Não dá para viver só de Érika numa Olimpíada
Giancarlo Giampietro
Enquanto Érika pôde e conseguiu jogar contra as francesas, a seleção brasileira estava muito bem, obrigado. Depender, porém, excessivamente, exclusivamente de uma única opção ofensiva não pode. Dá nisto: após uma primeira etapa empatada em 34, a França venceu a segunda metade com facilidade para fazer um placar de 73 a 58 no final.
Com um elenco volumoso, especialmente um garrafão muito versátil, o técnico Pierre Vincent levou um tempo, uns 20 minutos, mas voltou do intervalo preparado e determinado a segurar a superpivô brasileira.
As linhas de passe para a jogadora foram obstruídas. Ágeis e compridas defensoras a vigiavam de perto e, mais tarde, a força-bruta Isabelle Yacoubou foi acionada para trombar com a adversária, sem precisar de ajuda.
Érika passou a encarar sérias dificuldades para se posicionar ou receber qualquer bola no garrafão e, afastada da cesta, ela está longe de ser uma jogadora produtiva e eficiente, cometendo muitos erros na tentativa de fazer o passe por cima de suas marcadoras.
Em números: no primeiro quarto, a pivô anotou nove pontos. No segundo, quatro. No terceiro, mais quatro. E ficou por aí, somando 17. Por outro lado, depois de ter cometido apenas um turnover em todo o primeiro tempo, ela acumulou cinco na segunda etapa. No total, teve mais desperdícios de bola (seis) do que rebotes (quatro)
Sem essa – única mesmo, gente? – alternativa, o ataque brasileiro descarrilou. Faltou criatividade e movimentação fora da bola para tentar gerar bons arremessos. A equipe anotou apenas nove pontinhos no quarto final, três deles quando a derrota já estava decidida. Entre uma cesta de média distância de Silvia Gustavo aos 7min46s e dois lances livres convertidos por Clarissa aos 2min25s, o Brasil passou mais de cinco minutos sem pontuar, estacionado nos 54.
Desequilibrado ofensivamente, cada vez pressionado na partida, o time também perdeu o controle na defesa, permitindo um alto aproveitamento de quadra para as francesas: 50% nos tiros de dois pontos e três pontos. Difícil sobreviver assim, ainda que tenham forçado, no geral, 19 bolas perdidas das adversárias, um ótimo número, que foi construído quarto a quarto, depois de terem terminado a primeira parcial abaixo dos 40%.
Fez muita diferença no decorrer do jogo a maior versatilidade e preparação do elenco francês. Confiante, seu treinador usou todas as suas 12 atletas, e para valer: a rotação alternou entre os oito minutos de Florence Lepron e os 28 da armadora Céline Dumerc, cestinha do jogo com 23 pontos.
Dumerc atuou com muita liberdade, chutando de longe (duas bolas de três convertidas em dois chutes tentados), fazendo fintas e ainda agredindo o garrafão brasileiro (bateu sete lances livres). As rotações defensivas falharam muito nesse sentido, e Érika também ficou muito imposta quando envolvida em pick-and-rolls. A francesa se esbaldou com os chutes da cabeça do garrafão, acertando sete de nove arremessos no total.
No quarto final, que fez toda a diferença no jogo, não houve uma só jogadora que tenha desequilibrado: as cestas vieram de todos os lados da quadra. Tanto que, das 12 escaladas, apenas Jennifer Digbeu, que jogou por nove minutos, não pontuou. A França foi, então, um time com muito mais recursos táticos e técnicos.
Ora: não dá para viver só de Dumerc numa Olimpíada.
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O pior para Tarallo é que, nem se quisesse, ele poderia usar 12 atletas no jogo, desde o corte de Iziane na França, claro. E fez falta a maranhense hoje? Inegável. Sem a ala, o perímetro brasileiro fica muito enfraquecido ofensivamente, perdendo sua jogadora mais criativa em lances individuais que poderiam aliviar a pressão sobre Érika. Por outro lado, não dá para saber como a atleta se comportaria em quadra. Uma coisa é criar dentro de um sistema e outra é rompê-lo por conta própria pela sede de chutes e cestas costumeira.
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Contra a Rússia – segunda-feira, 12h45 –, o Brasil ainda entra com chances. As europeias fizeram uma estreia preguiçosa e complicada diante das canadenses e só foram vencer a partida com uma virada na metade final do quarto período, lideradas pela experiente armadora Becky Hammon, que fez seis de seus 15 pontos nos últimos três minutos.
As russas venceram por 58 a 53 apenas com uma parcial de 21 a 10 no último quarto. Periga, porém, que esse susto as despertem para a continuação do torneio. Aí complica.