Personagens dos playoffs: Vince Carter
Giancarlo Giampietro
Quem se lembra de quando havia gente doida o bastante para dizer que o Dirk Nowitzki nem era tudo aquilo que se falava, que ele nunca vencia nada que prestasse, que era apenas um bom arremessador, mas um fracote para triunfar na NBA? Mais um desses euros molengas, que não aguentava o tranco, e tal. Seu jogo só servia para a temporada regular. Na hora do vamovê, tirava da reta, afinava.
Estamos falando aqui dos idos de 2008, mais ou menos, e o alemão ainda não havia conquistado seu anel de campeão, derrubando LeBron James e a cambada de South Beach nas finais. De fato uma loucura. Mas o supercraque ao menos conseguiu assumir o controle da situação, ditando, com talento e, ufa, resultados, qual a percepção em torno de sua carreira, se é que um dia ele vai parar de jogar. Dá para imaginar Nowitzki girando, devagar quase parando, aos 50 anos, atirando a bola bem lá pro alto, e o arco terminando num chuá daqueles.
Agora, e quem se recorda dos tempos em que Vince Carter era o futuro da NBA? O tanto de pôsteres ''Vinsanity impressos com cravadas inigualáveis, como aquelas de sua inesquecível exibição no torneio de enterradas de 2000, ou mesmo aquela mais absurda (de todos os tempos) sobre o pobre Fredereic Weiss nos Jogos Olímpicos de Sydney, no mesmo ano. Sem contar os diversos NBA Actions que terminaram com suas jogadas que realmente testavam as mais conservadoras leis da física. Sim, aí voltamos no tempo um pouco mais, mesmo, no início da década passada, quando ainda era possível ter a dúvida sobre quem teria a melhor carreira: Vince ou Kobe.
Muita coisa também correu por baixo da ponte desde então. Muuuuuita coisa, neste caso. Carter foi de cidadão honorário a figura mais odiada em Toronto, onde até hoje é vaiado – especialmente por ter forçado sua troca, sabotando por completo seu valor, a ponto de o (incompetente, é verdade) Rob Babcock tê-lo repassado por um pacote de Eric Williams, Aaron Williams, um veteranaço Alonzo Mourning, que se recusou a jogar por lá, e duas escolhas de primeira rodada que viriam a ser Joey Graham e Renaldo Balkman (este para o Knicks). Bateu de frente com Jason Kidd em New Jersey. Não ajudou o Orlando Magic a segurar Dwight Howard. Não foi contagiado pela mágica de Steve Nash em Phoenix. Não, não e mais não. Varou os 30 anos como uma pálida lembrança de alguém que já havia sido extremamente relevante para o marketing da liga. até ser dispensado pelo Suns aos 34. Sim, para diversos críticos (oi!), era o fim.
Agora, no caldeirão que Rick Carlisle remexe e prepara com gosto, tudo parece ter um jeito, uma função. Carter foi mais uma contratação-tampão de Mark Cuban em 2011, depois de o proprietário ter implodido o time campeão, para desespero de Nowitzki. A ideia era adicionar veteranos produtivos, seguir em frente com um elenco minimamente competitivo, até que pudessem dar mais uma grande tacada no mercado – algo que não aconteceu exatamente, por mais que Monta Ellis esteja disputando sua melhor temporada. Nessa toada no ritmo de nós-trupica-mas-não-cai, Carter encontrou um novo nicho. Sem muita pressão, firmou-se na rotação, como um sólido chutador para espaçar a quadra ou assumindo mais responsabilidade quando Dirk está descansando, sem contar o fato de também ter se apresentado surpreendentemente como um valente marcador na primeira linha defensiva. Passou a se sentir tão bem que, ciente do final iminente de seu contrato, afirma já ter feito o suficiente pelo clube para merecer uma renovação. Aos 37 anos.
Depois da sensacional cesta da vitória contra o San Antonio Spurs neste sábado, Cuban vai ter de apelar realmente ao pragmatismo se quiser abrir mão do ala. Não custa rever o lance (até o momento em que o dono do clube invade a quadra para abraçá-lo):
Manu Ginóbili sofreu um leve empurrão e deixou o ala escapar por um instante, o suficiente para que seu oponente pudesse receber o passe. Mas o argentino se recuperou rapidamente e o pressionou no canto da quadra. Carter se contorceu e acertou um arremesso extremamente complicado. Valendo o jogo, a liderança da série. Justo ele, que ganhou, justo ou não, a fama de um dos grandes amarelões durante a década.''Às vezes você erra um arremesso importante, como em 2001, e você tem de liidar com isso por um tempo até receber a oportunidade novamente'', disse o ala, em referência ao chute em que errou em duelo com o Philadelphia 76ers de Allen Iverson nos playoffs de 13 anos atrás, pela semifinais do leste. Naquela ocasião, o ala viajou para a Carolina da Norte para participar de sua cerimônia de formatura durante a série, numa decisão que gerou muita polêmica e o perseguiu, basicamente, para sempre.
Com o jogo na linha, Carlisle não pensou em nada disso. ''Ele me disse: 'Ei, você vai receber a bola e vai matá-la'. Eu disse: 'OK, sem problema'. Na minha cabeça, eu já havia feito o arremesso antes mesmo de a jogada acontecer. Fico feliz que tenha dado certo'', afirmou o atleta, sem tanta empolgação assim para alguém que havia acabado de voltar ao grande palco da liga, num momento crucial para sua equipe. Gato escaldado, claro. Mas vivo, em busca da redenção que Nowitzki já teve.
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Aqui, uma compilação de 100 (!?) enterradas de Carter no auge. Imaginem se o YouTube e o Twitter estivessem vivos na época. Blake Griffin não teria chances, convenhamos:
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Seguem duas fotos do lance capital do terceiro jogo da série contra o Spurs, com o Mavs na frente por 2 a 1. Para mim, ainda mais espetaculares que o vídeo, com destaque para a segunda (o calcanhar quase mordiscando a linha e Manu saltando feito um louco):
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Por fim, o gráfico de aproveitamento de arremessos de Carter durante a temporada. Na quina esquerda da quadra, justamente o seu ponto preferido: