Parker faz terapia com título europeu apenas 3 meses após decepção em Miami
Giancarlo Giampietro
A gente não sabe como anda a cabeça de Gregg Popovich nestes dias, mas sobre Tony Parker podemos tranquilamente dizer que é, hoje, um dos caras mais felizes do mundo. O armador francês ignorou qualquer tipo de ''recomendação'' de seu treinador do San Antonio Spurs, decidiu encarar o EuroBasket aos 31 anos, mesmo com todo o desgaste – físico e emocional – que viveu na temporada passada da NBA e viu seu esforço premiado com um saboroso primeiro título continental.
Ok, obviamente esta não foi a primeira grande conquista da carreira do francês, que já ganhou o título da liga norte-americana em três ocasiões, sendo o melhor jogador das finais de 2007. Mas algo que me diz que soa muito melhor para o armador a combinação de ''silenciar a fanática torcida eslovena, dominar um batalhão de armadores de espanhóis e fechar a conta contra a Lituânia'' do que ''entortar os velhacos Eric Snow e Damon Jones'' na decisão.
Nos mata-matas, especialmente nas quartas e nas semifinais, Parker aprontou como o diabo em quadra e comandou uma talentosíssima seleção a um merecido e demorado título. Uma tremenda recompensa, considerando o esforço que fez nos últimos dias. Vejamos: dos grandes astros europeus trintões, foi um dos poucos a se apresentar para a disputa, enquanto gente como Dimitris Diamantidis, Juan Carlos Navarro, Pau Gasol e Dirk Nowitzki ficou fora.
Aqui, não se trata de uma crítica a essas craques que já se sacrificaram muito nos torneios Fiba durante a década passada e sofreram bastante com problemas físicos nas últimas temporadas, tendo um ou dois motivos razoáveis para pedir dispensa. Mas, antes disso, vale como uma nota de destaque para o francês, que também tinha tudo para abrir mão da competição, precisando de descanso para as articulações e, especialmente, para a cabeça, após a dolorida derrota para o Miami Heat.
Embora já pareça uma eternidade (né?) desde que testemunhamos os acontecimentos da final histórica da campanha 2012-2013 da NBA, só se passaram três meses e dois dias entre o Jogo 7 em Miami e o duelo França x Lituânia deste domingo. Muito pouco. Mas Parker decidiu fazer terapia em quadra e, ao lado do melhor amigo Boris Diaw e de Nando De Colo, pôde celebrar uma conquista que só pode ser reenergizante, ainda que às vésperas do início de mais um training camp pelo Spurs, na (glup!) Academia da Aeronáutica, pela qual Popovich se formou em 1970, lá numa época em que a Guerra Fria ainda era meio assustadora.
Os treinos pelo clube texano, aliás, recomeçam já na próxima segunda-feira, dia 30 de setembro. Isto é, não sobram nem dez dias para o armador respirar. Por isso, a princípio, Popovich, sempre muito metódico, controlador em sua abordagem de gestor, se manifestava preocupado com o eventual cansaço, para ficar num eufemismo, que poderia arrebatar seu francês favorito.
Agora, por outro lado, deve se sentir intimamente aliviado por não ter forçado a barra para vetá-lo – aliás, seria uma luta em vão também, pois o jogador já fez muito pela franquia, é bem grandinho e tem o direito de se preparar do modo como bem entende. No coração generoso do treinador, deve haver espaço para comemorar o fato de que ao menos três de seus rapazes conseguiram celebrar por alguma coisa relacionada ao basquete. E para Parker obviamente não foi qualquer coisa.
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Parker terminou o EuroBasket com médias de 19 pontos, 3,3 assistências, 2,1 rebotes e 50,7% nos arremessos, sendo eleito o MVP do torneio (veja sua ficha completa aqui). Mas a melhor notícia para Popovich, mesmo, talvez sejam os 29,6 minutos que ficou em quadra. Ainda que tenha disputado 11 partidas, algumas muito estressantes, no geral o astro foi preservado pelo técnico Vincent Collet.
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Ocupando o cargo desde 2009, Collet, 50, que não é treinador exclusivo da seleção francesa, ganhou uma justa renovação de contrato: seu vínculo com a federação agora vai até as Olimpíadas do Rio 2016.
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A enxurrada de franceses que invadiu a NBA durante a última década só serviu para atestar o potencial atlético de seu basquete. A coisa começou com Parker – se preferirem uma abordagem realmente cronológica, teríamos de lembrar o tenebroso Jerome Moiso nos anos 00 –, passou por Diaw, chegou a Batum e, no meio do caminho, envolveu uma sacolada de pivôs crus, mas fisicamente impressionantes. Entre eles, Alexis Ajinça, ele que, em Charlotte, já foi uma das milhares de vedetes de Larry Brown, para ser, pouco depois, prontamente desprezado pelo vitorioso e genioso treinador.
Não há como assistir o esguio pivô em quadra e não ficar impressionado – ele é praticamente a definição do termo ''potencial'' no basquete. Uma envergadura absurda e muita agilidade para alguém de seu tamanho. Neste EuroBasket, ele entrou na fogueira, cobrindo emergencialmente os desfalques de Joakim Noah, Ronny Turiaf e Ali Traoré e deu conta do recado, com médias de 9,1 pontos, 7 rebotes e 1,3 toco em apenas 19,2 minutos. Sua presença debaixo do aro foi importantíssima para solidificar a defesa dos campeões europeus e, no ataque, ele também se mostrou surpreendentemente eficiente para aproveitar a rebarba do que seus companheiros mais talentosos criavam, convertendo 54,5% de seus arremessos.
Ajinça foi draftado pelo Bobcats em 2008, quando, num destes treinos privados de última hora, encheu os olhos de Brown. A ponto de o técnico torrar o saco de seus patrões para que comprassem uma escolha extra na primeira rodada – a 20ª – para adquiri-lo. No total, em duas temporadas, o jovem pivô acabou jogando apenas 212 minutos pelo time de Charlotte. Trocado para o Dallas Mavericks e, depois, para o Toronto Raptors, teve de voltar para casa em 2011 com a confiança em frangalhos. No EuroBasket, mostrou estar, enfim, no caminho certo. Vale observá-lo na próxima temporada europeia.