Ano novo, vida nova? As figuras da NBA que pedem uma virada
Giancarlo Giampietro
Para muitos, a carreira de Danny Granger já estava encerrada. O ala havia passado por uma cirurgia no joelho esquerdo em abril de 2013, por conta de uma tendinose (sim, existe tendinite e a tendinose) que simplesmente não o deixava em paz. O veterano mal havia participado da campanha 2012-2013, fazendo tratamentos alternativos, separado do restante do elenco do Indiana Pacers, na esperança de se aprontar para ajudar a emergente equipe em batalhas com o Miami Heat. Não deu certo, e acabou indo para a sala de operação.
Depois de uma lenta recuperação, retornou ao Pacers para a campanha 2013-2014, já transformado, na melhor das hipóteses, em sexto homem, perdendo terreno para Paul George e Lance Stephenson. Por 29 partidas, ele simplesmente não conseguiu encontrar seu ritmo ideal. Não passou de 36% no aproveitamento dos arremessos – estatisticamente, na verdade, era o pior rendimento de sua carreira, muito pior até mesmo do que seu ano de novato, beeeem distante da forma que lhe valeu uma única indicação a All-Star em 2009. O desempenho foi tão aquém do esperado que Larry Bird, na ânsia de conseguir mais um trunfo para tentar, enfim, desbancar LeBron e Wade, não viu problema em despachar seu capitão para a Sibéria Filadélfia, em troca do irregular Evan Turner. Quer dizer: Bird desistitiu de Granger.
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O veterano rescindiu seu contrato com o Sixers e fechou com o Los Angeles Clippers, do outro lado do país, ao menos se encaixando em outro time com aspiração ao título. Vindo do banco, conseguiu elevar seu rendimento a um patamar minimamente satisfatório, mas sem lembrar em nada uma força ofensiva que fosse ameaçadora. Daí a surpresa quando Pat Riley, pressionado, talvez num ato de desespero, escolheu o ex-ala do Pacers, seu antigo rival de playoffs, num pacote de reforços de última hora ao lado de Josh McRoberts para tentar convencer LeBron a ficar na Flórida. Claro que não deu certo.
O Miami fechou, então, com Luol Deng para cobrir a lacuna aberta no quinteto titular – mesmo que essa fosse, em teoria, uma posição que Granger pudesse ocupar. A verdade era que Riley e o técnico Erik Spoelstra ainda não sabiam exatamente o que esperar do ala, ainda mais depois de ele ter passado por uma segunda cirurgia no joelho dois meses antes de se apresentar ao clube. Só imaginavam que, dado o histórico do clube para reabilitar quase-aposentados (desde os tempos de Tim Hardaway nos anos 90, até os mais recentes casos de Rashard Lewis e Chris Andersen), valia a aposta. ''Não sabíamos o estado dele para valer, mas conhecíamos nossos próprios registros com casos semelhantes, vindo de lesões, por volta dessa idade. Sabíamos que, se eles se comprometessem a trabalhar, que talvez eles precisassem da oportunidade certa, no lugar certo'', diz Spo.
Vendo o que o ala realizou nas últimas partidas, pode ser que tenha sido uma cartada certeira. ''Era para ser um processo longo, mas ele já está adiantado. Pensávamos que isso iria acontecer só no Ano Novo'', afirmou. Granger primeiro recebeu minutos nas 11ª e 12ª partidas do Miami. Depois, nas 18ª e 19ª. Voltou a ser aproveitado entre as 22ª e 24ª. Não animou muito e ficou parado por mais quatro jornadas, até ser inserido de vez na rotação. Então, no jogo mais esperado do calendário, com o retorno de LeBron no dia de Natal e transmissão, ele marcou 9 pontos, cinco dos quais em um momento crucial do quarto período, para esfriar uma reação do Cleveland Cavaliers. Nas duas partidas seguintes, marcou 39 pontos e converteu 70% dos seus arremessos, saindo do banco, com direito a oito cestas de três pontos. ''O que ele fez neste último par de jogos foi fenomenal'', afirmou Dwyane Wade.
Claro que está muito cedo para celebrar dessa forma. O desafio do jogador é justamente sustentar uma sequência produtiva, consistente e com durabilidade, algo que não acontece há mais de dois anos. Nesse caso, não bastaria apenas a conversão de seus arremessos feito um James Jones, mas também se pede boa movimentação pela quadra, especialmente na defesa – o Miami precisa de toda a ajuda possível neste momento.
De qualquer forma, sabe da melhor? A crescente de Granger veio justamente nas vésperas de seu reencontro com o Indiana Pacers. Dá para ter melhor timing que esse? E mais: precisava ser justamente nesta quarta-feira, na noite da virada de ano? Não poderia ser mais emblemático, mesmo.
Agora, num universo de mais de 400 jogadores, são diversos os atletas que precisam de, senão de um recomeço, ao menos de um momento de virada em suas carreiras:
– Todo o elenco do New York Knicks: Quer dizer, menos Cole Aldrich, Quincy Acy e Travis Wear, para quem a vida anda muito bem, obrigado. De resto, na pior campanha da história da franquia, o povo anda numa penúria que só. Se for para escolher um nome, porém, ficaríamos entre JR Smith e Andrea Bargnani. O ala-armador sempre foi o principal candidato a estranhar e odiar o sistema de triângulos. Esfomeado, de vista que só enxerga bem a cesta e nada mais, está agora convenientemente afastado de quadra devido a uma ruptura na fáscia plantar (algo que, acho, podemos traduzir como ''sola do pé'' no populacho). Já Bargnani não jogou sequer um minuto na temporada, por conta de uma ruptura de tendão no cotovelo. Sua estreia pode acontecer também nesta quarta, contra o Sixers. Difícil é encontrar alguém que ainda confie nesses caras. Smith só fez seu desempenho cair desde sua participação desastrosa nos playoffs de 2013. Para o italiano, Nova York, na verdade, já representava uma chance de recomeço, ao sair escorraçado de Toronto. Phil Jackson já disse que não topa nenhuma negociação que vá atrapalhar os planos dos Bockers no mercado de agentes livres. Não vai receber nenhum contrato indesejado que dure mais que os atuais.
– Bem, Josh Smith já ganhou, de certa forma, sua Mega-Sena da virada particular.
– Andrei Kirilenko: pobre AK-47. Sob o comando de Jason Kidd, o ala tinha tudo para brilhar em Brooklyn, considerando a predisposição do jovem treinador para fazer o uso máximo de atletas híbridos, versáteis. Aí as costas não deixaram. Quando alegou estar bem fisicamente, veio Lionel Hollins, um técnico que conseguiu belos resultados em Memphis, mas que tem visão beeeem quadrada sobre o basquete (''Pivô bom? Só se jogar de costas para a cesta'' etc.) Aí que o russo foi afastado da rotação, sem muita explicação, até se tornar o mais novo caso de banimento para a Filadélfia.A ironia é que, quando Kirilenko fechou com o Nets em 2013, houve uma choradeira geral na NBA: a de que havia um acordo por fora com o compatriota Mikhail Prokhorov, uma vez que ele havia aceitado um salário bem inferior ao seu valor de mercado.
Funciona assim, a propósito: a) um time precisa se livrar de um contrato, seja para abrir espaço no teto salarial, ou para diminuir as multas por excesso de gastança; b) o gerente geral liga para Sam Hinkie, chefão do Sixers, o time que nem mesmo cumpre a folha salarial mínima da liga e tem espaço para absorver qualquer tranqueira; c) Hinkie vai levantar o inventário do time que está ligando, para, d) rapelar mais algumas escolhas de Draft, até chegar o momento em que Philly vai ter 98% dos picks de todas as segundas rodadas da década; e) contrariado, mas sem ter muito o que fazer (ao menos ele vai economizar uns tostões, o que sempre agrada a qualquer proprietário de franquia), o cartola paga tudo o que o algoz solicita.
Foi o que aconteceu com Kirilenko. E pior: ao contrário da maioria dos atletas despachados para lá, Hinkie quer que o russo realmente se apresenta para jogar. Não porque conta com o medalhista de bronze olímpico para reforçar sua equipe, mas, sim, por vislumbrar uma nova troca para ele daqui a um mês – se ele jogar bem, vai aparecer algum time que sonhe com o título a pagar ainda mais pelo cara, saca? Mais escolhas de Draft! Obviamente que o russo não quer saber de virar um peão num joguete desses. Ele só quer liberdade. Se for dispensado, imagine se o San Antonio Spurs encontra um meio de contratá-lo (rompendo, vá lá, com Austin Daye)? O mundo precisa disso.
– Deron Williams: Por falar em Brooklyn Nets, conheça o astro de US$ 20 milhões (US$ 19,8 mi, para ser mais preciso) que conseguiu uma proeza: virar reserva de Jarret Jack! Nada contra o novo titular, gente. Mas é que o veterano sempre foi conhecido em sua carreira justamente como o principal concorrente de Steve Blake à condição de ''armador reserva dos sonhos de todo e qualquer treinador''. Ao menos por hora, acabou essa história para Jack. Deron perdeu duas partidas devido a uma contusão na panturrilha e, quando voltou, estava no banco. Em entrevista pós-jogo, supôs que era por medida cautelar de Lionel Hollins. Ao que o treinador respondeu: ''Não sabia que eu estava controlando os minutos dele''. Ui. Será que Sacramento, então, ainda topa conversar a respeito? Veja bem, Vivek. Já sabemos que vocês querem o Mason P, que está jogando demais, mesmo, e seria ótimo complemento para o Boogie. Mas… repare que o Sacramento está caindo pelas tabelas na conferência! E que isso talvez não tenha a ver com a meningite mardita que tirou o Boogie de ação, ou com a demissão de um técnico que havia colocado o time em boas condições de competir! O que isso significa? Significa que é hora de fazer mais uma troca por um astro renegado! Deu certo com o Rudy Gay, vai dar certo com o Deron também! Tro-ca já.
– Lance Stephenson: é, Lance, a essa altura, você tem de agradecer pela lesão que Al Jefferson sofreu na virilha, que vai tirar o pivô de quadra por um mínimo de quatro semanas. Ufa, né? Pois estava ficando feio: foi só o ala-armador sair de cena com uma torção pélvica (!?!?), que o Charlotte Hornets começou a vencer. Eram quatro triunfos consecutivos já, reforçando a tese de que o talentoso e intempestivo jogador era o problema. Segundo o RealGM, porém, tanto a diretoria quanto Stephenson chegaram a um consenso de que ainda está cedo para romper. Da parte do clube, resta saber apenas se isso não foi motivado pelo simples fato de que as ofertas que chegaram não animavam muito. O Indiana Pacers, por exemplo, flertou com a possibilidade de repatriá-lo. Ao que parece, segundo diversas reportagens, seus antigos companheiros não se animaram muito com a ideia, não. Então parece que, se quiser encontrar paz, Stephenson vai ter de se virar em Charlotte, mesmo, ajudando Kemba Walker, em vez de se meter no caminho do armador, especialmente num momento sem Jefferson.
– David Blatt: cogitar a demissão de um treinador estreante na NBA, com menos de seis meses no cargo? As coisas em Cleveland parecem não mudar nunca, mesmo, com trono ocupado ou vazio. O Cavs ainda deixa a desejar na defesa, é verdade, especialmente a proteção do garrafão, algo que sempre foi uma preocupação, devido a sua dependência de Anderson Varejão. Havia uma carência clara no elenco. Caberia a Blatt encontrar algum sistema para remediar isso, claro, e até agora não rolou. Talvez os jogadores não estejam escutando Blatt? Pois é. Mas essa não foi a mesma história com os últimos dois treinadores que passaram por lá? Irving e Waiters são reincidentes. Além disso, LeBron tem um comportamento no mínimo suspeito desde que voltou. Berra com companheiros em quadra, enquanto ele mesmo demora para voltar na transição defensiva. Diz a repórteres que estava em ''modo relaxa-e-goza'' contra o Orlando Magic, depois de uma preocupante derrota na véspera, para o Miami. Não importava, então? Ele age como se tivesse conquistado tudo de que precisava e, agora, era hora apenas de curtir o fato de estar perto de caso. No mesmo jogo contra o Heat, Kevin Love perdeu rebotes para Mario Chalmers e Norris Cole, enquanto vagava emburrado pela quadra. Enfim, Blatt, de um jeito ou de outro, vai precisar assumir as rédeas aqui. Segundo diversas fontes que trabalharam com ele na Europa, trata-se de um sujeito sensacional, que merece melhor sorte em sua grande chance nos EUA. A diretoria vai lhe dar apoio? Ou morrem de medo de LeBron para tomar alguma decisão que possa contrariá-lo?
– Anthony Bennett: que o canadense fosse perder minutos para Robbie Hummel realmente não era algo que Flip Saunders tinha em mente quando fechou, enfim, a troca de Kevin Love.
– Kobe Bryant: ele também é outro que já desfruta de um recomeço, após tantas lesões que lhe roubaram muitos meses preciosos nesta reta final. Mas para o astro do Lakers a temporada 2014-2015 não poderia passar rápido o suficiente. De qualquer forma, sabemos que ele arremessar 30 vezes por jogo não parece a solução num time fraquíssimo, embora os torcedores do Lakers adorem. Não dá para ser herói com esse time. Resta, então, passar a bola e liderar de um jeito bem diferente ao que se acostumou a fazer em uma vitoriosa – e conflituosa – carreira. Que tal?
PS: Desejo aqui um ótimo 2015 a todos – aqueles que estejam em busca de seu próprio recomeço, os que estão na crista da onda e, claro, o pessoal que toca tudo numa boa, sem tantas peripécias assim para contar, mas que não se enganem: como o filmaço Boyhood – a melhor coisa de 2014 – ensina, até a vida vida mais regular já é um grande acontecimento.