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Arquivo : David Blatt

Cavs desfalcado pede ajuda aos amigos de LeBron
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Giancarlo Giampietro

Visão de dirigente de LeBron vai ser testada

Visão de dirigente de LeBron vai ser testada

LeBron James tinha um plano, desde o início. Se era virar as costas para um Dwyane Wade em frangalhos, para os arremessos de Chris Bosh e uma liderança como Pat Riley, que fosse para um clube em que pudesse dar as cartas – se não todas elas, mas grande parte do baralho. Se pudesse ser em casa, quanto melhor.

Quando o Rei decide retomar suas raízes, nem toda a ingenuidade de Cleveland vai poder confiar que fosse por mero sentimentalismo e apego a crenças locais. Isso pode até ter influenciado em todo o processo, mas um cara tão inteligente e ambicioso como LeBron não vai seguir um rumo porque o coração mandou. Assim como faz em quadra, sua versão homem de negócios avalia tudo o que está ao seu redor nos mínimos detalhes antes de tomar qualquer, na falta de melhor termo, decisão.

A maior prova disso é sua própria carta publicada na Sports Illustrated, comunicando ao povo de South Beach que estava retornando com os seus talentos para Ohio. Lá, deixou claro que Andrew Wiggins e Anthony Bennett não faziam parte de seus planos, abrindo caminho para a negociação por Kevin Love. O ala exigia um sacrifício do futuro por parte da franquia para instaurar seu reinado imediato. Sabemos o que aconteceu.

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Pois agora Kevin Love está fora de ação. Oficialmente, no caso – uma vez que não possamos dizer que o ala-pivô estava 100% presente de corpo e alma durante uma temporada cheia de pequenos incidentes que, quando agrupados, pintavam um cenário no qual sua saída de Cleveland, como agente livre, era realmente possível. Ninguém sabe ao certo mais depois da cirurgia no ombro esquerdo que vai tirá-lo das quadras por até seis meses.

O que sabemos é que, sem Love, LeBron e todos os seus chapinhas vão ter de realmente jogar muito para combater o Chicago Bulls nas semifinais do Leste. Talvez seja injusto com David Griffin, o gerente geral que merece o prêmio de Executivo do Ano pelo simples fato de ter tornado possível a volta do superastro e ainda realizou duas excelentes trocas em meio a um momento de crise. Mas é notório que algumas contratações do Cavs foram, digamos, sugeridas por James.

Espera-se alguma coisa, qualquer coisa da dupla acima

Espera-se alguma coisa, qualquer coisa da dupla acima. Ambos com 34 anos

Sim, estamos falando de Mike Miller e James Jones, além de, em menor escala, Shawn Marion – que não é dos amigos íntimos, nem nada disso, mas foi recrutado pessoalmente pelo craque. Ainda mais com JR Smith suspenso das duas primeiras partidas em Cleveland, esses veteranos precisam dar alguma contribuição para o Cavs. Mesmo que David Blatt opte por usar Timofey Mozgov e Tristan Thompson ao mesmo tempo e por longos minutos. Mesmo com minutos elevados para LeBron e Irving, que já tiveram, respectivamente, 43,0 e 40,5 minutos contra o Boston Celtics. Love e Smith acumularam mais de 53 minutos em média, que precisam ser absorvidos por alguém.

“A margem de erro contra o Celtics era tamanha que eles poderiam jogar num nível C, que tudo bem. Mas agora essa margem diminuiu consideravelmente. Contra o Bulls, não vai dar nem mais o B”, afirmou o jornalista Brian Windhorst, do ESPN.com, em podcast com Bill Simmons, editor-chefe do Grantland. Windhorst não está mais 100% dedicado ao dia a dia do Cavs, mas é um dos repórteres mais bem conectados dentro da franquia – e também com o círculo mais íntimo de LeBron. Acompanha o ala desde sua adolescência.

Windhorst depois mencionou a necessidade de pelo menos um integrante desse trio parada dura jogar bem em jogos isolados. Tipo: se Jones for bem na primeira partida, Marion, na segunda e Miller, na terceira. Para darem mais opções a David Blatt. Do contrário, as coisas podem se complicar. O técnico também adiciona Kendrick Perkins a essa lista. “Caras que estão no banco e não estavam jogando muito, com Shawn, Mike e Perk, precisam obviamente estar prontos para jogar mais minutos, e sei que eles vão fazer isso por serem profissionais e terem experiência e por terem estado em situações vitoriosas antes”, afirmou.

De fato, são todos trintões com muita bagagem e histórias para contar e que já foram campeões em diferentes momentos de suas carreiras. Estão habituados a momentos de pressão. Blatt (e LeBron) têm de se apegar a esse conceito, mesmo, para contar com os veteranos. Já que, em termos de atividade em quadra, a produção foi praticamente nula durante a temporada.

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Mesmo no caso de uma projeção estatística por 36 minutos, as coisas não melhoram muito. Na maior parte do tempo, os quatro jogaram mais como aposentados do que como peças importantes num time de playoff. Para não falar das dificuldades de Jones e Miller na defesa e as trapalhadas de Perk no ataque, cometendo turnovers sem parar (32,1% das posses de bola na qual foi envolvido). Contra o Celtics, Miller não teve um minuto sequer de ação, enquanto Marion e Perk somaram sete. Jones foi o único que jogou regularmente, com 46 minutos em quatro partidas, acertando apenas 2 de 11 arremessos de três (a especialidade de sua carreira).

Não que seus contratos tenham sido completamente equivocados. Faz bem uma presença reconfortante no vestiário, ainda mais no caso do Cavs, que seria o time mais visado/badalado/atacado/pressionado do campeonato. Não é por acaso que, ao checar o plantel do hegemônico Chicago Bulls de Phil Jackson (e Jerry Krause…), vamos encontrar verdadeiros anciões como James Edwards em 1996, aos 40, acompanhado por John Salley e Jack Haley, e Robert Parish em 97, aos 43. Mas nenhum desses pivôs velhacos teria um papel relevante em quadra. Bem diferente do que se espera em Cleveland agora.

Bicampeão com Miami e um dos melhores amigos de LBJ, James Jones está confiante. Ou mais ou menos confiante: “Uma parte essencial de nosso time foi subtraída, mas acho que temos o suficiente e nós sabemos que temos o suficiente. Então vamos jogar, competir. No final do dia, é questão de dar nosso melhor e esperar que esse melhor seja o bastante”, diz o ala

Essa incerteza gera um suspense tático para lá de intrigante – e deve até mesmo dificultar a vida dos técnicos de Chicago em um primeiro momento. Na hora de preparar o scout da série, eles vão precisar se ater com cuidado aos reduzidos minutos em que Kevin Love – e Smith – estavam no banco e tentar tirar conclusões a partir daí.

Mike Miller teve algumas grandes partidas pelo Miami e pelo Memphis nos playoffs. Conseguirá replicá-las?

Mike Miller teve algumas grandes partidas pelo Miami e pelo Memphis nos playoffs. Conseguirá replicá-las?

(Um parêntese: a contraposição dos talentos gera duelos individuais extremamente interessantes. São todas variáveis que corre-se o risco de ficar muito confuso. Tanto aqui no texto como nas pranchetinhas mágicas. Kyrie Irving x Derrick Rose: quem vai pontuar mais e permitir mais/menos pontos também? Iman Shumpert x Jimmy Butler: foi o ala com o qual LeBron comparou Shump no momento da troca, mas o emergente astro do Bulls é muito mais completo – e forte. Mozgov x Gasol: o russo vai tentar brecar o espanhol, mas tomando o máximo de cuidado com faltas. Thompson x Gibson: o canadense saltitante, cheio de energia contra um combalido e valente ala-pivô. Miller/Jones x Dunleavy Jr.: a corrida dos veteranos. Por aí vamos.)

O que pega é que Chicago também tem seus problemas. Joakim Noah está se arrastando pela quadra, e não é que Taj Gibson esteja correndo muito mais. Nikola Mirotic também se contundiu contra o Milwaukee Bucks, para não falar de todo o drama em torno de qualquer queda de Derrick Rose. A despeito da lavada que sofreu no Jogo 6, o Milwaukee Bucks deu muito trabalho.

Como Zach Lowe destaca em sua análise sempre minuciosa, Jason Kidd não teve problema Noah com jogadores menores, uma vez que o pivô não representava nenhuma ameaça. Marion, mesmo dois ou três passos mais lento que os tempos de Matrix, não teria problema com ele e ainda poderia atrapalhar Butler. Será que Jones e Miller também dariam conta? Talvez não seja necessário usar Thompson e Mozgov, uma dupla atleticamente opressora, ma que pode atrapalhar o ataque, em termos de espaçamento. A não ser que Mozgov acerte seus chutes de dois de longe com muita eficiência. Ainda assim, a quadra estará mais apertada para as infiltrações de LeBron e Irving. “Vamos ter de manter nosso ataque espaçado porque é dessa forma que jogamos”, diz Blatt. “Claro que sem os dois na escalação, algumas mudanças precisarão ser feitas. Mas tivemos muito sucesso neste campeonato e não queremos nos afastar tanto das coisas que deram certo.”

Se Miller e Jones ao menos estiverem acertando seus arremessos, a solução mais prática e recomendável talvez seja colocar LeBron como o ala-pivô efetivo do time, algo que ele fez com maestria em Miami, e apostar no small ball. Usar a flexibilidade que uma aberração atlética como o camisa 23 proporciona. O problema é que, dentre as muitas razões para seu retorno a Cleveland, ter Kevin Love ao seu lado no quinteto inicial era muito atraente justamente para afastá-lo da cesta. “LeBron odeia defender no garrafão, ter de batalhar ali. Para ele, é OK jogar ali no ataque de vez em quando, mas odeia marcar na posição 4”, diz Windhorst.

Por essas e outras que a mera cogitação de LeBron para o prêmio de MVP não parece nem um pouco justa com os outros candidatos. Afinal, estamos falando de um jogador que deliberadamente se esquivou de algumas responsabilidades. O mesmo cara que tirou duas semanas de folga durante a temporada para aliviar o estresse sobre a mente e o corpo. Que falou abertamente sobre como, em algumas partidas, estava no modo “relaxa e goza”.

Contra Chicago, ele sabe que não vai poder se comportar assim – vai precisar se desdobrar, alternando entre Gibson, Noah, Mirotic e, provavelmente, Butler, no caso de o ala estiver massacrando Shumpert ou Smith (quando este retornar). Haja fôlego e resistência.

Mesmo que o Bulls também esteja avariado fisicamente, é um time muito mais forte e calejado que o Boston Celtics. Com um número maior de opções que as da final de conferência de 2011 que o Miami derrubou, mas com um mesmo núcleo sedento por seu primeiro título. Thibs, Noah, Gibson e, principalmente, Rose vão brigar enquanto puderem.

Aí que LeBron vai ter de se expor de acordo com o que sua equipe precisar e o adversário pedir. Se houve um motivo para ele curtir a primeira metade do campeonato, era para poder se desdobrar nos playoffs, algo que a primeira rodada. “Obviamente, Kevin traz muito para o nosso time. É uma grande perda para nós. Ninguém vai conseguir assumir sua função – ele é especial por um motivo. Mas alguns dos nossos caras vão ter de se levantar e fazer mais. Precisamos disso, ainda mais com o JR fora”, afirmou James. Que, dessa vez, não vai ser testado apenas como craque, mas também como dirigente. E amigo.


Que rei sou eu? Cavs aguarda LeBron exemplar na 2ª metade da temporada
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Giancarlo Giampietro

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“Grandes poderes trazem grandes responsabilidades”. É uma frase para a qual, obviamente, não se pode atribuir autoria, mas acabou eternizada na cultura pop por Stan Lee, quando este fez o edificante Tio Ben proferi-la para um jovem Peter Parker. Saca, né? O futuro Homem-Aranha, que ainda precisava entender exatamente o que mudava em sua vida a partir do momento em que foi picado por um mardito aracnídeo radioativo. Acontece.

Desde a adolescência, com seus jogos transmitidos em rede nacional nos EUA e o rosto estampado em capas de revista, mais jovem ainda que Peter, LeBron James certamente já se deu conta desse lema. Isso não o impediu de assumir o título de Rei. De jeito nenhum. Então, se é para tratar desta forma, com todos os caprichos envolvidos, espera-se uma contrapartida – que ele reine com dignidade, algo que, na primeira metade da temporada 2014-2015, esteve longe de acontecer. Mas que, a julgar por sua mudança de comportamento nas últimas três partidas, pode estar mudando. Já não era sem tempo.

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>> 30 times, 30 fichas sobre a NBA 2014-2015

Depois de enfrentar situações dificílimas em sua trajetória e vencer em Miami e retornar consagrado, o Rei James decidiu retornar a Cleveland, para abraçar o seu povo. Vocês perdoem se o tom do texto parece grandioso, mas  é que o próprio atleta levou a discussão para esse lado quando decidiu anunciar seu novo contrato com Cavaliers com uma carta pomposa publicada na Sports Illustrated.

Estava tudo muito perfeito. Ele decidia reatar os laços com muita gente para lá de magoada com sua saída, a começar por Dan Gilbert, o proprietário da franquia. “Estou voltando para casa”, disse. Uma vez de volta, estava por todos os lados em Ohio, como uma figura de fato onipresente. Muito bonito, mesmo. Chega uma hora, porém, em que a euforia passa, e os resultados começam a ditar o rumo das coisas.

LeBron: presente em ações comunitárias em Ohio

LeBron: presente em ações comunitárias em Ohio

Em termos práticos, pensando apenas no jogo, a primeira coisa que vinha na cabeça era que o cara já está realizado em sua carreira, finalmente* aclamado dentro e fora de quadra, e que esse parecia um movimento natural. (*PS: Essa noção, aliás, de que só os campeões podem se inserir no grupo dos grandes jogadores, como se Robert Horry superasse Charles Barkley, é bastante absurda, considerando tudo o que já havia feito em sua carreira, liderando alguns times capengas a um patamar elevado nos playoffs. De qualquer forma, LBJ oficialmente se livrava dessas amarras. Ganhou dois anéis, com um basquete exuberante, limitando qualquer polêmica ao seu redor apenas àquelas querelas de sempre, que não levam a lugar nenhum: “Fulano é muito melhor que sicrano” etc. Não esperem que eu vá perder meu tempo nessa.)

LeBron, todavia, tinha uma estrutura consolidada em Miami. Parceiros testados e aprovados e toda a credibilidade de Pat Riley nos escritórios. Virar as costas para isso não era uma, hã, decisão tão simples. Precisava, sim, de uma certa dose de coragem, para reassumir a missão de quebrar a maldição esportiva que paira pelos clubes profissionais de Ohio. Era tudo uma questão de prioridades, além do mais: o que pesava mais? O simples prazer de estar em casa, ou a chance de buscar mais um título para ele e o primeiro para seus súditos?

Retomando seu ensaio para a SI, nota-se que ele discorre muito mais mais sobre o significado de retomar o convívio em sua vizinhança. Apenas no sétimo parágrafo que ele menciona “Cleveland” como time e não como localidade, ao dizer que só sairia do Heat se fosse para fechar com o Cavaliers, mesmo – mas sem citar o nome do clube, curiosamente. Em nenhuma parte de sua carta isso acontece. Sério. Reparem que o apelido só aparece em intervenções editoriais.

A carta, a volta, o rei

A carta, a volta, o rei

Depois, LeBron repassa brevemente as cicatrizes que precisariam ser revisadas antes de selar um acordo. A principal era uma conversa franca e cara a cara com o intempestivo Gilbert. “Estava com as emoções confusas. Era fácil dizer que, ok, nunca mais gostaria de lidar com essas pessoas novamente. Mas aí você sobre o outro lado. E se eu fosse uma criança que acompanhava um atleta, que esse atleta me fez querer algo melhor para minha vida, e aí ele deixasse a cidade?”, indaga, retoricamente. Aqui, num documento de circulação nacional, o astro se assume com uma referência mais ampla e que seus gestos têm influência para muito além das quadras. Grandes poderes, né? Para assumir responsabilidades ainda maiores.

É tranquilo escrever que, por ora, a atitude do craque não condiz com o que fala.

O problema, desde já, é tentar encontrar uma unidade em seu discurso. Mesmo que não conceda tantas entrevistas exclusivas, como na conversa com Lee Jenkins, da SI, o jogador da NBA está muito mais sujeito ao contato com a mídia do que o boleiro regular brasileiro, por exemplo. O jogador de NBA fala bastante.

A paciência de LeBron não abrangia a evolução de Wiggins

A paciência de LeBron não abrangia a evolução de Wiggins

Com tantas declarações por aí, basta fazer uma boa pesquisa para ver que, como líder de um time que ajudou a construir, LeBron ainda, no mínimo. São diversas oscilações de jogo para jogo, dependendo do resultado. “Não estamos juntos pelo tempo necessário. As pessoas querem sucesso imediato no nosso esporte, e acho que é muito complicado de pedir isso”, afirma um dia. OK, isso condiz com o que está escrito no nono parágrafo de sua carta nacional, no qual o veterano deixava bem claro que não estava prometendo títulos. Que seria difícil conseguir, mais difícil até que 2010, quando se uniu a Wade e Bosh. “Não estamos prontos. De jeito nenhum”, escreveu. “Minha paciência vai ser testada. Sei disso. Vou para uma situação com um jovem time e um técnico novo. Vou ser o tiozão. Mas me empolga a chance de formar um grupo e ajudá-los a alcançar um lugar ao qual eles não sabiam que poderiam chegar. Eu me vejo agora como um mentor”, disse.

Parecia a coisa correta a ser dita. Na prática, porém… A parcimônia era menor do o volume de uma caixa d’água paulistana em janeiro de 2015. Tem vezes em que ele está espumando diante dos jornalistas:”Tentei me manter paciente. Tentei não deixar minha linguagem corporal tão ruim como aconteceu algumas vezes”, para depois falar sobre os “maus hábitos” desenvolvidos por alguns jogadores e reclamar sobre a pouca movimentação de bola. “Minha paciência não é infinita. Tenho um nível baixo de tolerância para coisas dessa natureza. Então é algo em que estou trabalhando também, algo que sabia desde o princípio que seria o maior teste que enfrentaria: ver o quanto tenho de paciência nesse processo.”

Primeiro ponto: qualquer observador sagaz percebeu de cara a omissão de Andrew Wiggins e Anthony Bennett em seu ensaio. Ali estava uma senhora dica para as duas escolhas número 1 do Draft: já poderiam preparar as malas, de preferência grandes, para caber muitos casacos felpudos. Estava na clara que seriam negociados por Kevin Love. O mesmo ala-pivô que nunca havia disputado os playoffs, é verdade, mas que, supostamente, era um produto muito mais bem acabado do que o par de adolescentes canadenses. E aí LBJ começou a se impor como dirigente. Quer dizer: é no que todo mundo acredita, a não ser que David Griffin estivesse realmente encantado com o potencial de Mike Miller, James Jones e Shawn Marion, todos acima da faixa de 34 anos.

Quando os jogos começaram, não demorou muito para começar o zum-zum-zum sem fim. De que LeBron não dava a mínima para David Blatt. Que mal escutava o que se falava durante pedidos de tempo, mantinha conversas paralelas e saía antes do final das instruções. Que preferia que o assistente principal Tyronn Lue fosse o comandante. Em quadra, começou o “jogo do aponta”. Qualquer pane defensiva do Cavs resultava em um jogador encarando o outro, com o camisa 23 ditando o ritmo. A julgar pelo turbilhão que tomou conta da equipe, é como se a sua carta tivesse sido ditada na época do Antigo Testamento, não?

O Cavs já disputou 42 partidas desde O Retorno, entrando oficialmente na segunda metade da temporada. Se LeBron se apresentou como um mentor, líder e figura anciã, elucidativa, foi só com as portas fechadas, não? Talvez no primeiro dia do training camp.

David Blatt tem o respaldo de seu xará, Griffin

David Blatt tem o respaldo de seu xará, Griffin

Quem não se lembra do confronto natalino com os velhos companheiros de Miami? No segundo tempo, Love falhou feio e permitiu em duas posses de bola seguidas rebotes ofensivos para o adversário. Um deles foi coletado por Mario Chalmers ou Norris Cole. O ala-pivô ouviu um monte de seu capitão: um “BOX OUT” daqueles em leitura labial que não precisava da ajuda do especialista do Fantástico. Para constar: foram dois lances realmente constrangedores.

Love tem feito disso: sua concentração oscila de acordo com o número de arremessos que recebe. Fica emburrado e joga tudo para o alto. LeBron tinha todo o direito, então, de chamar a atenção, de cobrar mais empenho do co-astro, ainda mais num fundamento que ele se gaba de ser dos melhores na liga. O problema é quando o próprio ala não faz o básico. Seu hábito de caminhar chutando pedrinhas e cantarolando na transição defensiva só se agravou da temporada passada para essa. Luol Deng fez o que quis em quadra, gente. Menciono esse jogo apenas devido ao apelo que teve, ao simbolismo presente em quadra. Não foi um caso isolado, definitivamente. Falhas generalizadas, mas um atleta em especial berrando em quadra. Comparem sua competitividade com a de Kawhi Leonard no início da temporada:

LeBron tem de se esforçar muito mais no ataque do Cavs do que Kawhi, no do Spurs, claro. Mas isso não é desculpa para vagar pela quadra. Ao mesmo tempo, nas entrevistas, o Rei pedia para os torcedores não esquentarem, a despeito da campanha irregular do time. Contra o Orlando Magic, no dia 26 de novembro, ele foi provocado por Tobias Harris e arrebentou no quarto final. Ao final da partida, soltou a seguinte pérola: “Na verdade, estava num modo de relaxamento hoje, mas este modo foi desativado depois do que ele disse”. LeBron voltou para relaxar, então?

Para ser justo, é aqui que se faz obrigatória a menção de que o ala jogava com dores no joelho e nas costas. “O joelho está doendo o ano todo. Vai e volta”, afirmou. A franquia em nenhum momento divulgou precisamente a origem desses problemas, mas ele ficou afastado de oito partidas, das quais seu time perdeu sete. Mesmo jogando de modo esculachado/avariado, suas habilidades são tamanhas que causam um impacto significativo. Seus números continuam espetaculares, com 26,0 pontos, 7,4 assistências e 5,5 rebotes. Mas o padrão de jogo está abaixo do que vimos há dois anos, no auge, em Miami.

Agora, esquece: não é decente fazer essa comparação direta, exigir esse tipo de produção, até por estar numa equipe de configuração diferentes. Fora isso, jogadores envelhecem. Até mesmo alguém de aparência super-humana como LeBron. Enfrentando uma crise, o Cavs não o tiraria de ação durante um trecho tão complicado da tabela, com jogos contra Hawks, Bucks, Mavericks e uma viagem pelo Oeste, se seus médicos realmente não recomendassem o período de descanso pensando a longo prazo.

LeBron, assistindo: relaxamento ou lesões?

LeBron, assistindo: relaxamento ou lesões?

Lesões e dores só não explicam o modo como vem se comportando em relação a David Blatt – que cometeu falhas de um treinador novato, mas sobre o qual escreveremos depois. LeBron já disse com todas as letras que chegou a um ponto na carreira em que não precisa de nenhum técnico para lhe dizer o que fazer em quadra. Quando questionado sobre um possível voto de confiança para o (?)comandante, se ele merecia ficar no cargo, soltou esta: “Que outro técnico nós temos? Ele é o nosso técnico”. Uma resposta conciliadora e atenciosa, né? Um verdadeiro diplomata.

O curioso é que o “Rei” passou pelas mesmas coisas em 2010, agindo com desdém em relação a Erik Spoelstra, por exemplo. Agir dessa forma novamente, conhecendo o desenrolar da história em Miami, chega a ser infantil. Embora, valha dizer, não seja o único. Atletas reclamam e entram em conflito com técnicos. E as superestrelas da NBA estão sempre demandando Têm muito poder. No caso específico de James e do Cavs, sua influência se torna incomparável. Nem mesmo Kobe apitaria tanto no Lakers. O fato é que não contribui para nada.

De todo modo, Griffin, com ou sem o aval de Gilbert, comprou a briga quando, antes de um jogo contra o Mavs, convocou uma coletiva na qual defendeu Blatt de modo enfático. O ala já estava afastado. A previsão era de muitas derrotas, e, ainda assim, o cartola arriscou seu pescoço para oferecer uma blindagem ao treinador. Ele só não poderia ir para a quadra, na estrada, para evitar esta cena:

Aconteceu em Phoenix, na primeira partida de LeBron após duas semanas de descanso – e sete derrotas em oito partidas. O astro disse que não fez nada demais e que estava apenas tentando salvar Blatt de levar uma falta técnica. O treinador ratificou a história. Mas dava para fazer de outro jeito, né? Ainda mais com o tanto de especulação em torno da relação entre os dois. Essa imagem tem tudo para ser a mais emblemática possível.

Ou, talvez, tivesse. Pois bastou uma bem-sucedida passagem por Los Angeles para concluir a viagem pelo Oeste para que as coisas mudassem.  Pelo menos assim quer entender a diretoria e a mídia em Cleveland. Especialmente depois de um triunfo contra os Clippers, um adversário de respeito, na qual a defesa foi mais uma vez uma peneira, mas o ataque funcionou de acordo com seu potencial: 126 a 121. Um triunfo mais que bem-vindo, é verdade. Mas o que mais se comemorou foi um jesto de James ao final do confronto. Depois de um pedido de tempo e de uma jogada bem-sucedida, que terminou com fal-e-cesta em cima de Tristan Thompson, o Rei se curvou diante da comissão técnica (em sentido figurado).

Veja a descrição do portal Cleveland.com sobre esse instante: “A jogada era para encontrar Irving na cabeça do garrafão, mas os Clippers estavam concentrados nele. James, então, fez um passe rápido para Tristan Thompson, que estava cortando para a cesta e finalizou a bandeja, sofrendo a falta. James imediatamente olhou para a comissão técnica e apontou na direção deles, como se os estivesse aplaudindo por desenhar uma jogada tão bonita e efetiva. Foi a primeira vez que James escancarou qualquer nível de satisfação ou gratidão a Blatt”.

O Akron Beacon Journal, jornal que vem relatando com intensidade o distanciamento entre os dois personagens, conta assim: “James estava engajado, particularmente na vitória contra o Clippers. Ele fez contato visual com Blatt. Conversou com ele na quadra. Esses são momentos que ele vinha tipicamente compartilhando apenas com Lue”.

Duas vitórias, uma boa jogada, e qualquer crise estaria resolvida? Sabemos que não é assim que acontece. Ainda mais quando um mero gesto de LBJ ganha tamanha proporção. Imagine como estava o clima na cobertura e no dia a dia para que dessem tanta importância para essa passagem. De qualquer forma, para quem vê o time de perto, foi um baita sinal. Então fica aqui registrado.

A segunda vitória em Los Angeles. Hora da virada?

A segunda vitória em Los Angeles. Hora da virada?

Dias depois, o Cavs pegou outro suposto favorito da Conferência Leste que encara péssima fase, o Chicago Bulls, e venceu por 108 a 94. A terceira vitória seguida, algo que não acontecia há quase um mês, e um respiro. “O período fora foi a coisa mais difícil por que já passei. Odiei o fato de que estávamos jogando um basquete bem decente quando saí e perdemos um monte de jogos. Espero que, quando voltar, possamos recuperar nosso caminho vitorioso”, havia dito o astro em Phoenix, antes do empurrão e antes dos triunfos.

Desde que retornou, LeBron vem com médias de 31,7 pontos, 5,2 assistências, 7,0 rebotes, 1,5 roubo de bola e acertou 52,3% nos aremessos de quadra. Excelente. Mas também cometeu um caminhão de turnovers (5,2), acertou apenas 61% nos lances livres e deu o papelão de sempre na defesa. Neste momento, no League Pass, durante as paradas de jogo, a NBA tem veiculado um clipe com as 17 assistências que Kobe deu contra o Cavs, seu recorde pessoal. Muitos desses passes resultaram em cestas com uma grande contribuição de seu amigo. Não consegui gravar as imagens aqui, mas LeBron foi batido em diversas situações constrangedoras. Segue uma delas abaixo, na qual ele nem mesmo tenta se aproximar de Wesley Johnson:

Quer dizer: umas coisas podem mudar. Outras, porém, requerem um pouco de… paciência. Um dado curioso levantado pelo site Nylon Calculus nos mostra como o Cavs pode ser considerado o time mais inconsistente da NBA: quando eles vencem, vão muito bem; quando perdem, perdem mal de verdade. Se você for confrontar o saldo do índice de eficiência obtido em triunfos (13,3) e o dos reveses (-14,1), vai ter um hiato de 27,4 pontos, o maior da liga. Esse padrão se mantém mesmo quando os três astros estão juntos em quadra. O que isso nos mostra? Que a equipe tem muito o que render mesmo e decola quando as coisas se encaixam. Mas as derrotas são feias na mesma medida, numa prova de seu desacerto. Esse tipo de resultado só evidencia os problemas de química.

Claro que não estamos falando exclusivamente de vestiário. Faltava um pivô como Mozgov, faltava mais gente atlética e comprometida com a defesa (a ver se Shumpert resolve…) e de alas, no geral, mais capazes que os anciões Miller e Jones (J.R. começa bem, mas não dá para comemorar muito, vocês sabem). Mas não dá para subestimar de modo algum o quanto o vestiário é importante para o sucesso de um time. Veja o que aconteceu com o Indiana Pacers na temporada passada, depois das adições de Evan Turner e Andrew Bynum. São diversos os casos semelhantes.

Em Cleveland, Akron e arredores, o ambiente em geral é bom – no que se refere a ruas e torcida, ainda tomadas pela euforia, pelo menos. A galera está contente demais em ter o prodígio local por perto. Para eles, porém, mais que o LeBron cidadão presente em consertos de música clássica, parques e projetos sociais, o que preferem ver é o LeBron craque em ação, alguém que faça o Cavs melhorar e competir em alto nível. Um LeBron totalmente comprometido com o seu reino, assumindo de fato suas responsabilidades.


Ano novo, vida nova? As figuras da NBA que pedem uma virada
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Giancarlo Giampietro

Danny Granger, agora feliz do outro lado, em Miami

Danny Granger, agora feliz do outro lado, em Miami

Para muitos, a carreira de Danny Granger já estava encerrada. O ala havia passado por uma cirurgia no joelho esquerdo em abril de 2013, por conta de uma tendinose (sim, existe tendinite e a tendinose) que simplesmente não o deixava em paz. O veterano mal havia participado da campanha 2012-2013, fazendo tratamentos alternativos, separado do restante do elenco do Indiana Pacers, na esperança de se aprontar para ajudar a emergente equipe em batalhas com o Miami Heat. Não deu certo, e acabou indo para a sala de operação.

Depois de uma lenta recuperação, retornou ao Pacers para a campanha 2013-2014, já transformado, na melhor das hipóteses, em sexto homem, perdendo terreno para Paul George e Lance Stephenson. Por 29 partidas, ele simplesmente não conseguiu encontrar seu ritmo ideal. Não passou de 36% no aproveitamento dos arremessos – estatisticamente, na verdade, era o pior rendimento de sua carreira, muito pior até mesmo do que seu ano de novato, beeeem distante da forma que lhe valeu uma única indicação a All-Star em 2009. O desempenho foi tão aquém do esperado que Larry Bird, na ânsia de conseguir mais um trunfo para tentar, enfim, desbancar LeBron e Wade, não viu problema em despachar seu capitão para a Sibéria Filadélfia, em troca do irregular Evan Turner. Quer dizer: Bird desistitiu de Granger.

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O veterano rescindiu seu contrato com o Sixers e fechou com o Los Angeles Clippers, do outro lado do país, ao menos se encaixando em outro time com aspiração ao título. Vindo do banco, conseguiu elevar seu rendimento a um patamar minimamente satisfatório, mas sem lembrar em nada uma força ofensiva que fosse ameaçadora. Daí a surpresa quando Pat Riley, pressionado, talvez num ato de desespero, escolheu o ex-ala do Pacers, seu antigo rival de playoffs, num pacote de reforços de última hora ao lado de Josh McRoberts para tentar convencer LeBron a ficar na Flórida. Claro que não deu certo.

Foram 19 pontos para Granger contra o Memphis, antes dos 21 contra o Orlando Magic

Foram 19 pontos para Granger contra o Memphis, antes dos 21 contra o Orlando Magic

O Miami fechou, então, com Luol Deng para cobrir a lacuna aberta no quinteto titular – mesmo que essa fosse, em teoria, uma posição que Granger pudesse ocupar. A verdade era que Riley e o técnico Erik Spoelstra ainda não sabiam exatamente o que esperar do ala, ainda mais depois de ele ter passado por uma segunda cirurgia no joelho dois meses antes de se apresentar ao clube. Só imaginavam que, dado o histórico do clube para reabilitar quase-aposentados (desde os tempos de Tim Hardaway nos anos 90, até os mais recentes casos de Rashard Lewis e Chris Andersen), valia a aposta. “Não sabíamos o estado dele para valer, mas conhecíamos nossos próprios registros com casos semelhantes, vindo de lesões, por volta dessa idade. Sabíamos que, se eles se comprometessem a trabalhar, que talvez eles precisassem da oportunidade certa, no lugar certo”, diz Spo.

Vendo o que o ala realizou nas últimas partidas, pode ser que tenha sido uma cartada certeira. “Era para ser um processo longo, mas ele já está adiantado. Pensávamos que isso iria acontecer só no Ano Novo”, afirmou. Granger primeiro recebeu minutos nas 11ª e 12ª partidas do Miami. Depois, nas 18ª e 19ª.  Voltou a ser aproveitado entre as 22ª e 24ª. Não animou muito e ficou parado por mais quatro jornadas, até ser inserido de vez na rotação. Então, no jogo mais esperado do calendário, com o retorno de LeBron no dia de Natal e transmissão, ele marcou 9 pontos, cinco dos quais em um momento crucial do quarto período, para esfriar uma reação do Cleveland Cavaliers. Nas duas partidas seguintes, marcou 39 pontos e converteu 70% dos seus arremessos, saindo do banco, com direito a oito cestas de três pontos. “O que ele fez neste último par de jogos foi fenomenal”, afirmou Dwyane Wade.

Claro que está muito cedo para celebrar dessa forma. O desafio do jogador é justamente sustentar uma sequência produtiva, consistente e com durabilidade, algo que não acontece há mais de dois anos. Nesse caso, não bastaria apenas a conversão de seus arremessos feito um James Jones, mas também se pede boa movimentação pela quadra, especialmente na defesa – o Miami precisa de toda a ajuda possível neste momento.

De qualquer forma, sabe da melhor? A crescente de Granger veio justamente nas vésperas de seu reencontro com o Indiana Pacers. Dá para ter melhor timing que esse? E mais: precisava ser justamente nesta quarta-feira, na noite da virada de ano? Não poderia ser mais emblemático, mesmo.

Agora, num universo de mais de 400 jogadores, são diversos os atletas que precisam de, senão de um recomeço, ao menos de um momento de virada em suas carreiras:

Todo o elenco do New York Knicks: Quer dizer, menos Cole Aldrich, Quincy Acy e Travis Wear, para quem a vida anda muito bem, obrigado. De resto, na pior campanha da história da franquia, o povo anda numa penúria que só. Se for para escolher um nome, porém, ficaríamos entre JR Smith e Andrea Bargnani. O ala-armador sempre foi o principal candidato a estranhar e odiar o sistema de triângulos. Esfomeado, de vista que só enxerga bem a cesta e nada mais, está agora convenientemente afastado de quadra devido a uma ruptura na fáscia plantar (algo que, acho, podemos traduzir como “sola do pé” no populacho). Já Bargnani não jogou sequer um minuto na temporada, por conta de uma ruptura de tendão no cotovelo. Sua estreia pode acontecer também nesta quarta, contra o Sixers. Difícil é encontrar alguém que ainda confie nesses caras. Smith só fez seu desempenho cair desde sua participação desastrosa nos playoffs de 2013. Para o italiano, Nova York, na verdade, já representava uma chance de recomeço, ao sair escorraçado de Toronto. Phil Jackson já disse que não topa nenhuma negociação que vá atrapalhar os planos dos Bockers no mercado de agentes livres. Não vai receber nenhum contrato indesejado que dure mais que os atuais.

A triste história de uma escolha de número um de Draft vinda da Itália

A triste história de uma escolha de número um de Draft vinda da Itália

– Bem, Josh Smith já ganhou, de certa forma, sua Mega-Sena da virada particular.

Andrei Kirilenko: pobre AK-47. Sob o comando de Jason Kidd, o ala tinha tudo para brilhar em Brooklyn, considerando a predisposição do jovem treinador para fazer o uso máximo de atletas híbridos, versáteis. Aí as costas não deixaram. Quando alegou estar bem fisicamente, veio Lionel Hollins, um técnico que conseguiu belos resultados em Memphis, mas que tem visão beeeem quadrada sobre o basquete (“Pivô bom? Só se jogar de costas para a cesta” etc.) Aí que o russo foi afastado da rotação, sem muita explicação, até se tornar o mais novo caso de banimento para a Filadélfia.A ironia é que, quando Kirilenko fechou com o Nets em 2013, houve uma choradeira geral na NBA: a de que havia um acordo por fora com o compatriota Mikhail Prokhorov, uma vez que ele havia aceitado um salário bem inferior ao seu valor de mercado.

Funciona assim, a propósito: a) um time precisa se livrar de um contrato, seja para abrir espaço no teto salarial, ou para diminuir as multas por excesso de gastança; b) o gerente geral liga para Sam Hinkie, chefão do Sixers, o time que nem mesmo cumpre a folha salarial mínima da liga e tem espaço para absorver qualquer tranqueira; c) Hinkie vai levantar o inventário do time que está ligando, para, d) rapelar mais algumas escolhas de Draft, até chegar o momento em que Philly vai ter 98% dos picks de todas as segundas rodadas da década; e) contrariado, mas sem ter muito o que fazer (ao menos ele vai economizar uns tostões, o que sempre agrada a qualquer proprietário de franquia), o cartola paga tudo o que o algoz solicita.

Deron e AK47 eram felizes em Salt Lake City e mal sabiam

Deron e AK47 eram felizes em Salt Lake City e mal sabiam

Foi o que aconteceu com Kirilenko. E pior: ao contrário da maioria dos atletas despachados para lá, Hinkie quer que o russo realmente se apresenta para jogar. Não porque conta com o medalhista de bronze olímpico para reforçar sua equipe, mas, sim, por vislumbrar uma nova troca para ele daqui a um mês – se ele jogar bem, vai aparecer algum time que sonhe com o título a pagar ainda mais pelo cara, saca? Mais escolhas de Draft! Obviamente que o russo não quer saber de virar um peão num joguete desses. Ele só quer liberdade. Se for dispensado, imagine se o San Antonio Spurs encontra um meio de contratá-lo (rompendo, vá lá, com Austin Daye)? O mundo precisa disso.

Deron Williams: Por falar em Brooklyn Nets, conheça o astro de US$ 20 milhões (US$ 19,8 mi, para ser mais preciso) que conseguiu uma proeza: virar reserva de Jarret Jack! Nada contra o novo titular, gente. Mas é que o veterano sempre foi conhecido em sua carreira justamente como o principal concorrente de Steve Blake  à condição de “armador reserva dos sonhos de todo e qualquer treinador”. Ao menos por hora, acabou essa história para Jack. Deron perdeu duas partidas devido a uma contusão na panturrilha e, quando voltou, estava no banco. Em entrevista pós-jogo, supôs que era por medida cautelar de Lionel Hollins. Ao que o treinador respondeu: “Não sabia que eu estava controlando os minutos dele”. Ui. Será que Sacramento, então, ainda topa conversar a respeito? Veja bem, Vivek. Já sabemos que vocês querem o Mason P, que está jogando demais, mesmo, e seria ótimo complemento para o Boogie. Mas… repare que o Sacramento está caindo pelas tabelas na conferência! E que isso talvez não tenha a ver com a meningite mardita que tirou o Boogie de ação, ou com a demissão de um técnico que havia colocado o time em boas condições de competir! O que isso significa? Significa que é hora de fazer mais uma troca por um astro renegado! Deu certo com o Rudy Gay, vai dar certo com o Deron também! Tro-ca já.

Lance Stephenson: é, Lance, a essa altura, você tem de agradecer pela lesão que Al Jefferson sofreu na virilha, que vai tirar o pivô de quadra por um mínimo de quatro semanas. Ufa, né? Pois estava ficando feio: foi só o ala-armador sair de cena com uma torção pélvica (!?!?), que o Charlotte Hornets começou a vencer. Eram quatro triunfos consecutivos já, reforçando a tese de que o talentoso e intempestivo jogador era o problema. Segundo o RealGM, porém, tanto a diretoria quanto Stephenson chegaram a um consenso de que ainda está cedo para romper. Da parte do clube, resta saber apenas se isso não foi motivado pelo simples fato de que as ofertas que chegaram não animavam muito. O Indiana Pacers, por exemplo, flertou com a possibilidade de repatriá-lo. Ao que parece, segundo diversas reportagens, seus antigos companheiros não se animaram muito com a ideia, não. Então parece que, se quiser encontrar paz, Stephenson vai ter de se virar em Charlotte, mesmo, ajudando Kemba Walker, em vez de se meter no caminho do armador, especialmente num momento sem Jefferson.

Vai tudo para a conta de Blatt, mesmo?

Vai tudo para a conta de Blatt, mesmo?

David Blatt: cogitar a demissão de um treinador estreante na NBA, com menos de seis meses no cargo? As coisas em Cleveland parecem não mudar nunca, mesmo, com trono ocupado ou vazio. O Cavs ainda deixa a desejar na defesa, é verdade, especialmente a proteção do garrafão, algo que sempre foi uma preocupação, devido a sua dependência de Anderson Varejão. Havia uma carência clara no elenco. Caberia a Blatt encontrar algum sistema para remediar isso, claro, e até agora não rolou. Talvez os jogadores não estejam escutando Blatt? Pois é. Mas essa não foi a mesma história com os últimos dois treinadores que passaram por lá? Irving e Waiters são reincidentes. Além disso, LeBron tem um comportamento no mínimo suspeito desde que voltou. Berra com companheiros em quadra, enquanto ele mesmo demora para voltar na transição defensiva. Diz a repórteres que estava em “modo relaxa-e-goza” contra o Orlando Magic, depois de uma preocupante derrota na véspera, para o Miami. Não importava, então? Ele age como se tivesse conquistado tudo de que precisava e, agora, era hora apenas de curtir o fato de estar perto de caso. No mesmo jogo contra o Heat, Kevin Love perdeu rebotes para Mario Chalmers e Norris Cole, enquanto vagava emburrado pela quadra. Enfim, Blatt, de um jeito ou de outro, vai precisar assumir as rédeas aqui. Segundo diversas fontes que trabalharam com ele na Europa, trata-se de um sujeito sensacional, que merece melhor sorte em sua grande chance nos EUA. A diretoria vai lhe dar apoio? Ou morrem de medo de LeBron para tomar alguma decisão que possa contrariá-lo?

Anthony Bennett: que o canadense fosse perder minutos para Robbie Hummel realmente não era algo que Flip Saunders tinha em mente quando fechou, enfim, a troca de Kevin Love.

Kobe Bryant: ele também é outro que já desfruta de um recomeço, após tantas lesões que lhe roubaram muitos meses preciosos nesta reta final. Mas para o astro do Lakers a temporada 2014-2015 não poderia passar rápido o suficiente. De qualquer forma, sabemos que ele arremessar 30 vezes por jogo não parece a solução num time fraquíssimo, embora os torcedores do Lakers adorem. Não dá para ser herói com esse time. Resta, então, passar a bola e liderar de um jeito bem diferente ao que se acostumou a fazer em uma vitoriosa – e conflituosa – carreira. Que tal?

PS: Desejo aqui um ótimo 2015 a todos – aqueles que estejam em busca de seu próprio recomeço, os que estão na crista da onda e, claro, o pessoal que toca tudo numa boa, sem tantas peripécias assim para contar, mas que não se enganem: como o filmaço Boyhood – a melhor coisa de 2014 – ensina, até a vida vida mais regular já é um grande acontecimento.


Retorno de LeBron desafia maldição esportiva de Cleveland
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Giancarlo Giampietro

30 times, 30 fichas para a temporada 2014-2015 da NBA

Ele voltou

Ele voltou

Em Cleveland, o burburinho começou em maio, quando o Browns selecionou o badalado – e controverso – quarterback Johnny Manziel no Draft da NFL. Aí que, no dia 11 de julho, três meses depois, chegou a carta de LeBron James, via Sports Illustrated, anunciando O Retorno do Rei. Aí quem iria segurar?

Os torcedores mais fanáticos foram para a rua. As aglomerações não chegaram a atingir o status de passeata, mas foi quase. A causa? Eles estavam confiantes, muito confiantes que estaria chegando perto do fim. Mas o quê?

A mal-di-ção que paira sobre a cidade.

De que seus times não seriam campeões nunca mais na vida.

“Ah, vá. Que história de maldição é essa? Que bobagem!”, pode ser sua recepção. Mas não brinque com, ou duvide dos sentimentos dos outros, cara.  A sensação a respeito é tão grave em Cleveland, que tem seu próprio verbete na Wikipedia, gente. Veja só como o texto começa: “A maldição sobre os esportes de Cleveland é uma superstição envolvendo a cidade de Cleveland, e  todos seus times esportivos”. Todos!

Um artigo que detalha a maldição

Um artigo que detalha a maldição

Desde que o Cleveland Browns ganhou o título do futebol americano em 1964, a cidade, também representada na NBA e no beisebol com o Indians, jamais ganhou um troféu. Se for juntar tudo, dá mais de 150 temporadas de jejum. E eles não aguentam mais conviver com esse fardo. Daí que, quando um LeBron volta parasua  casa – que, veja bem, não é exatamente Cleveland, mas Akron –, eles explodiram em euforia. Era chegada a hora.

Do ponto de vista nacional, a pressão sobre o Cavs vai ser natural. Afinal, é o que ronda toda a carreira do ala, ainda mais depois da chegada de Kevin Love. Estamos diante do novo supertime da NBA. Na cidade, porém, você pode imaginar o nível de tensão quando a equipe se aproximar dos playoffs.

“O campeonato é a nossa meta nesta temporada”, afirma Anderson Varejão, que já vive há 10 anos por lá, e então sabe que tem de tomar cuidado ao abordar o tema, de modo que ele complementa a frase: “Mas há alguns times muito bons lá fora. Espero que dê certo para nós logo de cara, e que vençamos todo mundo, mas as coisas não funcionam desta forma. Vai levar tempo”.

O time: antes de contratar James e Love, o Cavs já havia garantido um grande trunfo para elevar o produto que entrega em quadra: Blatt. O americano-israelense estava merecendo uma chance na NBA. Hoje, existem outros 28 técnicos que trocariam de lugar com ele num piscar de olhos – vamos deixar Pop fora dessa. Mas talvez não haja melhor nome para cumprir essa missão, independentemente de sua condição de estreante na grande liga. A começar pela defesa. Uma das características mais elogiosas de Blatt é sua capacidade camaleônica, de se adaptar ao que tem ao seu redor. E, como ele mesmo conta, no elenco formado pelo gerente geral David Griffin, com uma ajudinha de LBJ, há atletas que vieram de times que praticavam os mais diversos estilos de defesa no ano passado. Isso não é problema.

“Vamos ser versáteis. O fato de ter caras vindo de diversos sistemas só vai nos ajudar”, garante. Versatilidade não falta, realmente, para o treinador usar. Ele pode formar quintetos grandes e, ao mesmo tempo, velozes. Ou times baixos, mesmo, que vão correr ainda mais – ter o melhor jogador do mundo ao seu lado ajuda bastante para isso. Tudo vai depender da química em quadra e do adversário, do jeito que seu treinador gosta. O Cavs também tem um potencial imenso para dominar os rebotes jogo a jogo, com o trio Varejão-Love-Thompson sendo escoltado por Marion e James. Se você assegura os rebotes defensivos, estará bem posicionado para sair no contragolpe. Irving, Waiters e James vão adorar receber os touchdowns de Love, por exemplo. Em situações de meia quadra, arremessadores não faltam para esgarçar a defesa. Enfim, é um time bastante intrigante.

A pedida: o elenco ainda é majoritariamente jovem, considerando as peças principais, LeBron, Blatt e dirigentes vão falar que tudo tem tempo nessa vida, mas é óbvio que a equipe joga pelo título para já.

Linha de frente de Cleveland promete dominância nos rebotes

Linha de frente de Cleveland promete dominância nos rebotes

Olho nele: Tristan Thompson. Quando você observa o pivô canadense e ignora as minúcias do jogo, deve se sentir predisposto a amar o sujeito. É um cara muito rápido e ágil, que sai do chão com facilidade para enterrar ou capturar rebotes. Para ele, essa coisa de capacidade atlética é natural. Os pais eram esportistas, o irmão caçula, também. E o primo. Leia mais. Aqui, Thompson ganha relevância não só por ser aquele que vai revezar com Varejão no garrafão, mas também por causa do futuro. Um futuro bem próximo. O canadense chega a seu quarto ano de NBA, estando sujeito a renovar seu contrato. E vale quanto?

A despeito de suas habilidades como reboteiro, de cobrir espaços defensivamente, em termos de produção ofensiva, o pivô está estacionado, se for para checar sua produção por minuto, ou até mesmo regrediu, em termos qualitativos. No ataque, ele pode ter mudado de mão para arremessar – trocou a canhota pela direita –, mas isso não surtiu pouco efeito em seu aproveitamento de média distância, e com volume reduzido de tentativas. Passar também não consta em seu repertório. Estamos falando um jogador com sérias limitações. Mas que tem o mesmo agente de LeBron: Rich Paul. E a diretoria do Cleveland por acaso gostaria de desagradar o sujeito? A aposta seria que, instruído por Blatt, um professor muito mais gabaritado que Mike Brown e Byron Scott, Thompson progredisse de modo significativo para justificar o salário de mais de US$ 10 milhões que certamente vai pedir.

Abre o jogo: “LeBron vindo para cá não era o suficiente. Fechei o negócio só quando soube do Kevin Love. Isso me convenceu, deixou mais realista a ideia de que teríamos uma chance de vencer o campeonato neste ano”, dele, Shawn Marion, o cara.  Campeão em 2011 pelo Mavs, sendo um dos responsáveis pela marcação em LBJ, “Matrix” foi um dos reforços cortejados pelo craque para complementar o elenco da equipe. Resta saber se o ala seria contratado caso tivesse soltado essa antes de firmar contrato.

Você não perguntou, mas… segundo o repórter Dave McMenamin, do ESPN.com, quando Cavs e Lakers discutiram uma possível troca envolvendo Pau Gasol na temporada passada, a diretoria de Los Angeles não arredava o pé e pedia Anderson Varejão no pacote. Não foram atendidos, para sorte do pivô brasileiro. E, sim, chegamos ao dia em que ficar em Cleveland, em vez de vestir a camisa do Lakers, é algo que nem se pensa a respeito.

Brad Daugherty, pick 1, topsUm card do passado: Brad Daugherty. O Cavs ganhou a loteria do Draft pela primeira vez em 1986, 17 anos antes de ser brindado com LeBron James. Naquela ocasião, a franquia viveu talvez o seu grande momento – pelo menos até o dia em que o prodígio decidiu voltar para casa. Além do pivô revelado pela Universidade da Carolina do Norte, a diretoria caprichou nas escolhas de Ron Harper (em 8º) e Mark Price (em 25º), para construir o núcleo de um time que tentaria desafiar do Bulls de Jordan, Pippen e Jackson no início dos anos 90. Que draft! Como tudo que é bom tende a passar rápido para os times de Celveland, contudo, Harper foi trocado para o Clippers e Daugherty teve sua carreira abreviada devido a problemas crônicos nas costas. Ele jogou apenas nove anos na liga, dos 21 aos 28, se aposentando precocemente com médias de 19 pontos e 9,5 rebotes, sendo eleito cinco vezes para o All-Star Game no meio do caminho. A curiosidade é que, aos 30 anos, ele tentou voltar ao esporte. Mas oooooutro esporte: o automobilismo, como dono de uma equipe da série NASCAR de pickups, a mesma que já contou com Nelsinho Piquet em sua linha de largada. No atual elenco do Cavs, são duas escolhas número um de draft: LeBron e Kyrie Irving. Caso não tivessem fechado a troca por Love, teriam mais duas: Andrew Wiggins e Anthony Bennett. Haja sorte. É o carma para compensar a maldição.


LeBron? Intrigas? Nada. No Cavs x Heat, deu festa para Varejão
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Giancarlo Giampietro

Varejão brilha pelo empenho. Mas teve seus minutos de cestinha no Rio (Foto: Marcelo Regua/Inovafoto)

Varejão brilha pelo empenho. Mas teve seus minutos de cestinha no Rio (Fotos: Marcelo Regua/Inovafoto)

Em Cleveland, ele é uma sumidade. Neste sábado, foi a vez de ser reverenciado, com muita justiça, por seus compatriotas. Num comportamento bem diferente do que apresentou no ano passado em relação a Nenê, os torcedores brasileiros ovacionaram Anderson Varejão quando o pivô foi apresentado no Rio de Janeiro, antes do amistoso de pré-temporada da NBA contra o Miami Heat.

O reconhecimento, claro, tem muito mais a ver com o carisma do pivô do Cavaliers, muito por conta de sua cabeleira esvoaçante, marca registrada, que deixa todas as suas ações um tanto mais dramáticas – um fenômeno parecido com o que se passa com David Luiz e Carles Puyol nos gramados.

Qualquer aplauso direcionado a um jogador como Varejão é merecido. Num país em que se celebra o ataque no esporte como um aspecto até mesmo cultural, no basquete essa devoção acaba se canalizando para a figura do cestinha. E, de cestinha, o capixaba não tem nada. Ou melhor: apaga isso. Pelo menos por alguns minutos, num time que tem LeBron James e Kevin Love, o brasileiro foi promovido, de modo surpreendente e cordial, a referência ofensiva – e mais do que deu conta do recado.

Desde os tempos de adolescente surgindo no time principal de Franca, o grandalhão se destacou por seu tino até mesmo extrassensorial para os rebotes, a inteligência e empenho na defesa, turbinados por sua agilidade incomum. O cara do serviço sujo. Qualidades que fizeram dele um sucesso popular em Cleveland. E que, felizmente, não passaram despercebidas pelo pelo público nacional.

Varejão fiscalizando Bosh. Prioridades defensivas

Varejão fiscalizando Bosh. Prioridades defensivas

De qualquer maneira, o Varejão que jogou pelo Cavs foi outro. A partir do momento em que anotou os dois primeiros pontos do confronto, num tiro de média distância, o pivô não se cansou de balançar a redinha. Foi um gesto bem legal do técnico David Blatt, que desenhou jogadas que colocavam o cabeleira em posição favorável para pontuar lá dentro, assessorado por LeBron. Desse jeito, o treinador vai se tornar um personagem popular com seus atletas rapidamente. A seriedade de Blatt só não foi abalada quando, no período final, a galera passou a gritar o nome do pivô, pedindo seu retorno. Não ia rolar – há planos mais sérios, de longo prazo, que precisam ser respeitados.

O brasileiro deu provas de que tem munheca e que pode ser explorado. Teve até gancho de média distância caindo, tiros em flutuação, com muita confiança. Ele anotou 8 dos primeiros 16 pontos do time, ralando, vejam só, com Dwyane Wade. No primeiro tempo, foram 12 pontos no total, acertando seis de oito tentativas de cesta. Que fase! Sua participação se encerrou no terceiro quarto, com 14 pontos em 20 minutos.

No terceiro período, porém, Kevin Love foi mais um a se beneficiar da companhia de um LeBron que estava distribuindo mais, atacando menos, desembestou e estragou tudo, disparando em sua contagem pessoal (terminou com 25 pontos pontos em 26 minutos). Chris Bosh queria morrer de tanta inveja. O impetuoso Dion Waiters também aprontou uma ou outra coisa, deixando claro que talento, para ele, não é o problema. A questão é controlar a cabeça – mesmo num amistoso lá estava o jovem ala-armador fazendo caras, bocas e poses após suas infiltrações. Não precisa.

LeBron crava: uma das duas cestas de quadra do astro em pré-temporada

LeBron crava: uma das duas cestas de quadra do astro em pré-temporada

Em termos ofensivos, o potencial do Cavs é imenso. David Blatt tem ao seu dispor alguns craques, mas não é só isso. As características de LeBron e Love já permitem uma série de quintetos diferentes. A presença de caras como Dion Waiters, Shawn Marion, Mike Miller, Joe Harris e Tristan Thompson no elenco de apoio, porém, sugere caminhos intermináveis para serem explorados. São muitos atletas versáteis, intercambiáveis e alguns excelentes arremessadores de três pontos (a escolha de Harris na segunda rodada do Draft deste ano foi providencial, aliás). Para um jogo de pré-temporada, a fluidez das movimentações ofensivas já impressionam. A mente brilhante do técnico vai se esbaldar.

Com esse ataque superprodutivo, sua equipe foi dominante, liderando o placar de ponta a ponta.  No geral, foi um jogo de nível muito superior ao Bulls x Wizards do ano passado. O fator LeBron-contra-ex-time definitivamente contribuiu para isso, ainda que o astro estivesse bem mais complacente que o normal em quadra, ainda em modo pré-temporada. Com as pernas pesadas ainda, só tentou oito arremessos no total, convertendo dois. Nos lances livres, como reflexo desse condicionamento físico ainda aquém do esperado, errou quatro de sete chutes. Fechou sua participação na metade do terceiro período com sete pontos e oito assistências.

Entre seus antigos comparsas, Dwyane Wade começou bem, mas foi perdendo eficácia no decorrer dos quartos. Chris Bosh foi mais consistente e produtivo. A temporada promete para o pivô. Enquanto, para Udonis Haslem, as coisas estão bem claras: não tem essa de jogo de pré-temporada. O veterano pivô brigou, correu, trombou, reclamou e agitou bastante. Vale ficar bem atento ao ala James Ennis também. Calouro, ele foi escolhido por Pat Riley no Draft de 2013, mas jogou a temporada na Austrália, para ganhar cancha. Está afiado. De resto, muuuita discrição. No mau sentido.

Isso é curioso: por mais que tenha perdido apenas uma peça de seu time finalista de NBA, o Miami ainda busca de uma nova identidade, de atleta que ainda procuram entender exatamente qual é o seu papel. Afinal, foi a peça que saiu, né? O cara em torno de qual todo o sistema ofensivo e defensivo girava.

Do outro lado, bastante solto em quadra, o Cavs dá primeiros sinais bastante promissores. Só não esperem que, nesta jornada, Varejão vá receber tantos passes e marcar tantos pontos como fez no primeiro tempo. E ele, claro, nem importa. Desde que em junho possa fazer mais festa. Mas dessa vez em Cleveland.

*   *   *

O momento de pastelão do jogo coube a… LeBron! Claro. Vejam a cena:

Ao subir na defesa acompanhando Luol Deng, o craque do Cavs teve um lapso mental, viajou no tempo e se comportou como um atleta do Miami Heat ao fazer um corta-luz em Matthew Dellavedova, para liberar Norris Cole. Afinal, LBJ já ficou ao lado do armador-cabelo-de-bigorna por muito mais tempo do que do australiano. Acontece com as melhores cabeças.

*   *   *

O final da partida, pegando fogo, foi divertido, com Shabazz Napier lembrando os tempos de Connecticut e a turma do fundão do banco suando para valer, mostrando serviço – muitos deles serão dispensados nas próximas semanas. Não bastasse o reencontro de LeBron com a ex-equipe, a contratação de Kevin Love e tudo o mais… O Brasil ganhou até mesmo um jogo com prorrogação. A galera pirou, e haja sorte para os organizadores. Deu tudo certo, com um placar bastante elevado: 122 a 119 para o time de Varejão.


Maccabi joga sempre pressionado. Ainda mais sem Blatt
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Giancarlo Giampietro

Goodes deixa a sombra de Blatt num Maccabi reconfigurado

Goodes deixa a sombra de Blatt num Maccabi reconfigurado

Conforme dito já em toda a Internet, o Maccabi Tetl Aviv que enfrenta o Flamengo no Rio de Janeiro é bem diferente, em termos de nomes, daquele que foi campeão da Euroliga em Milão, em maio. Na troca de temporada, o clube israelense perdeu muitos de seus principais jogadores. Mas a grande mudança, mesmo, diz respeito ao seu comando técnico. Guy Goodes tem a missão ingrata de substituir um David Blatt que foi a grande força por trás de sua histórica e suada conquista e agora vai conversar bastante com LeBron James e Kevin Love em Cleveland.

Podem dizer que técnico não joga, mas Blatt é daqueles que faz a diferença, sim. Extremamente versátil, consegue tirar o máximo do grupo que tem ao seu dispor, adaptando seu jogo ao que seus atletas podem oferecer. “Há duas escolas de pensamento para técnicos, e nenhuma está mais certa que a outra. Há técnicos que têm o seu sistema e vão usá-lo, independentemente da montagem de seu time. E há técnicos que se adaptam, que pegam seu elenco, e jogam de acordo com suas habilidades. Sou mais dessa escola adaptável, com alguns princípios que são consistentes durante a minha carreira”, afirmou a Zach Lowe, do Grantland.

Para quem acopanhou o Maccabi na temporada passada, isso ficou bem claro. Blatt não só aplicava sua tática de acordo com o que tinha em mãos, como também o time era maleável bastante para alterar completamente seu estilo de um jogo para o outro, ou mesmo dentro de um jogo, dependendo do adversário, da fase dos atletas e se Schortsanitis estava em ação.

Baby Shaq grego era a única referência ofensiva, com jogo de costas para a cesta, do elenco do Maccabi 2013-14. Não joga contra o Flamengo

Baby Shaq grego era a única referência ofensiva, com jogo de costas para a cesta, do elenco do Maccabi 2013-14. Não joga contra o Flamengo

No time que derrotou o Real na decisão europeia, dos que foram para quadra, só mesmo o Baby Shaq grego tinha mais de 2,03 m de altura (oficiais 2,06 m, vamos dizer assim), e foi por menos de 10 minutos num jogo de prorrogação. Vimos um Maccabi correndo contra quem podia correr, um time de jogo mais lento quando não conseguia aguentar o pique, protegendo bem sua cesta mesmo sem estatura, alternando defesa pressionada com zonas simples ou mistas para desestabilizar o adversário, mas sempre povoando o garrafão.

De novo: era um time muito interessante, mas limitado, que tinha de se virar como dava – em termos de talento, no papel, seu elenco estava bem abaixo de seus concorrentes do Final Four. Foi um time que perdeu, por exemplo, seis de 14 jogos na fase Top 16, na qual ficou sob séria ameaça de eliminação, até garantir sua vaga nas quartas de final com uma vitória sobre o Bayern de Munique na penúltima rodada. Antes desse triunfo sobre o Bayern, acreditem: o próprio Blatt teve de encarar entrevistas coletivas em que  sua demissão era cogitada. Pasme.

Uma vez classificado para as quartas, porém, o time decolou, vencendo cinco dos próximos seis jogos. O turning point foi uma vitória dramática, na prorrogação, sobre o Olimpia Milano, em Milão, na abertura dos mata-matas. O time virou um jogo impossível, uma reação daquelas digna de Maccabi Tel Aviv, que o presidente Shimon Mizrahi, uma figuraça, vai contar para os bisnetos.

Em termos de talento, seu elenco estava bem abaixo se comparado com o da maioria das equipes classificadas para as quartas de final do torneio europeu. No Final Four, então, era claramente um azarão. Ainda assim, os caras derrotaram o CSKA Moscou num jogo parelho pela semifinal e, depois, derrubaram a máquina de se jogar basquete do Real Madrid na decisão. Mas é isso, né? O tipo de coisa que pode acontecer em jogos decisivos, ainda mais se em confrontos solitários. Um time competitivo engrenar, começar a acreditar e, pumba, realizar sua missão-na-terra. São justos, legítimos campeões, mas o próprio Blatt foi o primeiro a dizer que, num sistema de playoff, dificilmente ele e seus rapazes teriam chegado lá. Talvez estivesse subestimando suas próprias habilidades como estrategista e líder.

David Blatt saiu nos braços do povo

David Blatt saiu nos braços do povo

Blatt construiu um currículo e uma reputação que o empurravam para outra direção. Enfim, as portas da NBA foram abertas para ele, recebendo uma proposta generosa do gerente geral do Cleveland Cavaliers, David Griffin, que teve o apoio inesperado do intempestivo proprietário Dan Gilbert, que preferia um John Calipari. Poucos em Israel puderam acreditar. Não que ele não merecesse. É que não estavam preparados para que ele ‘já’ saísse após seu tão sonhado primeiro título de Euroliga. Havia apenas especulações de propostas para assistente, algo que não necessariamente seria atraente para alguém com seu status, e aí chegou o Cavs, pré-Retorno de LeBron, interessado. Pronto.

Cabe a Guy Goodes, então, assumir essa bronca. Pelo menos o treinador de 43 anos sabe muito bem da responsabilidade. São 15 anos de clube. Já integrou a comissão técnica do Maccabi por seis temporadas – entre 2006 e 2008 e também as última quatro como braço direito de Blatt. Não obstante, também jogou pelo time de 1990 a 1998. Agora assume o cargo principal, sem muita experiência, porém, nessa função. Entre uma passagem e outra como assistente, dirigiu o Hapoel Jerusalem, e só.

Como faz, então, agora que está no comando? “No papel há muitas diferenças entre os dois treinadores, mas também há várias semelhanças. Goodes aplicou no time muito da filosofia de Blatt como também a sua. Ainda assim, Blatt é conhecido por ser um treinador de espírito defensivo que se empenha em limitar os oponentes a 70 pontos por jogo. Goodes é o oposto. Ele ama o basquete veloz, com passes rápidos. Durante a pré-temporada, o Maccabi por duas vezes anotou 106 pontos e 109 em outra”, afirmou o jornalista israelense David Pick, um carrapato do Maccabi, ao Mondo Basquete.

Goodes estuda o Flamengo no tempo que dá. Crédito: David Pick

Goodes estuda o Flamengo no tempo que dá. Crédito: David Pick

É importante dizer que, mesmo que o elenco israelense tenha sido sacudido, o perfil dos atletas foi mantido. Vale destacar o retorno de Jeremy Pargo para a vaga de Rice e a aposta em MarQuez Haynes para o lugar de Hickman. Curioso como o clube realmente foi atrás de jogadores de características muito semelhantes, mesmo. Com os dois em quadra, já se pode esperar muita velocidade. Em situações de meia quadra, preparem-se para o uso e abuso do jogo de pick-and-rolls e pick-and-pops e até mesmo muitas jogadas no mano a mano, explorando a habilidade dos recém-contratados e a presença de muitos arremessadores ao redor deles, com o pivô Alex Tyus representando uma das poucas ameaças no corte para a cesta, fora da bola (fora, isto é, das mãos dos armadores americanos). Brian Randle, bastante atlético, mas voltando de uma lesão muscular, também precisa ser vigiado nessas – se for para o jogo, mesmo.

O time segue muito baixo, com apenas três jogadores acima de 2,05 m – quando, na real, era para ser apenas um. Explico: Alex Maric, de 2,11 m e muita presença física no garrafão, só foi contratado para quebrar o galho enquanto Sofoklis Schortsanitis se recupera de sua operação devido a um glaucoma. O terceiro é o pivô americano Jake Cohen, de 2,08m, que foi contratado no ano passado ao sair da universidade de Davidson. Ainda é um projeto, tendo sido emprestado para o Maccabi Rishon Lezion. Nesta temporada, deve ficar no clube principal, com o qual tem contrato por mais três temporadas, mas sem muito tempo de jogo.

Maric é um sujeito alto, forte, mas que já viveu dias melhores: único poste a desafiar o Fla nesta final

Maric é um sujeito alto, forte, mas que já viveu dias melhores: único poste a desafiar o Fla nesta final

É de se imaginar confrontos de ritmo acelerado em que um atleta lento como o australiano Maric não deve ter espaço – a não ser que o Flamengo não consiga defendê-lo. Como destacou David Pick, o Maccabi tem corrido bastante em seus jogos de pré-temporada, com média incomum de 93,5 pontos em seis partidas disputas na pré-temporada até aqui. Se essa proposta for mantida, for dominante, é algo que favorece o Flamengo, que também gosta de sair em transição, com atletas como Marquinhos, Benite, Laprovíttola, Meyinsse, Gegê, Felício etc. Estão preparados para isso.

Agora, é preciso ver se o novo treinador é um cara de uma cartada só ou se aprendeu com Blatt a se moldar também de acordo com o que jogo oferece, com as facilidades sugeridas e dificuldades impostas pelo adversário. Na pré-temporada, vem com cinco vitórias e apenas uma derrota justamente pela final da Copa da liga israelense, já valendo como partida oficial. Perderam para o Hapoel Jersualem, por 81 a 78.

Sofrer mais um revés em uma decisão seria péssimo para Goodes em seu início de trabalho numa instituição em que a pressão por resultados é gigantesca e pode afetar até uma lenda viva como Blatt. O ex-assistente e o clube ainda não estão preparados para mais mudanças em sua estrutura. Mas o Flamengo não está aí para dar uma forcinha.


Copa Intercontinental e suas incógnitas: chance para o Flamengo
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Giancarlo Giampietro

Copa Intercontinental 2014, Fiba, Flamengo, Maccabi

É difícil dizer qual é o Maccabi Tel Aviv que enfrenta o Flamengo neste final de semana pela Copa Intercontinental, no Rio de Janeiro. Porque já era muito complicado definir qual era a equipe que havia conquistado a Euroliga da temporada passada, com sua formação camaleônica, irregular, que acabou surpreendendo ao ser campeão continental. Você soma aí o fato de que eles trocaram de técnico, perdendo o genial David Blatt, e mudaram mais da metade de seu elenco, e os jogos desta sexta-feira e domingo ganham um aura de incógnita.

É um clima bem diferente da decisão do torneio de 2013, no qual o Olympiakos aparecia como amplo favorito. Isso tinha muito a ver com a consistência do clube grego, que havia conquistado dois títulos europeus seguidos e também contava com Vassilis Spanoulis, um cara que obviamente estava um degrau acima dos demais atletas em quadra.

Em termos de acúmulo de resultados positivos, dessa vez é o Flamengo que chega embalado, vindo de dois NBBs e sua primeira Liga das Américas – me desculpem, mas não dá para incluir aqui os recordes recentes do estadual, a despeito da tradição do torneio. O difícil é traduzir o jogo de cá com o de lá: o quanto um Fla dominante no Brasil e, por um ano, nas Américas é poderoso para enfrentar um campeão europeu meio acidentado. Um campeão justo, é verdade, porque levou a melhor em quadra – mas que definitivamente não foi o melhor time europeu de 2013-2014

Você jamais pode subestimá-lo – e certamente o Flamengo não vai correr esse risco. Eles têm camisa, história, com seis títulos continentais, uma base de torcedores das mais entusiasmadas do mundo todo. Então é claro que o time de José Neto vai respeitar seu adversário, e bastante. Só, acredito, não precisa se colocar em situação de inferioridade. Estivessem o Real Madrid ou o Barcelona do outro lado, aí a coisa mudaria de figura – estes, sim, os times com melhor campanha na Euroliga, até o Final Four.

Para comparar, durante a temporada regular (primeira fase e Top 16 somadas aqui), a agremiação israelense teve 16 vitórias e 8 derrotas, contra 21 e 3 do Real e 19 e 5 do Barça – sendo que o time de Huertas bateu de frente com Fenerbahçe e  CSKA pela etapa inicial e, depois, ainda precisou lidar com Fener, Olympiakos, Panathinaikos, Olimpia Milano por um grupo duríssimo. Além do mais, o próprio Blatt admitiu que, num confronto de playoff, sua equipe dificilmente teria derrubado o Real, ou até mesmo o CSKA. Em um jogos únicos, porém, foi uma tarefa plausível, graças em muito ao seu domínio do tabuleiro.

Para considerar também: os dois adversários chegam ao confronto em fase inicial de preparação. É apenas a pré-temporada. Os rubro-negros, nesse sentido, levam a vantagem de terem uma base muito mais bem entrosada. Um craque como Walter Herrmann, já mais velho, mas ainda de uma categoria acima da média, foi adicionado, e deve ser peça fundamental da equipe. Derrick Caracter é outra história, aqui discutida. De resto, a rotação está intacta. Já o seu adversário realmente passou por uma reformulação drástica em seu plantel, algo que sempre pode acontecer, mas não estava nos planos.

O Maccabi é bem mais vulnerável do que o título de campeão europeu pode sugerir. Não quer dizer que seja fraco, ok? Longe disso. Mas a expectativa é de um confronto muito interessante, desde que os flamenguistas estejam fazendo a lição de casa direitinho.


O Maccabi campeão que deprimiu o poderoso Real
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Giancarlo Giampietro

Festa em Tel Aviv: em prédio, o placar da final. Mais que basquete...

Festa em Tel Aviv: em prédio, o placar da final. Mais que basquete…

“Esta Euroliga fomos nós que perdemos. Se tivéssemos feito as coisas um pouco melhor, seríamos campeões”, afirmou Felipe Reyes. “É uma das derrotas mais difíceis na minha carreira. A equipe que ganhou da nossa não é melhor do que o nossa. Estamos f*****dos.”

Primeiro: o capitão do Real Madrid e um dos símbolos da geração dourada do basquete espanhol realmente soltou esta última frase on the record para resumir o que ele e seus companheiros sentiam nos vestiários em Milão após a derrota para o Maccabi Tel Aviv na final do campeonato continental. Para quem o viu receber o troféu de vice-campeão com o maior desdém, já numa fossa danada, não chega a ser uma surpresa o uso, enfim, de impropérios em entrevistas. Justo com os atletas merengues, um grupo de caras certinhos que pouca emoção deram a matérias que procuravam exaltar uma temporada (quase?) histórica do clube.

Agora, com toda a sua experiência, aos 34 anos, disputando sua décima Euroliga, Reyes sabe, ou deveria saber muito bem que nem sempre o melhor time vai vencer por aquelas bandas. O formato do Final Four já abre naturalmente espaço para os azarões ou coisas atípicas – o Real, mesmo, não vai bater o Barcelona por mais de 30 pontos todos os dias. Há muitos fatores que podem levar a diversas, supostas injustiças. Mas o espanhol que experimente dizer isso diretamente a David Blatt ou Tyrese Rice, o MVP da fase decisiva, aquele mesmo que não tomou conhecimento de nenhum defensor madridista que se aventurasse em pará-lo.

Talvez Blatt pudesse fazer uma concessão: que, no papel, um por um, o elenco do Real de fato daria uma surra no que ele tem ao seu dispor. Quiçá admitisse, mesmo, na esportiva, embora não tenha obrigação nenhuma de fazê-lo. Foi seu time o campeão. E isso, para sua realização e a de milhares e milhares de fanáticos, é o que importa, no fim.

Yarone Arbel, um chapa israelense que acompanha o time e o campeonato há anos, colunista no site da Euroliga e scout profissional, já havia dito no Twitter, de modo um tanto premonitório: A única chance do Maccabi ganhar este jogo é dar uma de… Maccabi. Não será sobre o basquete”.

Foi um comentário que segue a linha do que disse Reyes, horas mais tarde. Sim, o melhor time, como demonstrado durante toda a temporada, era o Real. Acontece que esse Maccabi que chegou a Milão era um monstro completamente diferente daquele que estávamos acompanhando durante as semanas, meses anteriores. Eles estavam transformados.

O clube chegou a perder quatro partidas consecutivas em março, o que é caso para crise institucional. A boataria dava conta de que Blatt estaria absurdamente ameaçado em seu cargo. O time penou para chegar aos mata-matas, mas aí veio um momento mágico, que encaminharia sua jornada para outra direção.

No mesmo Mediolanum Forum, o Maccabi abria o confronto com o emergente Olimpia Milano, sem a vantagem do mando de quadra. Empolgada, atlética, em alta, a equipe da quadra vencia o jogo por 12 pontos, restando algo em torno de quatro minutos no confronto. Ou sete pontos com menos de dois minutos. Os israelenses conseguiram uma virada inacreditável, vencendo na prorrogação. Durante as entrevistas pós-título, o treinador, seus jogadores e os dirigentes concordaram: aquele foi o momento em que passaram a acreditar que algo “especial” estaria por vir (foi a palavra usada por todos).

Veio mesmo. Quando subiram para a quadra no Final Four, estava diante deles. Foram nove mil torcedores do clube em Milão? Há quem diga até 10 mil. Uma quantia muito maior do que a torcida dos outros três clubes juntos. Impressionante, ainda mais por incluirmos aqui Barcelona e Real Madrid – o CSKA tem um nome pesado, mas, depois de transmitir seus jogos por duas temporadas no Sports+, está claro que seus admiradores não podem ser confundidos como “seguidores”.

E não há como o time entrar em quadra, do outro lado do Mediterrâneo, e não se empolgar com aquele mar de camisetas e bandeiras azul e amarelas na arquibancada. Impossível passar incólume por isso e não se sentir ainda maior. Há quem possa achar piegas a frase, mas não vejo como evitá-la: ali, o Maccabi, sim, era mais que um clube.

Se formos pensar, testemunhamos algo parecido neste NBB, com a ascensão do Mogi durante os playoffs. Guardadas as devidas proporções, claro. A torcida veio junto, o time cresceu. Ou: o time cresceu, a torcida veio junto. Difícil dizer o que acontece primeiro. O que sabemos é que, de maneira indiscutível, os dois juntos tornam a criatura mais temerosa.

Vejam as fotos das comemorações em Tel Aviv:

De cima, estava assim

De cima, estava assim

De perto, dava para ver isso

De perto, dava para ver isso

Até que...

Até que…

No meio da baderna, Guy Pnini ergue a taça

No meio da baderna, Guy Pnini ergue a taça

Na Euroliga, o Real era superior financeira e tecnicamente, mas não tinha isso ao seu lado. Como clube, seu adversário era maior.

(Sobre o jogo em si, comento, meio atraso, um pouco mais tarde.)


Dois finalistas, duas jornadas diferentes na Europa, um título marcante
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Giancarlo Giampietro

O show do Real Madrid

O show do Real Madrid

O que dá mais confiança? Um atropelo contra seu arquirrival ou uma vitória de virada com cesta nos últimos segundos? Difícil dizer, ainda mais para quem acompanhou os dois belos jogos desta sexta-feira pela semifinal da Euroliga, mas o certo é que Real Madrid e Maccabi Tel Aviv vão para a decisão de peito estufado, em busca de uma conquista marcante.

Aí você fala: “Ô, cara, e que título não seria marcante? Seu bobo alegre”.

Tudo bem, tudo bem, pode falar.

Mas é que realmente há razões muitas razões para ambos os finalistas celebrarem, para tornar o troféu a ser entregue no domingo mais especial do que o normal.

O Real, por exemplo. A equipe jogou o basquete mais bonito, vistoso e, ao mesmo tempo, eficiente de toda a temporada. E pode incluir aqui NBA, ACB, NBB e qualquer sigla de sua preferência. Os caras cumprem uma temporada histórica, cheia de brilho, que merece todos os troféus possíveis para completá-la. Se for para interromper um jejum que já dura 18 anos, tanto melhor – a última vez que conquistaram o continente foi em 1995, e pensar que a turma do futebol merengue reclama que a Champions não sai desde 2002…

Nesta sexta, no segundo jogo do dia, os madridistas aplicaram mais uma clínica gratuita e impiedosa, vencendo seu confronto por inacreditáveis 100 a 62. Já seria um placar absurdo contra qualquer oponente, o maior em semifinais da Euroliga. Mas quando você sabe que o Barcelona estava do outro lado, as coisas ganham contornos épicos – também foi o maior em Superclássicos em competições europeias, superando os 21 pontos na temporada 1993-94.

Esse é um termo que tem corrido um sério risco de cair num poço banal. Qualquer coisa hoje é épica, qualquer zé mané pode ser eleito um mito graças a uma pedrinha atirada de modo que ela quique na água sem afundar. Mas se a gente pega um Real que chegou a vencer 31 partidas consecutivas e já ganhou a Supercopa e a Copa do Rei em solo espanhol, com ambas as finais contra o mesmo Barça, e soma nessa conta o atropelo cometido em Milão, tudo fica muito grandioso, mesmo.

O Real, a essa altura, luta muito mais do que pelo título. O time de Pablo Laso luta para estourar a porta da história, entrando com tudo, como Cosmo Kramer costumava entrar no apartamento do Jerry. Com pompa e de modo estrondoso. Não será apenas uma equipe listada em meio a tantos outros campeões. Será um grupo relembrado para sempre, mesmo que não consigam repetir taças e o mesmo rendimento avassalador nas próximas campanhas.

O que não quer dizer que não houvesse um suspense para mais um duelo com o Barça em Milão. Marcelinho Huertas e seus companheiros haviam acabado de bater seu principal oponente no fim de semana passado, interrompendo uma sequência de três triunfos dos merengues.

Foi uma vitória com alguns asteriscos (Felipe Reyes, um líder e ainda um baita jogador, não jogou e Rudy Fernandez foi excluído por duas faltas técnicas e o Real tinha a liderança da liga nacional assegurada), é verdade, mas era algo que com o devido contexto colocava o favoritismo do clube blanco em dúvida. Afinal, o Barcelona já havia feito a melhor campanha do Top 16 da Euroliga e vinha numa arrancada na Liga ACB, com o maior saldo de cestas das últimas dez rodadas. Além disso, eles surraram o Real em quadra – embora o placar final tenha sido de 86 a 75, durante a partida a vantagem chegou aos 20 pontos. Tudo isso fazia a semifinal continental ainda mais e mais e mais interessante.

No primeiro quarto, um empate por 20 a 20 aumentava a tensão. O Real apresentou um ataque travado por uns seis, sete minutos – com um jogo atipicamente individualista, com poucas trocas de passes e precipitações na hora de concluir. Do outro lado, a equipe cometia muitas faltas, dando ao adversário o luxo de bater lances livres já a partir da marca de 6 minutos, enquanto Huertas brilhava em suas conexões com Ante Tomic.

Até que Laso chamou do banco de reservas seu MVP, Sergio Rodríguez, um pouco mais cedo do que o usual. E o panorama da partida se alterou drasticamente. O barbudo botou pressão para cima do armador brasileiro, levou ainda mais vantagem contra Victor Sada, e a intensidade de seu time começou a entrar nos conformes. Reyes e o tunisiano Salah Mejri também deram um bom empurrão na equipe, enquanto Nikola Mirotic atacava de modo exuberante, deixando qualquer pessoa ligada ao Chicago Bulls com água na boca.

O primeiro tempo terminou com uma vantagem já mais confortável, de oito pontos (47 a 35), mas era muito difícil prever o que viria a acontecer na segunda etapa. O Barça não conseguiu marcar mais de 14 pontos nos dois quartos, enquanto o Real acumulou 28 e 27. Um espanco, como diria Maurício Bonato. E as pancadas vinham de todos os lados.

Rodríguez foi mais uma vez fenomenal, 21 pontos em 20min51s, sem falar do aproveitamento de 4-5 (80%) nos chutes de três e as seis assistências, dos sete lances livres cavados e toda encheção que ele causa na defesa. Mirotic terminou com 19 pontos em 24 minutos, matando 6 de 8 arremessos de quadra e também foi presença constante na linha de bonificação. Reyes, Sergio Llull e um contido Rudy Fernández também superaram os 11 pontos. Só o caçula Daniel Diez, que entrou em quadra nos últimos 3min21s não fez cesta. Mais números: 60,5% nos chutes de dois (contra 43,6%), 48,3% de três, num número elevado de tentativas, 29, mas com bolas majoritariamente equilibradas (contra 27,8%) e 17 assistências para meros oito turnovers.

Os atletas do Barcelona perderam a compostura em quadra, ficaram desnorteados. Foi um nocaute literalmente técnico. Ainda tentaram apelar para a catimba e algumas faltas mais duras aqui e ali. Kostas Papanikolau, que lutava pelo tricampeonato, chutou a placa de publicidade e bateu boca com torcedores. Ficou feio.

Então percebem como esse título seria algo maravilhoso para o Real, né?

Tyrice Rice e Alex Tyus, decisivos no quarto período em vitória incrível

Tyrice Rice e Alex Tyus, decisivos no quarto período em vitória incrível

Agora, o Maccabi também te seus argumentos. Em Israel, estão acostumados a reinar de modo absoluto, mas ultimamente alguns concorrentes impertinentes vêm dando trabalho. No ano passado, o Maccabi Haifa, liderado por Gael Mekel – hoje reserva do Mavs –, ousou destroná-los na liga nacional. Nesta temporada, o time azul e amarelo ocupa a liderança, mas constantemente pressionado. É algo que incomoda, muito. Mas muito mesmo. Quase como uma nuvem de pernilongos carniceiros.

Em meio a esse desconforto, o clube chegou a perder quatro partidas seguidas – entre liga israelense e Euroliga –, e houve, acredite, quem especulasse ou pedisse a demissão de David Blatt. Algo inconcebível. Para ver como ficam mal-acostumados com o sucesso.

Pois bem. Sofrendo um pouco, o Maccabi conseguiu se desvencilhar de Bayern de Munique e Lokomotiv Kuban, e avançou aos mata-matas com a terceira colocação de seu grupo no Top 16, atrás de CSKA e Real. Nas quartas, derrubaram o Olimpia Milano para assumirem a condição de estraga-prazeres oficial do torneio continental, tirando os anfitriões do Final Four da competição, numa série encerrada em 3-1, mas com jogos duríssimos.

Mesmo os jornalistas locais mais camaradas admitem que este elenco de Blatt é o mais fraco do time de Tel Aviv a chegar ao Final Four nos últimos anos. De qualquer forma, depois de algumas semanas de turbulência, conseguiram se colocar entre os quatro melhores, encerrando um intervalo de dois anos.

Contra o CSKA, eu os colocava como azarões. E por três quartos o time moscovita fez valer esse palpite, chegando a abrir 15 pontos no placar. Na parcial final, no entanto, o armador Tyrese Rice, mais uma dessas formiguinhas atômicas – quase xará e sósia de Ty Lawson –, resolveu barbarizar. O baixinho se esbaldou contra Milos Teodosic, invadindo o garrafão russo quando bem entendia. De pouquinho em pouquinho, seja com suas bandejas ou com os rebotes ofensivos de Alex Tyus – livre, uma vez que os pivôs tinham de sair para tentar bloquear Rice, e a rotação defensiva de Ettore Messina não estava afiada o bastante para reagir rapidamente.

Aliás, um parêntese: após o fiasco de Zeljko Obradovic com seu milionário e caótico Fenerbahçe, dessa vez foi a vez de outra lenda viva do basquete europeu patinar. Um tanto impaciente durante a temporada, soltando os cachorros a toda hora, especulado como possível alvo do Utah Jazz, Messina claramente não soube potencializar todo o talento que tinha ao seu dispor. E, neste quarto período, deixou as coisas saírem totalmente de controle.

Demorou a pedir tempo, fez poucos ajustes e não encontrou um meio de frear Rice. Está certo que o armador Aaron Jackson, um defensor muito mais indicado que Teodosic, foi retirado lesionado nos minutos decisivos. Mas não há muitas desculpas além dessa para justificar o colapso do CSKA. Até que o mesmo Rice fez a cesta da vitória a 5s5 do fim, aproveitando-se de um desperdício de posse de bola infantil dos oponentes, com Victor Khryapa entregando o ouro bandido (aliás, valeu, Czar! A reputação agradece…). O clube russo ainda conseguiu deixar Sonny Weems (fora de sintonia no ataque, talvez cansado por perseguir Rick Hickman na defesa, anulando mais um dos destaques da fase final apontado por um certo bobão) livre na linha de três para um último chute, em vão.

O Maccabi perdeu o jogo praticamente todo e, completamente desacredito, aqui está na decisão. Então não há como eles não acreditarem que o título é possível, mesmo que o Real Madrid tenha feito uma apresentação soberba logo na sequência.

Confiança é uma coisa complicada, da qual não se pode duvidar. Pode equilibrar as coisas entre uma máquina de fazer cestas e um patinho feio nada pelas beiradas.

Se for para dar um palpite, fico mesmo com o Real. Só não digam aos rapazes de David Blatt que seria mais justo que a taça fosse para os espanhóis. Aos trancos e barrancos, também se constrói uma história marcante.


Em quem ficar de olho no F4 da Euroliga: Hickman e sua jornada
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Giancarlo Giampietro

Ricky Hickman, Maccabi Tel Aviv, Euroliga

Para quem ainda não está farto de tanta emoção, com o que se vem passando nos playoffs completamente alucinantes da NBA e com tantas surpresas no NBB, então é hora de abrir os braços para uma carga extra de drama – e basquete refinado – neste fim de semana. Mais especificamente na sexta-feira e domingo, com o Final Four da Euroliga.

A gente pode falar de Barcelona e Real Madrid, que fazem mais um clássico de matar, ou das constantes potências CSKA e Maccabi, que história não falta. Na verdade, vamos tratar desses clubes, sim, entre hoje e amanhã. Mas, antes, prefiro gastar um tempo com os protagonistas em quadra.

Sim, os melhores jogadores do mundo, inclusive os europeus, estão do outro lado do Atlântico. Parker, Nowitzki, irmãos Gasol, Pekovic, Gortat e tantos mais. Mas não quer dizer que o segundo maior torneio de clubes do mundo fique só com as sobras. Há diversos atletas que assinariam contratos na NBA sem a menor dificuldade, sendo peças relevantes, mas que, por circunstâncias diversas – entre as quais se destaca invariavelmente a adoração de fanáticas torcidas e alguns milhões de euros na conta –, seguem jogando perto de casa.

Navarro e sua breve parceria com Pau Gasol em Memphis. Frustração

Navarro e sua breve parceria com Pau Gasol em Memphis. Frustração

Peguem, por exemplo, Juan Carlos Navarro. Desnecessário falar sobre o currículo, a reputação e o talento de La Bomba. Em sua única temporada nos Estados Unidos, ele não chegou a ser maltratado como Vassilis Sponoulis foi por Jeff Van Gundy em Houston, mas sofreu demais em um ano perdido do Memphis (60 derrotas!), no hiato entre os times de Hubbie Brown e Lionel Hollins. Ainda viu seu grande amigo Pau Gasol ser trocado. Um ano depois, correu de volta para Barcelona, aonde é rei, talvez chocado com a barbárie.

Este é um caso emblemático. Mas há diversos nessa linha: Erazem Lorbek, cortejado pelo Spurs ano após ano, mas que segue no Barça; Dimitris Diamantidis, o mito alviverde do Panathinaikos; Nikola Mirotic, o segundo grande sonho de qualquer torcedor do Bulls que se preze (o primeiro, claro, sendo um Derrick Rose 100%); sem contar os diversos americanos ignorados pelos Drafts da vida, mas que construíram e lapidaram toda uma carreira no velho mundo (Keith Langford, Daniel Hackett, Joey Dorsey, Ricky Hickman, Tremmell Darden, Aaron Jackson, Bryant Dunston etc. Etc. Etc).

Não dá para cravar que todos eles seriam bem-sucedidos num ambiente muito mais exigente do ponto de vista atlético, em que suas façanhas europeias talvez sejam ignoradas, tendo eles que batalhar novamente a partir do zero por respeito e o decorrente tempo de quadra. Dependeria muito da franquia, da diretoria e, claro, do técnico – sem contar a adaptação muitas vezes complicada, como Tiago Splitter e Mirza Teletovic podem testemunhar.

Há que prefira, então, evitar o risco, ficando numa zona de conforto, já bem remunerado. Mas também há aqueles que são simplesmente subestimados, mesmo, não vendo a hora de receber uma boa proposta, mas sem necessariamente estarem dispostos a assinar pelo salário mínimo da NBA, como fez Pablo Prigioni em seu primeiro ano de Knicks, já na reta final da carreira.

Pensando apenas nos quatro semifinalistas, vamos listar abaixo alguns craques que merecem ser observados com atenção, mas sem a menor preocupação se dariam certo ou não na NBA. Bons o suficiente para serem apreciados pelos que já fazem agora. Essa é uma lista que já deveria ter sido escrita antes, para relembrar o belíssimo campeonato que fez Andrés Nocioni, a versatilidade da dupla Emir Preldzic e Nemanja Bjelica, do Fenerbahce, o próprio Dunston, vigoroso pivô do Olympiakos, eleito o melhor defensor da temporada, o jovem italiano Alessandro Gentile, revelação do Olimpia Milano e candidato ao Draft deste ano, e muito mais.

Antes de chegar aos caras, um lembrete para contextualizar: para os que estão (bem) mais acostumados com a NBA, lembrem que o basquete Fiba é jogado em 40 minutos, e não 48. Logo, o tempo de quadra de uma partida da liga norte-americana é 20% maior, de modo que as estatísticas em geral são mais infladas por lá, fazendo alguns dos números abaixo parecerem tímidos. Além disso, a abordagem ofensiva das equipes de ponta da Europa tende a ser diferente, com mais jogadores assumindo responsabilidades, dividindo a bola, mesmo as que têm grandes cestinhas, que poderiam muito bem carregar um time nas costas.

E, ok, aqui entra o momento da propaganda: o evento será transmitido com exclusividade pelo Sports+, canal 28/128 da SKY, com este blogueiro lelé na equipe de equipe, ao lado do ultrafanático e informado Ricardo Bulgarelli e os narradores Maurício Bonato, Rafael Spinelli e Marcelo do Ó, que, cada um ao seu modo, ajudam a dar emoção ao jogo.

Vamos lá, enfim, a alguns destaques do F4, sem necessariamente ser os melhores do campeonato, mas apenas uma lista que dá na telha. Free style, mano, com pílulas publicadas nos próximos dias:

Ricky Hickman, armador do Maccabi Tel Aviv. 
28 anos, 12,8 ppj, 2,8 apg, 52,1% de 2 pts

Em Tel Aviv, é verdade: qualquer jogador que vista a camisa do Maccabi já pode ser considerado um astro. Nem que o apelo seja apenas local. Para Ricky Hickman, não importa nenhum asterisco, nem nada disso. A partir do momento em que assinou com a superpotência israelense em 2012, relevando algumas propostas financeiras mais atraentes, as coisas enfim passaram a fazer sentido, depois do tanto que remou. Agora, dois anos depois, no Final Four da Euroliga, é hora de curtir o basquete em alto nível.

Ok, para ser mais justo, vale dizer que o armador já havia disputado, na temporada anterior, o All-Star Game da Lega Basket, a liga italiana de pallanacestro. Um campeonato que já foi mais vistoso, mas que ainda merece o respeito. Mas chegar, enfim, a um clube de Euroliga, ainda mais um com essa tradição, era enfim a ratificação do sucesso em sua carreira. Depois de muita espera.

Vejam este currículo: PVSK Pecs na Hungria em 2007; em novembro do mesmo ano, transferência para o CS Otopeni Bucareste. Terminada a campanha, rumbora para  a Alemanha, nem que seja para defender time B do BG 74 Göttingen, numa liga regional. Em dezembro de 2008, assina-se, então, o Giessen 46ers, que hoje está na segunda divisão do país.

(Aqui vale um parêntese para falar sobre o Giessen: os caras já foram de elite e ganharam cinco títulos nacionais, o último nos anos 70, porém. Em seu perfil de Wikipedia, no entanto, o orgulho fica pelo fato de o clube ter contado com o pivô americano Kevin Nash em seu elenco.

Kevin quem? Nash, hoje um astro da luta livre “profissional”, mas que foi pivô lá atrás. Jogou pela universidade do Tennessee, onde se formou em psicologia e da qual foi expulso em 1980 por ter, claro, saído na mão com o técnico Don DeVoe. Largou, então, a NCAA e foi jogar por dinheiro, até se aposentar em 81, defendendo o 46ers, devido a uma lesão no joelho. Aproveitou a estadia na cidade de Giessen e se alistou em uma base americana, servindo por dois anos com tropas da OTAN. Como se não bastasse, também trabalhou numa linha de produção da Ford e foi gerente de um clube de strip. Até entrar para o fantástico mundo da luta livre. Fim de um longo parêntese completamente absurdo, voltamos ao currículo, diabos.)

Ricky Hickman, versão Finlândia

Ricky Hickman, versão Finlândia

Se as coisas não ficam tão bem em tablado germânico, que se mude então para a Finlândia, para defender o Namika Lahti (prazer em conhecê-lo. Aí, em 2010-11, torna descer a Europa novamente, agora para a Itália, na Segundona de novo, pelo Junior Casale. Em 2011-12, enfim, hora de brilhar em um campeonato decente, pelo Scavolini Pesaro, na elite italiana. Foi essa a trajetória de Hickman até aqui. Imagine quantos já não teriam largado as coisas na hora de jogar uma liga amadora alemã…

Pelo Pesaro, Hickman foi para o jogo das estrelas, mas foi seu compatriota e companheiro de time, o acrobático e um tanto errático James White, quem foi agraciado com o grande salto, assinando com o New York Knicks.  Sua recompensa, contudo, veio logo em sequência.

No Maccabi, o americano tem um papel um pouco parecido com o de Vasilis Spanoulis no Olympiakos, ou Juan Carlos Navarro no Barcelona, embora com estilo diferente. Ele é uma válvula de desafogo para o ataque, produzindo muito bem no mano a mano, com habilidade no drible e um primeiro passo avantajado. Só não peçam, contudo, que mate o jogo de três. Seu aproveitamento em dois anos de Euroliga é de apenas 33,8%. Não chega a ser péssimo, ainda mais que muitos chutes são contestados ou em situações de pressão, contra o cronômetro.

Mas é que esse jogador – que também consta da lista de estrangeiros com passaportes fantasiosos, tendo defendido a Geórgia no último Eurobasket, sem, contudo, se chamar Hickmanoshivili –. rende muito mais quando bate para a cesta, quebrando a primeira linha defensiva e bagunçando o sistema adversário.

A partir de suas infiltrações, ele chama a ajuda dos defensores e abre a quadra para os diversos chutadores que David Blatt gosta de escalar. É isso que o brilhante treinador espera de seu armador, especialmente quando Sofoklis Schortsanitis estiver respirando – ou transpirando – no banco de reservas. Agressividade e responsabilidade. Para quem já passou por tanta coisa na carreira, não há o menor problema.