O adeus de Pop e mais algumas histórias sobre Tim Duncan
Giancarlo Giampietro
Tal como a contratação de Durant pelo Warriors, a aposentadoria de um cara como Tim Duncan é um tanto difícil de se assimilar. Foram 19 anos de NBA com ele no topo. Aí o cara decide que sua carreira chegou ao fim e não faz nem mesmo uma declaração formal para o release do Spurs. Foi assim: pronto, acabou.
O lado positivo do anúncio? De segunda-feira para cá, o pivô, talvez muito a contragosto, foi homenageado sem parar. Se a despedida de Kobe Bryant foi celebrada durante toda uma temporada regular – diluída, portanto –, a de TIMMY! veio de uma só vez, com artigos, galerias, clipes e anedotas despejados no ciberespaço nos últimos dois dias. Quem saiu ganhando com isso? Nós.
Então segue aqui um apanhado de histórias e memórias sobre um jogador que pouco deu o que falar para tabloides ou mesmo em termos de perfis, já que não era o cara mais aberto ou disposto com jornalistas.
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Começamos com um resumo do emocionado – sim, acreditem, emocionado – depoimento de Gregg Popovich nesta terça-feira, em San Antonio, antes de iniciar sua coletiva. Para constar, o Spurs ainda não conseguiu marcar com Duncan sua própria entrevista. Para quem quiser conferir na íntegra como foi o bate-papo com o técnico e presidente do clube, em inglês, o repórter Calvin Watkins, do ESPN.com, prestou o serviço público de transcrever tudinho. Vamos lá:
“Estou tentando organizar minha cabeça enquanto estou aqui e ele não está mais. E nós todos sabemos por quê. Dissemos isso por 19 anos, e ele realmente só se importou em fazer o melhor trabalho que podia quando o assunto era basquete, além de ser quem ele era com seus companheiros, alguém também que amava sua família. Ele é realmente isso.
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Essa entrevista jamais passa pela cabeça dele, então imaginei que o melhor era eu vir aqui e dar conta disso e de alguma forma dizer adeus a ele, o que é impossível por um monte de razões.
Tentei pensar em como compará-lo a alguém e o que dizer sobre ele. Sei que todo mundo comenta sobre com quem gostaria de jantar um dia. Sabe, se pudesse escolher alguém para jantar, almoçar, ou algo assim. As pessoas vão dizer nomes como Madre Teresa, Jesus, Dalai Lama, e, ok, eu entendo. Mas se você for pensar em pessoas mais mundanas, pessoas interessantes, penso em gente como William F. Buckley pela direita e Gore Vidal pela esquerda, com seus debates, pessoas muito espertas, cheias de ideias que mexiam contigo. E eu posso honestamente dizer (soluça) que meu jantar seria com Tim Duncan, porque ele é a pessoa mais real, consistente e verdadeira que já encontrei na minha vida. Ele era tão genuíno, que mexe com sua cabeça, como Buckley e Vidal fizeram de um jeito meio que avant-garde.
Passar um tempo com Timmy é algo sublime em diversas maneiras. As pessoas não sabem muito sobre sua inteligência. Penso em caras como John Cleese, espertos, incisivos, sarcásticos. Ninguém conhece esse lado de Timmy. Posso estar na orelha dele durante um jogo, perguntando de um modo duro por que ele não está pegando rebotes, na frente de todo mundo, e, na saída da quadra, ele vai dizer: ‘Obrigado pela motivação, Pop’, ‘Obrigado pelo apoio, Pop’, e se virava, olhando para o nada, nós começávamos a rir. Essas coisas passam despercebidas, mas seus companheiros reparam, e é por isso que els o amam, porque ele foi o melhor companheiro que qualquer um poderia imaginar.
Pense em quantas pessoas já jogaram com ele, e tudo o que Tim Duncan precisava fazer era levantar um dos braços, direito ou esquerdo, e colocar sobre seus ombros, e vinha daí um conforto que os permitia se tornar o melhor jogador que poderia ser. Tivemos um monte de jogadores que passaram por aqui e tiveram sucesso e foram para outros lugares apenas porque Tim Duncan criou esse ambiente.
Não é questão de falsa modéstia, de jeito nenhum. As pessoas que cresceram comigo me conhecem. Mas não estaria aqui se não fosse por Tim Duncan. Estaria em uma Liga Budweiser em algum lugar da América, gordo, e ainda tentando jogar ou treinar um time de basquete. Mas estou aqui. Ele fez a vida de centenas de nós, estafe e treinadores, durante os anos, e nunca disse nada. Ele apenas veio trabalhar todo dia. Chegou cedo, saiu tarde. E estava lá disponível para qualquer pessoa, desde os jogadores mais prestigiados aos menos conhecidos por que ele era assim, em todos esses aspectos.
Ele é insubstituível. Não vai acontecer. Nós somos todos únicos, mas ele foi tão importante para tantas pessoas que é incompreensível. Pensar que ele não está mais aqui deixa tudo difícil, desde ir para um treino ou pegar um pedaço de bolo de cenoura.”
Foi demais.
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Agora, se for para ler sobre a parceria entre Duncan e Popovich, um texto de 2014 de Marc Stein, também do ESPN.com, parece ainda definitivo. É longo, mas imperdível, com depoimentos de Kobe, Shaq e inúmeras fontes do universo Spur ou de adversários desse time histórico. Stein lembra quando Pop esteve a perigo no cargo, com a torcida pedindo por Doc Rivers e quando o mesmo Doc esteve perto de levar o pivô para Orlando, também discute a importância de R.C. Buford nessa relação, entre tantos causos.
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Antes de iniciar a sessão de perguntas e respostas, o treinador, então, citou um artigo do Wall Street Journal como um resumo perfeito da essência de Duncan como jogador. Aqui está: “Tim Duncan se vai, brilhantemente, sem vaidade“. Pego emprestada apenas o último parágrafo do texto assinado por Jason Gay: “Se você o viu jogar, será sua missão lembrar as futuras gerações que não o viram. O basquete é um jogo atordoante, com tanta criatividade individual, que é fácil se levar por um momento deslumbrante e ignorar o aspecto genial da consistência. Mesmo que Tim Duncan não tenha sido o mais brilhante, o mais barulhento ou o mais celebrado, dava para ver em seu jogo a verdadeira grandeza da NBA, por 19 anos ininterruptos. Você viu a história. Você viu Tim Duncan.”
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Foram realmente diversos textos sensacionais publicados em nome de Duncan. Kevin Arnovitz, do ESPN.com, afirma que o pivô foi “o jogador mais influente de sua época“. Algo talvez que você não imaginava ler, considerando a popularidade de Shaq, Kobe ou até mesmo de um ícone urbano como Iverson. Então que influência foi essa? “Embora ele tivesse pouco apelo público para fora da zona central do Texas, ele iniciou uma mudança cultural nos centros de treinamento da NBA, nos vestiários e mesmo nas suítes dos executivos. A NBA de hoje se tornou obsessiva pela adoção e instauração de uma cultura organizacional. Sempre buscando por alguma vantagem num ambiente competitivo, as franquias tornaram a cultura de trabalho como um baluarte”, escreve.
Em suma: o jeito San Antonio de vencer. E aí vemos alunos de Pop e R.C. Buford espalhados por toda a liga, como em Atlanta, OKC, Utah, New Orleans, Brooklyn, com os proprietários dessas franquias apostando nesses ideais. Mas apenas San Antonio tinha um Tim Duncan. “Nós todos entramos em nossas casas e agradecemos a ele. Pense em todos os técnicos, gerentes gerais e mesmo os assistentes de vídeo que agora são assistentes técnicos, todas as pessoas que subiram na hierarquia da liga. Devemos todo nosso sucesso e nossas vagas a Timmy. A ‘cultura’ foi Timmy”, disse Mike Budenholzer, presidente e técnico do Hawks.
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E o que dizer de Tim Duncan e o Brasil?
Bem, o pivô enfrentou a seleção nacional em algumas ocasiões. Primeiro como uma promessa universitária ainda.
Renan Damasceno, conta no Super Esportes da vez em que Tim Duncan jogou em Belo Horizonte e, depois de derrotado, foi ao vestiário brasileiro pedir dicas a Josuel. Queria aprender algumas manhas a mais sobre o tradicional gancho do gigante brasileiro. Sim, tudo isso aconteceu em 1996, um ano antes do pivô das Ilhas Virgens chegar a San Antonio.
Gustavo Faldon e Luís Araújo, pelo ESPN.com.br, foram atrás dos vascaínos que enfrentaram o Spurs em 1999 pelo exinto McDonald’s Championship, em Milão. A dupla também aproveitou um papo com Rogério Klafke para ir um pouco mais atrás no tempo, em 1994, quando Duncan estava treinando junto com os astros da NBA que iriam ganhar o Mundial do Canadá.
Quase uma década depois, em 2003, Duncan estava sendo dirigido justamente por Pop, a serviço da seleção americana que dominou o Pré-Olímpico de San Juan. O jogo de estreia foi justamente contra uma jovem seleção, com uma vitória fácil por 110 a 76. Pouco depois de conquistar o segundo título de sua carreira, Duncan anotou 17 pontos em 16 arremessos e só errou dois de dez arremessos. Uma dessas tentativas frustradas veio em toco do sempre ‘brabo’ Alex. O tipo de lance que rendeu ao ala-armador a proposta para jogar pelo Spurs.
Vale dizer que essa Copa América foi o grande momento Fiba da carreira do pivô. Em 2004, ele viveu uma Olimpíada infernal. Não só não evitou o vexame de três derrotas num mesmo torneio (uma bizarrice para a geração NBA, para Porto Rico, Lituânia e Argentina), como saiu enfurecido com a arbitragem, dizendo-se perseguido. Jamais defenderia o Team USA depois dessa.
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Por fim, duas anedotas de quadra da liga, de duas figuras.
Primeiro vamos com Steven Adams. O pirado neozelandês de OKC agora, em 2016, dominou o quarentão. Mas nem sempre foi assim: “Ele é um cara legal. Aí cometi meu maior erro quando era novato. Eu estava, tipo, batendo nele o tempo todo, e ele estava tendo dificuldade com isso. Aí ele se aproximou uma hora e falou comigo um pouco. Algo como: ‘E aí, amigão, como você está?’, esse tipo de coisa. Pensei: ‘Poxa, que cara bacana’. Depois disso, ele fez uns 20 pontos. Fui ao M.B. (Mark Bryant, assistente técnico da equipe) e disse isso. E ele falou: ‘Foi uma manha de veterano! Não faça isso. Você não pode ser legal em quadra’. E eu meio que dei de ombros. ‘Mas ele é um cara legal! Desculpe!’, respondi”
Por fim, recorremos ao ex-pivô Ethan Thomas, que não chegou a deixar saudades por onde passou, mas se tornou um dos atletas da liga mais engajados em causas políticas e sociais na década passada.
Sua história, porém, é mais simplória e reveladora: “Estávamos jogando contra o Spurs, e eu recebi a bola no garrafão. Fiz o pivô por dentro e avancei para o meio para tentar um gancho, e ele me bloqueou. Quando estávamos correndo em transição, ele me diz: ‘Foi um bom movimento, mas você tem de me atingir mais, para ou levar a falta ou para que eu não consiga te bloquear’. Não sabia se ele estava me provocando ou o quê, então apenas olhei para ele e disse: ‘Ok’. Então, algumas jogadas depois, fui para cima novamente, encostei mais no corpo dele e ele não conseguiu dar o toco. Errei o arremesso, mas ele olhou para mim e disse: ‘Bem melhor’, e eu segui jogando (risos)”.
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