Vinte Um

Arquivo : Nenad Krstic

O técnico que prefere revelar jovens a usar um americano meia boca
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Giancarlo Giampietro

Dusan "Duda" Ivkovic e um projeto para ser acompanhado de perto

Dusan “Duda” Ivkovic e um projeto para ser acompanhado de perto

Não é falta de ideia, juro. É que vale a pena ser lido e pode ter ficado perdido no site oficial da Euroliga se você não tem o hábito de dar uma passada por lá. Então tomo mais uma liberdade de tentar traduzir abaixo, deixando uma ou outra frase de fora, um depoimento do técnico sérvio Dusan Ivkovic, atual comandante do Anadolu Efes, de Istambul.

Esse é um clube turco que decidiu investir pesado para esta temporada, pensando também no futuro. Um clube com grana, mas tambeem com um projeto interessante que conta com algumas estrelas do basquete europeu, como Nenad Krstic, Stratos Perperoglou e Stephane Lasme, sem deixar de abrir espaço para jovens apostas.

O croata Dario Saric, selecionado pelo Sixers no último Draft da NBA, é uma das revelações contratadas. Não se trata de uma promessa: já uma realidade, tendo sido eleito o MVP da competição em novembro. Entre os demais garotos, vale destacar Cedi Osman, ala-armador turco de apenas 19 anos, eleito o melhor jogador do último Europeu Sub-19 e já convocado para a última Copa do Mundo, assim como Saric. Ele só estará fora de ação nas próximas semanas devido a uma torção de tornozelo.

Dario Saric, jovem estrela sob a tutela de Ivkovic

Dario Saric, jovem estrela sob a tutela de Ivkovic

Em seu texto, Ivkovic fala sobre como a chance de trabalhar novamente com atletas mais jovens foi um dos fatores que o convenceu a aceitar o cargo. Muitos já davam o veterano treinador como aposentado. Abaixo, ele diz que não era bem assim.

Esse é um dos pontos que motiva a tradução. Na busca pelo novo, não se pode esquecer as mentes colaboradoras do passado. No caso de Ivkovic, não havia esse risco, claro. Ainda é uma figura muito respeitada na Europa – conquistou sua segunda Euroliga, inclusive, não faz muito tempo, em 2012.

Todavia, o mais importante, mesmo, que acho que tem relevância e ressonância para o mercado brasileiro é o modo como ele fala a respeito de suas motivações no trato com atletas mais jovens, para desenvolvê-los. E sobre como nem sempre a válvula de escape norte-americana é a mais viável. Aquela coisa de: “Seu time está com problemas? Então tasca um gringo aí, mermão”. Com esse treinador em específico, não cola. No Brasil, quais são os clubes que estão efetivamente abraçando os jogadores mais jovens, dando a eles a chance de aprender em quadra, com seus próprios erros? Erros que podem ser corrigidos com um trabalho atencioso, dedicado, durante a semana? Quantos americanos são contratados por DVD, sem nem mesmo que se considere a possibilidade de trabalhar com os jovens da base?

Derrick Carater teria vez com Ivkovic?

Derrick Carater teria vez com Ivkovic?

Recentemente, vimos o Flamengo cair nessa, num exemplo célebre que atende pelo nome de Derrick Caracter. Um veterano cheio de problemas que quase tirou de quadra um talento como o de Cristiano Felício, na excursão rubro-negra pelas quadras da NBA. Este é um caso recente e que teve repercussão. Mas obviamente não foi um fato isolado.

Cada um interpreta e assimila o depoimento da forma que quiser. Não se trata de uma Verdade Absoluta, de um 11º Mandamento irrevogável. É apenas uma visão interessante, de uma das personalidades mais influentes e vencedoras do esporte, que ajudou na formação de diversos talentos nas últimas décadas.

Com a Iugoslávia/Sérvia e Montenegro/Sérvia, ele foi tricampeão europeu, campeão mundial, vice olímpico. Pelo Olympiakos, ganhou duas Euroligas, com 15 anos separando uma conquista da outra. O currículo completo está aqui para apreciação.  Tendo isso em mente, vamos ao texto, com o seguinte título: “Não existem atalhos”. Confira:

“Primeiro de tudo, gostaria de expressar minha satisfação com meu retorno à Euroliga, a melhor competição na Europa. Já participei dela por muitos anos com algumas equipes. Desde o AEK Atenas ao CSKA Moscou, Dínamo Moscou, Olympiakos e agora o Anadolu Efes. Por que retornei? Simplesmente porque sinto que ainda sou capaz de trabalhar bem. Minha filosofia é que, se alguém ainda sente que pode trabalhar, tem de fazer isso, desde que possa garantir qualidade ao seu esforço. Tive algumas ofertas quando estava dirigindo a seleção sérvia, mas não queria dividir funções, porque uma das partes sempre vai sofrer, seja o clube ou a equipe nacional.

Cedi Osman, uma das grandes promessas do basquete turco. Olho nele

Cedi Osman, uma das grandes promessas do basquete turco. Olho nele

Não é uma questão de cansaço físico – houve anos em que trabalhei por 12 meses –, mas, sim, de todo o processo que envolve o trabalho. Há coisas para se fazer nos clubes que acontecem durante o período de férias, coisas da qual você não pode tomar parte se estiver com uma seleção nacional. Havia diversas opções para eu me manter conectado ao basquete, que é a minha vida, sem retornar ao banco, para treinar. Mas, com o apoio da minha família, decidi voltar à lateral da quadra com um novo projeto em um país que tem um grande futuro em todos os sentidos. Um grande trabalho vem sendo realizado com os jogadores jovens aqui na Turquia, e o progresso fica evidente a toda hora. A Turquia começou a vencer medalhas nas categorias menores, e isso é a melhor garantia para o sucesso do basquete turco no futuro.

O maior desafio para qualquer treinador no início de temporada é montar um time e dar química, um alto grau de entendimento entre os jogadores. É um processo longo que requer tempo, trabalho e a paciência de todos. No basquete, não existem atalhos. Alguns jogos podem ser vencidos por inspiração ou um pouco de sorte, mas chegar ao ponto em que os jogadores se entendam com um simples olhar é um processo que leva, no mínimo, cerca de dois anos de trabalho coletivo. Você precisa formar um conjunto entre ataque e defesa de uma forma de colaboração praticamente automática.

Comparado com a campanha passada, o Anadolu Efes manteve apenas alguns jogadores. Além disso, tenho alguns garotos que nem mesmo pensavam que estariam com o time principal nesta temporada, mas minha ideia é usar estes jovens talentos turcos o máximo que puder, algo que já fiz no Olympiakos com jogadores gregos. Para compensar essa juventude e falta de experiência, assinamos com algumas estrela que já lutaram em diversas batalhas nessa competição. Vamos levar as coisas adiante passo a passo, com paciência e trabalho duro. Uma mudança de geração é algo difícil nos esportes coletivos. No meu ponto de vista, o Anadolu Efes precisa ter um papel relevante na Euroliga de 2015-2016. A única fórmula possível para isso é dar confiança aos garotos e fazer um bom trabalho individual com cada um dos jogadores.

Acho que todos os treinadores conhecem essa fórmula, mas eles não a aplicam em uma atmosfera de pressão, seja de diretores do clube, da imprensa, da torcida. Felizmente, este não é meu caso. Psso lidar com qualquer tipo de pressão e dar essa oportunidade aos jogadores jovens: quero que eles assumam a responsabilidade. Outro tipo de pressão que muitos técnicos enfrentam é a enxurrada de jogadores medianos da América, que muitas vezes tiram o lugar de jovens europeus, cortando seu desenvolvimento. Por um lado, a qualidade duvidosa de alguns desses jogadores não é o bastante para se vencer jogos, e, por outro, perde-se muito ao manter os talentos mais jovens no banco ou até mesmo fora do elenco. Há vezes em que os danos aos jogadores mais jovens são irreparáveis. Isso caminha junto com problema geral do basquete europeu de ver seu talento migrar cedo para a NBA.  Já dirigi muitos jogadores que tiveram sucesso na NBA porque saíram no momento certo, com maturidade e experiência. Porém, muitos deles saem bem jovens e despreparados, e aí retornam piores. Perderam tempo por terem sido impacientes.

Ivkovic e Divac em algum ponto dos anos 90. História para contar

Ivkovic e Divac em algum ponto dos anos 90. História para contar

Vale gastar umas palavras para falar sobre o que chamo de “preparação mental”. Isso também é um processo de trabalho diário. Eu pessoalmente prefiro trabalhar sozinho, sem um psicólogo, porque acredito que uma terceira pessoa entre o jogador e o técnico jogador não seja necessária. O técnico também precisa ser um psicólogo e entender a alma dos jogadores e entrar na cabeça e no coração deles para saber o que têm por dentro. Você tem de conversar bastante com eles, sozinho ou com todos reunidos no vestiário, mas tem sempre de pedir mais dos melhores jogadores. Já foi acusado de não ser capaz de lidar com estrelas, mas acho que é o contrário: sempre fui mais crítico com os melhores jogadores porque sabia que eles poderiam lidar com isso, e é por isso que chegamos juntos ao topo muitas vezes. Não posso cobrar tanto assim dos mais jovens. Com eles, você tem de ensinar e ser paciente.”

(Fim.)


Vai começar: a Euroliga 2014-2015 em números
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Giancarlo Giampietro

O Barcelona conta com um dos brasileiros da Euroliga. Vocês sabem quem, né? Na foto

O Barcelona conta com um dos brasileiros da Euroliga. Vocês sabem quem, né? Na foto

O basqueteiro sabe: quando chega outubro, o que ele mais ouve é: “Vai começar”.

Pois vai começar nesta quarta-feira a Euroliga de basquete, com um monte de jogadores que nos fizeram companhia durante a Copa do Mundo, dois brasileiros e o MarShon Brooks. Abaixo, alguns dados a respeito da segunda principal liga de clubes do mundo, que será transmitida no Brasil com exclusividade pelo canal Sports+, da SKY, time do qual farei parte novamente.  Jajá voltamos aqui com os times e jogadores para se ficar de olho, um contexto maior sobre os dois brasileiros no páreo – Marcelinho Huertas e JP Batista – e qualquer coisa que dê na telha.

Vamos lá, anotando:

76 – São 76 os jogadores dos Estados Unidos inscritos na competição, disparado o país com maior número de participantes no torneio. Em média, são mais de três por elenco. O atual campeão e vítima do Flamengo Maccabi Tel Aviv foi o que mais importou da fonte: oito! Mas nem todos são registrados como ianques, porém. No clube israelense, por exemplo, são três com cidadania local: o ala Sylven Landesberg e os pivôs Alex Tyus e Jake Cohen. Há americanos croatas, americanos bósnios, americanos belgas, e por aí vai.

Teodosic. Quem se lembra dele?

Teodosic. Quem se lembra dele?

66,6% – Da seleção sérvia que derrotou o Brasil pelas quartas de final da Copa, 8 atletas – ou 66,6% – jogam em clubes da Euroliga. O terror Milos Teodosic segue no CSKA Moscou, enquanto o pivô Nenad Krstic deixou a capital russa para jogar pelo Anadolu Efes, da Turquia. Em Istambul ainda aparecem o prodígio Bogdan Bogdanovic e o classudo Nemanja Bjelica, pelo Fenerbahçe. O pivô Vladmir Stimac saiu do Unicaja Málaga para o Bayern de Munique, mas o clube espanhol, por sua vez, completou sua cota com o armador Stefan Markovic. O Estrela Vermelha, único time do país disputando a competição, conta com os outros dois: o armador reserva Stefan Jovic e o atlético ala Nikola Kalinic. De resto? Miroslav Raduljca levou seus talentos, barba e Harleys para a China; Rasko Katic está em Zaragoza, Stefan Bircevic, em Madri (pelo Estudiantes) e Marko Simonovic, na França (pelo Pau-Orthez). O contingente sérvio, claro, não se limita a eles. Fora do Estrela, há mais nove jogadores espalhados pelo continente.

41 – É o número de atletas com experiência de pelo menos uma temporada regular completa na NBA – descartei os jogadores de contratos temporários, não-garantidos, com uma ou outra partida oficial ou amistosos de pré-temporada. Os dois que têm mais rodagem são Andrés Nocioni, nosso bom e velho e amigo, com  12.654 minutos (contando playoffs) e Krstic, com 11.252 minutos. Da safra nova, vale ficar de olho no que vão aprontar os alas MarShon Brooks (aquele mesmo ex-Nets, Celtics, Warriors, Lakers, seguidor de Nick Young, sem o carisma, mas que julga ser tão bom quanto um jovem Kobe Bryant e agora defende o Olimpia Milano), James Anderson (raro caso de talento mal desenvolvido em San Antonio, ex-Sixers, hoje no Zalgiris Kaunas) e Orlando Johnson (ex-Pacers e Kings, no Baskonia/Laboral Kutxa).

33,3% – Um terço dos clubes desta temporada não disputaram a última edição do campeonato: Dínamo Sassari (Itália), Nizhny Novgorod (Rússia), PGE Turow Zgorzelec (Polônia), Neptunas Klaipeda (Lituânia), todos estreantes, além de Limoges (da França, longe do torneio desde 1998), Valência (Espanha, desde 2011), Cedevita Zagreb (Croácia, desde 2013) e UNICS Kazan (Rússia, desde 2012).

Parla, Ginóbili!

Parla, Ginóbili!

13 – Há 13 anos que um clube da Itália, o país mais vencedor do torneio, não ganha leva o troféu para casa. O último foi o Virtus Bologna de um jovem Manu Ginóbili, em 2001, temporada na qual os times acabaram divididos em duas competições – a segunda com o nome de SuproLeague, ainda sob gestão da Fiba, que não foi adiante.

12 – No mapa da Euroliga, uma dúzia de países estão representados. A Espanha apresenta o maior contingente: cinco times (Barcelona, Baskonia/Laboral Kutxa, Málaga, Real Madrid e Valência). Rússia (CSKA Moscou, Nizhny Novgorod e UNICS Kazan) e Turquia (Anadolu Efes, Fenerbahçe e Galatasaray) têm três cada. Depois temos dois da Itália (Olimpia Milano e Dínamo Sassari), dois da Lituânia (Zalgiris Kaunas e Neptunas Klaipeda), 2 da Alemanha (Alba Berlim e Bayern de Munique), 1 da França (Limoges), 1 de Israel (Maccabi), 1 da Croácia (Cedevita Zagreb), 1 da Polônia (Turów Zgorzelec) e da Sérvia (Estrela Vermelha).

9 – A atual edição conta com nove campeões continentais, listados aqui pela ordem cronológica de seus primeiros títulos: CSKA Moscou (1961), Real Madrid (64), Olimpia Milano (66), Maccabi Tel Aviv (77), Limoges (93), Panathinaikos (96), Olympiakos (97), Zalgiris (99) e Barcelona (2003). Detalhe: o campeonato europeu de clubes só passou a ser disputado com o nome de Euroliga em 2001).

8 – Tal como acontece no futebol, o Real Madrid é o clube com mais títulos europeus, com oito. Da mesma forma que também acontecia nos gramados – até levantarem a taça na temporada passada –, os merengues aguardam há tempos, porém, a nona. Não sobem ao degrau do pódio desde 1995. Maccabi, CSKA e Panathinaikos têm seis títulos cada um.

Sergio Rodríguez, Señhor Barba MVP

Sergio Rodríguez, Señhor Barba MVP

5 – A Euroliga ainda tem um quinteto de MVPs em atividade nesta edição. Dificilmente eles poderiam jogar juntos, porém, já que estamos falando de cinco armadores: Juan Carlos Navarro (2009), Milos Teodosic (2010), Dimitris Diamantidis (2011) Vassilis Spanoulis (2013) e Sérgio Rodríguez (2014). Obs: o destaque de 2012 foi Andrei Kirilenko, ex-CSKA, durante a temporada do lo(u)caute da NBA.

3 – Uma tradição da Euroliga é a eleição dos MVPs de cada mês, assim como a NBA faz. O Barcelona tem uma curiosidade em seu plantel: com três prêmios cada um, Navarro e Ante Tomic são os dois recordistas nesse quesito. A longevidade de La Bomba impressiona: seus três troféus estão espalhados entre janeiro de 2006 e janeiro de 2011. Já o talentosíssimo pivô croata arrebentou na edição passada, faturando dois em sequência em fevereiro e março.

2 – Guerra da Cisplatina! Argentina, Brasil e Uruguai têm a mesma quantia de jogadores na Euroliga 2014-15: um par cada. Por essa você não esperava, né? Marcelinho Huertas (Barça) e João Paulo Batista (Limoges) fazem as vezes dos tupiniquins, enquanto Nocioni e o enjoado Facundo Campazzo representam os argentinos pelo Real Madrid. O espírito charrúa fica por conta do imortal Esteban Batista (Panathinaikos) e do armador Jayson Granger (Málaga). Obs: o jovem ala-pivô brasileiro Daniel Bordignon pertence ao Baskonia, mas foi emprestado para o Navarra, da Liga Adecco Oro, segunda divisão espanhola.

0 – O Cedevita Zagreb é o único time de todo o campeonato que não conta com nenhum jogador dos Estados Unidos em seu plantel. Em meio aos croatas, o único estrangeiro sob a orientação de Jasmin Repesa é o bósnio Nemanja Gordic, se é que isso pode ser considerado um forasteiro.


Brasil vence 75% de um jogo de xadrez e se posiciona bem para playoffs
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Giancarlo Giampietro

Marquinhos, o cestinha, Krstic, o inoperante: dois personagens da vitória brasileira

Marquinhos, o cestinha, Krstic, o inoperante: dois personagens da vitória brasileira

OK, vamos estourar de cara: o fato e o nome do jogo foi Marquinhos. O ala se sentiu como se estivesse no ginásio da Gávea, tranquilão para matar 21 pontos e liderar o ataque brasileiro numa dura e importantíssima vitória sobre a Sérvia pela Copa do Mundo.

Foi 81 a 73, mas poderia ter sido mais. Ou pior, com triunfo para os próprios sérvios, dependendo de uma série de detalhes, que vamos destrinchar logo mais. Antes, explica-se o valor deste triunfo.

Não só significa que os brasileiros venceram dois times europeus nesta primeira fase, como também garante o segundo lugar e assegura um posicionamento, digamos, confortável nos playoffs, pensando longe. Basicamente: evita que eles se deparem com a poderosa Espanha numa eventual quartas de final. Isto é, se chegarem a esta etapa, vão ter, em teoria, um adversário mais fraco para entrar na disputa por medalhas.

Para garantir esse posto, foi preciso passar por um jogo de xadrez. Ou, num populacho, o jogo de gato-e-rato. Partidas de basquete no mais alto nível tendem a ser encaradas deste modo – a não ser no caso em que o adversário é tão superior, que não há artimanhas para desbancá-los. Não era o caso nesta quarta-feira.

Nenê complica a vida de Krstic: pivô sérvio, antes uma estrela no mundo Sérvio, foi limitado a 7 pontos (2/9 nos tiros de quadra) pelos pivôs brasileiros, excelentes marcadores

Nenê complica a vida de Krstic: pivô sérvio, antes uma estrela no mundo Sérvio, foi limitado a 7 pontos (2/9 nos tiros de quadra) pelos pivôs brasileiros, excelentes marcadores

A Sérvia, vejam só, veio para a quadra com uma formação monstruosa de grande. Três pivôs de 2,08m para cima, dois deles pesos pesados, procurando minar o garrafão brasileiro: o inigualável Miroslav Raduljica e o esforçado, mas limitado Vladimir Stimac. Quis descer a marreta no jogo interior e mastigar o aro. No primeiro tempo, deu certo: 9 rebotes ofensivos e 13 lances livres descolados!

Sucesso, né?

Necas. Nada disso: o Brasil venceu por 48 a 32 antes do intervalo. Seria o suficiente para dizer que o jogo estava ganho? Como vocês podem perceber pelo placar final, também não.

Para a segunda etapa, os adversários voltaram do intervalo com uma formação bem mais baixa, leve e técnica, com três armadores – em vez de três armários. Esse time fez a vantagem brasileira se evaporar em cinco minutos (foi 16 a 6 de cara). Rubén Magnano não intercedeu, eles foram pontuando, pontuando, pontuando, até que viraram o placar e chegaram a abrir sete. Os balcânicos começaram a se movimentar muito bem sem a bola, exigindo atenção e agilidade dos brasileiros – o que não acontecia. Foram quebras e quebras defensivas sucessivas, com Huertas envolvido em muitas dessas. É um problema constante no jogo do brasileiro, sabemos.

E o que acontece? Aparentemente senhora de si, a Sérvia voltou a concentrar, canalizar o ataque em seus pivôs. Foi um ajuste bem camarada do técnico Sasha Djordjevic, um dos grandes armadores dos anos 90, mas que priorizou as bolas previsíveis no mano-a-mano para um ancião o trombador Raduljica e um Nenad Krstic irreconhecível de tão lerdo.

Splitter, por conta própria, colocou no bolso o gigante Raduljica. O pivô, que vinha atacando com eficiência nesta Copa, com média de 15 pontos e 59,4% nos arremessos, produziu bem pouco (11 pontos e 5 rebotes, mais quatro turnovers). Seu repertório é feito basicamente de tranco, intimidação físicos e semi-ganchos lentos e mecânicos que só.

O único problema que essas investidas forçaram foi o acúmulo de faltas por parte dos pivôs brasileiros. Nenê ficou pendurado com quatro. Splitter chegou a cometer duas no primeiro período, mas teve sua situação muito bem monitorada pelo técnico argentino. Quando voltou para a quadra no quarto final, estava suficientemente resguardado para contestar o sérvio com vigor, coragem e, muito mais relevante, inteligência. Guardou posição, sem partir para o roubo ou o toco, cavou duas faltas ofensivas e deixou que o oponente se atrapalhasse sozinho. A retaguarda estava resolvida, também com boa participação de Larry para fiscalizar Milos Teodosic (14 pontos e 5 assistências em 25 minutos, saindo do banco).

O figuraça Raduljica não foi efetivo contra os grandalhões brasileiros

O figuraça Raduljica não foi efetivo contra os grandalhões brasileiros

Do outro lado, Marquinhos estava em tarde inspirada. Ele já havia matado suas duas primeiras bolas de longa distância no quarto inicial e carregou essa confiança para os momentos decisivos. Puniu a defesa sérvia nos instantes em que ficou desmarcado e teve a melhor pontuação individual de um brasileiro neste torneio.

O ala foi bem assessorado por Leandrinho no primeiro tempo (11 pontos em 16 minutos, terminando com 16 em 28, sem jogar nos minutos derradeiros) e pelo próprio Splitter no quarto final (10 pontos, 7 rebotes e 6 assistências, com seus deslocamentos irrevogáveis fora da bola e muita visão de quadra – foram deles os dois passes para bombas de três de Marquinhos que diminuiriam o placar de 67 a 60 para 67 a 66). É o tipo de rendimento que o Brasil vai precisar nessa campanha e muito mais sustentável que os tiros de fora de Marquinhos (não dá para esperar que ele vá desafogar o jogo com 6 acertos a cada 9 tentativas, convenhamos).

A combinação dos tiros de fora com o jogo interior é sempre a mais adequada para o jogo de meia quadra e funcionou muito bem, enfim, no quarto período. Se der para atacar em velocidade, em transição, tanto melhor, como aconteceu no primeiro tempo impecável.

O desafio agora é atingir a consistência. Dessa vez o que descambou foi a defesa numa parcial. Somando os primeiro, segundo e quarto períodos, o Brasil teria permitido apenas 41 pontos ao adversário. Excelente. Mas acabou tomando 32 no terceiro, com falhas que não vinham acontecendo.

De qualquer forma, o Brasil, que foi mais time em 75% do jogo, escapou com sua preciosa vitória. Nesta quinta, vai treinar contra o Egito. Depois, é hora de voltar jogar xadrez, mas com a pressão de que cada jogada em falso pode valer a eliminação.


Há muito basquete além da NBA: a Euroliga começa a pegar fogo
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Giancarlo Giampietro

Sonny Weems, da NBA para o CSKA

O superatlético Sonny Weems substitui Andrei Kirilenko em Moscou

Por Rafael Uehara*

(Nota/Ótima notícia no Vinte Um: convidado do blog durante o mês de dezembro, o Rafael veio para ficar. Semanalmente, ele vai publicar um artigo por aqui. Aproveitem!)

O mundo não acabou, mas 2012 sim, e, com a virada do calendário, as principais ligas do mundo começam a pegar fogo nessa arrancada em direção ao fim da temporada. No caso da Euroliga, principal competição de clubes do continente Europeu, isso é sinalizado pelo TOP 16, que teve sua segunda rodada disputada na semana passada. Com a mudança de formato a partir dessa temporada, a segunda fase da Euroliga terá 14 rodadas para definição dos oito classificados para as quartas de final, ao invés de apenas seis em anos anteriores. Há ainda muito chão pela frente, mas já é possível se ter uma ideia de quais times são concorrentes legítimos ao título e quais precisam de mudanças drásticas para voltar à briga.

O Barcelona de Marcelinho Huertas foi à Rússia na semana que passou e perdeu apenas pela segunda vez na competição, 65-78 para o BC Khimki, mas não há dúvida de que a máquina catalã é a força mais respeitável do basquete europeu no momento. Mesmo com um elenco composto de menos jogadores de pedigree defensivo como no ano passado, liderado pelo técnico Xavi Pascual, o Barcelona está a caminho de igualar marcas históricas registradas em 2011-2012. De acordo com o site gigabasket.org, o Barcelona tem permitido apenas 88,8 pontos a cada 100 posses do adversário, marca muito similar ao 87,3 da temporada passada, o que é fantástico especialmente considerando que o time substituiu Boniface N’Dong, Fran Vázquez e Kosta Perovic por Ante Tomic e Nathan Jawai no pivô.

Juan Carlos Navarro, La Bomba

Um Barça menos dependente de Navarro no ataque para tentar o título

Tomic e Jawai foram incorporados ao time em uma tentativa de adicionar maior criatividade ao ataque, que sofreu demais contra o Olympiacos no Final Four do ano passado. Pascual fez as mudanças necessárias, incluindo maior envolvimento de Huertas, e o resultado tem sido um time muito menos dependente de Juan Carlos Navarro e Erazem Lorbek e que tem marcado em média três pontos por cada 100 posses a mais do que na temporada anterior. Graças à boa química entre Huertas, Jawai e Tomic no pick-and-roll, o Barcelona lidera a Euroliga em pontos no garrafão. Com esse ataque renovado e uma defesa histórica, o time catalão é, em minha opinião, o principal favorito ao titulo.

Talvez os rivais de Madri estejam no mesmo nível. O Real Madrid de Pablo Laso também está tendo um ano fantástico. Entre supercopa da Espanha, campeonato espanhol e Euroliga, os merengues perderam apenas quatro jogos até o momento, sendo um deles para o Barcelona semana passada. Com uma filosofia oposta aos inimigos catalães, o Real tem se estabelecido como o ataque mais feroz do continente. No momento, é apenas o terceiro classificado em pontos por posse (marcando em média 109,7 a cada 100), mas isso é porque o Montepaschi Siena e o Zalgiris Kaunas estão fazendo campanhas históricas em termos de eficiência. Com a adição de Rudy Fernandez (um talento fora de série no continente) e o desenvolvimento de Nikola Mirotic (a caminho de se tornar o melhor ala-pivô na Europa), o Real não tem como ser parado, apenas contido. Mas esse já era mais ou menos o caso na temporada passada. O que faz do time merengue um concorrente legítimo ao titulo este ano é a melhoria em prevenção, setor no qual o time subiu de 13º para terceiro em pontos permitidos por posse.

É o que diferencia o Real Madrid do Montepaschi Siena, por exemplo. O Siena tem o melhor ataque do continente, marcando em média 115 pontos a cada 100 posses de bola. Bobby Brown tem sido fantástico e lidera a competição com 252 pontos em 12 jogos após uma exibição magnífica de 41 pontos em apenas 18 tiros de quadra contra o Fenerbahçe, em Istambul semana passada. O Siena tem superado as expectativas pra esse ano. Devido a problemas financeiros do patrocinador, Banco di Monte Paschi, o time teve que se despedir de medalhões como Simone Pianigiani, Bo McCallebb, Rimantas Kaukenas, David Andersen, Nikos Zisis e Ksystof Lavrinovic e remontar um elenco com soluções mais baratas do que a torcida estava acostumada. O Siena começou o TOP 16 com duas vitórias, sobre Maccabi e Fenerbahçe, mas ainda é difícil vê-lo como concorrente ao título. Com a terceira pior defesa da competição, e a expectativa é que em algum momento sua falha retaguarda pesará.

Kaukenas fazendo das suas

Kaukenas encontra espaço para a bandeja pelo ataque sensacional do Zalgiris

Já o Zalgiris Kaunas de Joan Plaza não pode ser visto da mesma forma. Havia muitas dúvidas com relação à idade avançada do elenco e como esse time defenderia, mas o atual campeão lituano é o sexto colocado em pontos permitidos por posse, mesmo que apenas Tremmell Darden e Ibby Jabber sejam atletas de porte físico invejável. Essa aplicação no setor defensivo, mesmo que não seja de elite, tem sido o suficiente para dar suporte ao segundo melhor ataque do continente. É uma dinâmica curiosa e fenomenal: o Zalgiris marca a segunda maior taxa de pontos por posse e, ao mesmo tempo, tem a menor taxa de posses por jogo. Isto é, faz o máximo com menos. Plaza formatou uma maneira de jogar que minimiza os fatores idade e a falta de porte físico do time. Será interessante ver se o clube lituano conseguirá impor seu ritmo de jogo contra Real Madrid e CSKA Moscow, dois dos times mais atléticos do continente e dos poucos com atletas ao nível de NBA. Mas o que eles já têm feito até agora é suficiente para se estabelecer como força a ser respeitada.

Falando em CSKA Moscou, o time de Ettore Messina (que voltou pra casa após três anos divididos entre o Real Madrid e o Los Angeles Lakers) vem, quietinho em seu canto, fazendo a melhor campanha da liga até o momento. O CSKA tem sido muito menos dominante do que aquele time liderado pelo fantástico Andrei Kirilenko ano passado, mas venceu 11 de seus 12 jogos até o momento e é o quinto colocado em ataque e segundo em defesa. Talvez sejamos nós que tenhamos prestado menos atenção. Sonny Weems também é talento de NBA, mas empolga menos do que o sempre enérgico e impactante Kirilenko. A combinação de Weems e Dionte Christmas nas alas é o que diferencia o CSKA dos demais times do continente. Poucos têm a capacidade atlética da dupla. O sistema ofensivo ao redor de Nenad Krstic mudou, mas o pivô sérvio tem mantido sua excelência. Tem saído do banco apenas porque seu companheiro de posição Sasha Kaun está totalmente recuperado de uma lesão séria no joelho sofrida 18 meses atrás e Messina agora apresenta uma sutil uma queda por atletas de primeiro nível, depois de sua experiência nos Estados Unidos.

Em Israel, o Maccabi Tel Aviv de David Blatt começou o TOP 16 com duas derrotas para o Siena e o Caja Laboral, a última por um ponto em casa na semana passada. Vindo pra temporada, a dúvida era como esse time iria marcar pontos após as saídas de Keith Langford e Richard Hendrix. Mas, com um ataque certeiro em tiros de meia distancia e uma defesa que tem permitido o menor número de pontos no garrafão, a potência israelense está a caminho de fazer o papel que fez ano passado; timinho difícil de bater nas quartas de final. Mais que isso será uma surpresa considerando as limitações do elenco, mesmo que se há alguém capaz de tirar um final four desse time, esse alguém é David Blatt.

E por último, mas não menos importante, o atual campeão Olympiacos. A temporada começou meio estranha para os vermelhos de Piraeus, com duas derrotas nos primeiros três jogos e a saída do pivô Joey Dorsey do time após desavenças com o novo técnico Georgios Bartzokas, que substitui o legendário Dusan Ivkovic, aposentado. Mas as coisas se acertaram a partir dali. O Olympiacos ganhou sete jogos seguidos na Euroliga para terminar a primeira fase com vitórias em 10 jogos. Além disso, bateu o rival Panathinaikos no campeonato grego. A defesa se endireitou e o importantíssimo Kostas Papanikolaou se apresentou melhor depois de um primeiro mês muito tímido. O TOP 16 começou com derrota em Vitória para o Caja Laboral, rejuvenescido depois da demissão Dusko Ivanovic, mas os vermelhos se recuperaram com vitória sobre o Besiktas em casa. É difícil saber, porém, o quanto Dorsey fará falta nas fases finais. Ele foi peça fundamental na corrida ao título ano passado e seu substituto Josh Powell é um jogador de características totalmente diferente.

*Editor do blog “The Basketball Post” e convidado do Vinte Um. Você pode encontrá-lo no Twitter aqui: @rafael_uehara.


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