Para entrar no radar, Wesley Sena é único brasileiro inscrito no #NBADraft
Giancarlo Giampietro
Saiu nesta terça-feira a lista dos candidatos ao Draft da NBA, e dessa vez com um único brasileiro, o pivô Wesley Sena, cujo R.G. mostra: “Wesley Alexandre Sena da Silva”. Há duas semanas, como registramos aqui, Wesley Mogi, ou “Wesley Alves da Silva”, passou pelo Nike Hoop Summit, em Portland, se apresentando para mais de 100 scouts da NBA.
Então você pode imaginar a confusão que eles fizeram ao conferir a lista do Draft, especialmente para aqueles que, até hoje, escrevem Lucas ‘Noguiera’. : ) Fica mais difícil, mesmo, até porque os xarás também nasceram no mesmo ano, 1996 Então tem de se explicar que são dois jogadores diferentes, e tal. E até por isso, por mais que seu tempo de quadra tenha minguado nesta reta final de temporada, faz sentido que Wesley, o Sena, tenha inscrito seu nome, para ganhar cartaz e gerar sua própria identidade como prospecto internacional. Talento ele tem. Falta, por vezes, um empurrão.
Com 2,11m de altura (talvez até mais já) e mobilidade, o pivô de 19 anos tem recursos técnicos para ir longe. De cara, o que chama a atenção é a habilidade para o chute de média para longa distância, apresentando aqui e ali num sistema ofensivo abarrotado de cestinhas consagrados em solo brasileiro. Murilo Becker, seu companheiro diário de treinos, discorre sorrindo pela facilidade que o a jovem revelação tem para finalizar com as duas mãos no corte, a facilidade para o chute e como pode se transformar num pivô flexível de primeira linha.
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Encontrar espaço e chances neste tipo de elenco, todavia, é uma missão ingrata, e Wesley sabe disso. “Jogo no poste baixo, arremesso de média distância, de fora. Sempre tive, mas nunca fui um chutador. É um recurso que tenho, para desenvolver, que ninguém fique pagando para ver sempre. Vejo que, para completar o time, tenho de ter um jogo diferente do Hettsheimeir e do Jefferson, que são grandes arremessadores. Tenho de mostrar meu arremesso, mas tenho de ser mais agressivo no garrafão.”
Ao falar em “agressividade”, o pivô vai deixar seus técnicos e companheiros de clube felizes. Entre as diversas atividades de que participa durante os treinos em Bauru, nos treinos específicos e nos coletivos com os veteranos, esta mensagem vem sendo martelada em sua cabeça. É assim, mesmo, que você vai tratar um atleta de tanto potencial. Pois não é só arremesso. Ele tem boa mobilidade para alguém de seu tamanho e pode ser desses jogadores que jogam dentro e fora, dependendo de quem for seu parceiro na linha de frente ou de quem estiver do outro lado. “O Wesley ainda não entrega 50% do que pode fazer. É um pouco tímido ainda, pode ter mais intensidade. Mas é um cara que tem condições de ir muito longe em sua carreira”, disse o ex-pivô Josuel, que adotou a molecada espichada do clube em sessões específicas.
O tempo de quadra de Sena mais do que duplicou neste NBB, passando de 5,9 minutos em 2014-15 para 14,2, como complemento numa rotação que tem Rafael Hettsheimeir, da seleção brasileira, Murilo Becker, também de extenso currículo pela seleção, um dos maiores pontuadores da história do campeonato, e Jefferson William, também convocado recente para disputar o Sul-Americano, campeão pelo Flamengo e que tem média de 13,4 pontos em sua carreira pela liga nacional. Essa é uma boa estrutura para que o jovem pivô seja lançado. Aos poucos, mesmo.
Há garotos e garotos, prospectos e prospectos, certo? Um jogador como Lucas Dias pareceu desenvolvido desde muito cedo e já pedia mais minutos há pelo menos uma temporada, até ser premiado na atual campanha surpreendente do Pinheiros. Mas há jogadores que pedem um pouco mais de tempo para desenvolvimento. Isso não tem a ver necessariamente só com talento, mas também com sua trajetória, personalidade e clube que defende, entre tantos.
Por exemplo: Wesley, tal como seu xará Mogi, foi descoberto meio que por acaso, mas um pouco mais cedo. Se Mogi só foi apresentado ao basquete aos 16 anos, numa escolinha pública em sua cidade natal (Guaçu, no caso), Sena foi descoberto entre os 12 e 13 anos — ele não lembra direito — durante uma competição de saltos em sua escola, em Campinas. “Eu não sabia jogar basquete, nem sabia o que era. Mas já era bem alto já, tinha 1,96m (risos)”, disse. “Aí me chamaram para fazer um teste no clube da Hípica, pois estavam formando um time.”
É por isso que se bate tanto na tecla da “massificação”, por parte de governo ou CBB. O basquete brasileiro precisa encontrar um jeito de detectar talentos como esse mais cedo, para que eles sejam envolvidos mais cedo em um ambiente próspero para o desenvolvimento, mais estruturado. Em 2012, Wesley chegou ao Palmeiras. Dois anos depois, assinou com o Bauru. No meio do caminho, ao lado do irmão mais novo, Yuri, chegou a passar por um período de testes em Vitoria-Gasteiz, terra do tradicionalíssimo Baskonia, o clube espanhol que convenceu a família Splitter a liberar um adolescente Tiago, em 2000. “Ficamos umas duas semanas treinando, conhecendo, mas o Bauru me chamou. Vim para cá para treinar antes de ir para a Espanha, mas fizeram uma proposta boa, falando que iam montar um time bom, interessante. Optei por ficar aqui, perto da família. Na Espanha, demonstraram interesse, fizeram proposta, mas preferi ficar.”
Pelo clube do interior paulista, que se tornou gradativamente um papa-títulos na América do Sul, o pivô foi desenvolvido durante toda a sua primeira temporada, mais como uma peça de LDB (com 30,2 minutos, 12,2 pontos, 7,0 rebotes, 1,3 assistência e 1,1 roubo de bola) do que do time principal. Para o início da atual temporada, porém, o cenário mudou. Primeiro por causa de seu progresso, mas também pelas circunstâncias bauruenses, com diversos atletas se apresentando à seleção, outros voltando de lesão e alguns mudando de clube.
Com o Campeonato Paulista começando muito cedo, veio a grande chance para os atletas mais jovens do clube, até por conta de uma Copa Intercontinental que se aproximava também. A equipe sofreu para se classificar para as quartas de final e acabou derrotada pelo Mogi das Cruzes em dois jogos. Mas ao menos Wesley pôde ir para a quadra e respondeu bem, com 11,4 pontos e 5,9 rebotes, em 12 partidas, com 54,6% nos arremessos e 60,4% nos lances livres. Se você excluir os duelos com Mogi, já com a cavalaria de volta, foram 13,1 pontos e 6,8 rebotes. Não são números que quebram a bolsa, mas são significativos para alguém tão jovem no basquete brasileiro, numa competição que ainda estava relativamente em clima de pré-temporada, mas com diversos clubes da elite nacional, claro. Isso para um jogador ainda em formação.
“Já era combinado, que eu teria mais tempo para ficar em quadra e que precisariam de mim no Paulista. Era para eu ajudar os veteranos que ficaram, como o Paulinho e o (Robert) Day. Acho que me surpreendi um pouco com meus números. Comecei bem discreto o Paulista, e aí cobraram mais de mim. Depois, foi acontecendo”, afirmou. “Foi uma experiência que me ajuda muito, de poder tanto jogar na minha categoria abaixo como com os adultos. Já treino com caras de alto nível. Mas no jogo sempre se exige mais. “Fiquei muito contente com meu desempenho dentro de quadra, mas não dá para se contentar. Tem de querer mais e tem muito o que melhorar ainda, diariamente é que você vê suas dificuldades. Tenho de ter mais agressividade no jogo, brigar por todo rebote, sempre estar correndo, fazer as ajudas na defesa com mais velocidade.”
Estão aí, de novo: agressividade e cobranças, como Wesley, mesmo, admite ser preciso. “Ele é um jogador de quem a gente exige 200%”, afirma André Germano, que coordena a base bauruense, trabalha com Demétrius e Hudson Previdelo no time de cima e também responde pelas seleções menores na CBB. “Falamos o tempo todo sobre os acertos e erros dele, de como ele pode expandir seu jogo. É só acreditar no que ele pode fazer.”
Se, no decorrer da temporada, Wesley perdeu muitos de seus minutos, especialmente com o retorno de Murilo à boa forma, não quer dizer que ele tenha sido esquecido por seus treinadores. Especialmente pelo primeiro semestre, quando o calendário se afrouxou um pouco antes da Liga das Américas, Germano o colocou em um programa de treinamento dedicado, que em geral começava às 8h, com academia, e terminaria entre 11h30, 12h, com o treino dos adultos. No meio do caminho, fazia sessões específicas.
Ainda estamos falando de um projeto, de um jogador que ainda pode ser desatento na defesa, na disputa por rebotes, em um time que entra em todas as competições para tentar ser campeão. A previsão de Germano, por exemplo, é de que ele possa alcançar a maturidade como jogador aos 23, 24 anos, ganhando em fundamentos e entendimento do jogo, além do crescimento fora de quadra, mesmo. No trabalho com bola, a ordem é não limitá-lo ao garrafão, mesmo que, a princípio seja a tarefa que o time principal espera dele. Nenhum jogador deve ser enquadrado a nada, ainda mais nesta idade. Basta ver o que Cristiano Felício fez em Chicago quando teve chances, comparando com o modo como era utilizado no Flamengo. O brasileiro está hoje com 23 anos, justamente na faixa de idade que Germano aponta, por sinal.
É natural que Wesley sonhe com a NBA. Jogando por Bauru, aliás, ele teve sua primeira chance de conviver com a elite da modalidade, ao viajar para os dois amistosos históricos contra New York Knicks e Washington Wizards, em outubro, pelo calendário de pré-temporada da liga americana. Contra o time de Nenê, recebeu do então técnico Guerrinha 28 minutos para correr pela quadra. Terminou com 11 pontos, 5 rebotes e 2 assistências, matando 5 em 8 arremessos, com direito até a uma bola de três, na linha estendida. Nervoso, porém, errou seus quatro arremessos — a adrenalina sobe quando você para para pensar, né? “Não esperava jogar tanto, achei que ia entrar, mas não por tanto tempo. Entrei bem ansioso, mas acho que deu para produzir bem. Deu para ter uma noção do que é um jogo de NBA, bem diferente, bem físico. O Nenê ficou me dando dicas. Falou que era para continuar assim, que estou jogando bem. Foi uma grande sensação”, afirmou.
Mas tudo tem seu tempo. Ainda há uma longa estrada à frente para Wesley Alexandre Sena da Silva. Ou Wesley Sena, mesmo.
* * *
Por falar em Felício… Uma lembrança importante: talvez o pivô do Bulls seja o melhor exemplo para qualquer prospecto brasileiro, em vez de Bruno Caboclo, que foi uma clara exceção em todo esse processo. O Toronto se encantou por seu talento, assegurou uma promessa é, depois que o burburinho em torno do garoto fugiu do controle, gastaram logo uma escolha de primeira rodada nele, para surpresa geral. Isso nunca havia acontecido antes de, pelo menos não exatamente com um roteiro destes.
Já Felício passou batido em seu último Draft, o mesmo de Caboclo, em 2014. Mesmo depois de ter se apresentando bem no adidas EuroCamp em Treviso. Tudo bem. Voltou ao Rio de Janeiro e seguiu trabalhando. Até que o Bulls lhe abriu as portas para um teste. Contrariando todas as perspectivas, devido à conjuntura específica do elenco de Chicago, cheio de pivôs altamente qualificados. Como ele conseguiu? Não só com talento natural, mas com muito empenho. Ser ignorado por um sistema que só abre 60 vagas anuais é o mais provável, na verdade. Mas não é o fim da linha.
Esse tipo de roteiro deve estar na cabeça se cada garoto com aspirações de NBA, como o trio do Pinheiros (e mesmo um pivô bem jovem que logo mais vai estar em pauta, Lucas Cauê), Mogi e outros.
Dessa vez eles decidiram ficar fora do Draft. A movimentação, declarada, de scouts pelo país não foi das mais agitadas. Spurs e Sixers estiveram por aqui, do que sei. Bem menos do que no ano passado, quando Georginho foi um chamariz, depois de perfil publicado pelo DraftExpress. Que eles não tenham vindo não significa que não haja interesse. Pelo menos mais quatro clubes estiveram de olho no progresso da turma. A parceria da LNB com o sistema Synergy contribui muito para isso.
Três scouts manifestaram surpresa pela decisão de Lucas ficar fora, positivamente impressionados peço NBB que fez, passando de promessa a realidade, com números dignos de um All-Star nacional já. O progresso de Humberto também foi registrado. Mas seus clubes também não foram agressivos o suficiente também em suas sondagens. Para gente tão jovem, porém, não há pressa.
Lucas e Humberto vão completar 22 anos em 2017. Então vão ser candidatos automáticos ao Draft. Com mais um ano de cancha, desde que com tempo de quadra e oportunidade para produzirem, mantendo essa curva de ascensão, terão candidaturas ainda mais fortes, sólidas. Entre os olheiros, há aqueles que topam o risco máximo, como aconteceu com Caboclo, que tinha as ferramentas físicas, atléticas dos sonhos. Mas há muitos que preferem apostas mais factíveis, levando em conta aquilo que os atletas já produzem em suas ligas locais. Faz mais sentido, aliás. No caso de Mogi, George e Sena, de 1996, eles tem ainda mais dois anos.
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