Brasil passeia contra México, mas Magnano não alivia na educação de seus jogadores
Giancarlo Giampietro
Para Rubén Magnano, o jogo vale pelos detalhes, mínimos detalhes, mesmo. A seleção brasileira já tinha o título do primeiro Super 4 do ano assegurado, surrando um time mequetrefe do México por mais de 20 pontos, restando uns três ou quatro minutos no cronômetro, quando o jovem Rafael Luz brecou na linha dos três pontos, não viu nenhuma opção clara de passe para a frente, deu uma olhada para trás para ver se não vinha a ajuda e arremessou dali. Deu bico. Mas, nem se caísse, talvez não importasse. O técnico argentino olhou para o banco e pediu a substituição.
Se você avalia o contexto, é compreensível o que o caçulinha da grande família Luz fez: estava zerado no torneio, sua equipe já estava ganhando, minutinhos finais, e que mal haveria tentar aquela cesta? Não foi um chute absurdo. Mas o armador obviamente poderia ter mantido o drible e procurado uma situação melhor de ataque – seja para fins próprios ou para um companheiro. E não é que ele seja um cara egoísta: uma ou duas posses de bolas antes ele havia dado uma bela assistência em contra-ataque para Guilherme Giovannoni. Descendo a quadra a mil, foi acionado no meio do garrafão, tinha espaço para tentar a cesta em flutuação, mas naqueles passes de ''tá-aqui-a-bola-não-tá-máis'' (como num levantamento de vôlei, sabe?), deixou o veterano livre para fazer dois pontos.
Dentro da cultura séria, exigente que Magnano quer implementar na equipe, porém, ele não vai tolerar isso: se o atleta fez a jogada certa, muito bem. Isso só não vai significar que ele tenha crédito para violar o que considera saudável para sua equipe. E aí não importa também o cacife de quem contraria suas regras básicas – um pouco antes, Rafael Hettsheimeir, agora promovido a referência ofensiva, foi sacado de imediato quando forçou um tiro de média distância da zona morta.
Não que o treinador proíba qualquer tipo de iniciativa de seus atletas. Numa ocasião, Rafael Mineiro tentou uma bola de três que saiu bem torta, triscando o aro pela esquerda. Mas ele estava livre, equilibrado. Ganhou aplausos do comandante. Minutos depois foi a vez de Benite ser incentivado depois de errar uma bola de longa distância, saindo por trás de um corta-luz pela quina esquerda. A jogada saiu de acordo com o combinado, e tudo bem.
Esse é o tipo de disciplina que o argentino impôs na seleção que faz toda a diferença. Não é uma questão de usar brinco, moicano ou o que seja. Ele pede apenas o respeito máximo a uma cartilha de bom jogo, não importando as circunstâncias. E o México que pague por isso.
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Mais um exemplo do impacto de Magnano? Na hora de erguer a taça em quadra, nenhuma empolgação. Huertas agradeceu, exibiu o troféu para os companheiros, posou para fotos sem nem sorrir direito, e segue a vida. Claro, né? Não representa nada, não deveria nem ter premiação um evento preparatório desses, e os objetivos da seleção são be maiores. Em outros tempos, porém, a farra seria bem maior. Só o estreante Leo Meindl que partiu para uma volta olímpica individual, com um sorrisão daqueles. Aí tudo bem: é sua estreia pelo time e foi um gesto simpático para o público presente, aplaudindo.
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Quanto foi o jogo? Brasil 96 x 68 México. Valeu pela surra, pelo controle absoluto da partida a partir do segundo período, mas é muito difícil saber o que se traduz desta pelada para a competição de verdade, a Copa América. Foram inúmeras as bandejas livres, limpinhas, sem nenhum mexicano pela frente – até mesmo em situações de meia quadra. Giovannoni, sem culpa nenhuma diga-se, foi um desses beneficiados, por exemplo, concluindo um monte de contragolpes no quarto final, terminando com 17 pontos em 18 minutos.
O aproveitamento da equipe foi de 54%, positivo, mas o de três pontos ficou em 35% (7/20), a despeito da ausência de contestação por parte dos mexicanos. Se tirássemos Arthur de quadra, aliás, a pontaria de fora cairia para 25 % (4/16). Um pouco disso tem a ver com pernas cansadas pelas primeiras semanas pesadas de treinamentos, a falta de concentração no final do jogo, e tudo mais. Fiquemos de olho nos próximos amistosos para ver como essa situação vai se desenvolver.
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Vitor Benite vem sendo usado exclusivamente como um ala, de finalização na seleção. Ele saiu do banco hoje com o mesmo ritmo que havia apresentado na véspera, contra os uruguaios: extremamente confiante no arremesso, usando bem os corta-luzes para se desmarcar e encaçapando um monte de bolas no primeiro tempo. O problema disso é ficar muito acomodado com esse chute de longa distância e esquecer as outras formas de se encarar uma defesa. Para um jogador veloz como o flamenguista, falta invadir o garrafão e atacar a cesta com mais frequência, independentemente de como está a munheca de fora. Seleção de arremessos. Ele terminou com 5/11 de quadra (3/7 de fora) e 16 pontos em 24 minutos.
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Cristiano Felício evoluiu consideravelmente em sua temporada nos Estados Unidos. O pivô está muito mais desenvolto em quadra, mostrando um talento para passar a bola surpreendente e impressionante,. Seja em movimento, quando corta de frente para a cesta, ou girando com a bola de costas para o aro, o mineiro foi muito bem no fundamento, com uma propensão a servir aos companheiros importantíssima para a continuidade de sua carreira. Atlético e forte do jeito que é, ele só vai facilitar sua vida para pontuar se mantiver (e refinar) essa tendência. Na tabela estatística final, só vão constar cinco pontos para ele e uma assistência, mas esses números contam pouco.
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Os próximos passos da preparação brasileira: amistoso contra o Uruguai no dia 7 de agosto, em São Carlos; mais um Super 4 nos dias 10 e 11 de agosto, em Anápolis; e, por fim, no dia 13 de agosto, amistoso contra o México em São Paulo.