Vinte Um

Arquivo : Nikola Pekovic

É Boban Marjanovic contra a teoria da evolução no basquete
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Giancarlo Giampietro

Gustavo Ayón, de 2,08m, vira só mais um baixinho

Gustavo Ayón, de 2,08m, vira só mais um baixinho

A natureza – e o basquete – sempre dão um jeito de se reinventar, não?

(E que tal começar filosofando assim numa sexta-feira?)

No mundo todo, há muita gente pelo menos 35 vezes mais inteligente que um mero blogueiros que já tenha declarado a extinção dos dinossauros. Ou melhor, a extinção do pivô-cincão-gigante-jogando-de-costas-para-a-cesta-lento-toda-a-vida-mas-que-faz-estragos. Você pega o Miami Heat bicampeão da NBA em 2012-2013, os texanos Mavs e Spurs nas outras pontas (2011 e 2012), a seleção norte-americana reassumindo o controle das competições Fiba, o Flamengo, o Bauru… Enfim, são diversos os casos que comprovariam essa tese. Eles listam, sim, pirulões em seus elencos, mas são caras extremamente ágeis, explosivos, dinâmicos (como Tyson Chandler, Jerome Meyinsse, Mason Plumlee, Tiago Splitter etc., cada um na sua). A velocidade é o que manda em quadra.

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Só não dá para aplicar a teoria evolucionista assim tão friamente, gente. Ao menos não no esporte – que o diga Barcelona, com todos os seus tampinhas encantadores, subvertendo um darwinismo que parecia exigir de um jogador de futebol um mínimo de 1,85 m de estatura. No basquete, não seria diferente. Para cada ação, há uma reação. E, mesmo isoladamente, vão surgir casos que desafiam a regra vigente. Aí chega a hora de apresentar para o basqueteiro brasileiro mais incauto a figura imensa que se chama Boban Marjanovic, do Estrela Vermelha.

Para quem está ligado nas transmissões semanais de Euroliga no Sports+, o pivô não é novidade alguma. Agora, como ele não jogou a última Copa do Mundo e anda afastado da seleção sérvia, não foi draftado por nenhum time da NBA e só defendeu o Atlanta Hawks numa liga de verão ao lado de Lucas Bebê, pode ser que Marjanovic ainda seja um anônimo em geral. Urge, então, apresentá-lo.

Marjanovic nasceu na cidadezinha de Inđija, que tem área de 384 km² e cuja população não passa dos 50 mil habitantes. Foi revelado nas pelo Hemofarm, um tradicional clube de base da Sérvia – Darko Milicic também saiu de lá. Completou 26 anos em agosto passado. Ah, e e estava esquecendo já: ele tem 2,21 m de altura. Ou 2,22m. Ou 2,23 m, dependendo da fonte. Ele, vocês entenderam, é IMENSO. E não deveria ter espaço no basquete de hoje. Não só conseguiu se manter em quadra, porém, como é o jogador mais produtivo do segundo principal campeonato de clubes do mundo.

O sérvio lidera a competição em índice de eficiência tanto na medição normal, como por minuto. É o oitavo cestinha, com média de 15,7 pontos, o principal reboteiro, com 9,9, acerta 63,2% de seus arremessos de dois pontos (sendo o 13º) e sofre 3,85 faltas por jogo (o 13º também). Alguns detalhes, antes de seguirmos adiante: as equipes da Euroliga têm tabelas diferentes, então os números vêm com um asterisco; sobre as faltas: seriam muito mais, pode ter certeza, não fosse pelo fato de ele converter 74,6% de seus lances livres. Não é inteligente tentar parar o pivô na marra, então, embora muitas vezes seja a única alternativa quando o cara recebe a bola a um raio de cinco metros do aro, em situação de isolamento. Isso causa problemas sérios.

“Marjanovic é um dos jogadores mais dominantes da competição. É um jogador que proporciona muitíssima dificuldade para todas as equipes, porque temos pouca solução tática para enfrentá-lo, devido a sua maneira de finalizar e a capacidade que ele tem”, avalia o técnico Xavi Pascual, do Barcelona, que vai tentar parar o pivô nesta sexta (estou nessa transmissão ao lado de Rafael Spinelli). “Há poucos jogadores que dão identidade ao seu time nesta competição, e ele dá um estilo ao seu.”

Isso não deixa de ser uma ironia. Afinal, foi da Europa que a NBA pegou a gripe do strecht four, que tem Dirk Nowitzki como seu principal agente. Os dirigentes estão vasculhando todo e qualquer canto do mundo em busca de um pivô minimamente competente no arremesso de longa distância. A ideia é espaçar a quadra e facilitar as infiltrações de armadores e alas numa liga que não permite mais o contato de mão por parte dos defensores. Quanto mais espaçada a quadra, as figuras mastodônticas tendem a se complicar na defesa – como perseguir os jogadores mais rápidos no perímetro? Causa e efeito.

Na Europa, porém, Marjanovic tem a marcação por zona como sua aliada. Ainda que a liga americana permita defesas flexíveis hoje, existe ainda a restrição de três segundos para o marcador se distanciar de seu oponente. Claro que muitas vezes eles conseguem roubar dois ou três segundos a mais que o permitido, mas essa preocupação já interfere o bastante. Faz muita diferença, na real.

De modo que o pivô não precisa ser utilizado apenas de modo pontual, como acontece com o Maccabi Tel Aviv e Sofoklis Schortsanitis, por exemplo. Ele tem média de 27 minutos por jogo, enquanto a jamanta grega só fica em quadra por 14 minutos. Isso também diz muito a respeito do condicionamento físico do sérvio. O cara tem mais de 2,2o m de altura e pesa mais de 130 kg. Joga normalmente, e numa equipe que está cheia de alas jovens, fogosos que partem feito malucos para o contra-ataque – destaque para Nikola Kalinic (já bastante elogiado aqui), Jaka Blazic (um assessor dos irmãos Dragic na Eslovênia), o hiper-atlético Nemanja Dangubic (draftado pelo Spurs no ano passado) –, todos coordenados pelo arrojado armador Marcus Williams (ex-Nets, Warriors e Grizzlies).

O renovado elenco do Estrela vai correr sempre quando pode, especialmente quando joga em Belgrado, empurrados por sua torcida fervorosa. Marjanovic, claro, não é o primeiro a chegar ao ataque, mas consegue de certa forma acompanhá-los em transição. Além disso, não é sempre que seu time vai conseguir uma enterrada ou bandeja tranquila no contragolpe. Aí chega a hora de jogar em 5 x 5. Aí é bola no Marjanovic. E seu impacto ofensivo é enorme, com o perdão do trocadilho.

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Pega leve aí, Boban! Não vá machucar ninguém

Seu compatriota é lento, se comparado com Pau Gasol, Ante Tomic e outros espigões talentosos. Mas, considerando em seu tamanho, ele se mexe com relativa desenvoltura. Para os antenados com a NBA, não se trata de um Nikola Pekovic muito mais espichado, alguém que prevalece, sim, no garrafão devido ao físico avantajado, sem se esquecer da técnica para complementar o pacote. Debaixo do ar, dãr, só sai cravada. Mas ele tem excelente chute de média distância e gira bem, ainda que geralmente para a finalização com o braço direito, por cima do ombro esquerdo.

Na primeira fase da Euroliga, enfrentando Olympiakos, Laboral Kutxa, Valencia, Galatasaray e Neptunas Klaipeda, Marjanovic fez pelo menos 11 pontos em todas as dez partidas. Num jogo eletrizante de prorrogação dupla contra o Gala em Istambul, somou 23 pontos e 17 rebotes em 34 minutos, tendo cometido apenas duas faltas. Foi o mais volumoso de seus sete double-doubles. No primeiro duelo com o clube turco, matou 11 de 14 arremessos de quadra. Na segunda partida contra o estreante lituano Neptunas, o aproveitamento foi de 11-13. Uma vez que recebe a bola, ninguém vai movê-lo dali – por isso, a melhor forma de marcá-lo e atacar a fonte. O Real Madrid o limitou a 9 pontos (4-6), em 20 minutos, na abertura do Top 16 ao usar o americano Marcus Slaughter em marcação frontal, inibindo as linhas de passe. Contra o Maccabi, que tem em Alex Tyus um jogador similar, terminou com 10 pontos e 4-10, em 28 minutos.  Além disso, ambos os clubes possuem em Rodríguez, Lllull, Ohayon e Pargo armadores que pressionam, e muito, no perímetro. No reencontro com o Galatasaray, porém, voltou a arrasar, com 18 pontos (7-10) em 24 minutos.

Nem sempre foi assim, porém. Marjanovic sempre foi bem cotado como prospecto na Europa, tendo sido campeão mundial sub-19 em 2007, ao lado de Miroslav Raduljica, trombando com Paulão Prestes nas semifinais, aliás. Em 2010, depois de passar batido pelo Draft da NBA (estava no radar dos scouts, porém), se consolou com um belo contrato de três anos com o CSKA Moscou. A superpotência russa nunca o aproveitou, porém. Quando Dusko Vujosevic foi demitido, acabou dispensado, depois de ter sido emprestado para o Zalgiris Kaunas, pelo qual teve médias de 5,2 pontos e 3,5 rebotes em apenas seis partidas. Em 2011-2012, teve uma campanha praticamente perdida, passando pelo Nizhny Novgorod, da Rússia, e de volta aos Bálcãs, pelo Radnicki Kragujevac.

Foi só em 2012-2013 que o gigante se acertou, jogando pelo Mega Vizura. Virando referência no jogo interno, desabrochou com 16,9 pontos por jogo e 11,6 rebotes, aproveitamento de 68,9% nos arremessos e 85,4% nos lances livres para ser eleito o MVP da liga sérvia. O projeto estava recuperado. Na temporada seguinte, assinou com o Estrela Vermelha. Foi muito bem em 2012-2013, mas não foi o suficiente para descolar uma vaga na seleção nacional (Raduljica e Nenad Krstic foram escolhidos… A concorrência é braba). De qualquer forma, elevou seu jogo para outro patamar na atual campanha. Dificilmente ficará fora da próxima convocação.

A pergunta que fica: Marjanovic teria espaço na NBA hoje? Valeria o teste? Seria necessário, no entanto, encontrar um clube realmente interessado, que valorize muito suas peculiares características. Não existe em solo americano um jogador com seu tamanho, com porte físico. Roy Hibbert seria aquele que chega mais perto, com 2,18 m e mais de 130 kg também. Agora, até até o pivô que um dia defendeu a Jamaica em torneio Fiba Americas parece mais ágil que o sérvio (ao mesmo tempo, também é mais… baixo!). E Hibbert, não nos esqueçamos, joga num time que rema contra a maré, ainda apostando num jogo interior de pesos pesados, opressor – capitaneando uma das melhores defesas dos últimos anos, enquanto o principal recurso do sérvio é o ataque.

Se for apenas para oferecer o salário mínimo ou um contrato sem garantias, não tem por que Boban topar, economicamente. Ao final da temporada, seu agente vai poder barganhar tranquilamente um contrato milionário no basquete europeu. O que já é uma grande conquista. Ao menos esse dinossauro aqui já sobreviveu.


Splitter se entrosa com Duncan, cresce em quadra e vira peça-chave pelo Spurs
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Giancarlo Giampietro

Uma bandeja ao estilo Splitter

Splitter agora divide quadra com Duncan, sem perder sua eficiência

Por Rafel Uehara*

O Vinte Um já cobriu exaustivamente como o San Antonio Spurs continua um concorrente legítimo ao título, mesmo que sem badalação. Tim Duncan permanece um dos jogadores mais impactantes da liga aos 36 anos de idade, Tony Parker lidera um rolo compressor ofensivo com sua capacidade de criar no pick-and-roll, e Greg Popovich controla os minutos de seus veteranos como um mago. Muitos pensam, incluindo este que os escreve, que o time da temporada passada (que em um momento venceu 20 jogos seguidos a caminho das finais da conferencia oeste) deveria ter ganhado o título, não fosse o crescimento do jovem e superatlético Thunder.

O argumento pode ser feito que o time deste ano seja na verdade ainda melhor que o da temporada passada, devido a sua melhor capacidade defensiva. O Spur tem permitido a quarta menor taxa de pontos por 100 posses do adversário. Em 2011-2012, ficaram em 11º nesse departamento. E o brasileiro Tiago Splitter, titular em 17 dos 39 jogos da equipe em 2012-2013, é um dos motivos pra isso. Depois de um primeiro ano em que mal viu a quadra e um segundo ano de avanço, mas ainda sem total confiança de Popovich, Splitter é agora peça-chave em San Antonio.

O desenvolvimento de Splitter para esta temporada era visto como crucial para os Spurs, devido ao panorama da Conferência Oeste. O Thunder de Kevin Durant e Russell Westbrook ainda era previsto como o time a ser batido (mesmo após trocar James Harden), sendo um caso especial, graças ao porte físico de suas estrelas. De resto, todos os demais concorrentes ou semi-concorrentes à vaga nas finais apresentam torres gêmeas no garrafão: o Lakers com Pau Gasol e Dwight Howard, o Grizzlies com Zach Randolph e Marc Gasol e o Clippers com Blake Griffin e DeAndre Jordan. Para ir à guerra contra estes, San Antonio necessitava que o par Duncan-Splitter desenvolvesse melhor sincronia e, para isso, que Splitter fosse mais confiável.

Em maior tempo de quadra na temporada passada, ficou evidente que Splitter tem talento pra jogar na NBA. Seu entrosamento com Manu Ginóbili e Stephen Jackson nos pick-and-rolls o permitiu várias oportunidades para contribuir no ataque. Mas, em vários momentos, Splitter levou Popovich à loucura com erros de atenção na defesa e falta de firmeza ao finalizar contra contato ao redor da cesta. Isso agora é coisa do passado, e Splitter tem sido um dos jogadores mais consistentes, produtivos e efetivos em toda a liga.

Splitter tem o sétimo maior PER entre alas-pivôs, com 19,87 (na merdição desenvolvida pelo hoje vice-presidente do Memphis Grizzlies e ex-analista da ESPN, John Hollinger, que avalia a produção estatística dos jogadores por minuto). De acordo com o portal mysynergysports.com, Splitter é o segundo maior anotador por posse em pick-and-rolls, marcado em média 1,39 ponto a cada jogada. Também está entre os 25 melhores defensores em post-ups, jogadas em que se recebe a bola de costas para a cesta próximo à linha de fundo, e entre os 40 melhores defendendo o pick-and-roll. E, de acordo com NBA.com/advancedstats/, com Splitter em quadra, o Spurs permite menos pontos que o Grizzlies, segunda melhor rankeada defesa na liga, e marca em média 9,5 a mais que o adversário em comparação a 6,3 com ele de fora. Esses dois números, em especial, são fantásticos.

Tem mais: de acordo com 82games.com, Splitter e Duncan estiveram em quadra 222 minutos juntos até o momento e, nesse tempo, San Antonio marcou um total de 95 pontos a mais que o adversário.

A maior preocupação com relação a formações envolvendo Duncan e Splitter juntos (motivo pela qual Popovich as usou em apenas 48 minutos na temporada regular passada) era o espaçamento do ataque. Matt Bonner e Boris Diaw proporcionam melhor espaçamento devido as suas habilidades de acertar tiros de três pontos com consistência.

Mas, segundo Zach Lowe, do site Grantland, a combinação tem funcionado melhor esse ano devido a maior variação de armações, inteligente visão de quadra e passes de ambos os pivôs, e a crescente química entre eles. Eles constantemente se posicionam em lados opostos de quadra, às vezes armam corta-luzes um para o outro, e a comissão técnica é atenta em sempre orientar um para que faça algo que chame a atenção da defesa quando o outro arma um corta-luz para Parker.

O brasileiro deve ganhar alguma consideração para o prêmio de quem mais evoluiu na temporada, o MIP (“Most Improved Player”), mas será difícil que ele ganhe, considerando que o Spurs está sempre fora do radar e que estrangeiros que não são estrelas já recebem menor atenção pra começo de conversa – aliás, mesmo se o caso não fosse esse, o montenegrino Nikola Pekovic tem tido um maior impacto em Minnesota.

Isso não muda o fato, porém, de que Splitter tem tido em temporada fenomenal e se desenvolveu em parte essencial para as aspirações do time. Agora não só por seu potencial, mas, mais importante, por sua produção.

 *Editor do blog “The Basketball Post” e convidado do Vinte Um. Você pode encontrá-lo no Twitter aqui: @rafael_uehara.


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