Vinte Um

Arquivo : Meyinsse

Com repertório expandido, Felício causa boa impressão geral pela D-League
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Giancarlo Giampietro

Felíco x Jeff Ayres, ex-Spurs

Felíco x Jeff Ayres, ex-Spurs

Quando um time de NBA perde um pivô com todas as habilidades de Joakim Noah, tende a se enrascar. Mas não o Chicago Bulls. Para Fred Hoiberg, isso significa dar mais minutos para Taj Gibson mostrar seu confiável arremesso de média distância e cobrir terreno com movimentação lateral invejável. Pau Gasol também vai ganhar mais espaço para fazer das suas no garrafão, enquanto Nikola Mirotic tem mais chances para encontrar o rumo da cesta. Ah, e claro, para não falar do hiperprodutivo Bobby Portis, o calouro número 22 do Draft que parece ter sido escolhido, no mínimo, 12 posições mais cedo. Estamos falando já de quatro caras mais que competentes para compor uma linha de frente, e o quinto homem seria um grandalhão pouco ágil ou atlético, mas que faz parte da seleção australiana, é grande, forte, adora uma pancadaria e tem bons fundamentos para ajudar no andamento de um treino e tal.

Pensando nesse mundaréu de gente, não deixava de ser uma grata surpresa que o escritório gerenciado por John Paxson, operando sob as ordens do quase sempre avarento Jerry Reinsdorf, tenha, num primeiro momento, contratado Cristiano Felício e, agora, nesta semana, garantido seu contrato até o final a temporada. Lembremos que, numa decisão rara, o proprietário do clube já havia topado ultrapassar a temida “luxury tax” em US$ 5 milhões neste ano e ainda não viu problema em pagar mais US$ 500 mil para o pivô brasileiro.

Agora, ao vê-lo em ação nesta semana pelo Canton Charge, da D-League, jogando com desenvoltura, energia e repertório expandido, após ter disputado apenas duas partidas pela temporada regular, sem que tivesse entrado em quadra desde o dia 27 de novembro, o voto de confiança e a aposta no mineiro de Pouso Alegre parecem mais do que justificado. Parecem certeiros.

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Ok, não vamos julgar nada com base em duas partidas e 50 minutos pela liga de desenvolvimento. Mas é que, como brasileiros, temos uma vantagem sobre os americanos, né? Pelo menos em relação aos scouts que não tenham feito o dever de casa ao acompanhar o pivô que despontou em cenário internacional na mesma turma de Raulzinho e Lucas Bebê, o tendo se exibido para os olheiros mais atentos em 2011.

Não que os Bulls fossem os únicos antenados. Sei de dois clubes da Conferência Oeste que ao menos colocaram o nome de Felício em pauta para a composição de seus elencos de verão, mas nenhuma oferta foi feita. Um desses clubes esteve no Brasil para avaliar a garotada do Pinheiros e também inseriu seu nome no caderno de notas. Outro adorou o que viu de seus amistosos pelo Flamengo no giro de pré-temporada em 2014. Além disso, claro, pôde ser observado no adidas Eurocamp de Treviso no ano retrasado, seu bom desempenho não foi o suficiente para lhe valer uma vaga no Draft.

Como vemos agora, um ano e meio depois, não era o fim do mundo. Nesta semana, depois de cerca de um semestre de treinos com a comissão técnica de Hoiberg, pudemos ver um atleta com truques novos, enfrentando jogadores de NBA, ou que tentam voltar para lá, além de veteranos aspirantes e universitários recém-formados de sua idade, angariando mais fãs.

“Felício desenvolveu um arremesso de três pontos. Se ele puder sustentar isso, estamos falando de um cara que vai ficar muito tempo na liga”, avaliou um scout presente no ginásio do Santa Cruz Warriors, que recebe o chamado “Showcase” da D-League, com todos os clubes menores reunidos para uma série de partidas da temporada regular, agrupadas, em sequência.

Agressão
Um pouco do que Felício fez na primeira partida do Charge por estes jogos valem mais que uma exibição está aqui:

E aí já dá para reparar em como o arsenal do pivô revelado pelo Minas Tênis apresenta uma surpresinha ou outra. A começar pelos arremessos confiantes de longa distância, devidamente destacados pelo olheiro acima, e um diferencial que, sabemos bem, mais da metade da liga está buscando em seus grandalhões. Contra o Idaho Stampede, ele matou duas em quatro tentativas, sendo que a quarta foi desequilibrada, no estouro do cronômetro ofensivo. Os ataques a partir do perímetro também envolvem arremessos de média distância, do tipo que arriscava pelo Flamengo.

Mas há algo mais interessante aqui. Não é que o brasileiro tenha dado ‘apenas’ um ou dois passos para trás e expandido seu alcance no chute. Ele não parou por aí, literalmente, pois também vem apresentando movimentos calculados e inteligentes em direção ao garrafão quando não está em posição confortável para atacar o aro. Um lance no segundo tempo exibido no clipe acima mostra o jogador buscando a infiltração e finalizando de canhota com muita categoria. Da mesma forma que fez aqui na primeira partida pelo Charge contra o Oklahoma City Blue:

É uma bolaça, hein? Convenhamos. O que chama a atenção é novamente a conclusão com a mão trocada e a paciência que ele teve para iniciar a jogada, cortando da direita para a esquerda, sob controle. Alguém se lembra de ver uma ação semelhante por sua parte durante os títulos do Flamengo pelo NBB? Não me bate na telha, não. Felício esteve sempre em calmo no ataque, sem se precipitar para nada, tomando decisões corretas. Cometeu dois turnovers na primeira partida, mas não foi nada de alarmante. Em um deles, a arbitragem viu o uso indevido do braço na hora de se proteger e buscar a cesta cortando pelo fundo de quadra.

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Também não forçou a barra para buscar números e glória, mesmo que não jogasse há tempos. A diferença é que, comparando com Caboclo e Bebê, Felício ao menos teve muito mais tempo de quadra nas últimas duas temporadas pelo Flamengo, ainda que, em muitos momentos, a impressão era a de que ele pudesse ser muito mais utilizado, e seus lances pela D-League americana assim como a dominância na LDB brasileira comprovam isso. Felício pode ser muito mais do que um jogador de corta-luz e rebote no ataque. Sua habilidade como passador é bastante subestimada.

Em meia quadra:

Ou mesmo em transição:

Importante notar que o brasileiro nunca havia jogado com nenhum de seus companheiros antes. O Canton Charge é a filial do Cleveland Cavaliers, que curiosamente quebrou um galho para o rival de Divisão Central. Então na hora de fazer o corta-luz para seus armadores, abrir para o chute, ou mergulhar em direção ao garrafão, as coisas não saíam muito naturais. Falta química, claro. O entrosamento é mínimo. A despeito dessa limitação séria, se saiu bem. É preciso dizer também que ele tem bons jogadores ao seu redor, como os armadores Quinn Cook, campeão universitário por Duke e Coach K, e Jorge Gutiérrez, o mexicano ex-Bucks e Nets, o ala-pivô Nick Minnerath, versátil demais e que estaria ganhando uma boa grana na Europa, o ala John Holland, que joga por Porto Rico, e o ala CJ Wilcox, chutador cedido pelo Clippers. Ajuda ter gente qualificada ao lado, com instruções do técnico espanhol Jordi Fernandez, que trabalhava com academia Impact nos EUA.

Felício conquistou o respeito desses caras. Não basta ter o selo de NBA se não for para justificá-lo. Em termos de atitude, o brasileiro também se mostrou motivado, vibrando com as cestas dos parceiros. Essa atitude positiva se traduziu em energia em quadra, algo que nem sempre acontece no caso de enviados da liga de cima, que podem encarar a passagem pela D-League como um rebaixamento e algo de se envergonhar. Bobagem e egocentrismo exagerado, claro, em vez de se aproveitar a chance. Pois o pivô correu muito bem a quadra toda, com muita disposição e, contra a filial do Thunder, bateu seus adversários consistentemente. Veja esta sequência em que ele ganha o rebote num tapinha e já inicia o contra-ataque para concluí-lo de forma enfática:

Que tal a agressividade? Em detalhe:

Está aí outra abordagem que não era lá tão comum nos dias rubro-negros. Felício está buscando a cravada e o toco, está jogando acima do aro, e isso, no seu caso, vale muito mais como termômetro de intensidade e conforto em quadra do que pelo show:

Então temos isso hoje: um pivô que desenvolveu seu arremesso, sabe quando utilizá-lo, pode por a bola no chão e finalizar com autoridade ou categoria perto da cesta, podendo marcar 35 pontos em 50 minutos, com aproveitamento de 65,2% de quadra. Sai jogo daí, pelo menos no nível da D-League, por ora, aos 23 anos.

Agora, pensando em NBA, todas essas informações são bem relevantes, mas não necessariamente essenciais. Pois, num primeiro momento, tanto o Bulls como a concorrência não vai procurar neste showcase um jogador de referência, para carregar o ataque titular ou da segunda unidade. A prioridade dos scouts é encontrar peças complementares, para ajeitar a rotação. Que possam produzir algo no ataque, mas que, essencialmente, cuide bem das coisas do outro lado. “Rebotes, defesa, jogar duro e de forma inteligente: são essas as chaves para ele”, afirma outro scout ao blog.

Contenção
Contra o OKC B, Felício pegou apenas três rebotes em 27 minutos. Um problema? Não, pelo menos não para que tenha visto o jogo. Este é mais um caso de como se precisa muita calma na hora de falar sobre os números que sejam computados numa súmula de jogo. Foram várias as ocasiões em que o brasileiro simplesmente limpou terreno para que seus companheiros pudessem fazer a captura da bola. Como no vine abaixo, em que consegue conter o corpanzil de Dakari Johnson, um pivô muito promissor vindo da fornalha produtiva de John Calipari em Kentucky:

Felício é um bom reboteiro, com uma base forte nas pernas para guardar posição, excelentes mãos para fazer o controle e tino para se posicionar bem, compensando a impulsão reduzida quando tem os dois pés no chão. Número por número, já foram oito em 22 minutos contra o Stampede.

Na hora de proteger a cesta, uma característica pôde ser notada: Felício se saiu muito melhor contra pivôs mais pesados, que gostem de jogar perto da cesta, do que contra alas-pivôs ágeis e flexíveis que pudessem atacar usando o drible frontal, fora do garrafão. Abaixo, ele consegue segurar Dakari Johnson no tranco. Depois, vê Talib Zanna, mais baixo e leve, lhe contornar. Primeiro, a brecada:

Deu Cesta:

Em quadras brasileiras, Felício já mostrou mais agilidade em seu deslocamento lateral, sendo o tipo de pivô que consegue brecar armadores. Nessas últimas duas partidas, pareceu um pouco mais pesado e lento. Ou talvez seja apenas a relativização de suas habilidades atléticas diante de atletas de primeiro nível, tal como aconteceu em pelo menos três investidas de jogadores do Stampede, deixando o brasileiro para trás. É algo para se acompanhar. Pensando na NBA, é muito mais provável hoje que ele tenha que lidar com Zannas do que Johnsons. É algo que os scouts vão analisar com cuidado.

De toda forma, a impressão em geral no momento é de surpresa e otimismo. Em Chicago, num time que sonha com o título,  com tantos pivôs qualificados acima na rotação, Felício não vai ter muitas chances nesta temporada. Mal vai jogar. Ainda assim, teve seu contrato renovado, o que para ele, no câmbio de hoje, também rende uma gratificante bolada, além da satisfação de (primeiro) dever cumprido. Ao mesmo tempo, Paxson, o gerente geral Gar Norman e o técnico Fred Hoiberg sabem de que tipo de talento estão cuidando. Estão pensando mais longe, pedindo um investimento de Reinsdorf para o futuro. E, assim como aconteceu com Portis, para o restante da liga a capacidade de se seu outro pivô talentoso e novato não é mais segredo nenhum.


A final não é brasileira, mas o Bauru ainda é o favorito
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Giancarlo Giampietro

Alex, perto de mais um título continental

Alex, perto de mais um título continental

Não há como negar: o Bauru vai entrar em quadra neste domingo como o grande favorito ao título da Liga das Américas, no Rio de Janeiro. Tem grandes chances, sim, de estender a sequência de títulos do Brasil no torneio continental para três. Afinal, o time de Guerrinha já soma 15 vitórias consecutivas em partidas internacionais nesta temporada, somando aqui aquelas que fez para ganhar a Liga Sul-Americana. E não só isso. O clube paulista vem simplesmente arrasando os concorrentes que enfrenta pelo caminho, com uma margem de pontos superior a 27 pontos em média, tendo batido o Peñarol de Mar del Plata por 88 a 61, de modo incontestável.

Agora, uma coisa é o jogo falado, outra é o jogado, como diria qualquer um neste sábado, após o Pioneros de Quintana Roo, do México, ter derrubado o Flamengo e impedido uma decisão 100% nacional. Para frustrar o Maracanãzinho e a organização do Final Four da LDA como um todo, os caras batalharam, por vezes literalmente, contra o Flamengo, vencendo por 81 a 80. Já aprontaram uma, agora vão tentar outra.

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Sim, por mais que a mesma equipe mexicana tenha vencido o torneio em 2012 e tenha chegado ao Rio de Janeiro com cinco triunfos e apenas uma derrota, foi uma surpresa o resultado da segunda partida do dia. No papel, o elenco rubro-negro é muito mais qualificado. Acontece que os visitantes não permitiram que esse talento fizesse a diferença, jogando um basquete muito combativo, físico para desestabilizar um ataque geralmente potente.

Não teve bicampeonato para Neto e o Flamengo

Não teve bicampeonato para Neto e o Flamengo

Foram 25 faltas cometidas, com direito a dois jogadores excluídos. Um estilo que gera, obviamente, muitos lances livres – e o Flamengo, como um todo, falhou nos tiros de um ponto, (19-28, 68%). Mas as falhas na linha não foram a única razão isso para explicar o resultado. A defesa agressiva  também forçou 17 turnovers, cinco deles pelas mãos de Nícolas Laprovíttola. Marquinhos foi o único jogador de perímetro brasileiro que conseguiu enfrentar esses caras e prevalecer, com uma grande atuação (27 pontos, 8-10 nos lances livres, 8-13 nos arremessos, em 41 minutos).

Com ou sem porrete, os mexicanos defenderam muito bem o jogo exterior de seu adversário, limitando o time da casa a míseras 6 bolas de três pontos em 28 tentativas, para um aproveitamento de 21%. Isso, na real, não chega a ser uma novidade, uma vez que, no duelo entre ambos no dia 25 de janeiro, o Fla já havia acertado apenas 10 em 32 (31%). Junte os dois, e temos 16-60. Fica difícil de vencer assim, e aí faltou procurar outros – e melhores – caminhos para explorar Jerome Meyinsse, muito mais explosivo que seus oponentes, debaixo do aro. O pivô acertou sete de oito tentativas de cesta, mas também cometeu cinco desperdícios de posse de bola, somando 16 pontos em 39 minutos. Cristiano Felício ficou apenas cinco minutos em quadra e também poderia ter ajudado.

Na defesa, o que matou foi a dificuldade em marcar o pivô Justin Keenan, pesadão, mas com bom arremesso, se desmarcando em jogadas de pick and roll ou pick and pop para matar tiros de média para longa distância ou descolar faltas (25 pontos, 8-15 de quadra e 7-9 nos lances livres). A comissão técnica do Bauru certamente tomou nota disso, que o grandalhão tem de ser respeitado e contestado, até porque o armador Brody Manjarres não finaliza tão bem assim quando mais perto da cesta.

Ao ver estes números, Manuel Cintrón, ex-treinador de Porto Rico que diz ter ficado dois anos em fase de “reciclagem”, poderia se sentir até mais confortável ao caminhar para o embate com o Bauru na decisão. Afinal, sabemos bem que o clube paulista investe bastante nos chutes de longa distância também. Acontece que seu poderio ofensivo é tão grande que, mesmo numa jornada em que essas bolas não caem (8-36, 22% contra o Peñarol), os bauruenses podem chegar a 80 pontos.

Murilo, diferente de Jefferson, mas igualmente perigoso. Novas possibilidades no ataque

Murilo, diferente de Jefferson, mas igualmente perigoso. Novas possibilidades no ataque

Jefferson William faz falta no espaçamento de quadra, mas a dupla Murilo-Hettsheimeir oferece um jogo interior muito interessante para Guerrinha e um problema para qualquer oponente (somaram 34 pontos, 12 rebotes e 13-23 nos arremessos, com Rafael novamente exagerando na dose de três, errando sete de nove disparos). Outra: não é segredo que o eterno Alex adora uma partida de muito contato físico, batendo para dentro, desafiando gente muito maior. Na semifinal, fez um pouco de tudo, com 18 pontos, 6 assistências e 7 rebotes, 4-10 nos arremessos e 8-9 nos lances livres, em 31 minutos. Sua intensidade será importantíssima neste domingo.

Bauru e Pioneros também já se enfrentaram pela Liga das Américas, 22 de fevereiro. A equipe brasileira venceu por 92 a 79. Os 13 pontos, porém, foram abertos apenas no quarto final, com uma parcial de 28 a 15. Naquela ocasião, curiosamente, Manjarres anotou 17 pontos, mas foi o intempestivo Romel Beck Castro o cestinha, com 28 pontos e 6-10 nos tiros de fora – o restante do time ficou em 3-14. Do outro lado, os campeões paulistas mataram 13-35 e mais de 50% nos arremessos gerais. Ricardo Fischer jogou demais, com 19 pontos, 8 assistências e 6 rebotes (8-11), mas pode esperar algumas bordoadas neste domingo. A ver se essa dinâmica vai se repetir.

Antes de o torneio começar, Cintrón resumiu bem o estado de espírito de seu time: “Não temos nada a perder. Não havíamos traçado esta meta, de chegar ao Final Four, e a conseguimos. Vamos jogar como se fora um partido a mais e com a tranquilidade de saber que o trabalho deu resultados”. Resultado por resultado, o Bauru tem um retrospecto recente muito mais relevante. Agora resta confirmar isso em quadra.


20 votos para o Jogo das Estrelas do NBB 2015
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Giancarlo Giampietro

Cabem quantos do Bauru no Jogo das Estrelas?

Cabem quantos do Bauru no Jogo das Estrelas?

A assessoria de comunicação da Liga Nacional de Basquete cometeu a loucura de me estender um convite para participar da votação para o Jogo das Estrelas do NBB7, que vai ser disputado entre os dias 6 e 7 de março, com sede ainda para ser anunciada.

Ao menos essa responsabilidade foi divida entre diversos companheiros de imprensa, assim como os técnicos – e seus assistentes –, capitães e (!) árbitros envolvidos com a competição, além de outras “personalidades” da modalidade. Cada um dos eleitores teve a chance de escolher dez nomes para o time brasileiro e outros dez para a equipe estrangeira. Você precisa dividir cada grupo entre titulares e reservas, e os votos dedicados aos titulares ganham peso maior.  Essa é uma novidade no processo que, creio, ajuda a diminuir a chance de injustiças.

Mas, prepare-se, elas podem acontecer. Veja a repercussão, na NBA, para a exclusão de um enfezado Damian Lillard, que não conseguiu nem mesmo a 13ª vaga e foi ao Instagram protestar, lembrando que havia sido ignorado por torcedores, técnicos e até pelo comissário Adam Silver. Ele merecia a vaga de Kevin Durant? Para mim, sim, levando em conta o fato de que o ala de OKC perdeu metade da temporada norte-americana.

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Esse tipo de polêmica certamente vai aparecer aqui neste espaço, agora que abro minhas 20 escolhas. Inevitável. Mas boa parte das discussões depende de quais critérios cada um vai adotar para escolher sua seleção. Pesa mais o sucesso da equipe ou o rendimento individual de cada atleta? Na dúvida, preferi a solução mais fácil: dosar um pouco de cada caminho. Privilegiei os destaques das melhores campanhas, mas também tentei abrir espaço para caras que estejam numa ótima temporada, ainda que seus clubes decepcionem. Só procurei pensar apenas no que acontece neste ano, e, não, ignorando o conjunto da obra – se o cara é o cestinha histórico do NBB, se é medalhista olímpico, se já passou pela NBA etc.

Mais: você vai segmentar, estratificar os jogadores por posição? Na planilha encaminhada pela LNB, era preciso escolher um armador, dois alas e dois pivôs. Esses conceitos são todos meio relativos, não? Pegue um time como Limeira, uma das gratas notícias do campeonato. Nezinho, Ronald Ramon e Deryk estão revezando constantemente, dividindo a quadra, escoltados pelo gatilho de David Jackson, do jeito que o Paulo Murilo pregou sempre em seu Basquete Brasil – e quando dirigiu o Saldanha da Gama. Tentei ir um pouco além da nomenclatura clássica.

Vamos aos votos do VinteUm, então, seguidos por breves explicações. Os quintetos titulares vão ser escolhidos pelos torcedores:

NBB – Brasil
Titulares
Nezinho (Limeira)
Alex Garcia (Bauru)
Marquinhos (Flamengo)
Jefferson William (Bauru)
Rafael Hettsheimeir

Reservas
Coelho (Minas)
Leo Meindl (Franca)
Giovannoni (Brasília)
Gerson (Mogi das Cruzes)
Caio Torres (reservas)

Jefferson merece o posto de titular: influência tática e técnica

Jefferson merece o posto de titular: influência tática e técnica

O desafio aqui foi evitar de escalar todo o elenco do Bauru, né? Tendo apenas 10 vagas em cada seleção, achei o mais correta a distribuição entre mais clubes, impondo um limite de três atletas para cada agremiação. E aí Ricardo Fischer acabou sendo sacrificado, em detrimento de seus companheiros bauruenses escalados entre os titulares (Alex segue influenciando o jogo dos dois lados da quadra, resistindo ao tempo, Jefferson William é fundamental no sistema de Guerrinha por sua mobilidade e poder de execução, além de um bem-vindo nível de atividade na briga por rebotes e na defesa, e Rafael Hettsheimeir, ainda que deveras enamorado pelo chute de fora, vem sendo bastante produtivo em seu retorno ao país). Nezinho assume a vaga de Fischer, sendo um dos líderes do Limeira, pontuando com muito mais eficiência do que na temporada passada, ainda que frequente menos a linha de lance livre. Para completar, Marquinhos, que ainda não recuperou o ritmo de seu sensacional NBB5, mas tem números que igualam ou superam sua última campanha, em menos minutos, e ainda é um pesadelo para qualquer defesa nacional conter. O Flamengo também não tem sido o mesmo, mas, da mesma forma, continua sendo um time de respeito

Marquinhos: os números não são os do auge, mas a ameaça é a mesma

Marquinhos: os números não são os do auge, mas a ameaça é a mesma

No banco, o jovem Coelho merece reconhecimento: ganhou autonomia em Belo Horizonte e respondeu muito bem, obrigado. Em termos de produção, é o jogador mais eficiente de sua posição entre os brasileiros, com 14,59 por jogo, mais que o dobro de sua carreira – e o mais interessante pode melhorar muito ainda como um armador forte, veloz e agressivo. Confesso: foi uma dúvida brutal optar entre ele e Nezinho na vaga de titular, mas pesou a maior propensão ao passe e o recorde da equipe do veterano. Leo Meindl vem numa curva ascendente em sua carreira, ajudando o Franca a se manter entre os seis primeiros, a despeito dos problemas financeiros. Talvez não no ritmo esperado, mas está subindo enquanto se distancia de uma complicada lesão no joelho. Seu arremesso de três pontos o abandonou nesse campeonato, e talvez fosse mais interessante que ele usasse sua habilidade no drible e o jogo de média distância para buscar a cesta. Giovannoni faz uma temporada que o colocaria na discussão para MVP, mas o fato de o Brasília ser a grande decepção da temporada impede que isso aconteça.  Foi cruel deixar Lucas Cipolini fora, mas não havia como eleger dois atletas do time candango, a despeito de seu ótimo rendimento estatístico. No garrafão, temos então o jovem e hiperatlético Gérson, que faz Mogi crescer cada vez que vai para quadra com seu energia e dedicação extrema, e Caio Torres, em boa forma, vai fazendo a melhor temporada de sua carreira nos rebotes e como referência interior do time que menos arremessa de três no campeonato. Entre ele e Rafael, a dúvida também é grande. Seus números são superiores, mas o bauruense divide a bola com mais gente. A campanha abaixo de 50% do São José também não ajuda.

NBB – Mundo
Titulares
Jamaal Smith (Macaé)
David Jackson (Limeira)
Marcos Mata (Franca)
Tyrone Curnell (Mogi das Cruzes)
Jerome Meyinsse (Flamengo)

Reservas
Kenny Dawkins (Paulistano)
Ronald Ramón (Limeira)
Jimmy Baxter (São José)
Shamell (Mogi das Cruzes)
Steven Toyloy (Palmeiras)

Jamaal, decisivo nas poucas vitórias do Macaé

Jamaal, decisivo nas poucas vitórias do Macaé

A posição de armador estrangeiro, gente, é a mais concorrida de todo o campeonato. Não encontrei lugar aqui para Caleb Brown, limitado a apenas oito jogos em Uberlândia devido a dores lombares), para o jogo clássico do baixinho Maxi Stanic, do Palmeiras, e nem para Nícolas Laprovíttola, que anda muito inconstante. David Jackson, creio, é uma unanimidade como um arremessador letal de todos os cantos da quadra. Já Mata e Tyrone servem como influência mais que positiva para os jovens companheiros devido ao tino para cuidar de pequenas coisas e a conduta exemplar em quadra. Curiosamente, de tanto fundamento que tem, o argentino vira uma arma ofensiva em quadras brasileiras, assim como aconteceu com seu compatriota Frederico Kammerichs. Curnell pode não ser o jogaodor mais refinado, mas seu vigor físico e seu empenho contagiam. Quando faz dupla com Gérson, é melhor sair da frente – uma dupla que representa bem a identidade vibrante do Mogi. Meyinsse é hoje o pivô mais completo em atividade no país, dosando força física e agilidade acima da média.

Toyloy, uma fortaleza difícil de se combater no garrafão

Toyloy, uma fortaleza difícil de se combater no garrafão

Ramón ganha uma vaga pela consistência que dá ao trio de armadores de Limeira, clube cujo rendimento pede também três indicados. Seus números caíram em quantidade, mas subiram em qualidade, ocupando uma vaga que, em nome e números poderia ser do jovem Desmond Holloway. O Paulistano, porém, insere o explosivo Dawkins no quinteto reserva, mesmo que não repita a química obtida no campeonato passado. Baxter tem números inferiores aos de Robbie Collum (em menos minutos também), uma figura importante para o Minas, mas se sobressai pela postura defensiva. Shamell tem passado bem menos a bola, mas ainda se sustenta como um cestinha decisivo nas quadras brasileiras, enquanto Steven Toyloy voltou a ser uma rocha no garrafão depois de um ano em que foi subaproveitado pelo Pinheiros, levando um Palmeiras a uma honrosa sétima posição.
Estão aí. Se for para xingar, que seja com educação, tá?


Flamengo perde, mas mostra que não é café-com-leite
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Giancarlo Giampietro

Laprovíttola x Thomas: argentino nem se importou com rivais mais badalados (e bem mais ricos)

Laprovíttola x Thomas: argentino nem se importou com rivais mais badalados (e bem mais ricos)

Os aspectos que valem mais na turnê rubro-negra pelos Estados Unidos dizem respeito realmente ao que o clube pode ganhar em outras esferas, fora de quadra. Seja do ponto de vista logístico, estratégico e até – por que não? – comercial.

Mas, para quem acabou de conquistar a Copa Intercontinental, vem de um bicampeonato no NBB e tem também o troféu de melhor da América (Latina), o jogo também até que é importante. O Flamengo não pode ser visto como café-com-leite. Foi o que o primeiro time latino-americano a competir no maior palco da modalidade mostrou nesta quarta-feira, ao fazer uma partida dura com o Phoenix Suns, embora perdendo 100 a 88.

Alguma ressalvas, claro, precisam ser colocadas logo de cara: este foi apenas o primeiro jogo do Suns em sua pré-temporada. Eles estavam treinando pesado a mais de 2 mil metros de altitude até o final de semana e em diversos momentos dava para notar seus atletas pareceram um pouco pregados em quadra – os efeitos positivos da correria em Flagstaff devem ser sentidos mais adiante, ou assim espera, ao menos, sua comissão técnica. Além disso, o ginásio nem encheu, e tal. Para eles, esta é apenas uma fase de ajustes e de desenferrujar. Não entra para os registros oficiais.

Meyinsse fez de Miles Plumlee gato e sapato. Pivô do Fla tem bola para jogar em alto nível

JErome Meyinsse fez de Miles Plumlee gato e sapato. Muito forte, atlético e determinado, pivô do Fla tem bola para jogar em alto nível. Grande sacada de mercado dos rubro-negros

Posto tudo isso, ninguém vai jogar para perder – Gregg Popovich não infartou, mas também não ficou só de sorrisos em sua entrevista depois de a máquina chamada Spurs ser derrotada pelo modesto Alba Berlim, um pouco mais cedo, na capital alemã. Para o Suns, ainda contava o orgulho de jogar em casa, mesmo que vazia, contra um time ‘inexpressivo’ para o mercado de lá.

(Antes que os rubro-negros se enfureçam: os caras nem bem sabem o que é Barcelona ou Real Madrid no basquete – o problema é de ignorância norte-americana, e, não, de irrelevância flamenguista, tá?)

“Foi um jogo estranho… Não sabíamos muito sobre o Flamengo. Então foi um pouco difícil”, afirmou Goran Dragic, que, convenhamos, não jogou nada (6 pontos em 25 minutos, 2-9 de quadra, três turnovers e uma assistência). O astro esloveno foi dos que aparentou maior cansaço e falta de sintonia em quadra, errando até mesmo bandeja livre no contra-ataque.

Os treinadores e atletas do Suns podem ter estudado um minutinho ou outro do time brasileiro, mas certamente não conheciam em detalhe, por exemplo, os truques que um Nícolas Laprovíttola pode apresentar. O argentino pode ter forçado muitos chutes de três pontos (1-5, com péssimas escolhas) e algumas infiltrações sem destino, mas mostrou que tem talento para competir no mais alto nível, entrando no garrafão, cavando diversas faltas e tudo o mais, sem se intimidar com um pitbull como Eric Bledsoe (somou 13 pontos, sendo 10 deles em lances livres, e deu 12 assistências).

O armador não estava sozinho nesse sentido. Vários atletas flamenguistas mostraram categoria em diversos momentos da partida, quebrando alguns tabus a respeito de suas qualidades. Pesa para o elenco rubro-negro também seu entrosamento, sua química, sua continuidade são fatores que fazem diferença em qualquer esporte, mas que no basquete são ainda mais importantes. São essenciais.

Do ponto de vista individual, todavia, nada foi mais instigante do que ver o jovem Cristiano Felício causando impacto no garrafão, levando a melhor sobre um desastrado Miles Plumlee e dando um trabalho danado para os irmãos Morris. Fisicamente, no mínimo, está pronto. A técnica (sempre) pode melhorar, mas já está claro, no pouco tempo que recebe, que pode influenciar um jogo para agora – e não apenas num futuro hipotético baseado em seu potencial evidente.

Para constar: em 15 minutos, ele teve o maior saldo de pontos (o plus/minus) do Flamengo, com +13. Foram oito pontos e oito rebotes para o pivô. Ele realmente já pede um voto de confiança maior de Neto e precisa jogar, e mais. O rubro-negro só tem a ganhar com isso, e o basquete brasileiro, em geral, também agradeceria.

Sempre mais admirado fora do país do que por aqui, Marcelinho anotou 16 pontos em sua estreia numa quadra de NBA, contra um Dragic sonolento-quase-parando. Mas cometeu cinco dos 26 turnovers do Fla, fazendo muita firula na hora de passar a bola. No total, o jogo teve 47 desperdícios de posse de bola. Isso é pré-temporada

Sempre mais admirado fora do país do que por aqui, Marcelinho anotou 16 pontos em sua estreia numa quadra de NBA, contra um Dragic sonolento-quase-parando. Mas cometeu cinco dos 26 turnovers do Fla, fazendo muita firula na hora de passar a bola. No total, o jogo teve 47 desperdícios de posse de bola. Isso é pré-temporada, não podemos esquecer

Enquanto isso, o americano Derrick Caracter, contratado de última hora especificamente para a Copa Intercontinental e para o giro de amistosos nos EUA – pelo que vemos, desnecessariamente –, mal conseguiu fazer cócegas em seus compatriotas (cometeu dois turnovers em 9 minutos e mais nada). Ao contrário de Jerome Meyinsse. O pivô titular também fez bela partida, com 15 pontos em 24 minutos, dominando o garrafão ofensivamente no primeiro quarto até se atrapalhar com as faltas.

Foi investindo em Meyinsse, mesmo, que o Flamengo fez um belo início de partida, chegando a abrir vantagens como 6-0, 13-8 e 30-25, até meados do segundo quarto, quando o time da casa assumiu a liderança pela primeira vez no duelo, com 34-33. Se bem observado pelos olheiros internacionais, o pivô não deve durar muito no mercado brasileiro. Assim como Laprovíttola.

A partir do momento em que o Suns passou a rodar seu elenco, bem mais volumoso, o aspecto físico foi fazendo a diferença, ainda mais numa etapa ainda preliminar da preparação física dos caras. As escapadas no placar da equipe norte-americana aconteceram justamente na segunda parcial como na quarta, com o jogo de transição com pernas mais descansadas fez estragos. Vale destacar aqui outro ponto: o fato de o jogo da NBA ser mais longo, com oito minutos a mais do que os brasileiros estão habituados a disputar (20% mais longo). Cansa.

Por outro lado, mesmo que seja só um amistoso, de pré-temporada, também dá para puxar a orelha em termos de execução ofensiva também. Se o Fla tivesse maneirado nos arremessos de três pontos – ou caprichado mais, já que optaram pelas bombas… –, numa linha ainda mais distante que a da Fiba, talvez a história pudesse ter sido diferente. Vai saber. O time da Gávea matou apenas 6-25 de fora (24%). Quando o ataque alimentou os pivôs e usou mais infiltrações, foi muito mais produtivo. Nos primeiro e terceiro períodos, quando conseguiu segurar mais o jogo, a equipe de Neto venceu por 49 a 38. Mesmo.

Está certo: não foi um desastre, muito longe disso. Para se ter em mente: até agora o Maccabi Tel Aviv, aquele mesmo que foi derrotado na Copa Intercontinental pelos rubro-negros, já disputou dois e tomou duas pauladas. Nesta terça, deu Brooklyn Nets: 111 a 94. No primeiro jogo, contra o Cleveland Cavaliers, o placar foi de 107 a 80.

Para quem vem fazendo história em quadra, porém, ambição não pode faltar. Na próxima semana, tem mais: quarta, contra o Orlando Magic (teoricamente o jogo mais ganhável) e na sexta contra o Memphis Grizzlies. Os dirigentes, a comissão técnica e os jogadores vão descobrir mais instalações, mais atletas, mais conexões – e também podem fazer um pouco de turismo, que ninguém é de ferro. Mas, sim, pelo que apresentou em seu primeiro teste contra o Suns, dá para pensar em aprontar algo a mais que uma lista de presentes ou a lição de casa.


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