Estreia de Lucas Bebê comprova talento do pivô, mas mostra pontos importantes que pedem evolução
Giancarlo Giampietro
É natural que toda uma nação se empolgue com Lucas Bebê, por diversos motivos. Dentre eles destacam-se…
1) Mais um brasileiro na NBA.
2) Um brasileiro extremamente carismático.
3) Um brasileiro com muito potencial a ser explorado, para se salivar.
4) Que não vai parar de enterrar na cabeça de todo mundo tão cedo e vai dominar os clipes de ''melhores momentos''.
Então, na hora de avaliar o jogador, é preciso muito cuidado para não descambar para o elogio fácil, sem se preocupar com a laaaarga parte do basquete que o jovem pivô ainda precisa melhorar.
Num país geralmente intolerante com aqueles que 'ousam' falar ou escrever algo contrário ao que está em voga, principalmente contra queridinhos nacionais, nada melhor, então, do que recorrer ao próprio site do Atlanta Hawks como escudo para poder elaborar a respeito do quanto o Bebê pode melhorar ainda e que os hightlights quase sempre não contam nada sobre o jogo. O site oficial do clube, sim:
''A escolha de primeiro round do Atlanta foi liberada para jogar cerca de 25 minutos antes do tapinha inicial e brilhou no ataque. Ele marcou 10 pontos, acertando 5-8 nos arremessos, e apanhou três rebotes ofensivos (de um total de oito). Vários de seus acertos foram em finalizações de chacoalhar o aro em pontes aéreas. Ele é um jogador divertido de se assistir no ataque, já que corre pela quadra tão bem. Defensivamente é aonde ele tem de melhorar. Ele vai se fortalecer, obviamente, com os programas de musculação da NBA, o que deve ajudar, mas ele também tem de aprender a ficar com os pés no chão. Foram diversas as vezes em que ele tentou o toco, e isso custou dois pontos ao seu time. Se ele ficasse plantado, com os braços estendidos em vertical, as equipes terão dificuldade para arremessar ou passar ao seu redor. Mas, tudo bem, este foi seu primeiro jogo de NBA. E ele foi muito bem.''
Para dar sequências aos elogios, podemos destacar as duas assistências que Bebê deu em situações bem diferentes. Na primeira, ele apanhou um rebote ofensivo na esquerda do garrafão. Girou com a bola e viu o companheiro novato Dennis Schröder livre na cabeça do garrafão. Fez o passe preciso para uma bola de três pontos. Na outra, ele recebeu a bola após uma ação de pick-and-pop (quando, após o corta-luz, é o armador que desce com a bola e o pivô recua) e, com paciência, visão de jogo e muito toque no passe, deu na mão de John Jenkins para uma bandeja, passando por cima da defesa.
Foram duas jogadas para evidenciar que há muito mais em seu jogo para progredir além das enterradas cabulosas. A partir daí, seria interessante desenvolver seu drible. Com sua velocidade, ele é mais do que capaz de cortar com a bola, embora isso vá levar um tempo para se desenvolver. Trabalhar o chute de média distância (algo que já reclamou, no passado, que não faziam com ele na Espanha…) e também a movimentação de costas para a cesta são outros quesitos que, imagino, já estejam no caderninho dos treinadores de Atlanta.
Mas o mais importante mesmo é essa questão de buscar o toco a qualquer custo. Normal para jogadores jovens e, na verdade, é um vício que domina até mesmo uma penca de barbudos da NBA, Liga ACB ou NBB. No caso de Bebê, com sua envergadura impressionante, fica ainda mais tentador: ele acha que é possível bloquear todo e qualquer arrmesso em sua direção – ou na cobertura. Ok, um pivô está ali para isso mesmo: para contestar e proteger o aro. Mas há diversas formas de se fazer isso. A mais recomendada, aliás, é esta mesmo: os pés abertos, as costas eretas e os braços estendidos verticalmente. E sabe quanto mede um Lucas Bebê, do piso da quadra até a ponta de seu indicador lá no alto? Estamos falando de 2,97 m. Uma parede humana. Quando o brasileiro aprender a controlar seu ímpeto, vai se tornar um defensor de muito impacto em qualquer liga.
Contra o Clippers – ah, aos preguiçosos que não conseguem digitar ''nba.com'', o Hawks perdeu na abertura da Summer League de Las Vegas por 90 a 83 –, Bebê pouco fez disso. Saltou, saltou, saltou e deixou seu time vulnerável aos rebotes ofensivos – pois o pivô parte para o toco, não consegue, sai de sua posição e deixa seu time vulnerável, desmembrado em quadra. Para se ter uma ideia, o veterano Samardo Samuels (ex-Cavs) sozinho pegou sete sobras na tábua de ataque. Ele geralmente estava em quadra enfrentando Bebê. É muita coisa.
Samuels, aliás, representou já um baita desafio de cara. O pivô jamaicano é um força-bruta, com ombros de boxeador, que faziam de Lucas ainda alguém mais magrinho. Samuels dificilmente vai aparecer em qualquer vídeo de melhores lances, mas, quando em forma – como parece o caso neste verão –, é um jogador bastante produtivo operando no garrafão. E, sem tirar nem por, ele se esbaldou contra o carioca. Porque o brasileiro também ainda não sabe muito bem o que fazer na hora de defender um pick-and-roll, ficando muitas vezes perdido entre avançar rumo ao armador (ou ala, ou seja lá quem estiver driblando) e regressar para cobrir seu homem. Em muitas ocasiões, não fez nem uma, nem a outra, e lá estavam mais dois pontos na conta do oponente.
Vale ressaltar também a diferença na composição do elenco de Hawks e Clippers – o time californiano optou por montar um time de verão muito mais tarimbado e experiente, enquanto Danny Ferry quer ver, mesmo, seus calouros jogarem. Os armadores Jerome Randle e Maalik Wayns fizeram uma partidaça em conjunto e souberam aproveitar esses lapsos defensivos tranquilamente. Wayns, se ficar na NBA este ano, será como terceiro armador do ex-primo pobre de LA. Randle sonha há anos com uma vaguinha dessas, mas nada. Na hora de a temporada regular começar, estaremos lidando com Chris Paul, Ray Felton, Deron Williams, Goran Dragic etc.
De qualquer maneira, Lucas tem apenas 20 anos e muito chão pela frente ainda para se aprimorar. Sua atitude durante o jogo foi de se encorajar, jogando duro, empenhado em mostrar serviço. Talento natural ele tem de monte, do tipo que Samuels só pôde sonhar em ter. de Se for bem orientado, vai longe.
* * *
Vi o jogo pela NBA TV. Steve Kerr (o melhor) e Reggie Miller estavam dando conta da transmissão. Os dois exímios chutadores ficaram admirados sobre como Lucas Noigueira parecia, mesmo, um… Bebê. : )
* * *
Depois do 'Episódio Afro' na noite do Draft, agora foi a vez de a NBA se admirar com a capacidade de Bebê de correr a quadra. Para alguém de seu tamanho, é muito veloz. E o que passa uma sensação mais legal ainda são suas passadas largas, como se fosse um Carl Lewis.
* * *
A situação do carioca para a próxima temporada ainda não está definida. Mas, se você for consultar o elenco do Hawks, verá que há uma carência clara de pivôs atrás de Al Horford e Paul Millsap. E não há muitos bons nomes no mercado de agente livre agora, e Danny Ferry ainda precisa ver o que vai fazer com a oferta que Jeff Teague recebeu do Bucks, para saber o quanto lhe restará de teto salarial para investir. De modo que as coisas parecem se encaminhar para a permanência do brasileiro em Atlanta, ao lado de outro calouro, Mike Muscala (pivô que complementa bem o estilo de Bebê, flutando no perímetro com ótimo arremesso, mas que também é frágil fisicamente)? Bom, tudo vai depender das ambições do Hawks. Se o time se enxerga como um concorrente a vaga nos playoffs, talvez seja pedir demais de seus novatos segurarem minutos significativos na rotação de Mike Budenholzer. Vamos esperar para ver o que sai daí.