Vinte Um

Há muito basquete além da NBA: a Euroliga começa a pegar fogo

Giancarlo Giampietro

Sonny Weems, da NBA para o CSKA

O superatlético Sonny Weems substitui Andrei Kirilenko em Moscou

Por Rafael Uehara*

(Nota/Ótima notícia no Vinte Um: convidado do blog durante o mês de dezembro, o Rafael veio para ficar. Semanalmente, ele vai publicar um artigo por aqui. Aproveitem!)

O mundo não acabou, mas 2012 sim, e, com a virada do calendário, as principais ligas do mundo começam a pegar fogo nessa arrancada em direção ao fim da temporada. No caso da Euroliga, principal competição de clubes do continente Europeu, isso é sinalizado pelo TOP 16, que teve sua segunda rodada disputada na semana passada. Com a mudança de formato a partir dessa temporada, a segunda fase da Euroliga terá 14 rodadas para definição dos oito classificados para as quartas de final, ao invés de apenas seis em anos anteriores. Há ainda muito chão pela frente, mas já é possível se ter uma ideia de quais times são concorrentes legítimos ao título e quais precisam de mudanças drásticas para voltar à briga.

O Barcelona de Marcelinho Huertas foi à Rússia na semana que passou e perdeu apenas pela segunda vez na competição, 65-78 para o BC Khimki, mas não há dúvida de que a máquina catalã é a força mais respeitável do basquete europeu no momento. Mesmo com um elenco composto de menos jogadores de pedigree defensivo como no ano passado, liderado pelo técnico Xavi Pascual, o Barcelona está a caminho de igualar marcas históricas registradas em 2011-2012. De acordo com o site gigabasket.org, o Barcelona tem permitido apenas 88,8 pontos a cada 100 posses do adversário, marca muito similar ao 87,3 da temporada passada, o que é fantástico especialmente considerando que o time substituiu Boniface N’Dong, Fran Vázquez e Kosta Perovic por Ante Tomic e Nathan Jawai no pivô.

Juan Carlos Navarro, La Bomba

Um Barça menos dependente de Navarro no ataque para tentar o título

Tomic e Jawai foram incorporados ao time em uma tentativa de adicionar maior criatividade ao ataque, que sofreu demais contra o Olympiacos no Final Four do ano passado. Pascual fez as mudanças necessárias, incluindo maior envolvimento de Huertas, e o resultado tem sido um time muito menos dependente de Juan Carlos Navarro e Erazem Lorbek e que tem marcado em média três pontos por cada 100 posses a mais do que na temporada anterior. Graças à boa química entre Huertas, Jawai e Tomic no pick-and-roll, o Barcelona lidera a Euroliga em pontos no garrafão. Com esse ataque renovado e uma defesa histórica, o time catalão é, em minha opinião, o principal favorito ao titulo.

Talvez os rivais de Madri estejam no mesmo nível. O Real Madrid de Pablo Laso também está tendo um ano fantástico. Entre supercopa da Espanha, campeonato espanhol e Euroliga, os merengues perderam apenas quatro jogos até o momento, sendo um deles para o Barcelona semana passada. Com uma filosofia oposta aos inimigos catalães, o Real tem se estabelecido como o ataque mais feroz do continente. No momento, é apenas o terceiro classificado em pontos por posse (marcando em média 109,7 a cada 100), mas isso é porque o Montepaschi Siena e o Zalgiris Kaunas estão fazendo campanhas históricas em termos de eficiência. Com a adição de Rudy Fernandez (um talento fora de série no continente) e o desenvolvimento de Nikola Mirotic (a caminho de se tornar o melhor ala-pivô na Europa), o Real não tem como ser parado, apenas contido. Mas esse já era mais ou menos o caso na temporada passada. O que faz do time merengue um concorrente legítimo ao titulo este ano é a melhoria em prevenção, setor no qual o time subiu de 13º para terceiro em pontos permitidos por posse.

É o que diferencia o Real Madrid do Montepaschi Siena, por exemplo. O Siena tem o melhor ataque do continente, marcando em média 115 pontos a cada 100 posses de bola. Bobby Brown tem sido fantástico e lidera a competição com 252 pontos em 12 jogos após uma exibição magnífica de 41 pontos em apenas 18 tiros de quadra contra o Fenerbahçe, em Istambul semana passada. O Siena tem superado as expectativas pra esse ano. Devido a problemas financeiros do patrocinador, Banco di Monte Paschi, o time teve que se despedir de medalhões como Simone Pianigiani, Bo McCallebb, Rimantas Kaukenas, David Andersen, Nikos Zisis e Ksystof Lavrinovic e remontar um elenco com soluções mais baratas do que a torcida estava acostumada. O Siena começou o TOP 16 com duas vitórias, sobre Maccabi e Fenerbahçe, mas ainda é difícil vê-lo como concorrente ao título. Com a terceira pior defesa da competição, e a expectativa é que em algum momento sua falha retaguarda pesará.

Kaukenas fazendo das suas

Kaukenas encontra espaço para a bandeja pelo ataque sensacional do Zalgiris

Já o Zalgiris Kaunas de Joan Plaza não pode ser visto da mesma forma. Havia muitas dúvidas com relação à idade avançada do elenco e como esse time defenderia, mas o atual campeão lituano é o sexto colocado em pontos permitidos por posse, mesmo que apenas Tremmell Darden e Ibby Jabber sejam atletas de porte físico invejável. Essa aplicação no setor defensivo, mesmo que não seja de elite, tem sido o suficiente para dar suporte ao segundo melhor ataque do continente. É uma dinâmica curiosa e fenomenal: o Zalgiris marca a segunda maior taxa de pontos por posse e, ao mesmo tempo, tem a menor taxa de posses por jogo. Isto é, faz o máximo com menos. Plaza formatou uma maneira de jogar que minimiza os fatores idade e a falta de porte físico do time. Será interessante ver se o clube lituano conseguirá impor seu ritmo de jogo contra Real Madrid e CSKA Moscow, dois dos times mais atléticos do continente e dos poucos com atletas ao nível de NBA. Mas o que eles já têm feito até agora é suficiente para se estabelecer como força a ser respeitada.

Falando em CSKA Moscou, o time de Ettore Messina (que voltou pra casa após três anos divididos entre o Real Madrid e o Los Angeles Lakers) vem, quietinho em seu canto, fazendo a melhor campanha da liga até o momento. O CSKA tem sido muito menos dominante do que aquele time liderado pelo fantástico Andrei Kirilenko ano passado, mas venceu 11 de seus 12 jogos até o momento e é o quinto colocado em ataque e segundo em defesa. Talvez sejamos nós que tenhamos prestado menos atenção. Sonny Weems também é talento de NBA, mas empolga menos do que o sempre enérgico e impactante Kirilenko. A combinação de Weems e Dionte Christmas nas alas é o que diferencia o CSKA dos demais times do continente. Poucos têm a capacidade atlética da dupla. O sistema ofensivo ao redor de Nenad Krstic mudou, mas o pivô sérvio tem mantido sua excelência. Tem saído do banco apenas porque seu companheiro de posição Sasha Kaun está totalmente recuperado de uma lesão séria no joelho sofrida 18 meses atrás e Messina agora apresenta uma sutil uma queda por atletas de primeiro nível, depois de sua experiência nos Estados Unidos.

Em Israel, o Maccabi Tel Aviv de David Blatt começou o TOP 16 com duas derrotas para o Siena e o Caja Laboral, a última por um ponto em casa na semana passada. Vindo pra temporada, a dúvida era como esse time iria marcar pontos após as saídas de Keith Langford e Richard Hendrix. Mas, com um ataque certeiro em tiros de meia distancia e uma defesa que tem permitido o menor número de pontos no garrafão, a potência israelense está a caminho de fazer o papel que fez ano passado; timinho difícil de bater nas quartas de final. Mais que isso será uma surpresa considerando as limitações do elenco, mesmo que se há alguém capaz de tirar um final four desse time, esse alguém é David Blatt.

E por último, mas não menos importante, o atual campeão Olympiacos. A temporada começou meio estranha para os vermelhos de Piraeus, com duas derrotas nos primeiros três jogos e a saída do pivô Joey Dorsey do time após desavenças com o novo técnico Georgios Bartzokas, que substitui o legendário Dusan Ivkovic, aposentado. Mas as coisas se acertaram a partir dali. O Olympiacos ganhou sete jogos seguidos na Euroliga para terminar a primeira fase com vitórias em 10 jogos. Além disso, bateu o rival Panathinaikos no campeonato grego. A defesa se endireitou e o importantíssimo Kostas Papanikolaou se apresentou melhor depois de um primeiro mês muito tímido. O TOP 16 começou com derrota em Vitória para o Caja Laboral, rejuvenescido depois da demissão Dusko Ivanovic, mas os vermelhos se recuperaram com vitória sobre o Besiktas em casa. É difícil saber, porém, o quanto Dorsey fará falta nas fases finais. Ele foi peça fundamental na corrida ao título ano passado e seu substituto Josh Powell é um jogador de características totalmente diferente.

*Editor do blog “The Basketball Post” e convidado do Vinte Um. Você pode encontrá-lo no Twitter aqui: @rafael_uehara.