Ritmo, energia, química, e a tempestade perfeita para a seleção
Giancarlo Giampietro
Sendo julho, período de férias da garotada, a queda de produção do blog tem um timing ligerimante suspeito. Mas ainda não existem pimpolhos circulando pela base do conglomerado 21, e o mês foi de muito trabalho, mesmo, com algo como 33 dias trabalhados de 35 possíveis, em ritmo intenso. Só para deixar claro o porquê do sumiço e de como foi bem-vinda a colaboração de Rafael Uehara, para ao menos publicar algo durante o mês.
Posto isso, não quer dizer que não tenha dado para assistir a um jogo ou outro de basquete nesse meio-tempo, para evitar aplacar a tremedeira nas mãos e evitar que chegasse a uma crise de convulsão.
As ligas de verão? Infelizmente só consegui ver a de Orlando, perdendo a apresentação dos brasileiros em Las Vegas. Mas isso o Rafael conseguiu remediar, com seus scouts atenciosos em relação a Bruno Caboclo e Lucas Bebê. Nesta terça-feira, vou publicar também as notas de um experiente olheiro da NBA, que estava presente no ginásio, às quais tive acesso.
Antes disso, todavia, melhor falar sobre o que pude assistir para valer, e com grande satisfação, que foi a seleção brasileira campeã pan-americana – e que acaba de vencer Uruguai e Argentina em amistosos em Brasília.
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Bom, entre o torneio valendo ouro e o amistoso, já são sete vitórias seguidas. O basquete apresentado no Nilson Nelson foi o mesmo de Toronto? Claro que não. Nem poderia ser, e isso tem mais a ver com o calendário um tanto espaçado e traiçoeiro do que com o nível dos adversários. A seleção teve de ser preparada para um pico de performance, tanto do ponto de vista técnica como do físico de 21 a 25 de julho. Agora, encaminha nova preparação para um torneio que vai começar mais de um mês depois, de maior duração (espera-se…), lembrando que estamos falando de meses nos quais, supostamente, esses caras deveriam estar parados.
Aliás 1: como chamar essa temporada de seleção tão longa? Pré-e-pós-temporada-tudo-ao-mesmo-tempo? Flamengo, Bauru, Murcia… É bom que os clubes estejam atentos desde já em relação ao estado dos atletas em sua apresentação. Por mais jovem que seja o grupo, tem de tomar cuidado.
Aliás 2: se o plano de Magnano é contar com a tropa de choque veterana da NBA nos Jogos do Rio 2016, tanto melhor que não a usasse agora, especialmente depois de uma campanha pela qual só Leandrinho passou incólume.
Aliás 3: a vaga olímpica ter sido garantida ao país-sede vale como um alívio ainda maior considerando os dois fatores acima. Mais a respeito será tratado durante a semana, mas dá para dizer aqui que, esportivamente, comemora-se. Pensando nas constantes vezes que a CBB flerta com o desastre e até mesmo faz da vergonha um eufemismo, não há nada o que festejar, pensando no futuro.
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Agora, voltando à quadra. Deu para se notar um certo zum-zum-zum sobre como este Pan não poderia valer tanto assim, já que todos os principais adversários estavam formados por times em versão beta. Inegável isso, mas a seleção brasileira também não era, até a hora que entrou em quadra, favorita a nada.
O time de Ruben Magnano simplesmente dominou rivais de nível técnico – ou bagagem internacional, no mínimo – equivalente. E dominou devido ao excelente padrão de jogo apresentado. Padrão de jogo que turbina o talento disponível, como em qualquer time campeão. Você não vai vencer só pela técnica ou pela tática. Vai vencer quando as duas andam em conjunto, quando um treinador faz uma boa lista e tira o melhor daquilo que tem em mãos. Não há outro ''se'', ao meu ver, para ser ponderado aqui. Acho que podíamos combinar uma coisa: falar que é a seleção jogando. Sem B, C ou D. É o time convocado, que se apresentou, treinou e ganhou.
Foi o que aconteceu em Toronto, e algo bem diferente do que vimos em Guadalajara 2011 ou na Copa América 2013, por razões diferentes. Para o México, Magnano admitiu que reuniu o time já no avião, indo à base de catadão, mesmo. Dois anos depois, na Venezuela, o treinador jurava que contaria com seus principais nomes (mesmo num torneio em que Luis Scola e Greivis Vásquez eram verdadeiras aberrações) e se atrapalhou todo na hora de fazer as emendas necessárias. Ficou com um arremedo de equipe, sem coesão alguma entre as peças, perdendo para Uruguai e Jamaica. O maior vexame sobre o qual se tem nota, na quadra.
Desta vez, com planejamento adequado, tudo mudou. O título pan-americano obviamente começou a partir da convocação, muito mais razoável. Magnano formou uma equipe balanceada. Tão importante também foi o respeito pelo que aconteceu durante a temporada – algo que, por uma razão difícil de compreender, nem sempre acontece. Os nomes podem não ter sido tão revolucionários assim, em termos de material novo, mas foram pinçados todos atletas que jogaram muita bola no Brasil ou na Europa. Benite e Olivinha terminaram o ano voando pelo Fla. Augusto foi um dos cinco melhores pivôs da Liga ACB, sob qualquer avaliação. Rafael Luz se despediu do Obradoiro aclamado pela torcida. João Paulo foi campeão francês. Ricardo Fischer e Rafael Hettsheimeir ganharam quase tudo por Bauru. Marcus já atormenta os atacantes do NBB há tempos. Etc. Etc. Etc. Isso serve para confirmar o talento brasileiro por vezes subestimado. Não precisa de um selo de NBA ou Euroliga para se corroborar a qualidade de um atleta e, principalmente, de uma equipe.
A partir daí, foi entender a melhor forma como encaixar essas peças. Não era tão difícil assim. O grupo tinha bons armadores com propensão ao passe. Rafael e Ricardo podem ser jovens, porém já têm boa cancha, se não em competições pela seleção, mas em jogos de grande relevância por seus clubes. Havia bons arremessadores, com Benite, Meindl, Hetthsheimeir. Pivôs flexíveis como Augusto e Olivinha, e de habilidades distintas que combinavam muito bem, como os bons corta-luzes e cortes para a cesta de Augusto, o jogo de costas para a cesta de JP e mais chute.
De nada adiantaria, porém, se não houvesse química entre esses atletas, e até nesse aspecto a lista é, vá lá, extremamente feliz. É só ver o Marcus vibrando (em vez de urrando de dor), estirado na quadra do Nilson Nelson, depois de cavar uma falta de ataque da Argentina. O ala, agora do Basquete Cearense, é uma das tantas personalidades agrupadas de astral e energia elevados.
Isso não é conversa fiada e facilita o entendimento em quadra. Algo que foi basicamente impecável durante o Pan. A agressividade na marcação exigida por Magnano ganhou também a cobertura de uma defesa interior muito sólida. A boa defesa leva ao contra-ataque, e a execução em transição está no DNA. Quando não houve oportunidade para a definição rápida, o time cumpriu, creio, o melhor ataque em meia quadra sob gestão do argentino, com espaçamento e ritmo.
Por falar em ritmo, retomamos a produção normal do blog nesta semana, acompanhando como a seleção, com essa tempestade perfeita que vimos em Toronto, vai se virar contra oponentes mais qualificados.