Demétrius, e a difícil missão de substituir Guerrinha. Mais uma vez
Giancarlo Giampietro
Depois de muitas conversas Bauru afora, o que dá para se dizer sobre a demissão de Guerrinha: ele não caiu exatamente pelo volume de três pontos em seu ataque. O problema tinha muito mais a ver com relações fora de quadra – algo que, pela enésima vez, repetimos: vale tanto ou mais do que rabisco em prancheta e currículo de jogadores. É a famosa química, gente. “Desgaste” e “oxigenada” foram alguns dos termos mais ouvidos e discutidos. O clube acreditava que, mantido o rumo das coisas, não conseguiria o que pretende no NBB. Que é o título, ou o título.
Demétrius não teve nem dez dias de trabalho com seu estrelado grupo antes de estrear contra o Flamengo, e não vai ser num período desses em que a equipe ganhará nova cara. Pede-se um tempo para tanto. Por isso, natural que nesse primeiro confronto, o time ainda tenha, por exemplo, feito mais disparos de longa distância do que dois pontos (31 a 28), por exemplo. Se esse é um hábito que o técnico queira revisitar – e parece que é o caso, dadas as inúmeras vezes em que ele pedia calma na lateral da quadra, enquanto um atleta atirava –, ainda vai demorar um tico para acontecer. O que já vimos foi um Rafael Hettsheimeir operando mais próximo da cesta, tentando apenas três bolas de três.
>> Não sai do Facebook? Curta a página do 21 lá
>> Bombardeio no Twitter? Também tou nessa
O jovem treinador agora encara o maior desafio de sua carreira. É como suceder Lula Ferreira em Ribeirão Preto (algo que nunca aconteceu, com o encerramento das atividades do clube local) ou Hélio Rubens em Franca. Guerrinha se tornou um ícone na cidade. A gritaria depois de sua surpreendente demissão foi impressionante, e se justifica pelos resultados que obteve em tempos recentes e pelo projeto que ajudou a edificar. O curioso é que não é a primeira vez que isso acontece, de herdar um time das mãos de Jorge Guerra. A diferença é que, antes, foi em quadra.
De qualquer forma, aqui está o novo treinador bauruense, assumindo uma empreitada imensa, mas que ao mesmo tempo se mostrava irrecusável. Se há pressão em Bauru, é porque ele assume um time de potencial imenso:
21: Estava pensando: não é a primeira vez que você substitui o Guerrinha, não? Já havia acontecido quando vocês jogavam, herdando a armação de Franca e da seleção, não? Como é encarar essa missão agora?
Demétrius: Nós jogamos juntos em Franca. Acho que a última vez que ele defendeu a seleção foi na Olimpíada de Barcelona, em 1992, e eu cheguei em 1993. É um técnico vencedor, respeito muito o que ele conseguiu aqui. Quando soube que ele saiu, liguei para para conversar, para dar uma força, e também porque meu nome estava sendo envolvido em especulações. Mas foi algo que sempre fiz, pois somos amigos, então ligava seja nas vitórias ou nas derrotas. Quando saí de Limeira, foi numa situação muito semelhante e que foi muito difícil para mim e inesperada. Foi uma dessas ironias do destino que tenha chegado a isso. Ao aceitar a proposta, falei com ele, sempre num sentido de lealdade e amizade, e ele entendeu que eu não tinha participação naquela decisão e desejou sorte. Para mim, aumenta mais a responsabilidade, mas sempre fui de assumir desafios, e o mais importante é você estar preparado para enfrentá-los.
É o maior desafio de sua carreira?
Sem dúvida, o maior. É um time que está num ciclo vencedor, e chego para tentar novas conquistas, defendendo o título da Liga das Américas e buscando também o NBB. Não é simples, mas temos condição de fazer.
>> Alguém pode impedir uma final entre Bauru e Flamengo?
>> As primeiras impressões sobre o Flamengo 2015-2016
Foi um convite que te surpreendeu?
Fiquei surpreso, sim, já estava praticamente tudo acertado aqui em Bauru, enquanto eu tinha minha situação em Minas consolidada. Acabou sendo uma surpresa grande, mas é uma oportunidade incrível para a minha carreira.
Ao mesmo tempo, como é deixar o trabalho que começou tão bem no ano passado?
Minha conversa com o Minas foi muito aberta. O Victinho (Victor Jacob, gestor do Bauru) me ligou, perguntou se eu tinha interesse, eu disse que sim, mas que ele precisaria falar com meu clube primeiro. Ele falou com a diretoria, que abriu as portas, entendeu que era uma grande oportunidade para mim, e que, se eu quisesse conversar, não teria problema nenhum. Foi uma conversa muito sincera. Agradeço muito o entendimento da parte do Minas. Depois fiz uma reunião com os jogadores e expus minha situação. Eles entenderam o quanto essa oportunidade pode ser importante e que isso pode acontecer com eles no futuro.
Em Minas, você tinha um clube majoritariamente jovem, com alguns veteranos. Aqui, em Bauru, é o contrário. O quanto isso muda a abordagem do treinador no trato diário?
Minha filosofia segue a mesma. A maneira de trabalhar é a mesma: temos de treinar o mais próximo possível do modo como jogamos. É fazer uma defesa com intensidade, sair em transição, procurar as melhores escolhas no ataque. Mas o trato é o mesmo. Vamos procurar encaixar os mais jovens no time também, dar chances a todos, sabendo que a caminhada é loga. Para nós, o importante é chegar bem aos playoffs.
O Bauru venceu quase tudo que disputou no ano passado. Teve momentos em que passou por cima dos adversários, mas acabou perdendo fôlego no final. Essa é uma preocupação, então? Mais: em relação ao que você viu do time, quais os pontos que acha que pode melhorar no time?
Foi pouco tempo de trabalho até aqui, mas já estou passando o que espero, aos poucos. O importante é preciso chegar bem aos playoffs. Por dois anos consecutivos minha equipe teve a melhor defesa do campeonato, e espero colocar essa filosofia aqui, com chegada forte de transição. Tomar só 73 pontos de uma equipe como a do Flamengo já foi um passo importante. A meta vai ser esta (defesa perto dos 70 pontos). Se conseguirmos isso, vamos ficar em boa condição, por termos um volume de jogo alto. Acredito também que vamos ter muitas opções tática, diversidade.
Quanto ao ataque, um tópico obrigatório é a questão dos arremessos de três pontos. Bauru teve o chute de fora como arma que foi marcante em sua campanha, com um volume difícil de se ver por aqui. É algo que divide muita gente: jogadores de gerações passadas a defendem, estatísticos da NBA também a abraçam com fé. A outra corrente entende que é um desperdício de energia, que se ignora bolas mais fáceis e que apela-se um pouco para a sorte. Como você encara toda essa discussão e o que espera do time nesse sentido?
É lógico que temos muitos jogadores no time com essa característica, e não se pode pedir para que eles mudem isso. Precisamos analisar como foram chutadas essas bolas. Se de 30 bolas, 25 foram livres, porque o sistema deu isso, nós temos de chutar. Como vai falar para jogadores como Robert Day não chutar, se estiver livre? Acho que o mais importante não é a quantidade, mas a qualidade da decisão e como criamos essa oportunidade de decisão. Se estiver livre, tem de chutar, é o que a defesa está te proporcionando. Lógico que temos de ter a inteligência de variar o jogo, de jogar no poste baixo, de buscar a infiltração e variar. Com isso, a gente ganha um domínio maior do jogo.