Vinte Um

Nada que se compare a Ibaka na vitória do Thunder

Giancarlo Giampietro

a

Vamos lá, mais uma vez…

'''Cause NOOOOOOOTHING compares
Nothing compares 2 U!''

Calma, calma.

Não há clima para melodrama, sofrimento nenhum na base 21 aqui nesta manhã de segunda-feira, com o friozinho da zona sul paulistana lá fora. Muito menos em Oklahoma City. Lá o sol vai surgindo cheio de folia, depois do retorno de Serge Ibaka, com todos os retoques heróicos que os torcedores – mais os marketeiros – gostam. E nem dá para ser diferente, neste caso.

Mas que o igualmente histórico vídeo acima corre o risco de virar o clipe oficial da campanha do Thunder nestes playoffs da NBA, ô se corre. Independentemente do destino do time nos próximos dias. Vão virar o jogo contra o Spurs? Perdem na final? Ganham o tão esperado título para a dupla Durant-Wess? Não importa. Vamos todos chutar pedrinhas por aí com essa balada na cabeça, pensando no pivô.

“Se Ibaka jogar nesta série, vou raspar minha cabeça, usar um vestido, adotar um sotaque irlandês e cantar karaokê como Sinead O'Connor.''

Pois foi o que disse Scott Brooks, ainda em San Antonio, num dos blefes mais excêntricos da história da NBA. O técnico tentava de tudo para despistar sobre o possível retorno de seu pivô congolês-espanhol-mutante quando a série retornasse aos confins de Oklahoma. Todo mundo acreditou – menos Gregg Popovich, Tony Parker, Manu Ginóbili, Tim Duncan e o roupeiro do San Antonio.

Mas, que ótimo, né?

Aqui, vamos celebrar sempre quando uma fonte decide quebrar a rotina e mergulhar nas profundezas da cultura pop para dar uns quilates a mais a sua declaração.

Imagine se ele dissesse algo do tipo: “Gente do céu, já falei um milhão de vezes que o Ibaka não joga mais nesta final do Oeste. Chega disso”. Qual seria a graça desse chororô? Se for para chorar, que seja com a Sinead O’Connor.

Fato é que Ibaka se recuperou de seu estiramento na panturrilha – lesão que, segundo os médicos do Thunder, o afastaria do restante dos playoffs. Mesmo mancando em alguns momentos, ele pode ter alterado a série.

Foi o único fator? Claro que não:

1) Os rapazes de OKC notoriamente jogam melhor em casa. Especialmente contra os bandoleiros de San Antonio. Venceram agora os últimos oito confrontos em seu ginásio.

2) Brooks tomou a sábia – e ao mesmo tempo demorada – decisão de tornar seu time mais atlético em quadra. Arrancou Sefolosha e Collison de sua rotação e deu apenas 13 minutinhos para Perk. O experimento só não foi mais radical porque Derek Fisher e Caron Butler seguiram acima de Perry Jones, o Terceiro, na lista do técnico. Não exagera, né? Por mais inteligentes que sejam o ala suíço e o pivô que, ao lado de Durant, é o único remanescente da franquia dos tempos de Seattle, se for para apostar em gente cerebral, a vantagem tende a pender para o outro lado.

Então, com Reggie Jackson entre os titulares e Jeremy Lamb e Steven Adams ganhando mais espaço na segunda unidade, que viesse o caos para quadra, no ataque e, especialmente, na defesa. As linhas de passe ficam mais apertadas, o espaço para bater para a cesta também é reduzido.

Oi, gente, eu me chamo Reggie Jackson e também fui importante na nossa vitória, né? Depois de Sefolosha ter zerado nas duas primeiras partidas, o armador somou 15 pontos e 5 assistências no Jogo 3

Oi, gente, eu me chamo Reggie Jackson e também fui importante na nossa vitória, né? Depois de Sefolosha ter zerado nas duas primeiras partidas, o armador somou 15 pontos e 5 assistências no Jogo 3

De qualquer forma, a influência de Ibaka na partida foi obviamente maior, já pelo que fez num primeiro quarto que não poderia ser escrito nem em contos de fadas. O cara me faz a primeira cesta do time? E vai matando uma atrás da outra? E começa a dar tocos na defesa como se nada tivesse acontecido? Este já fica conhecido como oficialmente como o ''O Jogo do Ibaka'' nos registros históricos.

Para a autointitulada “Loud City” nem precisa de muito para o ginásio ser tomado pela histeria. Com o pivô aprontando dessas? Era recomendável o uso de protetor auricular. Até as 500 milhas da Indy ficaram mansinhas.

O impacto causado por Ibaka foi emocional inicialmente, mas, com o decorrer do jogo, se tornou ainda mais relevante no tabuleiro tático. Um Ibaka a 70, 80% já é no mínimo cinco vezes mais atlético que seus companheiros de garrafão. É o que se sente em quadra e que vai muito além dos quatro tocos que ele deu em 29 minutos neste Jogo 3, ou dos 2,7 tocos por partida durante a temporada regular (foi o segundo na liga nesse fundamento). Com sua envergadura e mesmo  agoraa limitada mobilidade, o pivô fecha espaços e intimida os adversários.

(Por outro lado, Nick Collison sabe aonde como se posicionar perfeitamente – ano após ano ele está entre os atletas que mais cavam/apanham em faltas de ataque –, mas não é capaz de surpreender um atacante pelo alto. Não vai ser aquele cara a contestar uma cesta quase certa e forçar o erro. O mesmo vale para Perkins. Adams, de 20 anos, vindo da Nova Zelândia, ainda está aprendendo os macetes – embora também tenha feito uma grande partida neste domingo.)

Não é que Ibaka apenas dê tocos e altere a rota de bandejas. Há casos em que seu oponente simplesmente nem vai olhar para a cesta, respeitando demais seus atributos defensivos. E isso vale até mesmo para um armador rápido e maroto como Parker (4-13 nos arremessos, 4 assistências e 4 turnovers), ou para um Tim Duncan (7-17 nos arremessos), com todos os seus anéis, prestígio e fundamentos. Só o Kawhi Leonard que não se importou muito:

Esse foi um caro corte para a cesta que resultou numa cesta fácil para o Spurs (com dois detalhes: talvez só tenha se tornado fácil devido ao arranque explosivo do ala e ao fato de Ibaka não estar 100% – reparem como ele ''demora'', segundo seus padrões, para largar Splitter e saltar na cobertura).  O time como um todo terminou o jogo com apenas 39,6% (36-91) nos arremessos, após ter combinado para 53,8% nas duas partidas em casa (91-169). Além disso, cometeu 16 desperdícios de posse de bola, vindo de apenas 9 e 12 em casa.

Esses números têm muito mais a ver com o que aconteceu entre os dois rivais durante a temporada regular, com Ibaka em ação, do que com o que vimos no início do duelo no Texas. Com o congolês-espanhol-mutante, o Thunder segurou o potente ataque de Popovich a 42 pontos no garrafão em média em quatro jogos, com 44% de acerto nos chutes. Sem ele, foram 60 pontos e 54%.

Joga lá para cima, mesmo, Manu, que o Ibaka quer te pegar

Joga lá para cima, mesmo, Manu, que o Ibaka quer te pegar

“A ausência de Serge é muito dura”, afirmou Reggie Jackson antes do Jogo 3. “Você fica até meio preguiçoso ao ter alguém como ele, que apaga tudo, na cobertura, interferindo em um monte de arremessos. Seu corpo começa a dizer algumas coisas: ‘Apenas os direcione no caminho de Serge’.”

Dentre as muitas declarações sobre o terceiro principal jogador do Thunder que li, acho que essa foi a melhor. Há tanta coisa implícita e explícita aqui. Vale destacar, pelo menos, o quão importante é a química que se desenvolve entre os atletas. Algo que você desenvolve com base na repetição diária de treinamentos que definitivamente você não vai reparar em menos de uma semana de treinos nas vésperas de uma final de conferência. A defesa da equipe se comporta de um jeito com Ibaka e de outra forma sem o cara, e não só por causa de sua constituição física assustadora.

Da mesma forma vale para o ataque, no qual marcou 15 pontos, com 6 cestas em 7 tentativas. É inevitável questionar como alguém tão ágil e forte como o pivô não tenha desenvolvido um jogo confiável de costas para a cesta. Acontece que, no ataque de Oklahoma City, todo e qualquer espaço obtido para infiltrações de Westbrook e Durant é bem-vindo. O grandalhão ter desenvolvido o chute de média para longa distância casa perfeitamente com essa proposta.

Nestes playoffs, Ibaka, aliás, tem a melhor média de acerto na média distância, convertendo 51,9%, entre aqueles que tentaram no mínimo 20 arremessos. Durante a temporada, ele matou 46,9% dali, quarto na liga entre os 65 jogadores que arriscaram pelo menos 250 vezes. Bem acima da média. Isto é: essa bola tem de ser respeitada, e a defesa do Spurs que se vire a partir daí – Splitter flutuando mais, em vez de se plantar embaixo da cesta, ou trocas rápidas na jogada de pick-and-pop, ou ajuda vindo da cabeça do garrafão, ou do lado contrário etc.

O Retorno de Ibaka

O Retorno de Ibaka

Claro, se Ibaka for jogar a próxima partida. Dessa vez o intervalo para recuperação é mais curto. Terça-feira já está aí – o que faz dos minutos a mais que ele jogou no domingo um tanto alarmantes: assim que Popovich limpou seu banco e voltou com Bonner, Ayres e Baynes, era o caso de Brooks ter sacado na hora seu pivô, mesmo que ainda restassem mais de cinco minutos.

Agora voltam as perguntas: será que joga? Será que joga e de modo efetivo?

Oklahoma City inteira vai cruzar os dedos em pensamento positivo. Todos eles cantando numa serenata que só para seu pivô: “Nada se compara a você”.