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Caras da Copa América: Thompson e Nicholson, e as diferentes formas de se formar um garrafão canadense
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Giancarlo Giampietro

A NBA está escancarada para o talento de estrangeiros há tempos. Para alcançar a liga norte-americana, há diversas maneiras. Pergunte aos brasileiros. Temos um Nenê começando a encestar com uma tabela fincada na garupa de um jipe. Temos Leandrinho com treinamentos praticamente militares quando era um infante, um adolescente. Que tal Tiago Splitter saindo de casa aos 15 anos para morar no País Basco? E por aí vamos, com infinitas rotas até conhecer o eldorado.

Para os canadenses, as coisas têm sido um pouco mais fáceis – na verdade, estamos em um ponto que já o fluxo das revelações do país mais ao norte da América (descontado o Alaska) já nem pode ser considerado mais uma tendência, mas, sim, uma realidade irreversível. Agora, entre eles também há diferentes maneiras de se encaminhar uma carreira profissional.

É só comparar as diferentes trajetórias de Andrew Nicholson e Tristam Thompson, duas das principais apostas de uma promissora seleção, dos poucos jogadores da grande liga americana a se apresentar para a disputa da Copa América e que vão desafiar o combalido garrafão brasileiro neste domingo, terceiro dia de disputa do torneio continental.

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Tristan Thompson no ataque

Thompson, badalado desde adolescente, destinado a jogar na NBA

Tristan Thompson, segundo tudo indica, foi sempre um destaque atlético, desde os primeiros anos de estudante em Brampton, uma das cidades englobadas pela grande Toronto. Uma significativa influência de carga genética ajuda a contar esta história. Seu irmão mais jovem, Dishawn (demais, né?), é um ala-armador já cobiçado pelas grandes universidades americanas, com previsão para se formar no colegial no ano que vem. Um primo foi destaque na NCAA e na liga de futebol canadense, como tackle defensivo. Embora os pais, de origem jamaicana, não tenham feito dinheiro com o esporte, estiveram sempre envolvidos com esse tipo de prática – o pai jogava futebol, a mãe era uma corredora – até que a necessidade de fazer a vida os levou a deixar a ilha caribenha rumo a Toronto.

Enfim, Tristan nasceu na metrópole canadense, que, vejam só, acabou ficando pequena para seus planos. Com 16 anos, deixou seu país para jogar no circuito colegial dos Estados Unidos. A primeira parada foi na Saint Benedict’s Preparatory School, ao lado do armador Myck Kabongo. Sua cotação explodiu nessa escola, entrando em seu ano de junior (o penúltimo neste nível) como o jogador mais bem ranqueado em todo o país em sua classe. Foi disputado também por muitas das principais universidades, escolhendo jogar na de Texas.

A despeito do sucesso em quadra, deixou St Benedict’s devido aos constantes conflitos com o treinador Dan Hurley. Depois de um bate-boca durante uma partida, foi afastado do time e anunciou que sairia do programa de vez. Um mero acidente de percurso, e  não demorou, claro, para que seu telefone disparasse a tocar, até que mudou-se para a prep school de Findlay. Lá, faria dupla com o armador Cory Joseh,  hoje armador titular da seleção canadense e reserva de Tony Parker no Spurs e com quem fez parceria em Texas.

Na universidade que recentemente revelou Kevin Durant e LaMarcus Aldridge, embora não tenha propriamente arrebentado, ficou apenas um ano e só – o chamado “one and done”, cada vez mais frequente desde que a NBA aumentou suas restrições para a admissão de calouros.  Aos 20, realizou aquele que parecia seu destino, selecionado no Draft de 2011 na quarta colocação pelo Cleveland Cavaliers.

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Andrew Nicholson, a finta e o contato

Andrew Nicholson, um (nerd) físico a serviço do basquete canadense

Até os 16 anos, Andrew Nicholson gostava, mesmo, era de jogar beisebol, talvez escondido dos pais. Mas ele acabou crescendo demais, correndo o risco de ficar um pouco ridículo com a indumentária deste esporte. Começou, então, a praticar basquete para valer no colegial Father Michael Goetz, em Mississauga, também nos arredores de  Toronto.

Quer dizer: “para valer” é relativo. Não está muito claro se o esporte era realmente algo planejado como algo sério para o seu futuro. Pelo menos é o que diz o técnico Mark Schmidt, da universidade de St. Bonaventure, que recrutou o praticamente desconhecido pivô depois de vê-lo em ação após uma viagem de cerca de 260 km da cidade de Olean, no estado de Nova York, para vê-lo em ação em Mississauga.

“Eu sentei com ele e seus pais depois de seu ano de calouro (já na universidade) e disse que ele poderia jogar na NBA. Eles não tinham noção disso. Para eles, era apenas livros, livros e livros. Era o modo como os pais dele encaravam as coisas, e é isso que ele faz. A ideia de uma carreira de basquete realmente nunca ocorreu para nenhum deles, então tive de explicar que havia uma chance legítima para isso”, afirmou o treinador, quando seu pupilo se preparava para o terceiro ano de NCAA, com 20 anos. “Ele calçava mais de 50, tinha mãos enormes do tamanho de uma mesa e não tinha ideia disso.”

A essa altura, os gerentes gerais já ligavam direto para Schmidt, procurando informações sobre aquele emergente jogador, de quem poucos haviam tomado nota até então, algo raro considerando a vasta rede de informações que os clubes da liga conseguem reunir. Embora já pudesse tentar o Draft de 2011, Nicholson optou por cursar o ano de senior, de modo que poderia se completar seu curso de física. A preferência, na verdade, era fazer química, mas ele teve dificuldade para conciliar os horários de estudante-atleta com classes e aulas extra no laboratório. “Ainda assim, foi desafiador”, conta Nicholson. “Mas tive a capacidade para isso. Sou muito, muito, muito bom em dividir meu tempo. Controlo até os milisegundos.”

Opa, então tá. Temos aí um raro caso de jogador profissional que optou por levar os estudos até o fim, sem medo de afetar sua outra carreira (muito mais lucrativa). Em tempos em que vemos Fabrício Melo momentaneamente desempregado, é de se pensar…

Diplomado e ainda badalado pelos scouts, depois de fazer treinos privados por 12 times diferentes em 14 dias, ele foi escolhido pelo Orlando Magic no Draft de 2012, aos 22, na posição 19.

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Um ano e nove meses mais velho que Thompson, Nicholson é um jogador de movimentos refinados no ataque. Consegue girar bem para ambos os lados de costas para a cesta e também ataca muito bem quando de frente para o aro, com um bom chute de média para longa distância, num repertório que já despertou comparações com David West. Para ele chegar a esse nível, porém, falta algo fundamental: a coragem e disposição do sempre subestimado pivô do Indiana Pacers em aceitar o contato físico e brigar pela bola.

Thompson, por outro lado, é pura energia. Embora seu físico, de cara, não passe essa impressão – não estamos falando do jogador mais musculoso –, sua capacidade atlética é acima da média, tem boa envergadura e, com esse pacote todo, é um baita reboteiro. Tecnicamente, contudo, ainda está em progressão. Consegue a maior parte de seus pontos quando servido próximo da cesta ou em rebarbas ofensivas.

(Até por isso, aliás, decidiu revolucionar seu jogo durante as férias: arremessava com a mão esquerda até o final da temporada passada, e agora resolveu que a mão direita tem a melhor munheca. Para os que mal conseguem usar a perna esquerda (ou direita) para subir no busão, morram de inveja: o ambidestro TT é daqueles que assina cheque com a direita, escova os dentes com a esquerda e pode bater lances livres como bem entender. Considerando que 58,6% de suas primeiras  483 tentativas na liga, decidiu tentar com a outra.)

Isto é: numa ótima notícia para o técnico Jay Triano, aumentando e muito o poder de fogo e versatilidade de sua seleção, em quadra eles também não poderiam ser mais diferentes.

Caras da Copa América:


Caras da Copa América: Renaldo Balkman, o homem banido das Filipinas
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Giancarlo Giampietro

Balkman no rebote

O pogobol Balkman na disputa por rebote – enquanto não faz nenhuma besteira em quadra

LeBron James ministrou uma clínica de basquete em Manila para 15 mil pessoas. Clínica nada, claro. Era mais um evento de adulação ao superastro do Miami Heat, com direito a show pirotécnico. Kobe Bryant também se divertiu um bocado por lá, como vemos nessa galeria, depois de ter enfrentado uma tempestade durante seu voo. JaVale McGee? Quase se naturalizou filipino.

As Filipinas amam a NBA e o basquete. Eles estão abertos a tudo. Só não querem saber mais de ver Renaldo Balkman nem pintado de ouro

Em março deste ano, o ala-pivô da seleção de Porto Rico aprontou um fuzuê inacreditável durante sua breeeeve passagem jogando na liga local. Vestindo a camisa do Petron Blaze Boosters (!?), num confronto com o Alaska Aces (!?!?), o rapaz  perdeu por completo as estribeiras em quadra após discordar de uma decisão da arbitragem.

Num episódio que rodou o mundo, Balkman começa a berrar na direção de um dos juízes. Quando um dos assistentes de sua equipe tenta chegar no clima de “deixa-disso”, levou um “chega-pra-lá”. Depois foi a vez de encarar um companheiro de time, com aquela postura de “tira-a-mão-di-mim”. E segue com sua insanidade. Dedos em riste, cabeça tombada, gritos e gritos, enquanto os adversários estão cobrando lances livres. Até que sobrou para Arwind Santos, outro parceiro de time, que… Acaba estrangulado! E não para nisso. Se acha impossível, veja aqui:

O episódio naturalmente deixou muita gente perplexa, incluindo o comissário da liga, Chito Salud, que optou por banir o porto-riquenho do basquete filipino para toda a eternidade. Além disso, só para deixá-lo sem o dinheiro do busão, também aplicou uma multa de 250 mil pesos filipinos, que dava na época algo como US$ 6 mil.

Depois, arrependido que só, Balkman usou o Twitter para tentar se redimir. “Gostaria de pedir desculpas a Arwind Santos como pessoa, alguém que respeito verdadeiramente (a-hã) e alguém que não iria machucar intencionalmente. Minhas ações foram irresponsáveis (ah, vá)”, disse o cabeludo, que falou que foi levado pelas emoções de um jogo intenso e que curtiu sua estadia nas Filipinas. “Todo mundo faz uma vez na vida algo que não era para se fazer e me deu branco naquela hora.”

Foi bom enquanto durou – ele tinha médias de 25 pontos, 13,4 rebotes, 2,4 assistências e 2,7 tocos por jogo na temporada, enfrentando uma concorrência bem fraca. Chito Salud não se sensibilizou com a resposta, mantendo a decisão da liga. Até porque ele citou este episódio aqui para julgar o atleta como reincidente:

Aqui, vemos Balkman “encarando” o venezuelano Greivis Vasquez, durante a Copa América/Pré-Olímpico de 2011, em Mar del Plata. Ele não gostou de uma falta dura do hoje armador do Sacramento Kings. Acabou suspenso por um jogo, ao lado de Nestor Colmenares, que chega para o empurrão em defesa de seu companheiro.

Sabemos também que o ala-pivô também já teve problemas disciplinares com a seleção porto-riquenha, abandonando o time por considerar que não estava sendo aproveitado de modo adequado.

Mas, tudo bem. Paramos por aqui, porque a ideia nem é pintar Balkman assim como o maior bandido do planeta. Só é preciso tomar cuidado com ele em quadra. Porque isso faz parte de todo um pacote de um dos jogadores realmente mais intensos que você pode encarar em quadra.

Ele definitivamente não é dos mais talentosos. Mas foi abençoado com uma capacidade atlética incrível – acho que consegue dar uns quatro ou cinco pulos em sequência na busca de um rebote, sem peder um centímetro na impulsão de pogobol – e muita determinação, correndo sem parar pela quadra. Incomoda mesmo, com os brasileiros puderam atestar na disputa da Copa Tuto Marchand, em que ele se aproveitou da lentidão dos adversários para revier seus tempos de astro filipino, com 24 pontos, 15 rebotes e quatro roubos de bola.

Renaldo Balkman

Balkman matou o garrafão brasileiro no último amistoso

Só com muito esforço e garra, mesmo, para que pudesse encaminhar sua carreira adiante. Quando estava no colegial, Balkman mal podia sonhar com alguma bolsa de estudos até que foi descoberto pelo técnico da Universidade da Carolina do Sul, Dave Odom, durante uma partida de eu Laurinburg Institute, em Orlando. “Eu me lembro da primeira vez que o vi. Estava sentado neste ginásio, com (o assistente) Barry Sanderson, e perguntei: ‘Quem é aquele garoto com os dreadlocks? É deste cara que precisamos’. Barry foi atrás, voltou e ninguém sabia seu nome”, afirmou o técnico.

É isso. De um jeito ou de outro, o jogador sempre esteve correndo – e por fora. Até que, de última hora, aparece alguém para acreditar. Quando, no Draft de 2006, o New York Knicks o escolheu na posição número 20, poucos puderam acreditar. Poucos, menos Isiah Thomas, então o chefão da franquia nova-iorquina, um dos piores gestores que a NBA já viu, mas um sujeito de grande reputação na hora de identificar talentos. Seria esse mais um diamante bruto descoberto pelo ex-genial armador?

Hoje, sabemos que não foi o caso. Balkman até desfrutou de algum sucesso em sua primeira pela temporada como um Knick, mas em nenhum momento justificou uma escolha tão alta, ainda mais quando gente como Rajon Rondo e Kyle Lowry estava disponível. (Embora, um parêntese: Cedric Simmons Rodney Carney, Shawne Williams, Oleksiy Pecherov e Quincy Douby foram os cinco jogadores selecionados antes de Thomas tomar sua decisão… Então não é que Rondo ou Lowry fossem tão amados assim naquele Draft.)

Não demorou muito, então, para que o atleta fosse chutado para fora de Nova York, trocado por um saco de batatas do Denver Nuggets, durante o expurgo do legado de Thomas que Donnie Walsh promoveu, numa reconstrução de elenco que depois resultaria na contratação de Amar’e Stoudemire e Carmelo Anthony. Alías, bem lembrado: quando Melo conseguiu forçar a barra para deixar as Montanhas Rochosas rumo a Manhattan, ironicamente Balkman foi incluído no mesmo pacote, de volta ao Knicks. Neste retorno, porém, jogou muito pouco até ser dispensado em fevereiro de 2012.

Foi aí que Balkman caiu na vida de andarilho do basquete e chegou a Manila. Para lá, no entanto, ele nunca mais pode voltar.


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