Vinte Um

Arquivo : Otto Porter Jr

Nos playoffs, não são apenas os superastros que brilham
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Giancarlo Giampietro

Matthew Dellavedova, aprovado por LeBron

Matthew Dellavedova, aprovado por LeBron

LeBron James, Derrick Rose, Stephen Curry, Blake Griffin, Chris Paul, Anthony Davis, Paul Pierce… É natural que, chegando os playoffs, o noticiário se concentre mais e mais nas grandes figuras da liga, aqueles que tendem a resolver a parada por suas equipes, naqueles momentos mais complicados. Os caras dos números arrebatadores, das bolas no estouro do cronômetro.

Na vitória do Cleveland Cavaliers sobre o Chicago Bulls nesta terça, para o Cavs abrir 3 a 2 na série, um lance que chamou muito a atenção foi este belíssimo toco de LeBron para cima de Rose, quando o armador tentava empatar o placar e completar uma reação assustadora dos visitantes no quarto período. Não só é um lance bastante plástico, como envolve duas estrelas:

Nesses lances de transição defensiva que tanto adora, LBJ foi lá no alto e deu a raquetada. Em slow, fica ainda mais bacana. Com a arrancada do armador e voo do bloqueador, é muito fácil ignorar o trabalho sutil de Matthew Dellavedova na jogada. O australiano, duro na queda, não se intimidou em ver o camisa 1 partindo em sua direção, a 100 por hora. Pelo contrário. Guardou posição e, no último momento, ainda se deslocou milimetricamente para a direita para forçar um ângulo  mais complicado no arremesso.  Desta forma, também retardou o movimento de Rose, permitindo a chegada de seu companheiro para a cobertura. Pimba.

São os pequenos detalhes igualmente relevantes num confronto tão equilibrado como esse, que tem toda a cara de sete jogos – isso, claro, desde que, em meio a tantas lesões, os dois times consigam listar o mínimo de jogadores exigido pela liga. Dellavedova, aliás, fez uma bela partida, que faz justiça ao papel que desempenhou durante o campeonato. Ele não vai produzir estatísticas, fazer cestas mirabolantes, mas o torcedor do Cavs e, principalmente, David Blatt sabe que pode contar com o australiano para o que der e vier.

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Não, não dá para esperar que ele vá fazer tuuuudo. Aquele tiro de três de LeBron, espremido na zona morta, com o Jimmy Butler vindo em sua direção? Melhor esquecer. Dificilmente o “Delly” refugaria na situação. Mas uma coisa é ter força de vontade, outra é a capacidade atlética e técnica para executar a jogada. Por outro  lado, se precisar que ele marque, ou torre a paciência de alguém, vai estar lá. A briga por um rebote ofensivo aparentemente perdido? Conte com essa também, mesmo que ele mal alcance no aro e que não seja nem o sétimo atleta mais veloz em quadra. Simplesmente encara. Alguém disposto a movimentar a bola ou para ficar de canto, sem reclamar se está tendo oportunidades que seu agente esperava? Mas, claro!

Durante a primeira metade caótica que foi a temporada do Cavs, Dellavedova foi importante justamente por isso, por sua entrega constante, ainda que seu rendimento estatístico em geral tenha sido inferior ao de sua campanha de novato. Foi alguém em quem tanto o contestado Blatt como o arredio LeBron poderiam confiar. Mesmo nesses mata-matas, em que seu aproveitamento de três pontos caiu de 40,7% para 36,5%, você vai ver em diversas ocasiões o Rei de Akron acionar o australiano em transição para um disparo de fora.

Contra o Bulls, obviamente não foi sua semi-interceptação de Rose que ganhou atenção.

Mas, sim, esse enrola-enrola com Taj Gibson, que resultou na exclusão do ala-pivô. Não dá para elogiar sua atuação nesse lance específico: um jogador de basquete presumidamente não precisa dar uma chave de perna no adversário. Ainda mais quando a bola já caiu na cesta. Por outro lado, rapaziada, são os mata-matas, né? Ou melhor: os playoffs. Os caras já se enfrentaram cinco vezes em menos de duas semanas. Essas coisas vão acontecer cedo ou tarde. Falou ao trio de arbitragem a perspicácia para também dar uma técnica no armador reserva do Cavs, ao passo que, se num primeiro momento a reação de Gibson parece indicar a exclusão como a melhor decisão, podendo rever o lance em quadra poderiam muito bem ter levado em consideração o fator “reação”. Enfim. Em sua estreia na fase decisiva, Dellavedova foi mais malandro que um veterano. “Delly é provavelmente o cara mais durão de nosso time”, comentou LeBron.

Pensando nesse, veja bem, valentão operário valente, que tal fugirmos um pouco da regra e listarmos, então, outros personagens periféricos das semifinais de conferência? Um exercício que o leitor corajoso de longa data do blog sabe ser recorrente por aqui. Não dá para escapar dele:

Mike Dunleavy Jr., Chicago Bulls: sim, pois o Jimmy Butler não conta. O ala já virou uma estrela e vai ser muito bem pago ao final do campeonato. Minha única preocupação com esse faz-tudo é a sua saúde. Ver Noah e Gibson se arrastando contra o Cavs traz ecos de Luol Deng para a quadra, e resta saber apenas como Butler estará daqui a quatro anos, mesmo que Thibs seja dispensado. Talvez boa parte do estrago já esteja feito. De todo modo, voltemos a Dunleavy, o ala que entrou na liga em 2002, também conhecido como o Draft de Yao, Amar’e e Nenê. Foi a terceira escolha, vindo de Duke já como campeão universitário e muita expectativa. Foi mais uma ser comparado a Larry Bird – hoje isso não está tão em moda, mas há 10, 15 anos qualquer ala branco minimamente talentoso que despontava nos Estados Unidos ouvia essa comparação. Obviamente o cara não chegou nem perto disso. Muitos questionam uma suposta falta de ambição e esperavam mais, se não, hã, top 10 da história, mas pelo menos algo mais consistente com os números que teve por Indiana em 2007-08 (19,1 pontos, 5,2 rebotes e 3,5 assistências, 42,4% de três pontos).

Dunleavy, discreto, eficiente e importante

Dunleavy, discreto, eficiente e importante

Pode ter frustrado alguns, mas é inegável que tenha talento: basta desviar os olhos de Rose e das caretas de Noah por alguns instantes e observá-lo em ação, mesmo aos 34 anos. No ataque, ele chuta que é uma beleza, se movimenta de modo muito inteligente pela quadra, é um excelente passador. Falta o arranque para a cesta, coisa que nunca fez parte de seu repertório, nem mesmo no auge. Ele não vai ser um cara para carregar um ataque, mas seu pacote de habilidades ofensivas é extremamente importante, para espaçar a quadra para as infiltrações de Rose e Butler, ainda mais quando a dupla de pivôs é Noah e Gibson, sem chute nenhum. “É uma das razões para eu ter vindo para cá: apenas fazer parte de um grupo que vença muitos jogos. Não ligo para o resto. Gosto de me apresentar, fazer meu trabalho e ir para a casa”, afirma o ala. Thibs adora: “Ele é o profissional exemplar. Joga para o time. É simplesmente um jogador de basquete. Tem horas que você apenas precisa mexer a bola de um lado para o outro. Ele vai lá e faz. Não se reflete em assistências, mas ele te dá movimento.”

Otto Porter Jr., Washington Wizards. Nenê é um candidato eterno nessa categoria, enquanto sua carreira durar. Mas vamos virar o disco aqui, pegando alguém que ainda pode ser considerado um lançamento no mercado. Porter teve apenas 319 minutos de jogo em sua primeira temporada, o que não dá nem 7 jogos inteiros. Nos playoffs, então, foram apenas seis minutinhos. Espirrava em quadra e saía. Um ano depois, porém, as coisas estão mudando: em oito jogos pela fase decisiva, ele já recebeu 263 minutos de jogo (43 vezes mais). Não se trata de caridade do técnico Randy Wittman.  Ainda que possa dar aquela viajada em quadra, o ala aos poucos se integrou ao time, dando enfim provas do basquete que fez dele também uma terceira escolha de Draft (num recrutamento bem fraco, é verdade).  Quando o selecionou, o gerente geral Ernie Grunfeld não tinha em mente um futuro craque, mas um complemento para seus jovens destaques. Como se fosse um Tayshaun Prince para Chauncey Billups e Rip Hamilton. Demorou um pouco, mas está acontecendo.

“Sua presença no rebote, seu arremesso… Isso é o seu crescimento. Sabíamos do que ele era capaz quando o selecionamos. Ele cresce a cada vez que vai para a quadra agora”, afirma Beal. Num elenco abarrotado de veteranos, Porter oferece a mais companhia na hora de acelerar, abrindo para o tiro de três pontos, ou cortando com sua passada larga rumo ao aro. Perto da tabela sua influência cresce, devido aos braços compridos e sua energia. Características agora bem empregadas do outro lado da quadra, algo com que DeMar DeRozan certamente não contava. Além disso, seu crescimento permite que Paul Pierce jogue mais minutos como  um ala-pivô aberto e também poupa o veterano de correr atrás alas mais rápidos pelo perímetro.

Dennis Schröder, Atlanta Hawks. DeMarre Carroll ainda é bizarramente o cestinha da equipe nos playoffs. Então acaba tendo sua candidatura impugnada dessa vez, e também já passamos por sua trajetória singular aqui. Legal, pois aí sobra espaço para falar sobre um reserva que vai subindo com determinação a escadaria dos queridinhos do blog. Pode chamá-lo até de Schrödinho, que tudo bem. O armador foi vital em diversas vitórias do Hawks na temporada regular, e ainda assim tem gente que pode achar que é uma “surpresa” o que ele fez nos últimos dois jogos em Washington. É que os rapazes de Mike Budenholzer venceram tantas partidas, mesmo, no campeonato, que se corre o risco, sim, de que uma ou outra contribuição fique para trás. O sucesso fica diluído.

Sem John Wall, o Wizards perdeu não só o seu principal organizador como também uma presença física imponente na marcação. Ao lado de Jeff Teague, o alemão vai se esbaldando. Ramon Sessions e Will Bynum não conseguem acompanhá-lo. Seu perfil é diferente dos demais listados. Estamos falando de um cestinha agressivo. Quando consegue forçar a troca após o corta-luz, fica mais fácil ainda, dando voltas em torno de Marcin Gortat, Paul Pierce e mesmo de um pivô ágil como Nenê. “Fico dizendo para o Jeff: ‘Continue atacando’. E ele me diz a mesma coisa. Era uma motivação para nós. Vamos para a cesta, que eles não conseguem nos parar”, diz o armador que, vejam só, numa projeção por 36 minutos, aparece como o principal pontuador do time, com 20,1 por jogo, além das 7,8 assistências. Teague precisou esperar um tempinho até assumir o posto de titular em Atlanta. Para mim, é questão de tempo para Schrödinho ganhar o mesmo status. Mesmo que em outro clube.

Tony Allen, Memphis Grizzlies. Hã… Quer dizer… Periférico?! Por dois jogos esse sujeito tirou os Splash Brothers da linha, desarmando o ala do Golden State Warriors. Estrelou vines e clipes do YouTube sem parar ao invadir uma roda de dança das criancinhas em Oakland, desarmar Klay Thompson na maior, dizer que Curry é bonitinho, e tal, mas que não é nada que não tenha visto antes e lançado sua campanha fervorosa para o “Primeiro Time de Defesa” do Conselho de Segurança e…  Precisa de mais?

Já foi, Klay

Já foi, Klay #1stTeamAllDefense

Mas, sim, periférico. Nas vitórias do Grizzlies, Mike Conley foi o protagonista, e pudera. O sujeito mal abre o olho esquerdo direito. Acabou de passar por uma cirurgia facial, por conta de múltiplas fraturas, e ainda está disposto a encarar um Andrew Bogut e um Draymond Green lá embaixo. Eu, hein? No ataque, Gasol e Z-Bo também carregam a pecha de dupla que joga na contramão da liga, lá embaixo, com se fossem os anos 80, 90. O armador e os homens de garrafão, além do mais, jogam dos dois lados da quadra. Allen causa um impacto enorme na defesa – e sua ausência no Jogo 4, com surra do Warriors, evidenciou isso –, mas suas deficiências ofensivas foram novamente expostas por Steve Kerr no Jogo 4 contra o Warriors. Seguindo tática empregada por Gregg Popovich no ataque, o técnico ordenou que seus atletas não se incomodassem que o ala ficasse livre no perímetro. Livre, mesmo, para arremessar enquanto bem entendesse. Se consultarmos o aproveitamento de arremessos em sua carreira, faz sentido. Nos playoffs, tem acertado apenas 33,3% dos arremessos de média distância e 10% de fora.


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