Vinte Um

Arquivo : Cipolini

“Era a hora de mudar”, diz Vidal, agora sem Alex e Nezinho
Comentários Comente

Giancarlo Giampietro

Vidal, novamente dirigindo o Brasília. Mas agora é outro Brasília

Vidal, novamente dirigindo o Brasília. Mas agora é outro Brasília

Não foi a primeira vez que Alex ou Nezinho deixaram a capital federal. O ala, por exemplo, havia saído até mesmo do país em 2007 para jogar pelo Maccabi Tel Aviv. Nezinho, por sua vez, já havia pegado a estrada para Limeira em 2008. Os dois retornaram, claro, e encheram a gaveta de medalhas. Muitas medalhas conquistadas.  Mas agora parece que é para valer. Que chegou a hora de Brasília seguir em frente com seu basquete sem a veterana dupla paulista.

>> Não sai do Facebook? Curta a página do 21 lá
>> Bombardeio no Twitter? Também tou nessa

Pelo menos é a sensação que o blogueiro teve em um papo agradável com o técnico José Carlos Vidal na cerimônia de abertura do NBB7, na última quinta-feira, no Paulistano – um grande evento, por sinal, muito bem organizado, de deixar qualquer competição brasileira com inveja, e prato cheio para os jornalistas, de tantas as fontes para serem consultadas. No decorrer dos próximos dias e semanas, vamos divulgar esse material coletado.

Começamos com Vidal, ele mesmo que entra no lugar do argentino Sérgio Hernández e vai para sua terceira passagem no comando técnico da equipe candanga, que faz sua estreia no campeonato nacional nesta terça-feira contra o Bauru, às 20h, na Panela de Pressão do interior paulista. Já mais um reencontro com Alex marcado, afinal, com transmissão oficial no site da LNB. É difícil para qualquer clube substituir um jogador como o ala da seleção, ou Nezinho. Especialmente no caso de um Brasília que havia se habituado a conquistar tudo com o núcleo construído em torno da dupla, além de Guilherme Giovannoni e Arthur. Mas, para o treinador, era chegada a hora. “Já havia um desgaste natural de todos esses anos”, afirma. “cho que a saída dos dois foi de 50% para cada lado (clube e jogador).”

Eles chegam: Fúlvio, Hobson e Cipolini

Eles chegam: Fúlvio, Hobson e Cipolini

Giovannoni e Arthur ficaram, agora com a companhia de Lucas Cipolini, o dinâmico pivô ex-Uberlândia, do armador Fúlvio e do americano Darington Hobson, que chega com a marca NBA em seu currículo. Os dois últimos, aliás, oferecem ao time um perfil completamente diferente, se comparados com os que partiram. A expectativa é que a equipe tenha mais movimentação de bola como resultado. “Na meia quadra, a gente aumentou nossa qualidade, de visão, de inclusão de todos no jogo”, diz Vidal. Para ele, no entanto, a prioridade ainda é o jogo de transição, a partir do momento em que o time solucionar algumas questões defensivas, hoje sua maior preocupação.

Foi algo, aliás, preocupante, mesmo, durante a primeira fase da Liga Sul-Americana que o clube disputou há algumas semanas em Bauru, sofrendo para eliminar o Defensor, do Uruguai, e conseguir a classificação. De todo modo, para Vidal, essa não é hora de pensar em renovação, no sentido de abrir espaço para juventude em seu elenco. Jovens como Ronald e Isaac estão nos planos, mas precisam assumir seus papéis. O próprio treinador lembra que ainda tem duas vagas de estrangeiros para serem preenchidas. E sua vontade é que venham atletas para decidir, para levar o clube de volta ao topo.

Após ter disputado as primeiras quatro decisões do NBB, os candangos ficaram fora da festa nas últimas duas edições, abrindo espaço para o Flamengo equilibrar o tabuleiro histórico. “É um momento de reestruturação, para poder atingir os resultados de que o Brasília precisa. Conseguir títulos e manter o basquete forte”, afirma. “Não estamos num momento de queda. Vamos reestruturar, mas pensando para cima. Ninguém vai ficar batendo palma para um time em renovação. Já vi isso acontecer com alguns times, quando dá essa abaixada e que uso como exemplo. Você estava levando duas, três quatro mil pessoas e depois abaixa para 400, 500. Não quero que isso aconteça em Brasília. Que continuemos com um time competitivo.”

Confira a entrevista completa:

Vidal: Brasília joga por títulos, e para agora

Vidal: Brasília joga por títulos, e para agora

21: Bom, a primeira pergunta é inevitável: o núcleo de seu time sofreu uma boa reformulação, com a saída de figuras como Alex e Nezinho, que haviam criado uma forte identidade. Quais as perspectivas para esta nova equipe?
José Carlos Vidal: É uma reconstrução difícil, um recomeço. No basquete você tem cinco jogadores titulares e os sete no banco. Quando você perde dois titulares, e importantes, tem uma reconstrução que sabemos que vai demorar um tempo e que estamos tentando fazer da melhor maneira possível. Por outro lado, acho que com aquele grupo já havia um desgaste natural de todos esses anos. O que o Flamengo fez anteriormente, o Brasília também precisava fazer.

Sentia, então, que era era mesmo a hora de mudar?
Era. Os resultados não foram ruins. Nessa última fase, em quatro anos com UniCEUB, ganhamos quatro títulos. Foram duas Ligas Sul-Americanas e dois nacionais. Acho que o que ficou de má impressão foi a derrota do NBB do ano passado, que não foi bom para a equipe e também para os patrocinadores. E aí decidimos mudar por bem ver com quais jogadores queríamos ficar e também quais jogadores queriam sair. Acho que a saída dos dois foi de 50% para cada lado. Acho que eles queriam sair, e a direção do clube também achou que era o momento. Conseguimos manter o Guilherme como um protagonista.

Pelo que vimos da primeira etapa da Liga Sul-Americana, o Giovannoni já foi bastante exigido. O time agora será reconstruído ao redor dele, como um pilar?
Isso, ele acaba sendo esse pilar, o que é importante. Também, perder três jogadores desse nível de uma vez seria complicado (risos). Haja busca por americano. A imprensa de Brasília, então, depois da saída dos dois, já estava falando que o time iria acabar, que acabou o sonho.

O clima ficou um pouco tenso, então?
Ficou tenso, mesmo (risos). Mas aí com a vinda do Fúlvio, para o lugar do Nezinho, acho que são jogadores equivalentes. A substituição do Alex é algo mais complicado. Sabia que seria. Ficamos esperando, aguardando um pouco…

Bom, o perfil dele é raro no Brasil, de ser um cara que joga realmente dos dois lados da quadra, e bem. Que causa um grande impacto.
Sim, não é fácil. Além disso, ele tinha um papel de liderança no grupo. Era o capitão, uma referência. Acho que isso por vezes é até mais difícil, do que uma questão tática ou técnica. Então isso é algo que o Giovannoni está tentando (suprir). E agora estamos com este norte-americano (o ala Darrington Hobson, que jogou a temporada passada em Israel e já passou pela NBA), que faz mais uma função 2 ou 1 e veio para substituir, para ser teoricamente importante. Precisávamos de um jogador dessa posição.

Você o considera um cara que venha para fazer a diferença? É sabido que, dos tempos de universidade em Novo México, que o Hobson atuava muitas vezes como um facilitador, mas não com um perfil de carregar pontuação.
A experiência que ele teve em Israel foi a única fora dos Estados Unidos. Não é aquele americano que vem para (chutar tudo)… Ele até perguntou para mim o que esperava dele. O sonho dele era (fazer carreira) nos Estados Unidos, claro, e parece que já foi alcançado de alguma forma.

Aliás, desculpe, mas como chegaram a ele? Quais informações tinham?
A gente conhecia também o Vandinho, que foi assistente técnico dele lá (referência a Adjalma Vanderlei Becheli Júnior, o Vandinho, brasileiro que trabalhou com Hobson no State University-College of Eastern Utah e que já trabalhou no Paulistano) e falou muito bem dele e disse que já estava recuperado (de cirurgia nos dois lados do quadril). A gente o conheceu primeiro por vídeos. E aí meu assistente encontrou o Vandinho numa clínica em que ele estava aqui no Brasil e ficou sabendo da negociação e disse que já havia jogado com ele. Aí foi melhor ainda. E foi por um outro lado também. Parece um cara intenso e vem com muita expectativa de que fazer uma boa temporada aqui. Ele sabe da pressão que vai ser. Já viu nossos jogos, sabe como é. Agora, é um jogador que não veio para ser um definidor, não é o americano definidor. Aí eu tendo Guilherme, Arthur e Cipollini para isso, que pontuam bem, e ele pode contribuir bem com suas características.

E como está o Fúlvio? Ele obviamente não teve um ano muito fácil em São José, depois de cirurgia por ruptura do cruzado anterior.
Naquela semana da Liga Sul-Americana, ainda tínhamos o Fúlvio a 60%. Não podemos esquecer isso, que ele estava há um ano parado. Foi uma aposta nossa. Eu gosto muito dele. Já havia trabalhado com ele como assistente. Todo técnico precisa ter um jogador de confiança. No meu time é assim, então vamos ter o Fúlvio. Que é armador, e quando você tem um armador assim, facilita o trabalho do técnico.

Alex, agora do outro lado: defesa ainda inspira preocupação. Isaac nos planos

Alex, agora do outro lado: defesa ainda inspira preocupação. Isaac nos planos. Crédito: Henrique Cunha/Paschoalotto/Bauru

Saem Nezinho e Alex, muito agressivos, um estilo que eles têm e com o qual venceram muitos títulos por Brasília. Mas agora chegam atletas de perfil diferente. Fúlvio pode pontuar, claro, mas tem mais vocação para a organização, muito mais passador. E o Hobson também. Você imagina um time mais homogêneo no ataque devido a essas características? O que você imagina de identidade para a equipe nesse sentido?
Não gosto muito de falar de filosofias, mas de estilos de jogo. Penso muito no jogo de transição, desde as categorias de base. E o Hobson também ajuda para esse papel. Ele pode pegar um rebote e levar a bola por conta, atravessando a quadra e dando bom ritmo ao time. Acho que, na meia quadra, a gente aumentou nossa qualidade, de visão, de inclusão de todos no jogo. Pelo Fúlvio e por ele. O Guilherme fazendo mais uma posição de 3, algo que ele fez a vida toda. Sabe se virar ali e está voltando a isso, estou insistindo com ele. É uma função importante para mim e na qual já foi usado no NBB5 e 6. E o Hobson também tem o um contra um, com o drible. Além disso, ainda vamos em busca de pelo menos mais um reforço, precisando alguém ali no poste baixo, mais forte, que pontue e possa fazer as coisas na hora do sufoco. Estamos procurando. Temos mais uma vaga de americano. Agora é esperar. É um time que vai poder jogar mais solto, mais leve e talvez com mais consistência. O problema por enquanto é mais a defesa, é onde temos de melhorar mais, antes de começar a temporada. Nesses três primeiros jogos, vimos que precisamos melhorar bem.

Isso tem mais a ver com ganhar coesão com as novas peças, ou é algo que vem mais das características dos jogadores, que pedem outro sistema defensivo para encaixá-los?
É mais a segunda alternativa, mesmo. Mas estou buscando esse sistema, mudando algumas coisas. Porque por, às vezes, mais que você queira uma coisa, tem hora que as características não são para aquilo que se pede. Mas acho que é um time que pode defender pelo aspecto cognitivo, que é algo que estou sempre falando para os jogadores: que às vezes você pode não ser um grande defensor de físico, individualmente, mas que, se defender conjuntamente, com inteligência, escolher a hora certa, fazer as trocas certas, seguir as regras, pode dar certo. O técnico tem de saber isso: as virtudes de sua equipe, de saber como pode jogar. Como sabia com a equipe anterior, desde 2006 e de quando voltei. Esse time agora é de outra visão, então tem de ter adaptação, mesmo. Explorar nossas virtudes e aceitar nossas deficiências para evoluir a partir daí, para um tipo de defesa que não fazíamos muito e no qual estamos treinando nesses dois meses. Agora é tentar por mais em prática e aí, sim, fazer uma avaliação real. Acho que o jogo contra o Bauru foi um bom jogo para isso. Até o terceiro quarto, estava equilibrado.

Queria perguntar também a respeito de dois dos atletas mais jovens: Ronald e Isaac. Eles já estão integrados à base do time há um tempo. Nessa nova configuração, eles ganham mais responsabilidades?
Acho que são dois jogadores que não podem mais ser considerados esperanças ou promessas, mas que têm que, neste ano, serem realidades. O Isaac quase não jogou no ano passado com o Sergio (Hernández, técnico argentino que dirigiu o time por apenas uma temporada) na rotação. Neste começo de temporada ele deu um pouco de azar, se machucou, mas é um cara que é para ser nosso sétimo jogador. Com o Ronald também. Depois, se eu troxer um 5, pode ser que a coisa mude um pouquinho. Mas o Isaac é um cara com quem conto. Eu o trouxe de Vila Velha, um garoto importante, arremessador, mas que tem de se impor.  Não vou dizer que tenha de ser um protagonista, mas que seja uma peça importante, assumir um papel. Isso tenho cobrado. Conto com ele e o Ronald. E aí tem os subs, que ainda são mais garotos, que nunca tinham jogado no adulto, os subs, o Bruno e o Gustavo. Mas não quero fazer uma renovação total no Brasília. Acredito que o Brasília tem um nome, e que a gente vai ser cobrado por isso. Também vou cobrar dos patrocinadores, que a gente tem vaga para mais dois estrangeiros. A gente tem de ver como começa e correr atrás. De chegar para a disputa. Acho que Limeira… Flamengo… Bauru estão com os elencos mais fortes do NBB. Não é o momento de Brasília ficar pensando em renovação. É um momento de reestruturação, para poder atingir os resultados de que o Brasília precisa. Conseguir títulos e manter o basquete forte.

O tradicional Nilson Nelson já lotou com basquete na capital federal. Pegou?

O tradicional Nilson Nelson já lotou com basquete na capital federal. Pegou?

Como você poderia nos explicar essa forte identificação de Brasília com o basquete? Sabemos que grandes jogadores vieram da capital, mas o que faz a cidade ter essa relação especial? Seria a ausência hoje de um grande clube de futebol? Ou o que mais? Como se desenvolve?
Acho que isso facilitou. Mas tem mais. Comecei a jogar basquete em Brasília em 1973, e aí a gente teve alguns ícones. O próprio Oscar começou a jogar no time em que joguei. Depois cheguei a um nível razoável. Teve o Pipoka, que saiu da minha geração de seleção. Sempre teve internamente quatro ou cinco clubes que tinha um campeonato que chegava a lotar ginásio. Tinha uma história. Eu mesmo lutei pelo Gama, que teve um time com o Gama em 2000, mas aí nunca deu certo. Já existia uma identificação com o esporte, mais do que o vôlei e outros esportes coletivos. Não ter esse time de futebol facilitou. Agora nessa nova fase conseguimos por 20 mil pessoas em jogo em 2006 contra o Flamengo, e daí para a frente a coisa foi evoluindo. Como todo brasileiro, a maioria quer torcer para time que ganha. Se começarmos a perder muito jogo em casa lá, o pessoal começa a cobrar que vai para o ginásio e nunca tinha perdido um jogo (Risos). Aí você fala que também não é bem assim… Então tem tudo isso. Foi crescendo. É por isso que falo com o pessoal, com os patrocinadores que não estamos num momento de queda. Vamos reestruturar, mas pensando para cima. Ninguém vai ficar batendo palma para um time em renovação. Já vi isso acontecer com alguns times, quando dá essa abaixada e que uso como exemplo. Você estava levando duas, três quatro mil pessoas e depois abaixa para 400, 500. Não quero que isso aconteça em Brasília, não. Que continuemos com um time competitivo.


Chega ao fim a carreira de Kammerichs, o operário argentino e xodó do Flamengo por um ano
Comentários Comente

Giancarlo Giampietro

Pesquisando sobre a seleção alternativa da Argentina que Júlio Lamas vai trabalhar para a Copa América, me deparei com esta manchete aqui o site do diário Olé, nosso bom e velho companheiro de tiração de sarro:

La extinción del Yacaré

 

Não é possível!

O jacaré?!

Sim, o jacaré Federico Kammerichs. O bigodudo que conquistou a torcida do Flamengo por uma temporada de NBB decidiu se aposentar neste ano, precocemente aos 33 anos. Convocado por Lamas, até pensou em fazer sua saideira em Caracas, mas optou por parar já, deixando o grupo dos atuais quarto colocados das Olimpíadas – e precisava lembrar!? – ainda mais inexperiente na busca pelo título continental e por uma vaga na Copa do Mundo.

Kammerichs, barba completa

O gesto característico de um Yacaré

Sem muita velocidade ou impulsão, mas com inteligência e coração, o ala-pivô teve uma carreira formidável, ainda que não à altura de seus companheiros de geração muito mais laureados. Ficando à sombra de Nocioni, Delfino e Herrmann, não teve lá muitos momentos brilhantes pela seleção, com exceção daquele fatídico Pré-Olímpico de Las Vegas 2007 – e precisava lembrar de novo, cazzo!? –, em que fez todo o serviço sujo necessário, limpando a quadra para Scola brilhar.

De qualquer forma, quando ele ficou aqui pertinho de nós, respirando os ares cariocas, Kammerichs mostrou o quanto podia ser especial em quadra.

Segue abaixo  um texto de nossa encarnação passada, tentando compreender o sucesso que ele desfrutava pelo Flamengo – pontuando bastante, somando double-doubles–, de certa forma surpreendente, para quem o conhecia apenas como um mero operário pela seleção argentina. Para não correr o risco de autoplágio, reproduzo na íntegra, já que não haveria muita coisa para acrescentar a respeito do cara, que fez sua última temporada pelo Regatas, em casa.

Foi publicado em 10 de janeiro de 2012, o que obviamente o inviabiliza desde já a concorrer à categoria de clássico da literatura esportiva nacional, logo depois de uma derrota rubro-negra para o Uberlândia, em dia inspirado do americano Robert Day.

Vamos lá:

“Robert Day acabou roubando a cena. A pauta prévia do VinteUm era assistir ao duelo entre Flamengo e Uberlândia no sábado com olhos fixos (bem, na medida que o enquadramento da TV permitir) em Federico Kammerichs, que vem arrebentando no campeonato nacional. Desviamos um pouco a atenção, mas cá estamos com ele.

Para os que acompanham o bigodudo por anos e anos de confronto com a Argentina, não surpreende que o medalhista olímpico contribua positivamente para o clube carioca e que seja um sucesso no NBB. Só não dava para esperar tamanho êxito, che: Kammerichs vai sustentando médias de 13,9 pontos por jogo, algo que jamais contentaria um Oscar Schmidt, mas é de se destacar num clube que já reuniu na mesma quadra gatilhos como Machado, Leandrinho e David Jackson, em um contexto de salve-se-quem-puder. Nos rebotes, está ainda melhor, com 10 por partida, liderando toda a liga. Além disso, seu aproveitamento nos arremessos de dois pontos é de 69,47%, convertendo basicamente seis por jogo a cada oito ou nove tentativas. Seus números defensivos não são de outro mundo, num reflexo de seu posicionamento correto, em detrimento de  precipitações em busca de roubos de bola ou tocos. Na somatória, noves fora, temos o segundo jogador mais eficiente (estatisticamente) do campeonato.

Aquela noite inesquecível de Las Vegas 2007

Kammerichs, naquela dolorida vitória argentina em Vegas

Um quadro que não condiz, que não bate com o que aprendemos a admirar – ou lamentar, dependendo do grau de envolvimento emocional – em suas partidas pela seleção argentina, na qual é valorizado por sua atenção aos pequenos detalhes do esporte, e, não, como um carro-chefe da equipe, daqueles com volume de jogo (mucho gusto, Scola, Delfino, Nocioni, Ginóbili, Quinteros, Prigioni etc).

Em toda a sua carreira em torneios FIBA com a albiceleste, só teve duplo digíto em pontuação no Sul-Americano de 2003, lá em Campos dos Goytacazes, com 11,2 por partida – época em que sua massa capilar ia muito além do bigodón, compondo um visual setentista daqueles –, e na Copa América de Santo Domingo-2005. Fora esses dois torneios, em competições de alto nível (ou não), ele teve médias de: 3,8, 3,7, 4,4, 0,5, 2, 7,3 e 4,4 pontos. Em quatro ocasiões, teve mais rebotes do que pontos, na verdade.

(Agora uma pausa nem tão breve para rodar o relógio para trás: era 2003 em Campos de Goytacazes, e naqueles dias a cidade fluminense tinha seu próprio clube na elite do basquete brasileiro, dirigido por Guerrinha, usando um modesto ginásio, onde este palpiteiro aqui ficou enfurnado para as finais do Sul-Americano, sentado nas tímidas arquibancadas ao lado de alguns scouts perdidos da NBA – o argentino Lisandro Miranda, do Dallas Mavericks, e dois (vai entender…) do Houston Rockets, BJ alguma coisa, um gigante figuraça, e Melvin Hunt, mais calado e hoje assistente técnico preferido de George Karl no Denver Nuggets, em ascensão notável, depois de ter trabalhado no banco do Cleveland Cavaliers. O principal alvo da trupe era o então jovem Carlos Delfino, que, na decisão, saltou para uma enterrada frontal, no meio do garrafão, diante do imponente Estevam: por alguns segundos, a respiração coletiva do ginásio parou e os olheiros da liga norte-americana levaram as mãos para a cabeça; o tempo se descongelou quando o pivô brasileiro, corajoso e ainda vigoroso, acabou fazendo a falta no ala, que seria selecionado no Draft um ano mais tarde pelo Detroit Pistons. Neste mesmo jogo, num domingo bem quente, Walter Herrmann, um cracaço que fazia a bola parecer de tênis em suas mãos, só não fez chover dentro de quadra. No time brasileiro, lembro que André Bambu havia rendido algumas notas para esses deslocados visitantes da NBA).

Kammerichs e Leandrinho tipo NBB

Leandrinho disparou, e Kammerichs vem atrás de qualquer sobra

Agora voltando: estávamos falando de como Kammerichs construiu sua carreira internacional muito mais como um operário do que como chefe da companhia. E o que acontece, então, para este veterano argentino se sobressair no NBB?

O ala-pivô nunca foi um jogador conhecido por sua capacidade atlética. Mas descolou seu nicho pela capacidade de leitura de jogo. Quase sempre aparece no lugar certo na hora certa para recuperar uma bola perdida, para fazer uma cobertura defensiva, se sacrificar em corta-luzes, capturar um rebote ofensivo, bloquear um pivô por trás. Ele sabe se aproveitar de quebras no sistema, de alguma interrupção no fluxo da partida para dar o bote. E, nos jogos frenéticos e desorganizados que temos visto durante o campeonato nacional, esse tipo de lapso ocorre aos montes, e há poucos concorrentes interessados nesse tipo de ação.

Kammerichs também é daqueles que joga duro o tempo todo. Pode ser lento e não sair do chão, mas  seus rivais não se podem deixar levar pela falsa impressão de estarem diante de um molenga. Especialmente quando confrontado com jogadores pouco móveis ou atléticos, que não consigam se aproveitar de suas deficiências – como Lucas Cipolini e Luis Felipe Gruber fizeram no sábado, aliás –, seu tino pela bola e dedicação podem colocá-lo em vantagem com facilidade. Ele vai correr o contra-ataque e receber a assistência do armador velocista que disparou primeiro. Vai atacar o rebote ofensivo. Vai se posicionar em um buraco defensivo e ter toda a liberdade do mundo para matar seu arremesso de média distância, embora não seja nenhum Léo Gutiérrez em termos de precisão.

Daí o volume maior ofensivo, ainda que nenhuma jogada seja propriamente desenhada para sua prestação de serviços. A cada cesta que faz, ele tem o hábito de cerrar o punho, com o braço flexionado, vibrando consigo de um modo um tanto desengonçado. Nunca em sua vida foi tão fácil atacar assim, então é hora de comemorar e aproveitar mesmo.

Só fica registrada aqui, no fim, a expectativa de que esse esforçado operário possa exercer qualquer tipo de influência em seus concorrentes brasileiros que não pelos seus supostos dotes ofensivos.”

*  *  *

Sabia? Kammerichs também foi draftado na NBA, o Portland Trail Blazers, lá nos idos de 2002, o mesmo ano de Nenê. Ele saiu na posição 51, cinco postos acima de… Luis Scola!. O bigodudo foi testado algumas vezes pela franquia do Oregon, mas nunca assinou contrato.

Na época, ele havia acabado de sair do modesto clube Ourense, hoje na LEB Oro, para o Valencia, ex-clube de Faverani e Splitter (por umas semanas de lo(u)caute). Jogou na Espanha sem muito destaque até 2008, quando retornou para casa, pelo Regatas. Aqui, sua ficha técnica de quando jogou a Eurocup, como se fosse a Liga Europa do futebol, em 2004-2005.


< Anterior | Voltar à página inicial | Próximo>