavelmente a adoração de fanáticas torcidas e alguns milhões de euros na conta –, seguem jogando perto de casa.

Navarro e sua breve parceria com Pau Gasol em Memphis. Frustração

Navarro e sua breve parceria com Pau Gasol em Memphis. Frustração

Peguem, por exemplo, Juan Carlos Navarro. Desnecessário falar sobre o currículo, a reputação e o talento de La Bomba. Em sua única temporada nos Estados Unidos, ele não chegou a ser maltratado como Vassilis Sponoulis foi por Jeff Van Gundy em Houston, mas sofreu demais em um ano perdido do Memphis (60 derrotas!), no hiato entre os times de Hubbie Brown e Lionel Hollins. Ainda viu seu grande amigo Pau Gasol ser trocado. Um ano depois, correu de volta para Barcelona, aonde é rei, talvez chocado com a barbárie.

Este é um caso emblemático. Mas há diversos nessa linha: Erazem Lorbek, cortejado pelo Spurs ano após ano, mas que segue no Barça; Dimitris Diamantidis, o mito alviverde do Panathinaikos; Nikola Mirotic, o segundo grande sonho de qualquer torcedor do Bulls que se preze (o primeiro, claro, sendo um Derrick Rose 100%); sem contar os diversos americanos ignorados pelos Drafts da vida, mas que construíram e lapidaram toda uma carreira no velho mundo (Keith Langford, Daniel Hackett, Joey Dorsey, Ricky Hickman, Tremmell Darden, Aaron Jackson, Bryan Dunston etc. Etc. Etc).

Não dá para cravar que todos eles seriam bem-sucedidos num ambiente muito mais exigente do ponto de vista atlético, em que suas façanhas europeias talvez sejam ignoradas, tendo eles que batalhar novamente a partir do zero por respeito e o decorrente tempo de quadra. Dependeria muito da franquia, da diretoria e, claro, do técnico – sem contar a adaptação muitas vezes complicada, como Tiago Splitter e Mirza Teletovic podem testemunhar.

Há que prefira, então, evitar o risco, ficando numa zona de conforto, já bem remunerado. Mas também há aqueles que são simplesmente subestimados, mesmo, não vendo a hora de receber uma boa proposta, mas sem necessariamente estarem dispostos a assinar pelo salário mínimo da NBA, como fez Pablo Prigioni em seu primeiro ano de Knicks, já na reta final da carreira.

Pensando apenas nos quatro semifinalistas, vamos listar abaixo alguns craques que merecem ser observados com atenção, mas sem a menor preocupação se dariam certo ou não na NBA. Bons o suficiente para serem apreciados pelos que já fazem agora. Essa é uma lista que já deveria ter sido escrita antes, para relembrar o belíssimo campeonato que fez Andrés Nocioni, a versatilidade da dupla Emir Preldzic e Nemanja Bjelica, do Fenerbahce, o próprio Dunston, vigoroso pivô do Olympiakos, eleito o melhor defensor da temporada, o jovem italiano Alessandro Gentile, revelação do Olimpia Milano e candidato ao Draft deste ano, e muito mais.

Antes de chegar aos caras, um lembrete para contextualizar: para os que estão (bem) mais acostumados com a NBA, lembrem que o basquete Fiba é jogado em 40 minutos, e não 48. Logo, o tempo de quadra de uma partida da liga norte-americana é 20% maior, de modo que as estatísticas em geral são mais infladas por lá, fazendo alguns dos números abaixo parecerem tímidos. Além disso, a abordagem ofensiva das equipes de ponta da Europa tende a ser diferente, com mais jogadores assumindo responsabilidades, dividindo a bola, mesmo as que têm grandes cestinhas, que poderiam muito bem carregar um time nas costas.

E, ok, aqui entra o momento da propaganda: o evento será transmitido com exclusividade pelo Sports+, canal 28/128 da SKY, com este blogueiro lelé na equipe de equipe, ao lado do ultrafanático e informado Ricardo Bulgarelli e os narradores Maurício Bonato, Rafael Spinelli e Marcelo do Ó, que, cada um ao seu modo, ajudam a dar emoção ao jogo.

Vamos lá, enfim, a alguns destaques do F4, sem necessariamente ser os melhores do campeonato, mas apenas uma lista que dá na telha. Free style, mano, com pílulas publicadas nos próximos dias:

Victor Khryapa, ala-pivô do CSKA Moscou.
31 anos, 2,03m, 6,6 ppj, 5,2 rbj, 4,2 apj, 54,7% de 2 pts, 38,7% de 3pts em 23 minutos

Alguém por favor sabe como se escreve “Sr. Fundamento” em russo? Mas, bem, nem carece de acessar um tradutor online. Vamos de Czar dos Fundamentos – até porque corremos o risco de a resposta ser “Czar fundamentalista”, uma outra história, que, suponho, não tenha a ver com o Khyrapa.

Na recente ascensão russa ao pódio de diversas competições internacionais, culminando com o bronze olímpico em Londres, era muito mais fácil se concentrar nos encantamentos de Andrei Kirilenko, ou na peculiaridade de a seleção ser guiada por um técnico norte-americano, David Blatt. Mas todo esse sucesso seria inviável sem a presença estabilizadora do ala-pivô, alguém que desenvolveu uma química excelente com AK47, uma vez que suas habilidades combinam perfeitamente.

O cerebral russo, que definitivamente não foi bem aproveitado na NBA – culpa de Blazers e Bulls e também de sua juventude –, faz um pouco de tudo em quadra, mas sua característica mais intrigante é a da armação (veja bem, armar o jogo, mas sem ser armador por nomenclatura), como suas 4,2 assistências por jogo atestam.

Flutuando de frente para a cesta, executa o jogo de high-low com perfeição, servindo a Nenad Krstic e Sasha Kaun. Fica tudo muito mais perigoso quando constatamos que seu chute de três precisa ser devidamente respeitado, assim como as bolas de média distância.

Ele arrisca pouco em direção ao aro, se movimenta hoje de modo bastante lento pela quadra, é verdade, mas, se for para derrotar o CSKA, Khryapa precisa ser sufocado. Nem sempre você precisa ser o jogador mais explosivo, ou aquele que resvala no topo da tabela – e de capacidade atlética o time moscovita já está bem servido com Sonny Weems e Kyle Hines, que busca o tricampeonato depois de brilhar com o Olympiakos. Desde que, claro, você esteja bem fundamentado. Em russo, que seja.


Pilar: “Precisam olhar direito para os que jogam no Brasil”
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Giancarlo Giampietro

Henrique Pilar acredita em fase de transição no basquete brasileiro

Henrique Pilar acredita em fase de transição no basquete brasileiro

No basquete brasileiro, devido à repetição das mesmas caras, da mesma praça e do mesmo banco, o mais fácil, mesmo, é presumir as coisas e seguir no piloto automático. Acesse lá o Google Maps, peça as direções, acione o GPS, e pé na estrada. Podemos estar falando do NBB ou, no caso, da seleção brasileira, que a história é a mesma. Não importa que ainda tenhamos semifinais e uma só final para ser disputada ainda em solo nacional. Que ainda haja muito mais jogos pela frente na Europa e nos Estados Unidos. Nós basicamente já sabemos quem vai ser pré-convocado e, se tudo der certo de acordo com os planos de Rubén Magnano, quem serão, no fim, os 12 eleitos e de onde eles virão.

Há uma forte e extensa corrente que acredita que é por aí, mesmo. Que temos apenas um punhado de jogadores gabaritados, habilitados para encarar competições internacionais. Que o fiasco da seleção no último Torneio das Américas é a prova disso. Ouso discordar.

Já discutimos aqui à exaustão no ano passado, mas não custa relembrar que o técnico argentino elaborou uma lista final desastrosa, com jogadores que não se encaixavam de modo algum. Tínhamos baixinhos e pesadões em excesso, com pouca gente fazendo a ligação entre eles. Os mesmos críticos diriam e disseram: ‘Mas você acha mesmo que a troca de fulano por cicrano faria a diferença?’, como se basquete se resumisse a nomes, a grifes, e não ao conjunto que esses elementos formam. A mesma linha de indagações, imbuída de preconceito, também passa pela (falta de) experiência, visão de jogo, fundamentos e que tais de uma turma que, de fato, pouco experimentou o que se pratica lá fora.

Em sua mais recente entrevista, para o Menon, companheiro aqui da blogosfera do UOL, o mesmo Magnano chegou a me confundir um pouco, ao defender os atletas do NBB, quando, na última pergunta, o jornalista menciona o fato de o pivô Paulão ter arrebentado na competição, mesmo depois de sofrer muitas lesões nos anos recentes e de não estar na melhor forma. O argentino respondeu: “O nível do NBB não é baixo. Dois brasileiros disputaram agora o título da América”.

Dentre as muitas frases do campeão olímpico em 2004, esta pode deixar quem acompanha o discurso do treinador um pouco encafifado. Afinal de contas, no ano passado, depois da humilhação que a seleção sofreu durante a Copa América, o argentino havia dito em todas as letra algo que absolutamente rezava pelo contrário. Que sem a turma da liga norte-americana e outros da Europa não havia chance, mesmo, de pensar de modo ambicioso. É algo que não desceu bem na hora e, agora, fica ainda mais engasgado.

Primeiro porque há um abismo todo entre sonhar alto e meramente conseguir em quadra sua vaguinha para a Copa do Mundo de basquete. Entre tentar golpear o Team USA do Coach K e perder para Jamaica e Uruguai.

Né?

Mas, diante daquele que talvez seja o maior fracasso de uma vitoriosa carreira, o técnico saiu disparando, acertando muita gente no caminho, ainda mais quando usou um tom até condescendente para se referir àqueles que jogaram na Venezuela e com ele sucumbiram. Algo como: ‘Gente, nós tentamos, mas não, infelizmente, é o que temos para hoje’.

Em meio ao discurso, falou também sobre os problemas físicos que parte da delegação enfrentou por lá, é verdade, e, num torneio curto, qualquer desarranjo pode ser fatal. Como mensagem principal, no entanto, fez questão bater na tecla das poucas alternativas que lhe restavam para formar um grupo competitivo. “O maior responsável, em primeiro lugar, sou eu. A segunda responsabilidade é de todos aqueles caras que deveriam estar aqui e não estiveram, deixando a gente praticamente na mão”, afirmou, na ocasião, em entrevista ao SporTV. Seriam poucos, raros os nomes capacitados para encarar qualquer tipo de desafio, segundo a lógica. Os mesmos de sempre, não importando o que se passe em quadra.

“O que venho observando no NBB e no basquete brasileiro hoje é que está ocorrendo uma transformação”, afirma o ala Henrique Pilar ao VinteUm. “O Brasília acabou saindo e já são dois anos em que eles não chegam a uma final. Acho que existe toda uma transição de paradigmas, uma troca de geração. Estão vindo uns moleques muito bons. E a gente no Paulistano tem um time com um pessoal para quem nunca ninguém deu bola, mas que sabe que tem valor. As pessoas precisam olhar para todos os jogadores e ver o que eles têm de bom e o que não têm. Agora o que vale é observar aquilo que está se jogando, e, não, (avaliar jogador) por ter título, por sempre ter sido campeão.”

Paulistano, com uma campanha invejável desde o início do campeonato, e Mogi, em arrancada nos playoffs, para chacoalhar tantas certezas, apareceram este ano para chacoalhar algumas certezas, com elencos montados pelas beiradas, sem a grana daqueles candidatos de sempre. Pelo que noto, contudo, a tendência, ao falar sobre essas façanhas, tem sido a de valorizar o trabalho de treinadores e diretores em trabalhos que deram certo, “a despeito da referência e seus elencos de jogadores medianos, medíocres”, numa extensão de uma abordagem conformista, num ciclo vicioso, no qual as qualidades e a legitimidade dos atletas acabam sendo avaliadas, julgadas muito mais pelo que consta em seus currículos.

Pilar para a bandeja

Pilar para a bandeja, diante da boa fase de Paulão

Estão todos num beco sem saída, sentenciados à irrelevância? E o talento natural? Não conta? Não pode ser trabalhado? Como explicar a constante atração de jovens talentos brasileiros por clubes espanhóis? Se há partes interessadas do outro lado do Atlântico, obviamente não é apenas o caso de um ou outro agente estar cumprindo seu trabalho. E, pera lá, talentos só podem ser explorados até os 19, 20 anos? Ninguém pode crescer, evoluir a partir daí? E não seria justo esperar, pedir de um profissional como Magnano – e outros vencedores – algo nesse sentido?

Bom, depois de bater algum recorde de perguntas consecutivas, paramos para abrir espaço novamente para Henrique Pilar. A entrevista com ele começou com pontos específicos sobre seu time, minutos depois da vitória no quinto jogo contra Franca, mas acabou descambando para essas inquietações. Foi rápido, o bate-papo certamente pediria mais tempo, mas o interlocutor é esclarecido o bastante para engrandecer e levantar o assunto. “Acho que é começar a olhar direito.  Todo mundo aqui teve uma escola, e uma escola muito boa de basquete, podendo jogar muito bem quando tem um esquema tático armado, em que cada um saiba o que fazer. Quando existe um time como o nosso (do Paulistano), que começou e pretende ficar junto mais tempo, que tenha uma coesão”, diz o ala.

Bom, depois do que vimos na última LDB, nossa liga de desenvolvimento, não dá para escrever com tanta firmeza assim sobre o trabalho de base dos clubes em geral. Foram muitos os erros primários para atletas que ainda estão em formação, mas cuja faixa de idade em teoria já não permitira que se apresentassem tão crus assim. De qualquer forma, me chama mais a atenção a menção ao bom rendimento de sua equipe, com seus “anônimos” produzindo justamente dentro de um ambiente organizado, estruturado, no qual podem render melhor de acordo com suas características.

Neste ponto, o maior mérito de Gustavo de Conti parece estar na sua prospecção de mercado, na sua capacidade para identificar e contratar talentos sem ter o cofre mais endinheirado. Este não é o primeiro grupo competitivo que ele consegue montar às margens das grandes contratações, sem prioridade na escolha. A diferença que vejo no Paulistano 2013-2014 é uma combinação melhor de peças, formando um time, se não revolucionário, mais orgânico em quadra. “Esse foi um propósito do Gustavo”, afirma Pilar. “Até quando ele me contratou, me falou que gosta de trabalhar com caras versáteis, que podem fazer várias funções, até para (compensar) a eventual ausência de um ou outro. Desde o começo nosso time teve esse propósito, e vem amadurecendo.”

Versatilidade sempre foi o forte desse atleta. A primeira vez que o vi jogar foi há mais de dez anos, quando ele era apenas o Henrique Macia, um jovem e bastante alto armador que fazia a transição da base para o adulto do Hebraica, sob a orientação de Adriano Geraldes. Dividia, na época, seus dias com o estudos na faculdade de Filosofia, sem saber exatamente se seguiria como jogador, embora fosse evidente sua predisposição pelo esporte. Acontece que de modo algum a carreira de basqueteiro era algo garantido. O cara penou um bocado até chegar a um estágio em que sua opção de vida não pode ser mais questionada, passando pela Nossa Liga com o Londrina, ressurgindo como um ala-pivô cheio de double-doubles no ABC Paulista, quando ganhou suas primeiras e breves manchetes.

Sim, Pilar se firmou como um jogador de ponta no basquete brasileiro, se encaixando muito bem no quinteto titular do Paulistano após disputar três NBBs pelo Bauru. No duelo derradeiro com Franca, arrebentou: foram 26 pontos em 30 minutos, matando todas as sete bolas de dois pontos que tentou, somando aí os 50% em três pontos (3/6). Claro que esse não é o padrão de apresentação do ala. Os 26 pontos representaram um recorde pessoal. Na temporada, tem médias de 12,03 pontos, 3,8 rebotes e 1,8 assistência.

Nessa partida, porém, o que impressionou não foi necessariamente sua produção. Mas, sim, o modo como executou. Pilar conseguiu dosar agressividade e paciência, atacando na hora certa, como o aproveitamento de 100% no perímetro interno explicita. Embora a mecânica seja ainda um pouco estranha, sua pontaria nos tiros de fora vem crescendo ano após ano, subindo dos 33,9% de 2011 para os 44,9% deste ano, no qual está flutuando mais pelo perímetro, numa dinâmica interessante com seus intercambiáveis companheiros de equipe.

É a partir da linha de três também que Henrique pode oferecer outras facetas a uma linha ofensiva. Com 1,98m e facilidade no drible, o jogador pode cortar para o centro e enxergar a quadra por cima da defesa, conseguindo girar a bola de um lado para o outro com facilidade, a partir de seus cortes para a cesta. Um facilitador e o tipo de característica que não se vê a toda hora por aí.

No perímetro, Pilar pode ser um facilitador a mais

No perímetro, Pilar pode ser um facilitador a mais

Não estamos tratando de nenhum Andre Iguodala ou Scottie Pippen aqui, claro. Pilar tem suas limitações. Volta e meia, pode se meter numa fria em quadra, encurralado, a ponto de entregar a bola para o torcedor ou adversário. Se não estiver com os pés plantados em quadra, seu chute tende a perder eficiência. Na defesa, ainda é preciso ver como ele reagiria se fosse confrontado mais vezes por atletas mais velozes e explosivos, ainda que na sexta passada tenha feito um sólido trabalho contra Jhonatan e Eddie Basden.

A ideia, na verdade, não é defender a convocação ou eleger como salvador da pátria um atleta específico. Em meio a tantos atletas que são pausterizados numa grande massa de aparente mediocridade, Pilar vira o personagem aqui muito por minha familiaridade com sua trajetória, por tê-lo visto crescer no decorrer de uma década, e também por sua disposição a falar sem receio de pisar em calos, ciente de que, a essa altura, já não tem nada a perder.

“Prefiro nem pensar nisso”, afirma. “Não quero… Tipo, eu venho jogando pelo Paulistano, pensando no Paulistano, jogando o NBB. Penso no que tenho de jogar, não fico me iludindo, colocando coisa na cabeça que não tem por quê. Prefiro ir jogando, vendo as conquistas que temos até agora. Depois penso no que pode acontecer. Ou, depois tudo pode acontecer, e eu só acataria as circunstâncias.”

Não fiz a enquete, mas é cômodo arriscar que esse sentimento, um tanto resignado, abrange a esmagadora maioria dos 40 e tantos jogadores que iniciam as semifinais do NBB nesta segunda-feira. Afinal, entre os quatro clubes restantes, quantos de seus atletas têm sido constantemente convocados? Citei, no Twitter, Marquinhos e Marcelinho Machado. Também tem o Vitor Benite, e o Guilherme Giavoni me lembrou do Caio Torres, hoje no São José, é verdade. Fica nisso.

Agora, o pivô revelado pelo Pinheiros encara aquilo que de certa forma já é um tabu. Ser completamente ignorado não é um privilégio da turma dos azarões como Paulistano e Mogi. Que o diga o armador Fúlvio, outro que faz a festa de qualquer bloquinho de anotações, já escaldado quanto ao tema. “Para quem ainda quer ir para a seleção, já falei para não vir para São José… Aqui você pode fazer chover, que não vai”, replicou.

Será possível que nenhum dos jogadores que ainda sonham com o título do NBB seriam capaz de prorrogar suas temporadas para a disputa de qualquer Sul-Americano ou Copa América? Rubén Magnano obviamente tem conhecimento de causa e os olhos muito mais bem treinados do que qualquer blogueiro babaca. Só esperemos, contudo, que, na sua posição, o treinador tenha a cabeça aberta.

*  *  *

Abaixo, a íntegra do rápido papo com Henrique Pilar:

21: Percebe-se um constante revezamento entre você, Renato, César, com versatilidade o suficiente para atacar dentro e fora. Como funciona essa dinâmica?
Henrique Pilar: Esse foi um propósito do Gustavo. Até quando ele me contratou, me falou que gosta de trabalhar com caras versáteis, que podem fazer várias funções, até para a eventual ausência de um ou outro. Desde o começo nosso time teve esse propósito, e vem amadurecendo. Hoje estou muito bem adaptado a isso, fazendo a 3 ou a 4, com uma boa frequência, para poder chegar ao playoff realizando isso muito bem.

Além de vocês três, obviamente os americanos têm responsabilidades ofensivas e também podem atacar pelo drible. No fim, parece que se divide mais as responsabilidades em vez de se concentrar em uma ou duas referências?
Melhor, né? Se você pega um time que tem um cara para marcar só, um cara a ser batido, a gente pode resolver os problemas com mais facilidade. Agora, se você tem cinco caras na quadra, e todo mundo que entra pode definir, fica mais difícil.

Agora falando sobre sua evolução. Lembro de ver você subir pelo Hebraica basicamente como armador. Depois, você despontaria no ABC como um cara bastante voltado para o jogando lá dentro, como um pivô. Hoje, parece ter encontrado um meio termo. É por aí?
No final das contas, eu sou mais um 3. Pelo menos hoje. Agora, posso levantar vantagem também jogando como 4. Consigo marcar um 4 alto e ao mesmo tempo tendo o corte para atacar. Como armador ficaria um pouquinho complicado, acho que já passou o tempo. Exerço muito mais a função de um 3 no time, mesmo.

No Paulistano, se a gente for considerar o que se estabeleceu no mercado brasileiro, dá para falar que não há atletas de grife, mas não parece ser um impedimento para o time. Concorda? E aqui está o time na semifinal, depois de ótima campanha na temporada regular.
Tenho uma opinião formada sobre isso. O que venho observando no NBB e no basquete brasileiro hoje é que está ocorrendo uma transformação. O Brasília acabou saindo e já são dois anos em que eles não chegam a uma final. Acho que existe toda uma transição, até pensando na seleção brasileira também, uma troca de geração. Estão vindo uns moleques muito bons. E a gente no Paulistano tem um time com um pessoal para quem nunca ninguém deu bola, mas que sabe que tem valor. As pessoas precisam olhar para todos os jogadores e ver o que eles têm de bom e o que não têm. Agora o que vale é observar aquilo que está se jogando, e, não, (avaliar jogadores) por ter título, por sempre ter sido campeão. É um momento de transição no paradigma do basquete brasileiro.

Você acharia absurda a cogitação de sua convocação para a seleção ou de algum de seus companheiros?
Eu prefiro nem pensar nisso. Não quero… Tipo, eu venho jogando pelo Paulistano, pensando no Paulistano, jogando o NBB. Penso no que tenho de jogar, não fico me iludindo, colocando coisa na cabeça que não tem por quê. Prefiro ir jogando, vendo as conquistas que temos até agora. Depois penso no que pode acontecer. Ou, depois tudo pode acontecer, e eu só acataria as circunstâncias.

O técnico Rubén Magnano já deu a entender que não conta muito com a mão-de-obra do NBB em sua seleção ideal, como atletas importantes para a seleção. Acha que o talento natural do jogador em atividade no Brasil pode ser subestimado?
Acho que é começar a olhar direito para as pessoas que jogam aqui. A mídia brasileira também quer muito só criticar, trabalhar com grife, e não tem por quê. Todo mundo aqui teve uma escola, e uma escola muito boa de basquete, podendo jogar muito em quando tem um esquema tático armado, em que cada um saiba o que fazer. Quando existe um time como o nosso (do Paulistano), que começou e pretende ficar junto mais tempo, que tenha uma coesão. É difícil montar um time e já sair jogando.

E como foi o desenvolvimento, então, desse Paulistano, para se dar certo?
A gente teve a sorte de todo mundo aqui entender o que precisa ser feito. A gente conseguiu estabelecer o que cada um faz em quadra, e isso vai crescendo a cada dia no playoff. A gente sabe o que se espera e vai lá e faz, executa. Não sou só eu, é o Des(mond Holloway), o César, o Pedro, o Manteiga, todo mundo que joga aqui. Eu não fiz uma boa série, por exemplo, mas hoje fiz um bom jogo. E vai ser a mesma coisa contra São José. Se eu puder fazer cinco jogos bons, ótimo. Se não puder, alguém vai aparecer. Todo mundo pode fazer.

A última: neste quinto jogo contra Franca, vimos um clima bem mais agitado no ginásio, e está certo que a torcida deles contribuiu bastante para isso. Com o Paulistano na semifinal, fica a expectativa de que se repita? Que o Paulistano consiga encher sua casa numa metrópole como São Paulo?
Acho que a gente tem torcida, embora falem esse negócio que o Paulistano não tem torcida. Pode não ser uma torcida organizada, fanática como Franca ou São José, mas temos torcida. Andamos pelo clube e sempre tem quem nos apoie. Acho que isso é uma coisa criada para desmerecer um pouco o clube. Aqui tem também. Pode ser um pouco diferente. Mas hoje, por exemplo, a gente limitou um pouco a entrada do pessoal de Franca e colocou a nossa torcida. Não tem sentido, que eles sejam maiores que a gente. Não, a gente é maior. Se forem dar metade para eles, vão gritar mais. Mas agora, não. Agora a gente vai fazer que essa seja a política do Paulistano.


Quebra de establishment e muita torcida no NBB
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Giancarlo Giampietro

Paulistano, um dos semifinalistas inéditos do NBB 6

Paulistano, um dos semifinalistas inéditos do NBB 6

Não vou sentar aqui e escrever mil maravilhas sobre as classificações de Paulistano e Mogi para as semifinais do NBB. Não que eles não mereçam, mas pelo simples fato de não ter acompanhado tão a fundo o campeonato, à devida maneira – as razões são muitas, mas podemos dizer que tudo se resume a tempo e, de qualquer forma, o texto não é sobre lamúrias de um só residente da Vila Guarani paulistana… Paremos por aqui. Vocês podem até não acreditar, mas nunca me atraí muito pelo charlatanismo. Não adianta inventar onda, usar argumentos abstratos e incensar aquilo sobre o qual não se tem muitas certezas. Ninguém merece. O que posso dizer, então, é especificamente sobre os acontecimentos da sexta-feira de basquete nacional que se passou. Um dia que terminou, fazendo os descontos obrigatórios, com saldo bastante positivo para a liga.

A começar pela quebra do establishment. São dois semifinalistas inéditos, que não constavam realmente em nenhuma bolsa de apostas no início da jornada, assumindo os lugares de Brasília (presença cativa entre os quatro melhores nas primeiras cinco edições da competição), Pinheiros (terceiro em 2011 e 2012) ou Uberlândia (vice do ano passado, e dono de um dos maiores orçamentos do país até esta temporada, algo que vai acontecer na próxima).

Para se definir os finalistas, o jogo nem sempre vai ser disputado em alto nível, algumas limitações técnico e táticas ainda são estridentes, mas também não dá para pegar tudo num punhado só, amassar com cara de asco e atirar na lata de lixo, achando que fez uma baita cesta. Tivemos dois ginásios lotados, tomados inicialmente pela euforia, para depois fazer a inevitável concessão à tensão. Em meio a esse cenário, algo muito relevante: os torcedores visitantes também presentes e fazendo barulho. Um envolvimento, um apego muito bem-vindo.

Dos francanos, não esperamos outra coisa, mesmo que obrigados a percorrer o uma distância maior e encarar o rush de São Paulo para chegar em tempo ao Paulistano. Já a galera de Mogi acaba sendo uma positiva novidade. Obviamente que a cidade tem lastro com o basquete, mas esse vínculo andava dormente. A recente guinada do clube, subindo degrau por degrau, alcançando os holofotes dos playoffs, deixando um gigante como o Pinheiros pelo caminho, serviu para acender a chama novamente. E eles têm feito uma baderna daquelas.

Torcida, Mogi, NBB, 2014, playoffsEsse é o resultado de brincar com as emoções de gente que tenha o mínimo interesse pelo esporte em geral. Dois jogos de matar-ou-morrer em sequência? Drama puro, chama público. Ainda mais com o desenvolvimento de suas respectivas narrativas durante a fase decisiva. Para Mogi, essa história ganha até contornos de fábula, com o time terminando a temporada regular com mais derrotas (18) do que vitórias (14), superando o Macaé por apenas um triunfo para garantir a última vaga nos mata-matas, como o 12º colocado. (Explicando, para os que não acompanham a liga: as oitavas de final são uma espécie de playoff preliminar, com chaveamento envolvendo os times que terminaram entre os quinto e 12º lugares, enquanto os quatro demais aguardavam para a disputa das quartas de final.)

Cheio de confiança, Mogi bateu primeiro o Pinheiros, campeão e vice das últimas duas Liga das Américas, e, depois, Limeira, ambos de virada. Já o Paulistano estava posicionado entre os cabeças-de-chave, depois de conquistar uma surpreendente segunda colocação ao término de 32 partidas, com 23 vitórias e 9 derrotas, deixando para trás o poderoso Brasília (21-11), ficando abaixo apenas do Flamengo (26-6), intrometido entre os favoritos. Foi o time de Gustavo de Conti que assisti de perto nesta sexta, como um dos poucos que não xingava alguém no ginásio Antonio Prado Júnior.

(Aliás, aqui cabe outro parêntese: ninguém quer que o público pire na ópera ou entoe um coral creole caribenho, nem nada disso. Mas tudo tem um limite. A cena é recorrente, com o Melk já registrou em crônica lá atrás, mas não deixa de causar espanto: todos aqueles garotinhos com cachinhos angelicais de um clube de elite da maior metrópole do país sentadas na arquibancada, atacando o mundo todo, apoiados, claro, pelos berros dos pais. Do outro lado, a caravana francana não fazia por menos. Foram eles, na verdade, quem deram início aos trabalhos ofensivos, antes do tapinha inicial. E, claro, esse não é um problema exclusivo dos dois clubes envolvidos, nem do NBB e do basquete. Educação, a gente não se vê por aqui.)

Abstraindo as torrenciais indelicadezas, como Paulão, alvo predileto da gurizada, fez por muito tempo, até não aguentar mais, dava para falar em clima de frenesi total, especialmente com a arrancada francana a partir dos minutos finais do terceiro período. A torcida dos visitantes nunca parou de apoiar sua equipe e quase se viu recompensada com uma reação daquelas.

O Paulistano chegou a abrir uma vantagem de 15 pontos no terceiro período, mas viu os adversários empatarem o placar em 72 a 72, a 4min20s do fim. Nesse momento, porém, o ala Henrique Pilar, o grande nome do jogo, voltou a desequilibrar, com seis pontos em sequênca – primeiro numa cesta de três após dobra para cima de Desmond Holloway na zona morta, depois com uma infiltração que resultou em falta-e-cesta, restando 1min21s. A partir daí, Franca se perdeu em precipitações em quadra, buscando sempre o tiro de longa distância, inclusive na posse de bola seguinte ao grande lance de Pilar, saindo de um pedido de tempo, diga-se. Não teve água no chope dos locais.

Venceu o time que apresentou um basquete mais equilibrado durante a noite. De novo: falo especificamente sobre este jogo. Fossem infinitamente superiores, não haveria a necessidade de uma quinta partida e tanto sofrimento. Em linhas gerais, contudo,  o time de Gustavo apresenta mais possibilidades. Tem um ataque potencialmente mais imprevisível, sobre o qual escreveremos mais durante a semana.

Ao final do confronto, pausa para falar com alguns atletas, sendo bastante inconveniente, é verdade, em meio a amigos e familiares. Conversa vai, conversa vém, tudo muito bom, mas, quando a turma da TV não para de passar pedir licença, penando para desarmar o aparato da transmissão, estava sinalizada que era mais do que hora de subir a Augusta (veja bem: su-bir a Augusta e, não, des-cer) e voltar para casa. Deu tempo para ignorar o finalzinho do jantar da família, ir direto para o sofá, cheio de maus modos, e pegar o quarto período de Limeira x Mogi. Deu tempo para ver o time do forasteiro Paco García se comportar muito bem emocionalmente nos minutos finais, resistindo à pressão de mais um desfecho dramático, celebrando seus novos heróis. Sobre esses heróis, também ampliar a discussão na sequência. O que vale, primeiro, é registrar o surgimento deles, nem que sejam efêmeros, para Mogi das Cruzes e, quiçá, para o público um tanto invocado e não necessariamente engajado do Paulistano. Para um NBB que ainda luta por espaço, por identidade, um ótimo passo.


Personagens dos playoffs: Splitter reage
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Giancarlo Giampietro

Tiago Splitter x LaMarcus Aldridge

Tiago Splitter já sabia o que vinha pela frente, mas estava preparado. Depois de lidar com Dirk Nowitzki por sete partidas, era hora de se virar com LaMarcus Aldridge. “Acho que LaMarcus é um Dirk mais jovem, que pode arremessar, infiltrar, jogar no garrafão e fazer muitas coisas. Não será fácil”, afirmou, antes de a semifinal da Conferência Oeste começar.

Difícil, mesmo, foi a vida do líder do Portland Trail Blazers nesta quinta-feira. No geral, também com a contribuição de Tim Duncan, o cestinha viveu uma jornada infernal, matando apenas 6 de seus 23 arremessos de quadra. Dentro desses números, 14 chutes foram contabilizados sob a vigilância do catarinense, dos quais ele acertou apenas dois. Os 14% de acerto valeram como o segundo pior de sua carreira, com um mínimo de dez chutes computados.

Não é questão de patriotada, vocês sabem. Mas, após destacar o que Nenê fez contra o Chicago Bulls, chegou a hora de também dar o devido espaço para o catarinense. Com a cabeça fria e competência, vai dando conta do recado, mostrando que os US$ 36 milhões que o San Antonio Spurs comprometeu em lhe pagar por quatro temporadas fazem sentido. Justamente contra um dos times que tentou convencê-lo a deixar o Texas no ano passado, quando o pivô se tornou agente livre, semanas depois de ter pouco sido utilizado na histórica final contra o Miami Heat.

Splitter poderia estar jogando ao lado de LaMarcus, e não contra

Splitter poderia estar jogando ao lado de LaMarcus, e não contra

“Você se sente bem que alguns times o queiram, e às vezes você até mesmo sente que seria legal tentar algo novo. Você fica com aquela dúvida na cabeça”, disse ao San Antonio Express-News o jogador que teve sondagens firmes do Blazers e do Atlanta Hawks. “Mas eu realmente queria continuar. Essa era a minha primeira opção. Quando tive a chance, abracei. O Spurs fez uma oferta que gostei e é ótima para mim e minha família. Não poderia dizer não.”

Que o Spurs tenha valorizado suas contribuições só poderia contar para recuperar um pouco de sua confiança, especialmente depois de ter jogado apenas 12min30s nos últimos dois jogos contra o Heat na decisão. Praticamente como se ele tivesse jogado apenas um período de oito possíveis.  “Isso sempre vai ficar na cabeça. Não tem como tirar. O que dá para fazer é seguir em frente e pensar apenas na próxima temporada”, disse na ocasião da extensão de seu vínculo com a franquia.

Para quem acompanha à distância, é difícil entender como alguém que tem médias de apenas 19,8 minutos na carreira, com 8,3 pontos e 5,3 rebotes, pode valer essa bolada toda. Ainda mais quando, no ano primeiro ano de seu volumoso contrato, ele regrediu estatisticamente tanto do ponto de vista das métricas avançadas como em produção por minuto. Por causa disso – ou talvez explicando isso, vai saber -, viu seu tempo de quadra se reduzir, depois de ter ganhado  espaço com Gregg Popovich nas suas três primeiras temporadas em sequência. As críticas viriam, naturalmente.

Nos mata-matas, porém, o valor de Splitter fica mais explícito. Numericamente, em nove partidas até esta sexta-feira, ele tem a maior média de minutos de sua carreira, em qualquer fase, com 28,1 por jornada, bem acima dos playoffs de 2013.  Em uma projeção por 36 minutos, sustentaria um double-double de 12,8 pontos e 11,1 rebotes, com presença marcante nas tábuas ofensiva e defensiva. Mas nada no basquete se resume apenas a números.

Contra o Mavs, ele foi o defensor primário de Dirk Nowitzki, que ficou limitado ao seu pior aproveitamento de quadra desde 2007, acertando somente 42,9% de suas tentativas de cesta. Obviamente os méritos não são exclusivos do brasileiro, com um rodízio de defensores e um sistema para atrapalhar o craque. Mas seu papel neste desarranjo do alemão foi inegável, algo que o leitor TristaSP, que tem a insustentável paciência de aturar esse blogueiro, mencionou no ato.

Tal como Duncan, Splitter, menos comprido e mais baixo, diga-se, é um defensor impertinente à base de fundamentos. Não há dúvidas que o pivô é alguém extremamente coordenado e com boa mobilidade para alguém de seu tamanho – basta comparar seus movimentos com os de Robin Lopez, por exemplo. Mas há uma distância considerável em termos atléticos com a elite da classe. Contra um Miami Heat “pequeno” e explosivo, isso pode pesar. Em geral, no entanto, contra as fortes duplas de garrafão do Oeste, suas habilidades fazem a diferença.  Ele dificilmente se deixa iludir com as fintas de seus oponentes, pois quase nunca vai tentar aquele toco espetacular – uma vez que não é o maior saltador da paróquia. Isso não o impede de se colocar entre os melhores defensores diante do aro na temporada regular. Também é difícil ver o catarinense deixar seu posicionamento em busca de uma recuperação de bola, atacando a linha de passes. Dentre todas as suas qualidades, a maior talvez seja a consciência daquilo que é e pode realizar em quadra (já recomendei este link do site Pounding the Rock, inteiramente dedicado ao Spurs, mas não custa sugerir outra vez).

Testemunhar o trabalho do brasileiro no mano a mano com LaMarcus é relativamente fácil. (Quer dizer, que fique claro: fácil para nós observarmos, mas de modo algum uma tarefa de tranquila execução). Terry Stotts desenha jogadas simples para que seu pivô fique isolado num canto da quadra, com mais liberdade para desenvolver seus movimentos, driblando sem se preocupar com a chegada repentina de um marcador extra. No início do quarto período, diante de Boris Diaw, estava funcionando. Popovich convocou Splitter de imediato, e a farra acabou. Nesse ponto, a capacidade de Tiago de minimizar o impacto de seu oponente sem, por enquanto, precisar da marcação dupla, é essencial para o equilíbrio defensivo do Spurs, mantendo os ótimos arremessadores do perímetros mais contidos.

Agora, por outro lado, há muito mais que Tiago possa oferecer em quadra para minar os adversários. Como, por exemplo, os corta-luzes que arma do outro lado da quadra. Algo que não só livra seus companheiros para chutes com mínima liberdade, mas também atormenta e atordoa aqueles que sofrem o impacto. “Os bloqueios deles machucam. Eles fazem bloqueios de verdade, um grande trabalho em preparar e conter nos bloqueios”, afirma o armador Damian Lillard. “Isso te desgasta muito. Perseguir Tony Parker é uma coisa. Ser acertado toda santa vez, tentando fazer isso, é outra. Tira muito de você.”

No ataque, ele também serve como uma excelente válvula de escape para tramas em pick and roll com Tony Parker e Manu Ginóbili, devido a sua inteligência para se posicionar sempre como uma ameaça no corte para a cesta, em ângulos favoráveis para a recepção de passes, atraindo a defesa. “Acho que minha conexão com Tony e Manu nos momentos quando Tim está fora de quadra ajuda muito a equipe a encontrar espaço para nossos chutadores, partindo para a cesta ou fazendo o bloqueio. É uma parte de nosso jogo, e a usamos muito bem na temporada passada.”

Essas intangíveis todas aparecem como itens silenciosos, discretos no contrato oferecido pelo Spurs. São detalhes como esse que justificam o salário de US$ 9 milhões anuais para Splitter. “Tiago é um defensor muito bom no garrafão. Ele também é bom na defesa de pick-and-roll e, se formos falar em ataque, ele joga realmente muito bem com as pessoas que temos e é um ótimo passador para a sua posição”, avaliou RC Buford, gerente geral do clube, o executivo do ano da liga.

Detalhes que obviamente não passaram despercebidos pelo gerente geral do Blazers, Neil Olshey, um caça-talentos de respeito, que ajudou a construir o atual timaço do Clippers e trouxe estabilidade a uma franquia de bastidores um tanto delicados como o Blazers (gerida pelo bilionário Paul Allen, um gênio dos negócios, mas por vezes intempestivo e cheio de cupinchas que podem interferir em decisões de basquete para a qual não estão exatamente preparados).

Antes de ser agraciado com a bizarra concessão de Robin Lopez pelo Pelicans, que tinha a intenção de limpar sua folha de pagamento desperadamente para assinar com Tyreke Evans, o dirigente – e ex-ator (!?!) – estava empenhado em investir no catarinense. Acontece que, assim como havia ocorrido em 2012 com Roy Hibbert e o Indiana Pacers, o Spurs nem permitiu que as conversas fossem adiante. Souberam do quanto o clube do Oregon estava disposto a pagar e já bateram o martelo. Não houve dramalhão nenhum, do jeito que Popovich gosta.

Lopez se encaixou perfeitamente no Blazers, é verdade, trombando com gente mais graúda, dando a LaMarcus o respiro necessário. Nesta série contra o Spurs, porém, na hora de avaliar os jogos nos seus pormenores, talvez seja inevitável para Stotts & Cia. se perder num breve devaneio sobre como seriam as coisas caso tivessem roubado Splitter para o seu lado.