Sérvia se aproveita de destempero brasileiro, atropela e está na semifinal
Giancarlo Giampietro
O jogo já estava complicado, duro, conforme o esperado. Até que, no início do terceiro período, um momento de destempero da seleção brasileira, a equipe mais velha da Copa do Mundo, foi praticamente mortal. Do seu lado, cheia de confiança, a Sérvia, num jogo de quartas de final, não ia permitir reação nenhuma. Não só administrou, como aumentou, e muito, a diferença, eliminou seu adversário e avançou para a semifinal – e a consequente disputa de medalhas. A equipe balcânica venceu por 84 a 56 e agora enfrenta a França, que surpreendentemente eliminou a Espanha.
O Brasil começou a terceira parcial de guarda baixa, permitindo que o adversário abrisse nove pontos de vantagem, após um primeiro tempo muito parelho. Depois de uma falta de Anderson Varejão sobre Miroslav Raduljica, a arbitragem sinalizou mais duas faltas técnicas contra Tiago Splitter e Marquinhos, com 7min19s no cronômetro. Os europeus fizeram cinco pontos nos lances livres e mais dois numa bandeja de Stefan Markovic, de modo que, com 7min10s, os brasileiros tinham novamente a posse de bola, mas com 16 pontos de desvantagem.
Um instante de descontrole emocional que acabou abalando um grupo com 31 anos em média (bem superior que a idade média dos sérvios, de 26). O técnico Rubén Magnano chegou a pedir um tempo de imediato, mas não foi o suficiente para acalmar sua equipe. O técnico argentino não viria a interferir na partida novamente, mesmo com a seleção ficando quatro minutos sem pontuar. Quando Raulzinho acertou um tiro de três a 1min18s do fim, ele estava apenas reduzindo um placar que já apontava 20 pontos de desvantagem. O quarto período começou com 66 a 44.
Cada jogo é uma história, mesmo. Esse duelo pelas quartas foi completamente diferente do primeiro embate entre os times. Ainda pela fase de grupos, foi o Brasil que primeiro abriu uma larga vantagem no placar, de até 18 pontos, para depois sofrer uma virada preocupante. Ainda assim, a equipe nacional conseguiu se acertar no quarto período e triunfou.
Na primeira fase, os sérvios haviam vencido apenas os frágeis Irã e Egito, tendo perdido também para Espanha e França. Nos mata-matas, porém, o time elevou sua produção de modo impressionante. Nas oitavas, derrubou a Grécia, até então invicta, por 90 a 72, chegando muito mais preparada para uma revanche com os brasileiros.
Depois de comer poeira contra o Brasil no primeiro jogo, especialmente na etapa inicial, os sérvios praticamente abriram mão da disputa pelos rebotes ofensivos para recomporem sua defesa com mais agilidade. Na mínima chance de escapada dos adversários, não hesitavam em fazer faltas táticas, para frear o jogo. Deu certo.
Em meia quadra, a seleção nacional seguiu com dificuldades de execução, problema detectado desde a fase de amistosos. Se contra a Argentina os pivôs conseguiam se impor fisicamente, dessa vez a disputa, digamos, corporal era muito muito mais equilibrada. Os sérvios conseguiram proteger sua cesta com autoridade, limitando seu oponente com apenas 38% nos chutes de dois pontos (9/24) nos primeiros 20 minutos. Os únicos que conseguiram ser produtivos lá dentro foram Varejão e Marquinhos. Varejão acertou apenas 2/7 nos arremessos, mas seguia firme no lance, em posição favorável para o rebote, cavando faltas, convertendo seus lances livres e, ufa!, chegando a oito pontos no primeiro tempo – a média no torneio era de 8,2.
Do outro lado, o time de Magnano simplesmente não conseguia segurar o genial e genioso Milos Teodosic. O experiente armador chamou muito o jogo na linha de três pontos e usou a largura de seus pivôs, especialmente Nenad Krstic, pivô que estava em forma muito melhor, se compararmos com sua exibição na primeira partida. O veterano, largo toda a vida, estabeleceu corta-luzes fortes, daqueles que castigam, mesmo, e liberou seu companheiro. Teodosic teve espaço para chutar e criar – soube também explorar a recuperação tardia de marcadores para forçar a falta e infiltrar. Faltou comunicação entre seus marcadores. Se era para deixar algum rival livre, poderiam escolher qualquer um dos outros quatro, menos o armador. E ele fez a equipe pagar por essas falhas e hesitações, anotando 16 pontos dos primeiros 37 dos balcânicos.
Outro problema foi a contenção do talentosíssimo Nemanja Bjelica. O ala-pivô tem 2,08m, longas pernas e joga bem afastado da cesta. Tirava Anderson do garrafão e abria espaços. Quando precisou atacar no mano-a-mano, bateu o pivô capixaba com certa facilidade, invadiu o garrafão e pontuou. Faltou alguém fechar esse corredor na cobertura. As coisas só melhoraram nesse sentido quando Nenê veio para a quadra. O são-carlense tem recuperação muito mais ágil, cercando a turma do perímetro com mais controle.
No segundo tempo, a Sérvia variou sua abordagem, pingando bolinhas no pivô Raduljica. Uma opção que havia sido sua prioridade no primeiro confronto, lembrem-se, mas que havia sido descartada até então nesta quarta-feira. O sérvio marcou quatro pontos em menos de dois minutos. No ataque seguinte em que foi acionado, sofreu a falta de Varejão, e o resto foi história.
A seleção brasileira simplesmente saiu dos trilhos a partir daí, e seu adversário não teve piedade, nem oscilação, nem nada. Matou, no geral, 50% dos seus arremessos, ao passo que limitou seu adversário a 34%. Teodosic terminou com 23 pontos. Krstic, impressionante no terceiro período, fez 10 pontos, matando 5 de suas 7 tentativas de cesta. Mas os números, no fim, nem importam. A partir do momento em que as faltas técnicas foram marcadas, era como se Brasil e Sérvia tivessem entrado num terceiro jogo nesta Copa do Mundo, para o qual apenas os balcânicos pareceram preparados.