Vinte Um

Arquivo : Paul Gasol

Miami, enfim, iguala intensidade do Indiana, se livra de zebra e está na final da NBA
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Giancarlo Giampietro

Chris Bosh vive na defesa!

Até o Chris Bosh marcou bem nesta segunda. Aí complicou para o Indiana de David West

De tanto que se fala, pode parecer o discurso mais automático de todos, uma falácia, o clichê dos clichês. E nem sempre esse discurso explica tudo, mesmo. Mas que pode fazer diferença? Ô se pode.

Tudo isso para falar de “energia”, “intensidade”, “vontade”, “raça”. São quesitos que supostamente seriam obrigatórios para jogadores que ganham milhões e milhões por seus contratos – só de salário. Mas nem sempre é fácil, assim, de se explicar. Nem sempre estamos falando exatamente de coração: “cabeça” pode explicar isso muito bem: a concentração para executar aquilo que é necessário em quadra.

Paremos por aqui, contudo. Independem as razões para as oscilações de empenho na análise deste Jogo 7: uma vez que o Miami Heat enfim pôde fazer frente, mesmo, consistentemente, frente ao Indiana Pacers  nas pequenas coisas, na briga pelos rebotes, na aplicação defensiva, seu talento fez a diferença. Vitória por 99 a 76 e a vaga nas finais da NBA para enfrentar o San Antonio Spurs.

Comecemos pelos rebotes, a batalha que todos julgaram ser impossível para os atuais campeões desde o começo da série. Nesta segunda-feira, o time da casa dominou as coletas (43 a 36), em especial na tábua ofensiva (15 a 8).

LeBron, rumo ao aro

LeBron e o Miami agrediram muito mais o aro no Jogo 7, sem ajuda dos juízes

Destaque aqui para Chris Bosh. Sim, é possível! No caso, consegue pegar mais de cinco rebotes num jogo! Vocês podem não acreditar, mas ele apanhou nove nesta partida decisiva, um recorde pessoal na final do Leste. Mas a ovação fica por conta, mesmo, de Dwyane Wade. O ala-armador orgulhoso e quebradiço que  até mesmo superou Bosh no garrafão com nove rebotes – seis deles ofensivos! Spoelstra chorou ao checar as estatísticas finais, certeza.

Além disso, temos o caminhão de 21 desperdícios de posse de bola cometidos pelo oponente. Mesmo quando venceram o primeiro tempo período por dois pontos, os jogadores do Pacers não tiveram a chance de se sentirem confortáveis em quadra. Cometeram nos 12 minutos iniciais 9turnovers. Eram 15 ao final do primeiro tempo. Reparem, então: cometeram apenas seis na segunda etapa, mas, francamente, o confronto já estava decidido. Uma vez que o time da casa abriu 15 pontos antes de ir ao intervalo, a fatura estava praticamente liquidada.

Pois o Pacers depende em demasia de seu quinteto titular (mais a respeito em um artigo sobre o fechamento de temporada deles). Significava, basicamente, que seus cinco principais jogadores precisariam fazer um trabalho tão impecável a ponto de tirar uma desvantagem dessas em 24 minutos de jogo contra um time que tem LeBron James. Muito difícil.

Mas mais difícil ainda quando esse mesmo time está jogando com uma defesa dessas. É impossível jogar com esse tipo de suor o tempo todo, 48 minutos por partida. Quando eles conseguem, todavia, entregar por alguns – ou muitos – minutos uma defesa com um nível de pressão acima da média dentro das quatro linhas, fica muito difícil. E só assim, mesmo, para inverter o tabuleiro apresentado apresentado na série.

Penando por todo o confronto com Roy Hibbert debaixo da cesta, resolveram cortar, de uma vez por todas, seu acesso ofensivo. Em vez de parar o poste com a bola dominada, melhor evitar que ele a receba de vez, não? E taca Mike Miller flutuando para a cabeça do garrafão, Bosh (aleluia!) marcando de modo antecipado, nem que fosse com um posicionamento 3/4 consistente, Chris Andersen, Udonis Haslem, Wade, Chalmers, todos eles esticando bem os braços, procurando o passe, acotovelando, cutucando, incomodando, sufocando, desgastando. Sem contar a defesa exemplar de LeBron para cima de George: colado em seu jovem e emergente rival (só 7 pontos em 2/9 de quadra, com 4 assistências e três turnovers), sem perder a pose ou o foco. Impressiona demais mesmo quando não faz cesta.

Como se ele também não tivesse arrebentado no ataque, ué: foram 32 pontos em 40 minutos, 15 deles na linha de lances livres (traduzindo: agressividade ao extremo e sem a ajuda da arbitragem geralmente caseira da liga). Perdeu o medo de encarar Hibbert? Sim. Mas também enfrentou  menos o paredão do Indiana rumo ao aro, uma vez que o gigantão teve um raríssimo problema com faltas no duelo. Além disso, o astro desta vez contou com a ajuda de Wade (19 pontos, 7/15, 5 lances livres) e Ray Allen (10 pontos, todos no segundo quarto decisivo). Quem é vivo aparece, gente. Wade definitivamente não jogou como o craque de sempre, mas ao menos compensou a explosão reduzida com um pouco mais de coragem.

Com a vitória, o Miami se insere num grupo seleto de equipes a jogar a final da NBA por, no mínimo, três anos seguidos: apenas o Los Angeles Lakers (em seis ocasiões), o Boston Celtics (duas), Chicago Bulls (duas), Detroit Pistons (uma) e Knicks (uma, nos anos 50) deram conta disso.

Só mesmo, os elencos mais talentosos para se estabelecer desta maneira.

Desde que a habilidade natural esteja acompanhada por tudo aquilo que os técnicos imploram nessas gravações registradas em discursos inflamados durante paradas de tempo. Súplicas que podem parecer as mais banais. Mas que, no calor de uma decisão, podem fazer toda a diferença.

*  *  *

Pequenos detalhes. Dentro e fora de quadra. Como Erik Spoelstra  comprovou neste jogo ao limar Shane Battier de sua rotação e inserir Mike Miller. Para os técnicos conscientes, metódicos, é algo MUITO difícil de se fazer. Pense o seguinte: você ficou com um padrão de equipe por mais de 90 partidas no ano. Chega uma hora, porém, em que fica de frente para a parede. As coisas estão difíceis, tem de fazer algo. Mas primeiro você se sente obrigado a tentar até o último instante a reabilitação de um de seus homens de confiança. Até que chega a hora em que diz chega. E, para Battier, ao menos no duelo com o Pacers, chegou o fim. Toca botar Mike Miller, que estava afundado no banco de reservas, em quadra.

Mike Miller x Paul George

Mike Miller, mais do que um chutador e peça quase esquecida no banco do Miami. Talento

Miller foi muito bem em pouco tempo no Jogo 6 e mostrou que estava pronto. Na volta a Miami, não contribuiu em nada no ataque naquele fundamento que basicamente paga seu salário – o chute de longa distância –, mas mostrou por que já foi um agente livre cortejado por James e Wade para se juntar ao time. Porque ele pode fazer, sim, mais do que arremessar. Ótimo reboteador para sua posição, bom passador e um jogador inteligente que cobre bem os espaços dos dois lados da quadra. Fez a diferença em diversas posses de bola dessa maneira: ajudou muito nas dobras defensivas do segundo período derradeiro e conseguiu várias interceptações. Não por acaso, em sua linha estatística, o número mais elevado foi de roubos de bola: três. Parece nada, mas é muito mais do que o esperado e, ao mesmo tempo, descreve muito pouco o que ele fez em quadra.

E ter um Mike Miller como solução de última hora diz muito a respeito do desnível de talento nos dois grupos. O cabeludinho certamente seria o sexto homem do Pacers se estivesse do outro lado.

*  *  *

Frank Vogel foi duramente criticado por sua decisão de sentar Roy Hibbert na posse de bola final da prorrogação do primeiro jogo. Uma pane que acabou sendo custosa demais, e ele mesmo assumiu o erro. Neste Jogo 7, seu erro foi um o pouco mais sutil, mas também valeu como uma senhora derrapada. Ele falhou feio em sua rotação. Depois de vencer o primeiro período por dois pontos, abaixou a guarda muito rapidamente, ao descansar três titulares de uma vez (DJ Augustin, Sam Young e Tyler Hansbrough), permitindo a reação imediata – e a escapada dos adversários no placar. Uma coisa as estatísticas mais avançadas mostraram claramente na série: quando o Indiana tinha seus cinco titulares, juntinhos, ao mesmo tempo em ação, a equipe venceu o Miami Heat. Qualquer outra formação, porém, mesmo que fosse apenas um reserva acompanhando quatro titulares, deu Miami. Numa partida dessas, era hora de segurar um pouco mais as mudanças, mesmo que se corresse o risco de esgotar o quinteto inicial. Era a hora de ver como o oponente viria para quadra e, aí, tomar uma decisão. Mas tudo bem também: o que o treinador tirou de um plantel limitado desses é incrível, e, apenas em sua terceira temporada como o comandante, está crescendo junto com seus atletas.

*  *  *

Depois do jogo de cartas e blefes entre Popovich e Spoelstra durante a temporada regular – nos dois confrontos diretos entre dois candidatos ao título, pelo menos um dos times poupou alguns de seus principais jogadores –, agora chegou a hora de eles e suas equipes se enfrentarem para valer em quadra. As finais começam no dia dia 6, quinta-feira, em San Antonio Miami, claro. Expectativa de um grande embate.

 


O corte de Augusto e os pivôs das Olimpíadas
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Giancarlo Giampietro

Tá, vocês já sabem: Augusto Lima foi o último cortado da seleção brasileira masculina para as Olimpíadas de Londres-2012. No fim, o que isso pode significar?

Caio Torres, seleção brasileira

Caio Torres, um dos 12 olímpicos

Vamos tentar entender. Mas deixando bem claro: o que vem aqui abaixo é o produto de especulações internas do QG 21, sem informações que venham diretamente de Foz do Iguaçu, muito menos de Córdoba, na Argentina, ok? E outra: o post está imenso, sim, mas com informações que julgo interessante compartilhar e discutir de modo um pouco mais prolongado do que o normal.

Adelante, então:

– Começando pelo mais simples, algo que muitas vezes pode ser ignorado em favor de teses mais mirabolantes. Magnano pode realmente achar que Caio é o melhor jogador entre os dois pivôs ou pelo menos considerar que era o que estava em melhores condições para ir aos Jogos.

– Além disso, de informação, mesmo, dá para dizer que Magnano conhece Caio há tempos e sempre o admirou. Para justificar essa afirmação, resgatamos uma passagem que o blogueiro testemunhou lá atrás em 2004 (caceta, já são quase dez anos atrás!), na distante ilha de Chiloé, cidade de Ancud, no Chile. A anedota já foi contada em nossa encarnação passada, mas nem todo mundo aqui nessa nova casa tem ligações com o sobrenatural para saber disso, né? Então segue o que já foi publicado no VinteUm do além-vida, na ocasião da divulgação da primeira lista de Magnano: “Sabemos que Magnano adora Caio desde os tempos de base. Em 2004, em Ancud, cidadezinha a mil quilômetros de Santiago, lá embaixo no continente, o treinador já via o pivôzão fazer estragos, mesmo sendo dois anos mais novo que a concorrência num Sul-Americano. Estava lá e via o quanto ele se divertia em falar “The Big Man”, de boca cheia, subindo as escadas, em minha direção depois de ver o brasileiro atropelar os adversários no garrafão. Ao ver seu nome novamente incluído na relação principal, não tem como esquecer a cena.”

Faltou dizer que fazia um frio danado, e Magnano só estava virando as costas para o jogo para buscar um copo de café na tendinha bem tímida armada dentro daquele inesquecível ginásio, que precisava de uma calefação daquelas.

– Sabendo dos problemas físicos de Nenê, a convocação de Caio, também não deixa de ser um movimento de precaução do argentino, não? Mesmo na melhor forma física de sua vida, o pivô do Flamengo ainda é uma fortaleza.

David Andersen x Andrei Kirilenko

Andersen e Kirilenko: força bruta?

– Se ignorarmos as dores no pé de Nenê, talvez o argentino esteja se preparando para batalhas físicas de garrafão em Londres-2012. Esse é um mantra constantemente evocado aqui, ali e em todo lugar. Será, mesmo? Convém aqui, então, um resumo não tão breve sobre o que nos aguarda na primeira fase olímpica, pelo Grupo B, em termos de pivôs:

1) a Austrália tem um garrafão de respeito, com David Andersen, Aleks Maric e Matt Nielsen, todos beeeem rodados em alto nível na Europa. Desses, contudo, apenas Maric é alguém que investe muita energia de costas para a cesta, dando suas pancadas – algo que só fez em treino nas últimas duas temporadas, diga-se, já que estava enterrado no banco do Panathinaikos depois de um a Euroliga imponente pelo Partizan. Andersen também pode fazer isso, mas faz tempo que sua preferência é flutuar com frequência para o perímetro, dada sua habilidade no chute de média distância. Nielsen opera basicamente da cabeça do garrafão, fazendo bons corta-luzes, arremessando e orientando os companheiros;

2) a Rússia tem Timofey Mozgov e Sasha Kaun, um NBA e outro CSKA, dois grandalhões, mas nenhum deles é uma grande arma ofensiva. Varejão não teria problema com nenhum deles, por exemplo. O restante são alas-pivôs versáteis, que chegam na zona pintada com velocidade e, não, força;

Pau Gasol x Yi Jianlian

Há uma boa diferença entre um Pau Gasol e um Yi Jianlian

3) a China joga com Yi Jianlian e o imortal Wang Zhizhi, que são da categoria pena, né? Mais chutadores do que tudo. Tem também um sujeito de 2,21 m inscrito, Zhang Zhaoxu. Se ele fosse minimamente ameaçador, com essa altura e 24 anos, já teríamos ouvido a alguém mencioná-lo, creio;

4) a Grã-Bretanha está mais ou menos no mesmo patamar dos australianos, com gente bem experiente e pesada em Robert Archibald e Joel Freeland. Agora, são dois que Splitter cansou de enfrentar na Espanha, quase sempre com resultados mais que positivos. Já Pops Mensah-Bonsu tem um dos melhores nomes do torneio olímpico e é um ótimo atleta, mas não alguém para Caio marcar. Daniel Clark e Eric Boateng também podem apresentar um currículo razoável, mas ninguém pode temê-los.

(Nota de rodapé? Clark jogou com Caio no Estudiantes espanhol anos atrás e seguiu no clube, enquanto o brasileiro foi dispensado e/ou decidiu se desligar. Dava pra desenvolver mais aqui, mas iríamos nos estender demais, né? Tem a ver com jogador comunitário, imaturidade, muitas apostas no clube etc.)

5) Espanha: aí, sim. Os irmãos Gasol, o atlético Ibaka e o chatíssimo Felipe Reyes, daqueles que parece lento, baixo, mas é forte e técnico pra burro e nunca desiste. Aqui é pedreira para qualquer time do mundo.

6) Se quisermos já prospectar sobre as oitavas, os EUA vão apenas com um pivô tradicional para Londres, mesmo caso da Nigéria; a Argentina tem Juan Pablo Gutiérrez, a Lituânia leva o jovem Jonas Valanciunas e o robótico Javtokas; na França, os três pivôs listados são Ronny Turiaf, Kevin Seraphin e Ali Traoré, gente. São jogadores que podem render bem em determinadas situações, mas esse trio não intimida nem a China ofensivamente.

Façam as contas. A era dos gigantes, a era do “cincão” já acabou faz tempo, galera. Mesmo um Dwight Howard não representa exatamente o mesmo tipo de problema que era lidar com um Patrick Ewing, ou Arvydas Sabonis. O jogo vai mudando.

– Essa conclusão nos inclinaria para a convocação de Augusto? Teoricamente, sim. Seu jogo realmente se encaixa melhor com o que vamos ver pela frente: um pivô ágil, determinado, que corre toda a quadra. Não se iludam com algo: força física nem sempre quer dizer mais intensidade e melhor presença defensiva. E esse não é um ataque contra Caio, de modo algum. Aqui estou mirando, na real, os mantras, dogmas repetidos a esmo e que adotamos como a verdade mais pura e absoluta, sem muitas vezes nem parar para pensar a respeito, mesmo. Agora, não dá, necessariamente, para cravar que Augusto era a melhor escolha. Ele é mais jovem, mais cru e teve de superar uma série de questões físicas e médicas durante a última temporada.

– Questionar se não era o caso de cortar Raulzinho me parece algo bem inadequado. Ainda mais vendo Magnano usar Larry como um ala sem receio algum, nos últimos amistosos sem Leandrinho e/ou Marquinhos. E, quanto ao ligeirinho, não dá mais para considerar Leandrinho alguém que “joga, quebra o galho de 1”. Mesmo, e por favor. Na NBA, ele não executa mais esse tipo de bico há umas quatro temporadas, no mínimo. E a função de armador é muito importante para se falar em “quebra-galho”.

PS: Veja o que o blogueiro já publicou sobre Caio Torres e Augusto Lima em sua encarnação passada.


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