Jukebox NBA 2015-16: o carma chega para abalar o Clippers
Giancarlo Giampietro
Em frente: já estamos nos playoffs e o blog vai tentando fazer uma ficha sobre as 30 franquias da liga, apelando ainda a músicas, fingindo que está tudo bem. A gente se esbalda com o YouTube para botar em prática uma ideia pouco original, mas que pode ser divertida: misturar música e esporte, com uma canção servindo de trilha para cada clube. Tem hora em que apenas o título pode dizer algo. Há casos em que os assuntos parecem casar perfeitamente. A ver (e ouvir) no que dá. Não vai ter música de uma banda indie da Letônia, por mais que Kristaps Porzingis já mereça, mas também dificilmente vai rolar algo das paradas de sucesso atuais. Se é que essa parada existe ainda, com o perdão do linguajar e do trocadilho. Para mim, escrever escutando alguma coisa ao fundo costuma render um bocado. É o efeito completamente oposto ao da TV ligada. Então que essas diferentes vozes nos ajudem na empreitada, dando contribuição completamente inesperada ao contexto de uma equipe profissional de basquete:
A trilha: ''Instant Karma (We All Shine On)'', por John Lennon
Então. O último post, sobre as consequências imediatas da lesão de Stephen Curry, terminou com a lembrança de que Doc Rivers, no ano passado, para provocar e mexer no vespeiro, afirmou que o título do Golden State Warriors poderia se explicar muito pelo fator sorte. De não terem sofrido nenhuma baixa mais séria durante a campanha e por ver seus principais oponentes caindo mais cedo. Com a expectativa de reencontrar os atuais campeões pela semifinal do Oeste, esse comentário ganhava um grifo irônico e perigoso, já que poderiam enfrentar um adversário, agora, ferido e também com irritado, querendo provar algo. Ainda assim, no contexto das 21h (do horário de Brasília), o Clippers não teria mais do que reclamar. Era aquela coisa: calar-se e jogar.
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Bom… Esse contexto não durou nem cinco horas. Pelo Jogo 4 da série contra o Portland Trail Blazers, Chris Paul sofreu uma fratura na mão direita, que muito provavelmente vai afastá-lo do restante dos playoffs. Aí a observação impertinente de Rivers sobre o Warriors se tornou, digamos, cármica. Não se deve mexer jamais com essas coisas no esporte. Daí entra nosso amigo John, sempre mordaz, desconfiado e, também, sagaz. ''O carma instantâneo, imediato vai vai te pegar. Vai te bater bem na cara. É melhor você ficar alerta, querido. Junte-se à raça humana'', escreve em um verso. Depois, você ainda vai encontrar estas linhas: ''O carma instantâneo vai te pegar. Vai te tirar de derrubar. É melhor reconhecer seus irmãos. Todos que você encontrar.''
Ouch.
Por anos e anos, o Clippers cultivou duas imagens em Los Angeles. A primeira, otimista, de time do futuro na metrópole californiana. Uma hora chegaria a vez deles, preparadíssimos para desbancar o Lakers. A segunda, alvo de chacotas, veio como consequência dos constantes tropeços que o fortíssimo núcleo de Chris Paul, Blake Griffin, JJ Redick e DeAndre Jordan, gerido por Doc Rivers, não conseguiu evitar. Perder faz parte do jogo. Mas a choradeira insistente desses caras? Virou folclore. Agora, infelizmente, eles têm todos os motivos para resmungarem demais, ainda que, em seu protesto, só possam somente olhar para o céu, em vez de reclamar contra um trio de arbitragem qualquer, contra a liga etc.
Nesta campanha para tentar se afirmar como sério candidato ao título, que nunca foi tão mais forte como no ano passado, quando derrubaram o San Antonio Spurs num duelo épico, a equipe angelina até se habituou a jogar esporadicamente sem Chris Paul ou Blake Griffin. Mas nunca sem os dois ao mesmo tempo, por um longo período. É o que vai acontecer desta vez: no mesmo boletim médico que divulgou que o armador passou por uma cirurgia já nesta terça-feira, deixando-o afastado por tempo indeterminado, os assessores também informaram que o ala-pivô não jogará mais nesta temporada, devido à reincidência de sua lesão no quadril.
Isso que mata. Pela temporada 2011-12, Paul ficou fora de 22 partidas, e o time conseguiu segurar as pontas, curtindo as habilidades diversas de Griffin como criador, como uma arma ofensiva praticamente completa – só faltava o tiro exterior, mesmo. Nas últimas temporadas, isso foi raro. O armador poderia até estar com um estiramento de virilha aqui, ou uma outra lesão muscular ali, mas ele ao menos conseguia estar em quadra, pelas campanhas, hã, fracassadas pelos playoffs, de 2012 até agora. No caso de Griffin, a onda de problemas físicos começou na temporada passada, quando perdeu 15 jogos. Na atual jornada, piorou: só pôde ir à quadra em 35 rodadas, abalado não só por uma distensão no quadril como, depois, pela fratura na mão que sofreu ao esmurrar um dos roupeiros do time. Coisa de TMZ e TV Fama. Para deixar claro, ele ficou muito sentido pelo ocorrido. Ok, ok.
Durante esta prolongada ausência, Doc Rivers viu seu time responder muito bem. Sem Griffin, fortaleceu sua defesa, que foi a quarta mais eficiente da liga desde o dia 26 de dezembro, sem Griffin. Do outro lado, manteve um ataque poderoso que se concentra nos pick-and-rolls entre Chris Paul e DeAndre Jordan e a ameaça do tiro exterior ao seu redor, sendo o oitavo sistema ofensivo mais eficiente no mesmo período. Uma encrenca para qualquer adversário, mesmo para os grandes favoritos. Jogaram tão bem que o retorno de seu ala-pivô estelar apresentava até alguns dilemas, de como integrá-lo, especialmente quando estava claro que ele não estava nem a 60% de seu potencial, números à parte. Faltava ritmo e força. Da pior forma possível, o técnico-presidente nem precisará mais se preocupar com isso. A dor de cabeça ficou muito maior.
Sem a dupla, é difícil imaginar que alternativas Doc pode encontrar para montar um conjunto ainda competitivo para o nível que os playoffs exigem. Jeff Green, Paul Pierce e Wesley Johnson, por comitê, vão ter de assimilar o volume ofensivo dedicado a Griffin. Acontece que é difícil encontrar jogadores mais irregulares que Green e Johnson, duas escolhas top 10 de Draft que frustraram vários treinadores. Já Pierce está nas últimas: só participou de 27 minutos da série contra o Blazers, de 192 possíveis. A não ser que Rivers esteja errando feio em sua avaliação, é sinal de que não se pode esperar mais 20,0 pontos por jogo do ídolo do Celtics em um longo mata-mata. Na melhor das hipóteses, o Clippers poderia ao menos contar com o melhor de cada um em noites distintas.
Ainda assim, seria o bastante? A vida de qualquer finalizador fica mais fácil quando a bola está nas mãos de Chris Paul, um dos melhores armadores da história. Agora, a mudança de estilo não poderia ser mais radical: o filhão Austin Rivers assume a condução do ataque, de cabeça baixa, pensando quase sempre na cesta. Figura nada querida em Portland, Jamal Crawford também vai ter de se mexer, ao sair de sexto homem de vida fácil para ponto de referência no ataque. Da parte desse chutador maluco, eleito pela terceira vez o melhor sexto homem da liga, também valeria um esforço para envolver seus companheiros, ainda mais com Austin ao seu lado. Pablo Prigioni viria do banco para tentar dar alguma firmeza ao time.
Para constar: JJ Redick também está lidando com um problema no calcanhar, algo bastante significativo para alguém que não pára de correr pelo ataque, em busca de uma boa oportunidade para subir para o arremesso. Se ele não conseguir se movimentar com rapidez de um lado para o outro de quadra, o espaçamento do ataque fica ainda mais comprometido.
O baque não se limita à tarefa de fazer cestas, claro. A forte defesa do Clippers conta com a presença mastodôntica de DeAndre ao centro do garrafão, mas começa pela pressão que CP3 ainda consegue colocar em cima da bola. Contra o Blazers de Damian Lillard e CJ McCollum, ele vinha sendo figura fundamental para limitá-los. Não que jogasse sozinho: contava com a ajuda de dobras acima da linha de três pontos para forçar que os cestinhas se livrassem da bola. De certa forma, vinha dando certo, com ambos pontuando menos em relação a suas médias pela temporada regular. Rivers vai ter a disciplina para continuar este abafa? Prigioni vai ter fôlego?
Imagine a lista de tarefas que Rivers e seu badalado estafe teriam de cuidar na primeira reunião que tiveram após serem informados de seus desfalques? Um jogo que provavelmente devem ter estudado com carinho foi a derrota apertada para OKC, sofrida no dia 31 de março, por apenas dois pontos, fora de casa. Naquela ocasião, o técnico poupou o trio Paul-Jordan-Redick, enquanto Griffin ainda não estava pronto para jogar. Austin Rivers e Crawford marcaram, cada um, 32 pontos, enquanto Jeff Green contribuiu com mais 19 saindo do banco. Foi um desempenho surpreendente e que só não rendeu uma grande vitória pelo fato de sua defesa ter tomado 119 pontos. Alguns dias depois, novamente preservando seus principais atletas, a equipe venceria o Utah Jazz por três pontos, na prorrogação, também como visitante. Crawford fez 30 pontos e Prigioni somou 13, com mais sete assistências. O quão realista seria esperar a reprodução de um desempenho desses pelos playoffs? Em busca de informações, Terry Stotts muito provavelmente também colocou scouts e assistentes para dissecar essas duas *fitas*.
Aí, galera, que o Trail Blazers, tendo igualado a série em casa, virou favorito para um confronto melhor-de-três a partir desta quarta-feira. Mesmo que tenha um elenco muito jovem. Mesmo que o Clippers ainda tenha o mando de quadra. Mas o momento agora é todo favorável a Portland, e caras como Damian Lillard e CJ McCollum, na real, curtem esse tipo de situação, de encarar qualquer vestígio de pressão. Para um time que não estava tão bem cotado assim no início do campeonato, uau. Uma baita história. Para uma franquia que já sofreu com lesões de Bill Walton, Sam Bowie e Greg Oden no decorrer de sua história, acabando com sonhos ambiciosos, não vão lamentar tanto assim os problemas do oponente. O carma deles já foi pago há tempos e com juros elevadíssimos.
PS: a música inicialmente planejada para o Clippers era ''Wouldn't It Be Nice?'', clássico dos Beach Boys, banda icônica da Califórnia, muito mais apropriada. A pergunta era básica: não seria legal que os antigos primos pobres de Los Angeles ficassem juntos e se dessem bem dessa vez? Até esta segunda-feira, estava mantida. Tivemos de mudar.
A pedida? Só um milagre, mesmo. Que Austin Rivers viva as melhores semanas de sua vida. Que DeAndre Jordan acerte 80% de seus lances livres. Que JJ Redick passe a pontuar não só com precisão nos arremessos e inteligência, mas com explosão física e dribles mortais. Que Wesley Johnson ou Jeff Green possam fazer 20 pontos por jogo. Que Jamal Crawford tenha aproveitamento superior a 45% nos arremessos. Qualquer coisa nessa linha…
A gestão: sim, se o San Antonio perdesse Kawhi e LaMarcus, provavelmente diria adeus precocemente. Se Draymond Green se juntasse a Stephen Curry no banco, Golden State também diria que ficou para a próxima. Cleveland sem LeBron e Kyrie? O mesmo. OKC sem Durant e Wess? Vimos no ano passado: nem playoff dava. Então… Se o Clippers, completando sua quinta temporada de Chris Paul e Blake Griffin, não conseguir o título, dessa vez não haveria o que Doc Rivers pudesse ter feito no mercado para remediar a situação. O que não quer dizer que o trabalho do presidente não deva ser questionado.
Enquanto tiver Chris Paul e Blake Griffin, com DeAndre Jordan e JJ Redick dando suporte, a tendência é a de que os resultados em quadra desviem a atenção do que vem acontecendo no escritório. Vai chegar o momento em que as seguidas decisões (no mínimo) questionáveis que tomou nos últimos anos cobrarão um preço. Não seria um exagero dizer que se trabalho de longo prazo beira o desastre. Ele já virou o pôster dos críticos que preferem a separação de Estado e Igreja, ou melhor, de dirigente e técnico. Qual o receio aqui? Que o treinador esteja sempre muito mais preocupado com questões imediatistas. O futuro? Fica para depois, mesmo.
O último exemplo disso foi a troca por Jeff Green, em fevereiro. Você pode ser o maior fã deste ala. Até concedo isso. Mas não dá para justificar um negócio por Lance Stephenson e uma escolha de primeira rodada de Draft. Não só por Stephenson ser muito mais jogador (a despeito da insanidade latente) e ter se reencontrado em Memphis. Mas pelo fato de ter desperdiçado mais uma seleção de calouro, uma ferramenta muito valiosa para a montagem de elencos.
A piada aqui é que talvez o presidente Rivers nem se importe mais em trocar escolhas futuras. Afinal, o técnico Rivers não aprova nunca os jovens jogadores que recebe junho após junho, mesmo. Parece conversa de maluco? Os renegados discordam: o ala Reggie Bullock foi descartado rapidamente e teve bons momentos com Detroit neste ano; CJ Wilcox é um chutador já de 25 anos que só joga pela D-League; Branden Dawson (cuja única manchete este ano foi um caso de polícia). Para um técnico renomado, que foi um armador condecorado, guiando diversos times rumo aos playoffs com os dois cargos, é surpreendente que, como diretor, tenha um aproveitamento pífio na hora do Draft.
A questão fica mais ampla quando vemos que, nem mesmo quando vai atrás de veteranos, Doc tem acertado — seja por problemas de avaliação do cartola ou do treinador. Spencer Hawes, Josh Smith, Glen Davis, Lance Stephenson, Jordan Formar, Chris Douglas-Roberts, Jared Dudley… São vários os atletas que chegaram durante sua gestão e foram dispensados de modo apressado. Alguns deles passariam a render mais quase que imediatamente após trocas. É uma confusão que só, que fica mais grave quando notamos o estrangulamento de sua folha salarial.
Muitos de seus movimentos foram realizados com o intuito de livrar o clube de multas pesadas do chamado ''hard cap''. Leia-se: livrar o clube das próprias armadilhas que ele mesmo arrumou. Como quando pagou mais uma escolha de primeira rodada de Draft ao Bucks para despachar o salário de US$ 4 milhões de Jared Dudley, um reserva de bom nível que durou apenas uma temporada em LA. Sua atuação foi fraca, é verdade, mas estava lesionado.
Enfim. Não dá nem para listar todas as bobagens feitas. O que deveria preocupar o torcedor do Clippers é que Doc pode muito bem decidir que chegou a hora de reformulação para o time, independentemente da azarada fratura sofrida por Chris Paul. Se for o caso, saberá por que caminho seguir?
Olho nele: Jamal Crawford
Sem CP3, sem Blake, o principal criador de jogadas de Clippers acaba sendo Jamal Crawford, mesmo, aos 36 anos, com seus crossovers indecifráveis no perímetro seguidos por arremessos-relâmpago. O problema: uma coisa é produzir contra as segundas unidades dos oponentes, tendo duas superestrelas ao seu lado. Agora, como referência, como vai ficar a vida do veterano? A gente sabe que coragem não falta. Arremessos também estarão mais do que disponíveis e, convenhamos, Crawford nunca viu um chute que ele achasse impossível de matar. Conforme citado acima, ele ainda pode ser explosivo na noite certa, ultrapassando a marca dos 30 pontos, com bolas heróicas que, sozinhas, lhes renderam o prêmio de melhor reserva do ano. Volume não é problema para ele. Duro é atingir essas marcas com um mínimo de eficiência. Sua média foid e 13,8 pontos e 41,8% nos arremessos em 29 minutos, com apenas 23,1% nos chutes de longa distância.
Um card do passado: Dominique Wilkins. A atual versão do Los Angeles Clippers é certamente a mais promissora da franquia desde que ela adotou este nome. Numa história de muitas derrotas e derrapadas, todavia, o clube já teve seus momentos em que tudo parecia estar caminhando bem, que havia chegado a hora da virada. Voltando no tempo, temos o time de Elton Brand e Sam Cassell em meados da década passada. Um pouco antes, em 2002-03, a base formada por Andre Miller, Marko Jaric, Keyon Dooling, Corey Maggette, Quentin Richardson, Lamar Odom, Chris Wilcox e Michael Olowokandi prometia demais. Tá. Mas o time que mais empolgou Billy Cristal deve ser aquele do início dos anos 90, com Mark Jackson, Danny Manning, Ron Harper, Charles Smith, Ken Norman, entre outros. Sob o comando de Larry Brown, eles se classificaram para os playoffs tanto em 1992 como em 1993, o que era um estouro, já que não acontecia desde a época de Buffalo Braves, em 1976. Tá.
Em 1993, o time já contava com Dominique Wilkins como seu cestinha. O veterano de 34 anos havia chegado em troca por Manning. Nome por nome, parecia um tremendo negócio, né? Estavam recebendoum Hall da Fama, que iria anotar 29,1 pontos e 7,0 rebotes por sua nova equipe. Jogava bola o suficiente para ser convocado para a segunda seleção profissional norte-americana, que seria campeã em 1994. Mas aquele era o último ano de contrato de Wilkins. E você acha que ele renovaria com o Clippers?! Claro que não. Na temporada seguinte, assinou com o Boston Celtics. Manning também estava em vias de se tornar agente livre. Era mais jovem, de todo modo, uma estrela em ascensão, que havia sido selecionado pela franquia como a primeira escolha do Draft de 1988. Será que Manning renovaria em Los Angeles? Imagino que a chance era maior. De Atlanta, foi para Phoenix, onde faria parceria com Charles Barkley. Sua carreira nunca seria a mesma, porém, devido a diversas lesões no joelho. Manning era um ala-pivô versátil com muito talento. Mas Blake Griffin causou mais impacto em L.A. Se Doc achar que é a hora de trocá-lo, o retorno será mais duradouro?
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