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Arquivo : Adam Morrison

Exclusiva com JP Batista: na Euroliga, seguindo em frente
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Giancarlo Giampietro

JP Batista, agora em ação pelo campeão francês

JP Batista, agora em ação pelo campeão francês

Prestes a completar 33 anos, o pivô João Paulo Batista apenas segue em frente. Ao que parece, vai sempre pelas beiradas, mas construindo uma carreira única para os padrões brasileiros. Ele acabou de abrir sua nona temporada seguida na Europa, agora defendendo o Limoges, campeão francês, com direito a mais uma participação na Euroliga.

“Olha, é difícil de responder, pois fica um pouco fora do meu controle. Quem me conhece sabe de onde eu vim e o caminho que tive que percorrer pra chegar onde estou”, afirmou ao VinteUm, em generosa entrevista por email.

O pernambucano já está mais que acostumado a batalhar e ser, de certa forma, relevado. Acontece desde cedo, vindo de uma região que ainda está muito afastada dos principais centros de captação de talentos no país. Até chegou a jogar em São Paulo, por Paulistano e São José do Rio Preto, mas nada que prometesse muito. Resolveu, então, pegar as malas e embarcar em busca de um literal “sonho americano“.

É aquilo: você chega a uma cidade no interior dos Estados Unidos, sem saber exatamente o que te espera, sem falar inglês fluente – e “sem nada no bolso”, lembra –, apenas empenhado em fazer as coisas acontecerem. Que tal um junior college em Western Nebraska? Ou, quiçá, o Barton County Community College? Foi a rota que o pivô tomou, mesmo, até entrar no radar de times de ponta da NCAA. Entre um punhado de propostas, escolheu a de Gonzaga, na qual teria a companhia de um certo Adam Morrison – além do armador Jeremy Pargo, que a torcida do Flamengo conheceu tão bem neste mês e quem reencontrou recentemente:

Com seu cabelo desgrenhado, bigode ralo e meiões estendidos, Morrison havia virado uma coqueluche jogando pelos Bulldogs, com aparições regulares em ESPN, Sports Illustrated, New York Times e afins. Em 2006, a equipe estava debaixo do holofote nacional, mas não quer dizer que JP estivesse dominando o noticiário. De qualquer maneira,  era uma das peças mais importantes do time e ao menos ganhou a atenção de quem mais valia. “Ele é o nosso herói anônimo”, afirmou, na época, o técnico Mark Few, sobre o atleta de médias de 19,3 pontos e 9,4 rebotes. “Ele segue entregando, entregando e entregando todas as noites para nós.”

Em Gonzaga, luzes, ainda que para outro, e o serviço sujo bem feito

Em Gonzaga, luzes, ainda que para outro, e o serviço sujo bem feito

Gonzaga acabou caindo precocemente naquele torneio, perdendo na terceira rodada para uma UCLA de eventuais cinco jogadores de NBA (Arron Afflalo, Jordan Farmar, Luc Richard Mbah a Moute, Darren Collison e Ryan Hollins). Com o pessoal de sua turma, está sempre em contato. “Todas as férias vou para lá treinar”, afirma. Neste ano, encontrou Morrison, que está concluindo seus estudos e estudando a possibilidade de virar técnico.

No Draft de 2006, João Paulo passou batido. Disputou uma liga de verão pelo Minnesota Timberwolves, mas foi se profissionalizar, mesmo, apenas na Europa, pelo Lietuvos Rytas, da Lituânia. Está na Europa desde então, numa carreira bastante sólida – e incomum para brasileiros, ainda que poucos deem bola. Já são oito anos por lá.

Sobre a seleção? Neste longo intervalo, foi chamado por Lula Ferreira em 2007, sendo campeão pan-americano. Participou também do fatídico Pré-Olímpico de Las Vegas 2007, assim como da campanha do Pré-Olímpico mundial em 2008, já com Moncho Monsalve, num elenco dizimado por desfalques. Seguiu no time para ser campeão da Copa América de 2009. Na gestão de Rubén Magnano, porém, só foi lembrado em duas ocasiões e sempre de última hora, em situações emergenciais. Em 2010, foi o substituto de Nenê, cortado por lesão. Em 2013, para mais uma Copa América, teve de interromper suas férias no Recife para novamente socorrer o argentino. O time foi um desastre, mas, nos poucos minutos que teve, o massa-bruta rendeu.

Mas precisamos entender: aos 32 anos, JP continua bastante produtivo em quadra, mesmo sem nunca ter sido um dos pivôs mais atléticos – pelo contrário. Forte toda a vida, joga com os pés no chão, um jogo terreno, de feijão com arroz, que dificilmente vai gerar lances de arromba, que virem sucesso no YouTube. E não tem problema: o basquete não seria feito só de acrobatas ou velocistas. Não se trata de um jogador perfeito, claro. Sua movimentação limitada pode ser explorada na defesa. Com pouca envergadura, também não é o protetor do aro mais temido. Por outro lado, com discrição, inteligência e seriedade, porém, começa sua terceira campanha de Euroliga, pelo Limoges, após jogar seis temporadas pelo Le Mans.

Dois pontos de João Paulo pelo campeão francês Limoges

Dois pontos de João Paulo pelo campeão francês Limoges

Na entrevista abaixo, ele nos conta sobre sua experiência no basquete francês, mas não se sente tão confortável em falar sobre a baixa popularidade em sua terra, para a qual pensa em voltar o quanto antes. Aliás,  o pivô revela ter entrado em negociações sérias com o Flamengo neste ano e que estava preparado para fechar um contrato, só para ver o negócio desfeito na última hora. Assinou, então, por mais duas temporadas com Limoges. Confira:

21: Depois de seis anos no mesmo clube, você chega ao Limoges, atual campeão francês. Como tem sido sua adaptação? Há muita diferença no estilo de jogo de um time para o outro?
JP: Minha adaptação tem sido muito boa. Sou um jogador de mente aberta e com facilidades de me adaptar rapidamente. O sistema do meu novo treinador é muito parecido com o que eu joguei os últimos seis anos, facilitando ainda mais.

Qual a sua expectativa para a Euroliga deste ano? A meta é chegar ao Top 16? Dá para sonhar mais alto? O clube chega para brigar nas duas frentes: continente e defesa do título nacional?
Acho que Maccabi é CSKA são os gigantes no nosso grupo. Muito superiores devido ao seu maior orçamento etc. Estamos com um time muito interessante neste ano e podemos surpreender. Não tem muita gente acreditando em nossa equipe, mas temos confiança e vamos brigar por uma vaga no Top 16, que é o nosso objetivo na Euroliga. Sem dúvida temos um time forte e vamos brigar pelo título francês.

A posição de pivô é a mais concorrida do basquete brasileiro há muito tempo. São vários grandalhões na NBA, outros jovens que surgiram nos últimos, e tudo o mais. Você acha que, nesse contexto, acabou ficando um pouco esquecido ou subestimado em seu país, embora tenha uma carreira bastante sólida na Europa?
Olha, é difícil de responder, pois fica um pouco fora do meu controle. Quem me conhece sabe de onde eu vim e o caminho que tive que percorrer pra chegar onde estou. Devido à pouca popularidade do basquete no Brasil acho que a mídia sempre deu muito foco a NBA, Euroliga e ACB e pouco ao resto.

No ano passado, JP e a seleção não renderam em fiasco na Copa América

No ano passado, JP foi chamado de última hora para a Copa América

Saindo de Olinda, longe dos grandes centros de basquete do Brasil… Depois fazendo sua trilha nos Junior Colleges até chegar a Gonzaga… Pelos Bulldogs, era um dos coadjuvantes do Adam Morrison… E agora vai tocando sua carreira na Europa, na França, indo sempre pelas beiradas, seguindo em frente. Essa, digamos, discrição seria algo que te ajudou?
Sem dúvida. Acho que passei um pouco despercebido pelo Brasil, quando joguei pelo Paulistano e São José do Rio Pardo. Agarrei com unhas e dentes quando a oportunidade de ir pros EUA apareceu, e hoje agradeço a Deus todos os dias por estar vivendo o que sempre sonhei quando criança.

Você ainda mantém contato com seus companheiros de Gonzaga? Quando falou pela última vez com o Morrison?
Sim, mantenho um pouco de contato com a maioria. Todas as férias eu volto para lá para treinar. Vi Morrison em julho, quando estive pela universidade. Ele está terminado seus estudos e fazendo parte da comissão do time masculino de Gonzaga como voluntário, para ganhar experiência.

Daqueles tempos do basquete universitário americano, qual a lembrança mais forte que tem? O jogo em que foram eliminados no Torneio Nacional? Ou  as coisas mais corriqueiras, dos tempos de estudante, como o esforço de chegar aos EUA sem saber direito o que seria de sua vida por lá?
Sem dúvida a eliminação do torneio da NCAA doeu um pouco. Mas foram muitos obstáculos no caminho, ainda mais por ir para os Estados Unidos sozinho, sem saber o que esperar, sem nada no bolso. Tinha somente a fé e a determinação de vencer como pessoa e como atleta, e isso vai sempre marcar mais.

Você começou sua carreira profissional pelo Lietuvos Rytas, num verdadeiro “país do basquete”. Como foi sua experiência num país desses?
Na Lituânia realmente foi uma experiência única. É um lugar onde o povo respira basquete. É como o futebol no Brasil. Sem palavras.

JP quase fechou com o Flamengo. Mas joga de alviverde, mesmo, este ano

JP quase fechou com o Flamengo. Mas joga de alviverde, mesmo, este ano

Sabemos que, embora o orçamento dos clubes não esteja entre os maiores da Europa, a liga é muito bem organizada do ponto de vista financeiro. O que mais você pode nos contar nesse sentido, em relação ao que se faz no restante da Europa? Já teve problemas com salários atrasados, por exemplo? Que tipo de lição a Liga Nacional Brasileira poderia tirar daí?
Uma das razões pelas quais estou aqui por tanto tempo é devido a essa estabilidade da liga e do país. Nunca recebi um salário atrasado aqui na França. O basquete aqui é muito bem divulgado, e a cobertura pela TV, muito boa e organizada. Os ginásios estão muito bem estruturados e limpos. E o campeonato tem cinco divisões. Acho que o basquete tem evoluído muito no Brasil, mas, num país dominado pelo futebol, a exposição é muito pouca. Futebol é muito popular aqui, mas, mesmo assim, tem transmissão de jogos de basquete quase todos os dias na TV.

Em termos de resultado de seleção, o basquete francês talvez viva seu melhor momento na história. Qual o impacto das recentes conquistas para a liga francesa, em termos de investimento e público?
O basquete sempre foi um esporte de boa popularidade aqui na França. Estes últimos resultados só têm ajudado ainda mais a valorizar o investimento que sempre foi feito, com mais eventos envolvendo torcedores etc. As grandes empresas estão investindo sem medo, e a criançada, se interessando cada vez mais.

Os times franceses estão constantemente revelando talentos, em geral muito atléticos. Tanto que o país é aquele que tem hoje o maior número de estrangeiros na NBA. Como acontece essa integração dos garotos da base? Existe alguma obrigação nesse sentido, ou é algo que acontece mais devido a circunstâncias de mercado?
O campeonato juvenil acontece paralelamente ao adulto. E todos os times da primeira divisão fazem um trabalho de base espetacular. Todas equipes fornecem alojamento, educação e alimentação a todos jogadores do cadete e juvenil. E aí os jogadores de talento do juvenil são integrados à equipe profissional para treino e jogo. Geralmente uns dois ou três. A maioria acaba sendo revelada desta forma.

Para fechar: seu contrato com o Limoges é de dois anos, né? O segundo ano é totalmente garantido? Você tem algum tipo de plano para quando o vínculo se encerrar? Pensa em jogar o NBB?
Sim, assinei um contrato garantido de dois anos. Quero muito voltar ao Brasil. Fui sondado pelo Flamengo em junho quando meu contrato em Le Mans terminou. Infelizmente não conseguimos entrar em acordo e ao mesmo tempo tinha a proposta do Limoges com um prazo para dar uma resposta. Confesso que estava pronto pra fechar com o Flamengo, mas infelizmente não deu certo.


Queridinho da América dá sua última cartada para tentar voltar à NBA
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Giancarlo Giampietro

Adam Morrison, Summer League Las Vegas 2012

Em 2005 e 2006, Adam Morrison foi um dos queridinhos da América. Com estilo hipster e muitas, mas muitas cestas, ele colocou a cidade de Spokane, sede da universidade de Gonzaga, láaaa no Noroeste dos Estados Unidos, no mapa esportivo do país.

Hoje, seis anos depois, ele afirma ter dado, na liga de verão da NBA de Las Vegas, sua última cartada para seguir no basquete profissional. O que aconteceu para seu conto de fadas chegar a esse ponto?

Bem, longa história.

*  *  *

Adam Morrison, darling da NCAAComeçando pelo conto: em sua temporada de junior (terceiro ano no College), 2005-2006, marcou 28,1 pontos por jogo e foi o cestinha de todo o basquete universitário. Por cinco vezes, quebrou a barreira dos 40 pontos, algo considerável na competição, mesmo se fosse contra adversários não tão respeitáveis.

Chamava atenção seu estilo de velha escola, com uma habilidade para acertar arremessos de todos os pontos da quadra, mesmo sem ser o mais explosivo ou atlético, longe disso. O cabelo era volumoso, com a franja estendida por toda a testa, o bigode, ralo, as meias escuras ficavam estiradas até a canela, num visual incomum para jovens de sua geração. Para completar seu status cult, também ajudavam bastante injeções de insulina que podia receber até mesmo no banco de reservas para controlar a diabete, diagnosticada aos 13 anos.

Seus feitos ocupavam manchetes pelo país e dominavam o noticiário dos canais esportivos nas TVs fechadas. Era um darling, mesmo. A cena em que desaba na quadra, chorando muito, após uma derrota para UCLA nos mata-matas da NCAA, gerou muita repercussão. Uns elogiavam sua paixão pelo jogo, outros questionavam se ele era forte mentalmente para seguir adiante.

Em 2006, pulando seu último ano universitário, foi draftado em terceiro pelo Charlotte Bobcats. Michael Jordan, que havia acabado de assumir o controle das operações de basquete da franquia, dava seu aval.

*  *  *

Uma vez na NBA, o choque de realidade foi embaraçoso. Morrison tinha séria dificuldade para marcar seus oponentes, geralmente muito mais ágeis e mais fortes, penava para bater os 40% no aproveitamento de arremessos de quadra. Terminou o ano de calouro na reserva e mal-afamado. No início de sua segunda temporada, para piorar, sofreu uma grave lesão no joelho, perdendo todo o campeonato. Em 2009, foi trocado para o Lakers.

Adam Morrison, Draft BobcatsCom Phil Jackson, foi bicampeão da NBA, mas mal saía do banco, enquanto o ala Shannon Brown, que o acompanhou na transação e nada badalado, se tornava uma peça importante na rotação. Em 2010, foi dispensado pelo clube californiano.

Virou piada para os jornalistas, sempre lembrado como o caso de alguém que havia fracassado na liga. Desde então, tenta regressar sem sucesso. Jogou pelo Estrela Vermelha, na Sérvia, onde foi bem. Quando se transferiu para o Besiktas, da Turquia, voltou a se afundar na reserva, rompendo seu contrato em fevereiro deste ano.

*  *  *

“Estou aqui para ver se algo pode acontecer”, afirmou Morrison, antes de disputar a Summer League de Las Vegas pelo Los Angeles Clippers. Em Orlando, ele jogou pelo Brooklyn Nets. “Se eu jogar bem, talvez eu ganhe uma chance aqui ou talvez por outro time da NBA.”

Se não der certo? Ele descarta voltar para a Europa. “É muito longe e tenho duas filhas agora. Estou muito certo de que se nada acontecer agora, provavelmente eu irei para casa, concluirei meu curso (administração esportiva) e vou virar um técnico. Há um certo prazo para você perseguir algo. Se não der certo, então é hora de seguir em frente.”

Adam Morrison, cabeleira, mas sem bigodeNeste domingo, naquele que pode ter sido, então, seu último jogo como um profissional de basquete, ele marcou 26 pontos em 29 minutos contra o Celtics de Fabrício Melo. Converteu 9 de seus 15 chutes de quadra, quatro em seis de três pontos. Foi aplaudido pelos torcedores e até ouviu gritos de “M-V-P”. Mesmo que de brincadeira, gostou. “Nos últimos seis anos, eu fui só vaiado. Então foi bom isso”, afirmou.

Em Vegas, ele anotou 20 pontos por partida, com 55,1% nos chutes de quadra e incríveis 61,9% nos três pontos. “Só queria mostrar para as pessoas que posso jogar. Muito foi dito sobre mim, de que sou apenas um reserva, o que entendo”, afirmou. “Mas vim para cá muito por orgulho, para mostrar o que posso fazer. Se não der certo, posso dizer que estou feliz pelo que fiz e mudarei para algo diferente”.

Será que é o fim da linha ou a América se mostrará como aquela terra de segundas chances para o ala?

No Clippers, pode ser difícil, depois da contratação de Grant Hill e Jamal Crawford. Mas talvez haja algum clube por aí empenhado em testá-lo. A história precisa, realmente, de um final.


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