Em quem ficar de olho no F4 da Euroliga: Ante Tomic motivado
Giancarlo Giampietro
Para quem ainda não está farto de tanta emoção, com o que se vem passando nos playoffs completamente alucinantes da NBA e com tantas surpresas no NBB, então é hora de abrir os braços para uma carga extra de drama – e basquete refinado – neste fim de semana. Mais especificamente na sexta-feira e domingo, com o Final Four da Euroliga.
A gente pode falar de Barcelona e Real Madrid, que fazem mais um clássico de matar, ou das constantes potências CSKA e Maccabi, que história não falta. Na verdade, vamos tratar desses clubes, sim, entre hoje e amanhã. Mas, antes, prefiro gastar um tempo com os protagonistas em quadra.
Sim, os melhores jogadores do mundo, inclusive os europeus, estão do outro lado do Atlântico. Parker, Nowitzki, irmãos Gasol, Pekovic, Gortat e tantos mais. Mas não quer dizer que o segundo maior torneio de clubes do mundo fique só com as sobras. Há diversos atletas que assinariam contratos na NBA sem a menor dificuldade, sendo peças relevantes, mas que, por circunstâncias diversas – entre as quais se destaca invariavelmente a adoração de fanáticas torcidas e alguns milhões de euros na conta –, seguem jogando perto de casa.
Peguem, por exemplo, Juan Carlos Navarro. Desnecessário falar sobre o currículo, a reputação e o talento de La Bomba. Em sua única temporada nos Estados Unidos, ele não chegou a ser maltratado como Vassilis Sponoulis foi por Jeff Van Gundy em Houston, mas sofreu demais em um ano perdido do Memphis (60 derrotas!), no hiato entre os times de Hubbie Brown e Lionel Hollins. Ainda viu seu grande amigo Pau Gasol ser trocado. Um ano depois, correu de volta para Barcelona, aonde é rei, talvez chocado com a barbárie.
Este é um caso emblemático. Mas há diversos nessa linha: Erazem Lorbek, cortejado pelo Spurs ano após ano, mas que segue no Barça; Dimitris Diamantidis, o mito alviverde do Panathinaikos; Nikola Mirotic, o segundo grande sonho de qualquer torcedor do Bulls que se preze (o primeiro, claro, sendo um Derrick Rose 100%); sem contar os diversos americanos ignorados pelos Drafts da vida, mas que construíram e lapidaram toda uma carreira no velho mundo (Keith Langford, Daniel Hackett, Joey Dorsey, Ricky Hickman, Tremmell Darden, Aaron Jackson, Bryan Dunston etc. Etc. Etc).
Não dá para cravar que todos eles seriam bem-sucedidos num ambiente muito mais exigente do ponto de vista atlético, em que suas façanhas europeias talvez sejam ignoradas, tendo eles que batalhar novamente a partir do zero por respeito e o decorrente tempo de quadra. Dependeria muito da franquia, da diretoria e, claro, do técnico – sem contar a adaptação muitas vezes complicada, como Tiago Splitter e Mirza Teletovic podem testemunhar.
Há que prefira, então, evitar o risco, ficando numa zona de conforto, já bem remunerado. Mas também há aqueles que são simplesmente subestimados, mesmo, não vendo a hora de receber uma boa proposta, mas sem necessariamente estarem dispostos a assinar pelo salário mínimo da NBA, como fez Pablo Prigioni em seu primeiro ano de Knicks, já na reta final da carreira.
Pensando apenas nos quatro semifinalistas, vamos listar abaixo alguns craques que merecem ser observados com atenção, mas sem a menor preocupação se dariam certo ou não na NBA. Bons o suficiente para serem apreciados pelos que já fazem agora. Essa é uma lista que já deveria ter sido escrita antes, para relembrar o belíssimo campeonato que fez Andrés Nocioni, a versatilidade da dupla Emir Preldzic e Nemanja Bjelica, do Fenerbahce, o próprio Dunston, vigoroso pivô do Olympiakos, eleito o melhor defensor da temporada, o jovem italiano Alessandro Gentile, revelação do Olimpia Milano e candidato ao Draft deste ano, e muito mais.
Antes de chegar aos caras, um lembrete para contextualizar: para os que estão (bem) mais acostumados com a NBA, lembrem que o basquete Fiba é jogado em 40 minutos, e não 48. Logo, o tempo de quadra de uma partida da liga norte-americana é 20% maior, de modo que as estatísticas em geral são mais infladas por lá, fazendo alguns dos números abaixo parecerem tímidos. Além disso, a abordagem ofensiva das equipes de ponta da Europa tende a ser diferente, com mais jogadores assumindo responsabilidades, dividindo a bola, mesmo as que têm grandes cestinhas, que poderiam muito bem carregar um time nas costas.
E, ok, aqui entra o momento da propaganda: o evento será transmitido com exclusividade pelo Sports+, canal 28/128 da SKY, com este blogueiro lelé na equipe de equipe, ao lado do ultrafanático e informado Ricardo Bulgarelli e os narradores Maurício Bonato, Rafael Spinelli e Marcelo do Ó, que, cada um ao seu modo, ajudam a dar emoção ao jogo.
Vamos lá, enfim, a alguns destaques do F4, sem necessariamente ser os melhores do campeonato, mas apenas uma lista que dá na telha. Free style, mano, com pílulas publicadas nos próximos dias:
– Ante Tomic, pivô do Barcelona.
11,8 ppj, 6,3 rpj, 2,2 apj, 63,3% de 2 pts, 68,4% nos lances livres em 22 mpj.
E o que você faz quando é dispensado – e, de certa forma, humilhado – publicamente pelo Real Madrid?
O clube merengue não estava lá muito satisfeito com o espírito competitivo de Ante Tomic e resolveu exercer uma cláusula contratual para romper seu vínculo com o pivô croata um ano mais cedo.
Veja este trecho de reportagem do diário As: “Sua falta de energia tapou suas virtudes inquestionáveis, e o Real Madrid preferiu não seguir contando com um jogador que não ofereceu os níveis de energia necessários que a equipe precisava nem sequer em partidas da final que o Real Madrid perdeu ante um Barcelona muito concentrado em seu jogo interior”.
Ok, não foi o técnico Pablo Laso que escreveu o texto, ou nenhum diretor do clube. Mas a gente conhece a relação quase simbiótica entre os jornais da capital e os poderosos do Real. Dá, quase, para assumir como discurso oficial.
Então, Tomic, o que fazer?
Ué, assinar com o Barcelona, claro. E, melhor, arrebentar pelo arquirrival.
Desde que deixou a capital espanhola, migrando para o sul, o pivô adquiriu uma bem-vinda consistência. Nada como boa rodagem e experiência – e uma motivação a mais. É quando você vê o potencial ser concretizado, quando muito, ou tudo, do que se projeta para um jogador acontece começa a acontecer em quadra, até que parece algo praticamente automático – a ponto de ter sido o MVP dos meses de fevereiro e março – em sequência, mesmo, algo que nunca havia acontecido antes na história da liga.
Aos 27 anos, o croata de 2,17m sabe bem o que fazer quando acionado, confiante em produzir como a primeira opção ofensiva do Barcelona. Há momentos em que talvez ele pudesse ser ainda mais explorado, mas esse é o “preço a se pagar” (nem precisa de tanto drama, vai?) individualmente por fazer parte de um dos elencos mais caros e competitivos do continente, cheio de cestinhas de prestígio.
Já fiz essa comparação antes, e ela parece ainda mais válida depois de mais uma temporada: em diversos movimentos, Tomic vai lembrar Pau Gasol, um dos últimos grandes ídolos do clube catalão, especialmente pelo biótipo esguio e até por seu comportamento calmo em quadra – que muitas vezes pode ser interpretado, precipitadamente, como complacência. Seu tiro de média distância precisa ser marcado, embora seja muito mais eficiente num raio de dois ou três passos, usando sua envergadura, embora não tenha tantas alternativas assim (em tremos de sequência de fintas, para abrir mais espaço no garrafão). A visão de jogo e capacidade para servir seus companheiros tanto na cabeça do garrafão como próximo da tabela, de costas para o aro, também vem melhorando a cada ano, chegando a 2,2 assistências por jogo neste ano. Ajuda, nesse sentido, o fato de ter sido desenvolvido como um jogador de perímetro, antes de dar aquela espichada no fim da adolescência.
Sua química com Marcelinho Huertas está num ponto excelente. Com seus braços compridões, vira um alvo fácil para pontes aéreas, mesmo que ele não seja daqueles atletas que castiguem o aro – melhor deixar isso para o Joey Dorsey, mesmo. O legal é quando os dois trocam favores, com o pivô passando para o brasileiro em handoffs, ou com passes por cima dos marcadores para acertar o brasileiro em cortes por trás da defesa.
Hoje, na real, o melhor jeito de parar o pivô do Barcelona é tentar atacá-lo com agressividade do outro lado da quadra, para tentar carregá-lo de faltas (2,7 por jogo). Para alguém de sua estatura, o croata se mexe bem pelo garrafão, mas ainda vai ser vulnerável diante de armadores e laterais numa troca de pick and roll. O difícil é escolher a melhor hora de buscar a infiltração, uma vez que Xavier Pascual arma uma defesa bem compacta, fechando espaços.
Tomic se tornou sem dúvida o principal pivô do basquete europeu, com o terceiro maior índice de eficiência da competição. Algo que a Euroliga confirma, elegendo o atleta como o melhor da posição nos últimos dois campeonatos. É esse o craque que o Real vai ter de encarar mais uma vez.
Seu contrato vai até 2015. O próximo passo natural seria a NBA, na qual ja á foi draftado pelo Utah Jazz em 2008, num daqueles stash picks, na 44ª posição. Mas resta saber se Tomic toparia. Para quem sai de Real para Barça diretamente, não acho que tenha receio de desafios.