Vinte Um

Bauru chega a NYC, e o Paulista fica para trás após inacreditável pendenga

Giancarlo Giampietro

Bauru, NBA, New York, 2015

É com um certo atraso que sai o texto, mas há coisas que não dá para deixar.

Exatamente há uma semana, o basqueteiro bauruense e o brasileiro em geral deveria estar se sentindo bem, especialmente aqueles que puderam ir ao Ginásio do Ibirapuera durante o final de semana para ver os duelos da Copa Intercontinental com o Real Madrid. O público, na média, foi excelente – assim com o clima, com figuras importantes do passado desfilando por todos os lados e sendo reconhecida.  Mas não era 'só' a galerinha do basquete, o segmento. A festa se expandiu para acolher algumas fileiras de torcedores do próprio Real e mais. A equipe do interior paulista perdeu, como se esperava, mas fez uma série dura, com direito a vitória no primeiro jogo. Tudo muito bem, obrigado.

Mas aí você vira a página do calendário, e o basquete nacional faz questão de te lembrar do quanto ainda precisa avançar. A referência, claro, fica por conta do impasse entre Bauru e a federação do estado. Um impasse que resultou na rasgação de mais um regulamento de competição para eliminar o atual bicampeão paulista não exatamente pelo que se passou em quadra, mas, antes, pela impossibilidade de mandar seus jogadores para ela.

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Para o leitor de NBA que talvez não tenha acompanhado a novela em detalhes, segue um resumo em 10 passos:

1) Bauru e Mogi das Cruzes estavam disputando as quartas de final do campeonato;
2) os dois primeiros jogos foram realizados na segunda e na terça-feira (21 e 22) que antecederam a Copa Intercontinental, com o time de Mogi vencendo ambas em casa;
3) Bauru tinha viagem marcada para os Estados Unidos para o sábado seguinte, dia 3, restando o meio da semana para a conclusão do confronto;
4) o problema é que o Mogi estava escalado para disputar a Liga Sul-Americana de terça a quinta-feira;
5) logo, Bauru pediu para que jogassem depois que voltassem dos EUA, no dia 15 de outubro;
6) seria uma loooonga espera, mesmo, e, além do mais, a federação alega que já tinha o dia 17 reservado com a Rede TV! como data para um dos jogos da finais;
7) mas então por que não fazer os jogos antes? Foi o que Bauru inicialmente pediu, para que fizessem as duas primeiras partidas antes e pudessem, talvez, fechar o confronto antes mesmo da disputa mundial. Não dava, segundo Mogi, pelo fato de terem de ajustar sua quadra para os padrões exigidos pela Fiba;
8) os jogos foram marcados, então, para 2 e, se necessário, 3 de outubro, data da viagem bauruense;
9) o clube do interior afirmou que não jogaria assim;
10) por fim, o que aconteceu? Para evitar que Mogi tivesse o trabalho de viajar para Bauru só para se configurar o W.O., a FPB se antecipou e terminou por avançar a equipe automaticamente para confronto semifinal com o Paulistano.

Enfim, o caos, como gritaria o Rômulo Mendonça.

Antes de mais nada, é preciso dizer que os clubes daqui já flertaram com esse tipo de episódio em diversas ocasiões nos últimos anos. Mas muitas vezes, mesmo, e só escaparam, porque sempre tinha o tal do jeitinho para encontrar novas saídas. Acontece que, dessa vez, havia coisa muito séria envolvida. A NBA estava de um lado do espectro. Do outro, um acordo (raro e precioso) com a TV aberta. Difícil que um ou outro lado fosse ceder. Deu no que deu.

Larry Taylor, Mogi, Liga Sul-Americana 2015

Aliás, aí está mais uma lástima: tal como no futebol, essa coisa de campeonato estadual de basquete parece com os dias contados. Mesmo o Paulista, que, nas quadras, em seu contexto, tem importância muito mais relevante, se comparado com o de seu irmão dos gramados. Foi, de certa forma, um acordo surpreendente este fechado entre RedeTV! e clubes paulistas, que praticamente bancaram toda a operação – um sacrifício inteligente e necessário para a promoção de suas marcas e patrocinadores, aliás. Ainda que longe das condições ideais, fechado de última hora, este acerto foi uma tremenda notícia. Acompanhado a isso veio o próprio hotsite da competição que, em que pese sua acidentada navegabilidade e um ou outro termo sem tradução, ofereceu muito mais informação estatística que o de costume, no jurássico portal da entidade. Era mais um ponto para animar, mas que, diante do fiasco esportivo explicitado nos de capítulos acima, acaba virando uma pequena notinha de canto de página.

Pois, além do vexame de se encerrar um playoff sem que ninguém tenha chegado a três vitórias – e aqui, convenhamos, não interessa se Mogi terminaria por varrer, ou não, seu oponente –, diplomaticamente  as três partes perderam o rumo também no extraquadra.

– Por mais frustrado que o clube estivesse com Mogi e seu treinador, por razões aqui explicitadas, não há por que Rodrigo Paschoalotto, presidente do principal financiador de Bauru,  pregar a expulsão de Paco Garcia do basquete brasileiro. Acaba atrapalhando a parte sensata de seu protesto, que foi pedir um pouco de ''boa vontade'' por parte do adversário e da federação. Ainda mais quando ela já havia sido avisada no final do mês de agosto.

– Do lado de Mogi, diante de inflamadas declarações, sua fria (e, quiçá) e um tanto cínica nota oficial não ajuda em nada. Por mais que não tenham aceitado a antecipação das quartas de final por causa dos ajustes em sua quadra, e, não, pela escapulida de Paco, não vejo motivo para se enfatizar que o Paulista e a Sul-Americana  sejam ''competições oficiais'', em detrimento de amistosos da NBA. Mogi tem time hoje para ganhar qualquer campeonato que dispute. Então, nesse ponto, a pergunta ecoada por Bauru, é válida, sim: estivessem eles a convite da liga norte-americana, como seriam os arranjos? Seria impossível fazer os jogos nos dias 18 e 19 e, depois, viajar para Bauru, enquanto os operários teriam mais de uma semana para ajustar a quadra de acordo com as demandas da Fiba?

– Já a FPB… bem, a federação faz um ótimo trabalho de autossabotagem há tempos, independentemente de, na última semana, ter enfrentado uma questão realmente delicada que foi a morte de seu presidente. Antonio Chakmati se foi, ficam as condolências ao seus familiares, mas nenhuma entidade esportiva deveria depender tão somente das decisões de um só presidente para tomar decisões. Competência e sensatez à parte. Para constar, o Bauru exime o novo presidente Enyo Correa de culpa nessa pendenga. Veja o que o que dirigente teve a dizer  ao camarada Alessandro Luchetti, do iG. De qualquer forma, seja lá qual fosse o responsável técnico, lascado por lascado, será que não daria para telefonar para Grego ou qualquer outro cartola da LSA para sondar a possibilidade de segurar a etapa de Mogi por mais uma semaninha?

Não adianta vir com legalismo aqui. Que as regras do Paulista estavam na mesa, e cabia a Bauru aceitá-las. Afinal, a FPB pode assumir a gestão de seu campeonato, mas não é dona dele. Ou não deveria ser. O poder em nossas entidades esportivas é usualmente viciado e tende a se considerar, hoje, autossuficiente. ''O sitema é f…'', pode ranhetar o Capitão Nascimento. O bom senso passa longe quando você tenta encasquetar que um de seus representantes – e atual bicampeão, oras – esteja indo para os Estados Unidos jogar contra times da NBA. E também não venham os mais retrógrados dizer que o convite ao campeão da América (Latina) não passa de um movimento imperialista, contaminador e sorrateiro por parte da grande liga. Claro que a intenção não é apenas e tão somente o desenvolvimento do desporto nacional. Dãr. Mas negar uma oportunidade dessas para seus atletas seria, na falta de termo mais educado, uma grande estupidez.

Que Bauru, com todos os seus títulos recentes, ainda tenha brigado para jogar o Paulista já foi, de alguma forma, um grande lucro para a federação. A despeito da tradição de seu campeonato e dos avanços feitos neste ano, depois de uma longa caminhada para trás,  à medida que o NBB se solidifica (ou tenta se solidificar) e a Fiba continua bancando duas competições continentais, não parece haver espaço no calendário para acomodar a disputa de tantos troféus. E aí o estadual é aquele que pode sofrer mais, se o atual formato, com tantas datas necessárias para a sua conclusão, for mantido. Aí talvez seja o caso de uma equipe bem-sucedida como Bauru, ou qualquer outro supercampeão que venha existir, abraçar a estratégia de jogar com a molecada do início ao fim, e paciência – e até isso poderia ter problema, devido à incidência da LDB. Veja só: mesmo com boa vontade, já é bem difícil de tocar. Se as partes forem se perder em orgulho, politicagem e amadorismo… Aí, mano, cumpadi…Aí é ''falou, aquele abraço!'' ou ''inté''. No caso de Bauru, ou melhor: ''bye, bye''.

Bem-vindo, Bauru

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