Vinte Um

Brasil supera traumas, anula e Scola e mete 20 pontos na Argentina

Giancarlo Giampietro

Nenê e seus comparsas dessa vez dominaram Scola, abrindo caminho para sacolada

Nenê e seus comparsas dessa vez dominaram Scola, abrindo caminho para sacolada

O começo de jogo não poderia ser mais preocupante. Luis Scola terminou o primeiro quarto com apenas dois pontos, e a Argentina estava na frente por 21 a 13, bombardeando da linha de três pontos. Então ficava aquela impressão: você tira o cabeleira do jogo e abre o perímetro. Se for brecar os tiros de fora, vai deixar o cara jogar? Como se as coisas fossem excludentes.

Hoje, Scola joga muito mais flutuando do que próximo da cesta. Segurar o velho carrasco na cabeça do garrafão e fiscalizar os arremessos eram tarefas que poderiam ser enquadradas no mesmo plano, e, quando isso passou a acontecer, o Brasil deslanchou em quadra, caminhando para uma vitória há muito tempo aguardada sobre os rivais sul-americanos em um mata-mata de respeito: 85 a 65, e a vaga nas quartas de final conquistada. A Sérvia é o próximo obstáculo, na quarta-feira.

"Wild Thing". Um dos melhores apelidos do basquete atual, fazendo justiça a um Anderson Varejão dominante nos rebotes: 5 ofensivos _ 8 pontos e 4 assistências numa grande atuação

''Wild Thing''. Um dos melhores apelidos do basquete atual, fazendo justiça a um Anderson Varejão dominante nos rebotes: 5 ofensivos _ 8 pontos e 4 assistências numa grande atuação

Na defesa e nos pormenores do jogo interno, os pivôs foram totalmente dominantes na zona pintada e seguraram o craque argentino com uma linha estatística irreconhecível: 7 pontos, 7 rebotes e 2/10 nos arremessos, mais os frustrados 3/8 nos lances livres. Além disso, Raulzinho veio do banco totalmente confiante, ignorando por completo a idade que seu RG mostra, 22 anos, caçula da equipe, marcando 17 pontos em 22 minutos, acertando 8 de 9 arremessos.

Uma revelação em quadra o armador, ajudando o Brasil a conquistar sua terceira vitória contra a Argentina em jogos em que Scola estivesse em quadra, depois de sete derrotas em nove confrontos. Os argentinos sentiram a falta de Manu Ginóbili durante todo o torneio – mas já haviam batido os brasileiros sem o genial ala-armador do Spurs antes. Dessa vez, porém, com um elenco cheio de improvisos, mesmo com o fator emocional e o retrospecto ao seu lado, não tiveram forças para lidar com a seleção brasileira.

Eles só se deram bem, mesmo, por dez minutos. No primeiro quarto, os brasileiros permitiram que os hermanos acertassem cinco bolas de fora, 15 pontos, equivalendo a 71% do escore deles. Pablo Prigioni, de uma hora para a outra, havia se transformado num Stephen Curry, acertando todos os seus chutes – terminou o primeiro tempo com 100% de quadra e 15 pontos na sua conta.  Sabemos que o veterano argentino não é tão produtivo ou arrojado assim com a bola em mãos. Nunca foi. Suas oportunidades surgiam com base na movimentação de bola de um ataque muito espalhado.

Sem referências internas, o adversário jogava com até cinco atletas flutuando. Por dez minutos e um pouco mais, a defesa brasileira simplesmente permitiu muitos chutes livres. A partir do momento em que acertou suas rotações – novamente com participação decisiva e muito mais atenta de Alex, Larry e Raulzinho – sim, o armador foi primeiro importante na defesa, para depois arrebentar no ataque, matando seus arremessos de todos os cantos. Ajudou, claro, o acúmulo de faltas de Scola também, que teve de descansar por quase todo o segundo período. Quando ele voltou, porém, sua presença não foi o suficiente para desequilibrar novamente a defesa no perímetro.

Garrafão: território brasileiro
As faltas anotadas contra Scola e sua ineficácia geral na partida foram consequências diretas do impacto dos pivôs brasileiros (mais tamanho, mais força física, mais agilidade e disposição para prevalecer no jogo sujo e nas pequenas tarefas). Splitter, Nenê e Varejão marcaram 21 pontos somados. Aí numa análise mais rasa, pode-se até pensar que foram mal, que espera-se muito mais deles, e tal cousa, e lousa, e maripousa, como diria o Alberto Helena. Mas realmente não dá para cobrar muito mais dos grandalhões, como outros números igualmente importantes atestam. Por exemplo: eles deram 11 das 16 assistências brasileiras.

O fato é que os três foram agressivos durante toda a partida e, aos poucos, com persistência e inteligência,  controlaram o garrafão – especialmente depois do intervalo. No terceiro período, a equipe nacional apanhou o dobro de rebotes ofensivos que havia obtido em toda o primeiro tempo, chegando a nove. Varejão foi o destaque aqui, atacando a tábua de ataque sem parar, atropelando um guerreiro como Andrés Nocioni no meio do caminho. O capixaba terminou cinco rebotes do lado argentino da quadra. Splitter apanhou mais três. O trio somou 21 rebotes. Para comparar, no total, a Argentina teve 26 (contra 39 do adversário). Ressalte-se aqui também os oito rebotes de Marquinhos, um fundamento que nunca foi o seu forte. O ala estava energizado.

Com mais posses de bola, oprimindo e desmoralizando a defesa argentina no jogo interno, o Brasil passou a afinar seu ataque, elevando atee mesmo sua produção nos tiros de fora, saindo de 2/11 no primeiro tempo (18,8%) para 8/18 na segunda etapa (44,4%). Outro mundo. A mínima troca de passes envolvendo os pivôs representava um desafio para os adversários, que formaram uma seleção sem envergadura e capacidade atlética. Tiveram muita dificuldade para contestar.

Depois de tomar 5 em 9 disparos até a metade do segundo quarto (55,5%), a seleção limitou seus oponentes a apenas 4 dos próximos 17 (23,5%) até que Salem Safar procurou sacudir as coisas no quarto final. Quando a vantagem brasileira já era superior a 10 pontos. Não seria o ala reserva argentino que alteraria o panorama do jogo. A essa altura, a Argentina estava basicamente rendida, sem ter a quem recorrer para fazer frente a um time muito mais atlético, sem nenhum vestígio de temor do seu lado. Dessa vez, não houve retrospecto, não Scola, nem nada que impedisse a seleção brasileira de avançar.