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Flamengo vence Paulistano em jogo duro para levar o tri
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Giancarlo Giampietro

Olivinha vibra. É um dos que adora um jogo de contato

Olivinha vibra. É um dos que adora um jogo de contato

Por anos e anos a maior crítica sobre o basquete que se pratica no Brasil foi direcionada à (falta de) defesa. Quer dizer, talvez essa tenha sido a crítica 1-A, dividindo espaço com a 1-B, valendo pelo excesso de tiros de três pontos.

Na final do NBB 6 que vimos neste sábado, na boa– mas enxutíssima – transmissão da Globo, não dá para questionar que o Flamengo venceu o Paulistano em um jogo verdadeiramente intenso, para conquistar seu terceiro título na competição, o segundo consecutivo. Não há como contestar isso.

Mas, olha, para o meu gosto a decisão foi dura até demais.

Algumas notas a respeito:

– Ao todo, tivemos 58 faltas marcadas, praticamente 1,5 por minuto de jogo;

– Segundo as contas do irrequieto Luiz Gomes, que está preparando coisa nova por aí, foram 150 posses de bola na partida. Logo, mais de 38% delas foram pontuadas por faltas;

– De todos os atletas que entraram em quadra, apenas o jovem armador Arthur Pecos ficou zerado nesse quesito – mas ele jogou apenas 1min17s;

– Dois atletas foram excluídos com cinco faltas (Pilar e Renato Cabornari), e outros cinco terminaram pendurados com quatro (Meyinsse, Shilton, Manteiguinha, Holloway e Mineiro);

– No segundo período, antes do festival dos árbitros na volta do intervalo, os dois times estavam estourados com pouco mais de quatro minutos jogados.

– Marcelinho Machado, um jogador que nunca foi o cara mais incisivo na hora de bater para a cesta, sofreu seis faltas, sempre na (positiva) malandragem, com boa movimentação sem a bola, também sabendo usar a agressividade dos adversários a seu favor;

– Foram batidos ao todo 59 lances livres.

– Ao menos não precisaram acionar nenhum paramédico ou a ambulância.

Entendo as críticas aos árbitros, que marcaram realmente algumas faltas antidesportivas fantasmas (lembro de duas contra o Flamengo, no segundo tempo, em especial aquela em que Pilar tropeça no pé de Felício, e o jovem pivô é punido). No geral, é evidente e triste o impacto da decisão tomada pela liga e sua parceira televisiva em forçar que os árbitros sejam grandes protagonistas do espetáculo.

Como se os homens do apito já não tivessem uma tarefa inglória de fiscalizar um jogo com um monte de trogloditas digladiando em um espaço reduzido, com vários fundamentos e regras para serem observados, eles ainda precisam ser tutores? Fazer mímicas e afins, em portunholês (português + espanhol + inglês), para orientar o jogador sobre o que estão marcando, quando, na verdade, o objetivo é vazar o som para o que “o amigo telespectador não perca nenhum detalhe”. Foi um convite oficial para que eles tomassem (ainda mais) parte do espetáculo, e cá estamos.

Mas há dois pontos adicionais aqui para avaliar.

Primeiro que nariz torcido para arbitragem não é um patrimônio cultural do NBB – os playoffs da NBA estão cheios causos para contar, que o diga Doc Rivers; na Euroliga chovem críticas também (na final europeia, aliás, vimos este ano 55 faltas, mas com cinco minutos a mais de jogo: teve prorrogação).

O mais importante, todavia, é a concentração nos fundamentos. Uma vez dedicados ao ato de marcar, agora o esforço dos técnicos em seus atletas precisa se voltar aos fundamentos, em como executar uma defesa agressiva, obviamente fazendo contato, mas com um pouco mais de disciplina. Mais pés, com posicionamento, menos mãos, para compensar. Na NBA, por exemplo, o Indiana Pacers tem a melhor defesa da temporada, mas foi apenas o 14º no ranking de faltas por partida (20,5 por jogo, sendo que cada jogo tem 8 minutos a mais).

Peguem, por exemplo, a falta que o ala-pivô Renato fez em cima de Marcelinho Machado a 14 segundos do fim. O time estava apenas dois pontos atrás o placar. Mas Renato, mais lento, se afobou no perímetro, tentou dar um tapa na bola, nas mãos do experiente camisa 4, e jogou um dos maiores arremessadores da competição na linha de lance livre.

A intenção aqui não é crucificar esse valente e um tanto subestimado jogador, até porque ainda tinha muita partida pela frente – digo, ainda teve tempo de Manteiguinha arriscar um arremesso terrível da zona morta e de Marcelinho converter mais dois lances livres. E, obviamente, é muito mais fácil falar a respeito aqui do conforto do sofá, em que o único barulho ao redor é o do martelo do vizinho. Desagradável, mas não mais que milhares de rubro-negros pulando feito doidos na arquibancada.

(Aliás, a pressão de uma final em jogo único, outro presente da parceria televisiva, também contribui para a pancadaria, deixando todo mundo num estado mais elevado de tensão e instabilidade.)

Segundo a reportagem da Globo, a ordem que veio do banco do Paulistano era para evitar a falta, um ponto importante. Mas ela foi feita. Talvez muito por força do hábito, reflexo.

Gustavo de Conti falou em entrevistas durante a semana sobre o poderio flamenguista no jogo de transição, uma força do time desde a temporada passada. Durante a temporada regular, o vice-líder foi presa fácil diante da melhor campanha, tomando duas sacoladas: 80 x 58 e 98 x 67, tomando em média 89 pontos por partida.

Na decisão, ficou claro que sua preocupação era emperrar o adversário. Talvez fosse essa sua maior (e única?) chance. E dessa vez conseguiu. O irônico é que, para amarrar o jogo, contou também com ajuda do próprio adversário, que também desceu o braço. O clube de São Paulo cometeu 33 faltas, contra 25 dos rubro-negros. Quanto mais faltas, mais lances livres. Quanto mais lances livres, menores as chances de se partir em velocidade – a não ser que você tenha um quarterback como Kevin Love na reposição de bola.

No jogo de meia quadra, o Paulistano conseguiu equilibrar as coisas, criando bastante em situações de um contra um com sua dupla de ágeis americanos. Em meio a tantas faltas marcadas, porém, só conseguiu usar o cestinha Holloway por 24 minutos. O que aconteceria se… Mas aí os flamenguistas nem podem deixar a fase terminar, uma vez que seu pontuador mais eficiente, o atlético-toda-vida pivô Meyinsse também jogou pouco, por 25 minutos. São dois caras que teriam tudo para desequilibrar o confronto, mas foram privados.

Os dois finalistas valorizam a retaguarda, num empenho que realmente foge do que nos acostumamos a ver em temporadas anteriores. Topam combater e ralar na defesa. Quer dizer: a mentalidade pode ser alterada. Agora é prudente dar um próximo passo.


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