Chicago Bulls: a hora é agora para um time reforçado
Giancarlo Giampietro
30 times, 30 fichas para a temporada 2014-2015 da NBA
As enquetes promovidas pelo NBA.com antes de uma temporada começar são imperdíveis. Servem como um belo termômetro sobre a liga, uma vez que os entrevistados são os 30 gerentes gerais das franquias, as (supostas?) cabeças pensantes que movem as engrenagens competitivas do campeonato. Na edição deste ano, na hora de falar sobre os técnicos, Gregg Popovich foi unanimidade. Nenhuma surpresa, até aí: 92,9% dos votos para melhor treinador; 57,1% para melhor motivador; 46,4% para aquele que faz os melhores ajustes dentro de um jogo; por fim, 77,8% para aquele que coordena o melhor ataque.
E o que Popovich tem a ver com o Bulls? Nada. Mas, fora a aclamação ao treinador do Spurs, outro ponto chama a atenção nessa pesquisa: Tom Thibodeau foi o segundo treinador mais mencionado. Em uma categoria, aliás, ele bateu Pop – como aquele que tem, claro, a melhor defesa, recebendo 92,9% dos votos. De todas as perguntas feitas, todavia, apenas em uma Thibs não foi mencionado sequer uma vez. Vocês sabem: aquela sobre sistemas ofensivos. A combinação dessas duas notas diz muito sobre o que se espera – e o que se vai cobrar – do comandante do Chicago para a temporada.
Desde que assumiu o cargo, Thibodeau levou o Bulls a quatro campanhas vitoriosas, com aproveitamento geral de 65,7%. Excelente. Este é o 12º melhor aproveitamento da história da NBA, acima até de Pat Riley e Stan Van Gundy, por exemplo. Entre os técnicos em atividade, só fica atrás de Gregg Popovich (quarto, com 68,6%) e Erik Spoelstra (11º, com 66%). Phil Jackson é o líder, para constar: 70,4%.
Se for para computar apenas os jogos pelos playoffs, seu rendimento cai para 43,6%, com 17 vitórias e 22 derrotas. Em duas ocasiões o seu time foi eliminado na primeira rodada, incluindo o campeonato passado, em que perderam para o Washington Wizards. Em 2011, perderam na final do Leste para o Miami. Em 2013, na semifinal de conferência, para o mesmo rival, a grande potência deste início da década.
Agora, falar sobre todos esses números, sem levar em consideração o contexto, seria absurdo. Especialmente no caso do Bulls de Thibodeau. Afinal, o técnico perdeu seu melhor jogador, Derrick Rose, nos mata-matas de 2012, e, desde então, vem sendo obrigado a usar um plano de contingência atrás do outro para manter sua equipe competitiva. Na última campanha, teve de superar até mesmo o fogo amigo, quando sua diretoria resolveu se livrar de Luol Deng, dando a entender que não compensava brigar por nada. O técnico e Joakim Noah não deixaram. Esse tipo de trabalho não passou despercebido pela concorrência, como a enquete oficial da liga comprova. Trabalhos dignos, de tirar leite de pedra.
Para o campeonato que começa na semana que vem, a história é diferente. Rose está de volta. Depois de disputar o Mundial, sem sustos, vem jogando a pré-temporada também sem acusar nenhum problema. Suas estatísticas são relativamente ruins, mas não dava para esperar algo diferente, para alguém que ficou basicamente dois anos sem jogar. Pau Gasol substitui Carlos Boozer na rotação, e não dá nem para calcular o quanto isso é melhor para a equipe. O espanhol é mais habilidoso, mais alto e protege o aro, mais experiente em jogos decisivos e, a julgar pelo que vimos durante a Copa, está em grande forma. Splitter, Nenê e Varejão podem dar seu testemunho. O banco ficou bem mais forte com a chegada dos calouros Nikola Mirotic e Doug McDermott, dois excepcionais arremessadores, e com a constante evolução de Taj Gibson – sem contar o promissor ala Tony Snell.
É um conjunto muito rico, com peças valiosas para a defesa – e também para o ataque. Há mais opções de troca, para que os principais atletas não sejam exauridos pelo técnico. E aí que o bicho pega. Se nenhum acidente (toc, toc, toc) acontecer, Thibs tem em mãos um dos melhores plantéis da liga, justamente no ano em que o Miami Heat se desfez e que, em Cleveland, LeBron ainda está formando seu novo supertime. Para esta versão do Bulls, a hora é agora.
O time: com Thibodeau, o Bulls teve a melhor defesa de 2011 e 2012. Em 2013, acreditem ou não, ele permitiu que o time derrapasse para quinto. Em 2014, tomaram vergonha na cara e terminaram com a segunda mais eficiente, atrás apenas do extinto Indiana Pacers. Temos um padrão aqui: a rapaziada sofre demais contra Chicago. Do outro lado da quadra, porém, o panorama é bem diferente. Na temporada passada, o ataque do Bulls foi simplesmente o antepenúltimo em eficiência. Em 2013, o 24º. Um horror: jamais uma equipe tão boa na retaguarda, mas tão fraca para pontuar conseguiu chegar perto do título. Mas nem tudo é caos. Em 2012, ainda com Rose em plena até os playoffs, tiveram o quinto melhor índice ofensivo. Em 20122, o 12º. A expectativa, então, é que a volta de Rose (mesmo um Rose a 70%, ou quase) e a chegada de Gasol e dos calouros ajudem sensivelmente nesse quesito. O espanhol é fundamental para isso: tem uma versatilidade impressionante, mesmo com idade mais avançada. Pode atacar de frente e de costas para a cesta, é um exímio passador e tem tudo para formar uma dupla de pivôs eletrizante com Noah. São fatores que sugerem possibilidades infinitas para seu treinador. A bola está com ele, por enquanto, e os dirigentes da liga esperando uma confirmação.
A pedida: Derrick Rose prega paciência, diz que ainda há uma longa trilha pela frente. Mas o torcedor do Bulls está pensando em título, sim, este ano. Ou pelo menos deveria estar.
Olho nele: Nikola Mirotic. Rose vai chamar quase toda a atenção da mídia que for cobrir Chicago. Aí vem Gasol. Depois dos astros, o que sobrar pode ficar para o calouro McDermott, um dos queridinho nacionais nos tempos de NCAA. Tudo merecido, aliás, todos talentosos. Mas creio que Mirotic possa ter um impacto muito maior que o do jovem americano, por ser multifacetado. Algo que seus companheiros passaram a tomar nota no training camp. ''Ele é muito bom, realmente bom. Ele adiciona uma dimensão diferente ao jogo… É muito mais que apenas um arremessador. Quando você pensa nesses pivôs abertos, não imagina caras que possam dar tocos, correr bem pela quadra, e ele consegue: ele é um puta de um jogador'', afirmou Noah, mais inspirado e eloquente do que nunca. Para os que viram o montenegrino naturalizado espanhol nos últimos anos pelo Real Madrid, não é surpresa. Mirotic era um dos melhores atletas da Europa. Em Chicago, encara uma rotação pesada, com JoJo, Gasol e Gibson. Assim como aconteceu com Splitter, Scola, Teletovic, e outros, deve passar por um período de adaptação. Pensando longe, porém, seria prudente da parte de Thibs dar minutos regulares ao ala-pivô.
Abre o jogo: ''Acho que da última vez que ele veio para cá como jogador do Lakers, estava rolando aquela coisa polar, ártica, aquele vórtice polar. Foi brutal. Quando você está acostumado a ir para a praia todo dia, escolher o vórtice polar diz muito'', Noah, sobre Pau Gasol, que trocou a Califórnia por Chicago, uma das metrópoles congelada no último inverno.
Você não perguntou, mas... o armador Aaron Brooks gosta de chamar o calouro McDermott de Ray. Por que ele é um bom chutador, tipo o Ray Allen? Nada. ''Achei que era o nome dele. Quando decobri que não era, o continuei chamando de Ray'', afirmou o baixinho, abusando do calouro. Sim, a NBA está cheia de gente biruta. Em Chicago, Brooks tenta beber da mesma fonte que DJ Augustin, CJ Watson, John Lucas III, Nate Robinson… todos armadores que reviveram ou impulsionaram suas carreiras vindo do banco, sob a orientação de Thibs.
Um card do passado: Toni Kukoc. O astro croata chegou ao Bulls em 1993, aos 25 anos, dois anos mais velho que Mirotic hoje, e com um currículo impressionante: tricampeão europeu pelo KK Split (na época chamado de Jugoplastika e Pop 84), três vezes MVP do Final Four europeu, tetracampeão iugoslavo, campeão mundial pela Iugoslávia em 1990, vice-campeão olímpico pela Iugoslávia em 1988 e pela Croácia em 1992, bicampeão do EuroBasket pela Iugoslávia em 1989 e 1991 e bronze no Mundial de 1994 pela Croácia. Ufa, né? Então não era definitivamente um calouro qualquer que o Bulls recebia em seu primeiro ano sem Michael Jordan. O ala já chegou ganhando uma fortuna, despertando a ira de Scottie Pippen, que estava preso a um contrato subvalorizado. Essa discrepância salarial gerou um dos episódios mais baixos da história do time e da carreira magnífica de Pippen, quando ele se recusou a voltar para a quadra num jogo de playoffs contra o Knicks, em 1994, com 1s8 restando no cronômetro. A jogada de Phil Jackson havia sido desenhada para Kukoc. Pior: com Pippen servindo como isca, que o craque americano, que havia jogado uma barbaridade durante toda a temporada, não aceitou. Claro que a frustração era muito maior que isso. Detalhe: o croata fez a cesta da vitória.