NBB7 tem Flamengo favorito ao tri, mas com nova ameaça
Giancarlo Giampietro
O NBB que começa nesta sexta-feira promete o melhor nível técnico do campeonato em sete edições. São ao todo dez atletas que disputaram a última Copa do Mundo, algumas importações de talento interessantes e jovens promissores – sim, eles ainda existem, mesmo que dependam da boa vontade de seus técnicos para jogarem. Fazer um bolão para adivinhar os quatro semifinalistas também será uma tarefa complicada, com muita gente se achando no direito de entrar nessa parada, o que é extremamente saudável. Resta saber o que todos os técnicos por trás dessas forças poderão aprontar, para fazer suas equipes se diferenciarem e subirem na tabela, tirando o máximo da técnica que tiveram à disposição.
De todo modo, em meio a essa crença de imprevisiblidade, uma tese é difícil de se evitar. Nem há muito como escondê-la: por tudo o que conquistou na última temporada – e no início desta –, o Flamengo é o grande favorito, principalmente depois que as negociações de Marquinhos com a NBA não foram adiante. Um jogador único dentro da liga nacional.
Se o time rubro-negro confirmar essa condição, chegará a um tricampeonato, repetindo o feito de seu rival Brasília, que ganhou três taças consecutivas entre 2010 e 2012. Se, para enfrentar adversários da liga norte-americana, em partidas de mais longas, o elenco de José Neto se mostrou reduzido, em cenário nacional, com os 40 minutos regulares da Fiba e uma concorrência mais justa, plantel não será um problema. Nem mesmo o tão sonhado pivô extra, que poderia ter sido JP Batista, parece necessário.
Dessa vez ele terá Vitor Benite desde o início da campanha – em vez de apenas na partida final –, ganhando mais poder de fogo. Mas o grande chamariz, mesmo, em termos de novidade fica por conta de Walter Herrmann, que, aos 35 anos, tem muito o que render em quadra:
Demais, né? É o tipo de lance que você não cansa de rever. De tão sofisticado que foi o movimento, a cada reprise pode-se reparar em um novo detalhe: nada como fazer da bola de basquete uma bolinha de tênis. Herrmann, Marquinhos e Olivinha formam um trio de atletas intercambiáveis, que podem exercer múltiplas funções, entregando um pacote de características diversas que facilitam muito qualquer riscado de prancheta. A linha de frente é complementada pelo excelente Jerome Meyinsse, que comprovou contra Maccabi e NBA que não é só forte e atlético para os padrões sul-americanos, e Cristiano Felício, que já provou merecer seus minutos em sua turnê pelos EUA.
Não fica só nisso. Nícolas Laprovíttola é o melhor armador em atividade no país hoje, com um arsenal de fintas para entrar no garrafão quando bem entender. O que facilita a conexão com Olivinha, Herrmann, Meyinsse e Felício e, ao mesmo tempo, abre espaço para os chutes de fora de seus companheiros. Se o argentino maneirar um pouco no ímpeto e desistir dessa ideia de chutes de três em movimento, a partir do drible, sua eficiência vai decolar, impulsionando toda a equipe. Sim, há sempre detalhes para corrigir e o que melhorar, mesmo para os campeões. Mesmo para um time com o luxo de contar com um Gegê em constante evolução, saindo do banco. Enfim, um esquadrão, que deve imprimir um estilo de jogo agressivo, de velocidade e combativa defesa.
Uma nova ameaça
O Fla tem três quatro (1, 2, 3, 4) jogadores que disputaram a última Copa do Mundo. O único clube que repete essa marca é justamente aquele que, em teoria, desponta como a maior ameaça ao seu reinado: o Bauru. Campeã nacional em 2002, com os veteranos Raul, Vanderlei e Josuel, um emergente Leandrinho e os adolescentes Marquinhos e Murilo, a cidade só se viu entre os quatro melhores do NBB na edição retrasada, quando terminou em terceiro lugar.
Para esta sétima edição, porém, a equipe do interior paulista foi a que mais se reforçou. Num projeto bastante ambicioso, a diretoria entregou a Guerrinha quatro grandes nomes: Alex, Rafael Hettsheimeir, Jefferson William e Robert Day, que se juntam a um núcleo já bastante forte. As contratações do veterano Alex, que aos 34 ainda tem um vigor físico assustador, e de Hettsheimeir são as que chamam mais a atenção, e não necessariamente pela grife de seleção brasileira. Tirar o ala-armador de Brasília foi uma surpresa, um negócio que causa impacto em duas equipes de ponta de uma vez. Já o pivô passou os últimos nove anos na Espanha, estava em clubes de ponta do campeonato nacional mais forte da Europa e que poucos imaginavam que poderia voltar aos 28. Pois ele queria faz tempo, como revelou ao VinteUm.
O Bauru tem todas as peças que precisa para montar um ataque poderosíssimo. São três pivôs versáteis com Murilo, Hettsheimeir e Jefferson. Larry Taylor e Ricardo Fischer dividem a armação. Guilherme Deodato, o americano Day e Alex rodam nas alas. Esperem trovejadas de três pontos aqui. Constam também os caçulas Wesley Sena (se conseguir bater Thiago Mathias, já será ótimo sinal), Carioca (um tanque em direção ao aro), Vezaro e Gabriel para completar a rotação. As interrogações ficam por conta do joelho de Murilo, que vem dando trabalho, e da consistência defensiva de um time que é baixo no perímetro e vai depender de muita pressão em cima da bola para se proteger – algo que Alex, Larry, Fischer e Gui podem muito bem fazer.
É um plantel mais volumoso e com mais apelo que o do velho candidato Brasília, que tem José Vidal novamente na beirada da quadra. Giovannoni é um sério candidato ao prêmio de MVP do ano, agora com ainda mais responsabilidades ofensivas, enquanto Arthur vai correr ao redor das defesas, se desmarcar e converter seus chutes. Fúlvio é o tipo de armador que vai satisfazê-los em sua sede de pontos. Para a equipe candanga voltar ao top 4, porém, dois pontos são importantes: que o americano Darington Hobson se encaixe e se adapte – já ouvi por aí que ele tem um senso de grandeza um pouco desproporcional ao que produz… – e que Ronald e Isaac esteja prontos para carregar uma carga maior. A defesa vai depender muito dos três.
Mais que o CV
Esses são evidentemente os times mais estrelados da competição. Considerando a divisão de títulos bipolar dos seis primeiros campeonatos, sabemos que isso tende a fazer diferença por estas bandas. Por outro lado, a lista de vice-campeões nos permite pensar, sim, em mais candidatos, ou surpresas. Não é que Flamengo e Brasília tenham chegado a todas as decisões. Nos últimos quatro anos, a equipe derrotada foi diferente.
O Paulistano, segundo colocado do ano passado, fez por merecer o respeito de todos e também mantém seu núcleo, com um elenco bastante homogêneo em que os americanos Kenny Dawkins e Desmond Holloway carregam a pontuação e uma série de companheiros os ajudam com defesa, movimentação de bola e espaçamento. Para este ano, chegaram o experiente Fernando Penna (um jogador de que gosto, mas que não sei bem o quanto era necessário num elenco que já tinha o jovem Arthur Pecos para ajudar Dawkins e Manteiguinha) e o americano DeVon Hardin, um gigante extremamente atlético que chega para substituir um Rafael Mineiro, que foi para o São José. O pivô havia feito ótimo campeonato na temporada passada patrulhando o garrafão, ocupando espaços na defesa. Para isso, Hardin, que já foi selecionado no Draft da NBA de 2008, vai ter de mostrar que é muito mais que um campeão de enterradas. E, sim, Fabrício Melo poderia estar aqui, mas acabou dispensado por questões extraquadra. Gustavo de Conti vai tentar fazer dessa turma uma nova encrenca para os adversários.
E, se for para falar em surpresa, não há como ignorar o que o Mogi das Cruzes também balançou o NBB6. Honestamente, talvez nem mesmo o técnico Paco Garcia esperasse que sua equipe poderia alcançar a semifinal e endurecer contra o Flamengo numa série melhor-de-cinco. O problema do sucesso é o desmonte. Quatro de seus atletas migraram para o próximo clube dessa lista. Em contrapartida, chegaram caras de ponta como Shamell e Paulão, além do ala Tyrone Curnell, referência do Palmeiras no campeonato passado, do armador Elinho e do jovem pivô Gerson Espírito Santo, formado em Colorado State. O Mogi pode manter a pegada de um garrafão pesado, massacrante que o levou longe, mas também conta hoje com mais alternativas para acelerar o jogo. Tantas trocas, porém, pedem tempo para o acerto. O que não deve mudar é o apoio de sua torcida. Lá o mando de quadra faz realmente diferença.
Também semifinalista, mesmo numa temporada conturbada em que contou com três técnicos, o São José é outro que tem algumas caras novas para entrosar. E pior: algumas delas chegando de última hora, perdendo a fase de preparação, a ponto de faltar contingente para o técnico Zanon – recém-egresso do Mundial feminino, diga-se – realizar coletivos. Além disso, Caio Torres vem sofrendo com uma tendinite no joelhor direito. A contratação de Mineiro ganha relevância por isso. Valtinho é quem assume a direção agora – Manny Quezada, o homem dos 50 pontos, foi embora. Nas alas, Betinho vai ter a companhia de dois americanos: Andre Laws, que está de volta (e nem dá para entender por que havia sido liberado), e Jimmy Baxter, mais um que vem da Argentina.
Agora vai?
O continente paulista, aliás, talvez chegue com sua maior força ao campeonato nacional, desde que ele passou a ser organizado pela LNB. O estado, maior polo produtor do país, ainda não conquistou o título do NBB, tendo de se contentar com três vice-campeonatos, quatro terceiros lugares e três quatro lugares. Tem mais gente querendo entrar nessa briga.
O Pinheiros estoca as revelações mais tentadoras do basquete brasileiro, com o novato Georginho chegando para a festa, mas tem na contratação do técnico Marcel de Souza seu ponto mais intrigante, que promete algo de diferente no plano tático, encerrando seu exílio. A receita na montagem do elenco é semelhante à de seu rival da capital: nomes não muito badalados, mas com bons jogadores em quantidade (são quatro armadores que pedem tempo de quadra, por exemplo: os irmãos Smith, Paulinho e Jéfferson Campos, sem contar Humberto). Subestimem o quanto quiserem um trator como Marcus Vinícius Toledo, que isso não costuma sair bem. Os resultados recentes do time, campeão da Liga das Américas 2013, também o credenciam.
De volta ao interior, armadores também não faltam a Limeira, agora com Nezinho ao lado de Ronald Ramon e Deryk. A presença de um cestinha como David Jackson e de Rafael Mineiro, Teichmann e Fiorotto também encoraja muito. E quanto a Franca? O time da capital basqueteira dosa, entre seus protagonistas, a cancha de Helinho, que está de volta para trabalhar, veja só, com Lula Ferreira, e dos argentinos Juan Figueroa e estreante Marcos Mata (candidato a MVP?) dois alguns prospectos para a seleção brasileira como Leo Meindl e Lucas Mariano – mas talvez que talvez só sejam aproveitados com maior frequência no outro ciclo olímpico, a julgar pelo progresso deles e o conservadorismo de Rubén Magnano. A rotação, porém, é enxuta.
São todos ótimos times, com muito potencial para ser explorado por seus treinadores. Depois do que Paulistano, São José e Mogi fizeram no NBB6, cada um ao seu modo, com trilhas diferentes, está claro que o equilíbrio da competição permite diversos desdobramentos. O maior orçamento, os nomes mais consagrados… Essas coisas talvez não importem mais. Vai pesar o melhor trabalho de quadra, mesmo.
No Rio, pensando nisso, o Flamengo tem algo que costuma fazer a diferença no basquete: química e continuidade, como o Spurs demonstra na NBA. No caso do gigante carioca, a diferença é que, em seu elenco, estão muitos dos melhores jogadores da liga também. Uma combinação dura de derrubar.